Decisão Monocrática nº 50000455020188210058 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 04-04-2022

Data de Julgamento04 Abril 2022
ÓrgãoNona Câmara Cível
Classe processualRemessa Necessária
Número do processo50000455020188210058
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001985536
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Remessa Necessária Cível Nº 5000045-50.2018.8.21.0058/RS

TIPO DE AÇÃO: Auxílio-Doença Previdenciário

RELATOR(A): Des. EUGENIO FACCHINI NETO

PARTE AUTORA: OSMAR DONIZETE GONCALVES (AUTOR)

PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

REEXAME NECESSÁRIO. ACIDENTE DE TRABALHO. NÃO CONHECIMENTO. sentença aparentemente ilíquida. condenação de valor facilmente determinável. potencial econômico da condenação que, EM JUÍZO DE PROJEÇÃO, não alcançará o teto estabelecido no art. 496, § 3º, I, do cpc/2015.

1. A nova redação dada ao art. 496, §§ 1º e 3º, do CPC/2015 disciplina o reexame necessário de forma diversa do CPC/73. Á primeira vista se poderia pensar que a alteração legislativa limitou-se ao aumento do teto do valor estabelecido como parâmetro para a submissão ao reexame oficioso – que de 60 (sessenta) salários mínimos passou para 1.000 (mil), em se tratando da União.

2. Contudo, embora evidente e altamente significativa, essa não foi a única modificação, visto que o parágrafo primeiro, ao substituir a expressão “haja ou não apelação” pela expressão “não interposta a apelação no prazo legal”, deixou claro que a remessa de ofício se dará apenas se ausente o recurso voluntário.

3. Na linha das transformações operadas, se antes talvez fosse compreensível a submissão irrestrita e em larga escala de toda e qualquer sentença ilíquida proferida contra a fazenda pública ao duplo grau de jurisdição, mesmo quando o potencial econômico da condenação fosse insignificante ou relativamente módico (como forma de “proteger” o patrimônio público) e não houvesse recurso da parte interessada, hoje tal imposição não mais se sustenta. Destarte, a manutenção do reexame obrigatório em nosso ordenamento jurídico se justifica apenas em casos especiais, a saber: quando o valor da condenação, ainda que ilíquido, for realmente alto (isto é, evidentemente acima do teto estabelecido no novel diploma processual, mesmo em juízo de projeção), e não houver recurso voluntário da Fazenda Pública. Viabilidade de se fazer o juízo de admissibilidade com base em projeção que já encontrava respaldo em precedentes do STJ na vigência do CPC/73.

4. No caso em exame, não houve recurso voluntário. Não obstante, embora aparentemente “ilíquida”, é possível constatar que o valor da condenação não tem a menor possibilidade de ultrapassar o teto estabelecido no art. 496, § 3º, inciso I do CPC/15.

reexame necessário não conhecido, DE PLANO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

Trata-se de reexame necessário de sentença proferida nos autos da ação acidentária ajuizada por OSMAR DONIZETE GONCALVES contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, cuja parte dispositiva é a seguinte:

Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do NCPC, julgo PROCEDENTE o pedido formulado por OSMAR DONIZETE GONÇALVES em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, e extingo o processo, com resolução do mérito, para CONDENAR o réu ao pagamento do auxílio-acidente, a contar da data seguinte ao dia da cessação do auxílio-doença (05.10.2017), corrigido monetariamente pelo índice oficial de remumeração básica da caderneta de poupança desde a data em que era devido até 25.03.2015 e, após, pelo IPCA-E, acrescido de juros de mora aplicáveis à caderneta de poupança, a contar da citação.

CONDENO o réu ao pagamento de honorários advocatícios, os quais, tendo em vista a natureza da causa, fixo em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da publicação da sentença, com fundamento no art. 85, §2°, do NCPC, no Enunciado n° 76 da Súmula do TRF-4 e n° 111 da Súmula do STJ.

Isento o réu do pagamento das custas processuais, conforme prevê o art. 11, caput, da Lei n° 8.121/85 (Regimento de Custas do Estado do Rio Grande do Sul), com redação data pela Lei n° 13.471/2010 (TRF-4, AG 0005256-81.2014.404.0000, 6ª Turma, Rel. Des. Vânia Hack de Almeida, D.E. 10.12.2014).

(...)

Parecer do MP pleo não conhecimento do reexame (EVENTO 8 destes autos eletrônicos de segundo grau).

É o breve relatório.

