Conselhos gestores e regulação: a assistência social em tempos de transição

AutorCarla Cecília Rodrigues Almeida
CargoProfessora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá
Páginas251-270
Artigo
Conselhos gestores e regulação:
a assistência social em tempos de transição
Carla Cecília Rodrigues Almeida*
Resumo
O artigo analisa a atuação dos conselhos municipais de assistência social
no regramento das organizações da sociedade civil classificadas como
de assistência. Chama a atenção para a importância que essas instâncias
assumem para a operacionalização dos princípios mais gerais que regem
a política de assistência social no país. Enfocando a função reguladora
que os conselhos gestores exercem, procura compreender, de um lado, o
ambiente institucional mais amplo no qual eles estão inseridos e, de outro,
seu poder de remodelar um determinado tipo de associativismo que, até
recentemente, identificava-se e era identificado com a filantropia.
Palavras-chave: conselhos municipais, assistência social, Sistema Único de
Assistência Social, regulação, entidades de assistência social.
1. Introdução
Em 2003, a IV Conferência Nacional de Assistência Social aprovou
o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que forneceu os
fundamentos para a organização dessa política em todo o território
nacional. Um ano depois, como desdobramento, o Conselho Nacio-
nal aprovou a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), que
definiu e detalhou os conceitos referentes à gestão dessa política
específica, os direitos e os usuários que ela deveria abranger. Em
2005, aprovou-se a Norma Operacional Básica do SUAS (NOB/SUAS),
* Professora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de
Maringá. Endereço eletrônico: carlaalm@uol.com.br.
252 p. 251 – 269
Volume 8 – Nº 15 – outubro de 2009
que disciplinou a gestão da política de assistência, distribuindo suas
responsabilidades e definindo suas instâncias e instrumentos1.
Esse conjunto de normativas buscou responder aos impe-
rativos da Constituição de 1988 e da Lei Orgânica da Assistência
Social (LOAS) de 1993. Ao inscreverem a assistência no âmbito
do sistema público de seguridade do país, aqueles marcos legais
abriram as portas para um processo que, vinte anos depois, ainda
não se completou plenamente. Pode-se dizer que seus percalços
e descontinuidades refletem os obstáculos, novos e velhos, que
vêm desafiando a sociedade brasileira a cumprir as promessas de
universalização dos direitos e de aprofundamento democrático
instituídas pelo texto constitucional de 1988.
No que diz respeito aos obstáculos conhecidos de longa data,
o desafio é o de deslocar um conjunto de ações tradicionalmente
reconhecido como o terreno próprio da filantropia para o campo
específico dos direitos e das políticas públicas. E no que se refere
aos novos, após o desmonte efetuado pelas reformas estruturais
da década de 1990, o desafio é o de recuperar a capacidade do Es-
tado para assegurar direitos. É importante lembrar que, para além
desse, o desafio é o de também recuperar a própria legitimidade
em se fazer do Estado uma instância que responde por direitos, já
que aquelas reformas difundiram uma cultura de desqualificação
dos direitos. Nos seus termos, o sujeito de direitos passou a ser
concebido como o sujeito dependente do Estado e, por isso mesmo,
não digno de ser reconhecido como um igual.2
Nas páginas que se seguem, analiso esse processo de cons-
tituição da assistência social como uma área específica de política
pública, tendo como foco a atuação dos conselhos municipais. Mais
precisamente, analiso sua atuação frente às responsabilidades de
ajustar a prática e o funcionamento das organizações da sociedade
1 Esse artigo é resultado de uma pesquisa que contou com o apoio financeiro
da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Estadual de Ma-
ringá (PPG/UEM) e foi desenvolvida no quadro do programa Observatório das
Metrópoles – Instituto do Milênio – CNPq.
2 Sobre os deslocamentos simbólicos que acompanharam e ajudaram a garantir
a implementação das reformas estruturais no Brasil, ver Almeida (2006).

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