Crítica À Prescrição Trabalhista: Entre A Realização Do Estado Social E A Proteção Ao Capital

AutorValdete Souto Severo
CargoJuíza do trabalho no Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região. Mestre em Direitos Fundamentais, pela Pontifícia Universidade Católica
Páginas99-124
99
Volume 89, número 01, jan.-jun. 2017
CRÍTICA À PRESCRIÇÃO TRABALHISTA:
ENTRE A REALIZAÇÃO DO ESTADO SOCIAL E A PROTEÇÃO
AO CAPITAL
CRITICAL TO THE LABOR PRESCRIPTION: BETWEEN THE
REALIZATION OF THE SOCIAL STATE AND THE
PROTECTION OF CAPITAL
Valdete Souto Severo1
RESUMO:
Este artigo estabelece um estudo crítico acerca da função que a prescrição desempenha
no contexto de um Estado Social. A perspectiva de análise é a dos direitos fundamentais
trabalhistas. O texto propõe algumas sugestões de aplicação restritiva da prescrição no
âmbito das relações de trabalho. O processo do trabalho e o direito do trabalho constituem
instrumentos que servem à reprodução da sociedade capitalista. Também são, porém,
fatores de tensão do sistema, permitindo que ele continue se desenvolvendo. Sob esse
enfoque, a prescrição trabalhista, para que não implique negação dos direitos
fundamentais do trabalhador, deve ser aplicada sempre com a máxima restrição possível.
PALAVRAS-CHAVE: direito do trabalho – processo do trabalho - prescrição – direitos
fundamentais
ABSTRACT:
This article contains a critical study of the role that prescription plays in the context of a
welfare state. The analytical perspective is that of labor fundamental rights. The text
proposes some suggestions restrictive application of prescription in the context of labor
relations. The process of labor and labor law are instruments that serve the reproduction
of capitalist society. They are also, however, system voltage factors, allowing it to
continue developing. Under this approach, the Labour prescription, for not involving
denial of fundamental rights of the worker should always be applied with the greatest
possible restraint.
KEYWORDS: labor law - work process - prescription - fundamental rights
1 Juíza do trabalho no Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região. Mestre em Direitos Fundamentais,
pela Pontifícia Universidade Católica - PUC do RS. Doutora em Direito do Trabalho pela USP/SP.
Recebimento em 26/06/2017
Aceito em 08/09/2017
100
Volume 89, número 01, jan.-jun. 2017
1 INTRODUÇÃO
“O legislador - pensei - é como aquele mágico.
Quando quer, faz o direito sumir na
cartola, ou o transforma num inofensivo coelho.
Mistura e confunde realidade e fantasia,
trocando a essência pela aparência
(Márcio Túlio Viana, no texto “OS PARADOXOS DA PRESCRIÇÃO.
Quando o trabalhador se faz cúmplice involuntário da perda de seus Direitos”)
O discurso de efetividade dos direitos trabalhistas, para que seja coerente e tenha
implicações práticas, deve necessariamente passar pelo exame da prescrição. Festejado
como um instrumento de garantia da paz social, a prescrição se revela como medida de
proteção ao patrimônio e de contenção de demandas, desde uma lógica empresarial de
que é preciso reduzir o número de processos, mesmo que à custa da efetiva solução dos
conflitos sociais.
A gestão por metas, adotada explicitamente no âmbito do Poder Judiciário, desde
a criação do Conselho Nacional de Justiça, pela Emenda 45/2004, vem determinando o
modo como esse instituto é aplicado. Um exemplo bastante eloquente é a recente decisão
do STF, que reduz o prazo de prescrição para a cobrança do FGTS, de trinta para cinco
anos, apesar do que dispõe a lei específica, posterior a Constituição e flagrantemente mais
benéfica.
Tudo isso indica a necessidade de reavaliarmos as normas ligadas à prescrição, no
âmbito das relações de trabalho, a fim de compreender as razões para a sua incidência e
para o seu afastamento, sempre da perspectiva da função que o Poder Judiciário exerce
ou deveria exercer, num contexto de Estado Social.
Com esse propósito, tratarei aqui da prescrição sob a ótica exclusiva das relações
de trabalho, a partir do reexame e da compreensão do artigo 7º, XXIX, da Constituição,
à luz do princípio da proteção e da necessária efetividade dos direitos fundamentais
trabalhistas.

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