Analiso.

Decido monocraticamente o recurso, forte no art. 932, inciso III do CPC/2015, sob registro que a situação encontra enquadramento no referido permissivo legal, pois sobre o tema controvertido há entendimento consolidado junto a este Órgão Fracionário, respaldado inclusive em recente precedente do STJ, a evidenciar a desnecessidade de apresentação do recurso em mesa. Ademais, fica resguardado às partes o direito de provocação do Colegiado, se assim entenderem conveniente, mediante eventual interposição do recurso adequado para tanto.

Pois bem.

Cediço que o STJ, em sede de recurso repetitivo1 (art. 543-C do CPC), firmou entendimento – que redundou na edição da Súmula 4902 –, no sentido da obrigatoriedade de realização do reexame necessário de sentenças condenatórias ilíquidas proferidas contra a Fazenda Pública.

Tal entendimento alicerçou-se especialmente no Código de Processo Civil de 1973, cujo art. 475 assim prelecionava:

(...)

Art. 475: Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

I – proferida contra a União, os Estados, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;

(...)

§ 1º. Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.

§ 2º. Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo e não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.

(...)

Ocorre que o legislador infraconstitucional, ao editar o novo Código de Processo Civil, optou por disciplinar a matéria de forma diversa, dando-lhe novos contornos, esses muito mais condizentes com a realidade hodierna enfrentada pelos tribunais pátrios, senão vejamos:

(...)

Art. 496: Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

(...)

§ 1º. Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.

(...)

§ 3º. Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:

I – 1.000 (mil) salários mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – 500 (quinhentos) salários mínimos para os Estados e as respectivas autarquias e fundações e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;

III – 100 (cem) salários mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações de direito público

(...)

À primeira vista se poderia pensar que a alteração legislativa limitou-se ao aumento do teto do valor estabelecido como parâmetro para a submissão ao reexame oficioso – que de 60 (sessenta) salários mínimos passou para 1.000 (mil), em se tratando da União e suas autarquias e fundações de direito público.

Contudo, embora ‘gritante’ e extremamente significativa, essa não foi a única modificação. Isso porque o parágrafo primeiro, ao substituir a expressão “haja ou não apelação” pela expressão “não interposta a apelação no prazo legal”, deixou claro e cristalino que a remessa de ofício se dará apenas e tão somente se ausente o recurso voluntário.

Como bem pontuou o Colega Richinitti, no voto que capitaneou a mudança de entendimento desta Câmara acerca do tema (proferido nos autos da Apelação Cível nº 70070429097, julgada na sessão de fevereiro de 2017:

(...)

“É de conhecimento geral que não se presumem, na lei, palavras inúteis. Recomenda a boa hermenêutica, efetivamente, que todas as palavras, expressões, locuções e orações empregadas em textos normativos devem ser compreendidas, sempre que possível, com a sua devida utilidade e eficácia, em conformidade com a velha máxima segundo a qual verba cum effectu sunt accipienda.

Sob tal perspectiva, é preciso reconhecer que expressões e termos introduzidos em legislações revogadoras – seja mediante substituição de uma palavra, frase ou período anteriormente positivado na norma, seja mediante acréscimo de uma ou mais expressões que não constavam do texto revogado – ganham especial relevo quando se busca interpretar determinada regra a partir da nova redação que lhe foi conferida.”

(...)

Quis o legislador, portanto, com essas duas alterações significativas, reduzir drasticamente o número de processos remetidos aos tribunais para o reexame de ofício, cuja prática em larga escala, embora pudesse encontrar importante justificativa no passado, hoje não mais se sustenta, ao menos não na conformação anterior.

Peço vênia aos Colegas pela digressão que seguirá, a qual julgo necessária para contextualização do problema e justificação do posicionamento que passarei a adotar.

Especialmente a partir de meados do século passado, o Estado passou a atuar em várias frentes, inclusive no domínio econômico. Inúmeras empresas públicas, autarquias e sociedades de economia mista foram criadas para atender as demandas da população, abrangendo as áreas de energia elétrica, telefonia, saneamento básico, saúde, exploração de minérios, dentre outras, passando a configurar o que veio a ser chamado de “estado máximo”, dotado de uma administração burocrática, e, não raro, corrupta (infelizmente). Por evidente, quanto mais abrangente era o seu leque de atuação, maior o número de demandas judiciais que passou a enfrentar. E mais difícil tornou-se a defesa de seus interesses em juízo, pois não contava com quadro de...

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