CONTROLADORES DE ACESSO DA AGENDA PÚBLICA: AS CONSTRUÇÕES DE MASCULINIDADES CISGÊNERAS HEGEMÔNICAS NO PANORAMA PRÉ-ELEITORAL DE 2018 NO BRASIL

AutorVicente Tchalian, Lucas Guerra da Silva
Páginas210-227
GÊNERO|Niterói|v.19|n.2|210 |1. sem.2019
CONTROLADORES DE ACESSO DA AGENDA PÚBLI-
CA: AS CONSTRUÇÕES DE MASCULINIDADES CISGÊ-
NERAS HEGEMÔNICAS NO PANORAMA PRÉ-ELEI-
TORAL DE 2018 NO BRASIL
Vicente Tchalian1
Lucas Guerra da Silva2
Resumo: Esse trabalho observou discursos de pré-candidatos à presidência do
Brasil em 2018, com vistas a analisar como se dão construções de masculinida-
des ali performadas. Nosso escopo teórico centra-se nas discussões sobre mas-
culinidade hegemônica e participação política de mulheres no cenário brasileiro,
na crítica ao dispositivo da transgeneridade e à cisnormatividade heterocentrada.
Partimos da observação e tabelamento dos dados gerados por meio de vídeos
postados no site Youtube® e popularidade no Facebook, além de dados de pes-
quisas do Datafolha para propor uma análise crítica da atual conjuntura políti-
ca do país, a partir do aprofundamento da categoria “controladores de acesso”.
Palavras chave: masculinidade; política; discurso.
Abstract: The present workaimedto observe the speeches of presidential candi-
dates of the year 2018 in Brazil to perceive how constructions of masculinities
performed by these actors are given. Our theoretical scope focuses on discus-
sions about hegemonic masculinity and political participation of women in Brazil
politics, as well as the critique of transdipositive and heterocentriccisnormativity.
We started with the observation and tabulation of data generated through vide-
os posted on Youtube® and the interaction of the public with them, as well as
data from Datafolha surveys to propose a critical analysis of the current politi-
cal situation, trhoughout the deepening of the cathegory “access controllers”.
Keywords: masculinity; politics; discourse.
Introdução
Os processos de construção de masculinidades não são descolados da história,
da cultura, das estruturas sociais e instituições do Estado. Uma das referências
mais citadas nos estudos sobre essa temática é Raewyn Connell, cuja obra consis-
1 Mestre em Estudos de Cultura Contemporânea (UFMT), cursando doutorado no mesmo programa. E-mail:
tchalian2@gmail.com.
2 Mestre em Políticas Sociais e Dinâmicas Reginais (Unochapecó), cursando doutorado em Estudos de Cultura
Contemporânea (UFMT). E-mail: lucasguerra.psicologo@gmail.com.
p.210-227
GÊNERO|Niterói|v.19|n.2| 211|1. sem.2019
te na consagração da categoria masculinidade hegemônica, que segundo a autora
poderia ser definida como “uma configuração de práticas organizadas em relação
à estrutura das relações de gênero” (CONNELL, 2013, p. 259). Tais práticas re-
petidas historicamente vão enrijecendo as possibilidades de construções de mas-
culinidades diferentes das hegemônicas, alocando assim apenas em alguns corpos
essa performance. Entretanto, podemos perceber que durante esse processo de
repetição emergem também possibilidades de fuga, de desvios da rota prevista.
Que a masculinidade hegemônica está relacionada com formas particulares de re-
presentação e uso dos corpos dos homens já foi reconhecido desde as formulações
iniciais do conceito. (CONNELL, 2013, p. 269, destaque nosso).
Ao afirmar que por masculinidade podemos compreender práticas e uso dos
corpos dos homens, Connell (2013) não leva em consideração, por exemplo, os
corpos transmasculinos. Essa prática de exclusão de masculinidades apresentadas
por corpos não cisgêneros constitui uma ferramenta que cria a norma ao mesmo
tempo que cria o anormal. Podemos dizer que o mesmo ocorre com outras mas-
culinidades (gays, pessoas com deficiência, negros, idosos, etc.).
Pensar os corpos humanos categorizando-os de acordo com uma diferença
anatômica visível é uma tradição já bastante imbricada na estruturação de todo
o globo, salvo raras exceções. Tem-se que durante os estudos sobre anatomia,
mediante procedimentos de investigação invasiva em cadáveres fabricaram-se
desenhos que foram espalhados pelo Ocidente e que são utilizados até hoje como
verdades. Como demonstrou Laqueur (2001), apenas na história recente os li-
vros de anatomia humana descrevem o clitóris de forma mais realista, graças às
tecnologias médicas.
Essas construções de uma versão universalizante da história, repetidas co-
tidianamente por meio de instituições já eleitas como produtoras de realidades
produzem um efeito de verdade a essas construções. Vivemos na contempora-
neidade os resultados dessas cadeias de efeitos, produtoras de verdades que com-
partilhamos, reiterando assim sua veracidade ou, ao menos, credibilidade. Con-
sideramos que vivemos ainda a não atualização desses mitos-verdades divulgados
pela ciência ocidental, tanto na forma como compreendemos e fazemos ciência,
como na forma com que fazemos as informações obtidas por meio desses proces-
sos chegarem às demais pessoas. Bom exemplo disso são as políticas públicas com
foco em saúde da população masculina cisgênera.
A Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (BRASIL, 2008)
apresenta a definição de que existe uma realidade singular masculina pautada
na cisgeneridade como norma e atrelada a diversos contextos corporais-ana-
tômicos, socioculturais, políticos e econômicos que teria impacto direto na
p.210-227

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT