Decisão Monocrática nº 50000491320158210149 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 01-04-2022

Data de Julgamento01 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50000491320158210149
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001972989
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000049-13.2015.8.21.0149/RS

TIPO DE AÇÃO: Poluição

RELATOR(A): Desa. MARILENE BONZANINI

APELANTE: DUILIO CEOLIN (RÉU)

APELANTE: ROGERIO CEOLIN (RÉU)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. decisão monocrática. DIREITO AMBIENTAL. aÇÃO CIVIL PÚBLICA. DRENAGEM DE BANHADO. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DANO COMPROVADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO INFRATOR. LEGITIMIDADE COMPROVADA.

- O Código Estadual do Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul, Lei nº 11.520/200, define, no art. 14, XIV, os banhados “como extensões de terras normalmente saturadas de água onde se desenvolvem fauna e flora típicas”, arrolando-os como área de preservação permanente.

- O nexo de causalidade entre a limpeza de valas para drenagem do banhado com o objetivo de usar a área para o cultivo agrícola, comprovada por meio dos depoimentos, laudos e prova técnica produzida nos autos, redunda no dano ambiental.

- A configuração do dano ambiental, em face da responsabilidade objetiva, não exige a comprovação de culpa do agente, mostrando-se suficiente o liame entre o dano e o nexo de causalidade.

APELO DESPROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Adoto o relatório do parecer ministerial, da lavra do Dr. Anizio Pires Gavião Filho, verbis:

Trata-se de recurso de apelação interposto por Rogério Ceolin e outros, inconformados com a sentença que, nos autos da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul contra o Espólio de Duílio Ceolin e Rogério Ceolin, julgou procedente o pedido formulado, determinando que os requeridos se abstenham de praticar, nas suas propriedades, ou em áreas sob sua responsabilidade, abertura ou limpeza de drenos em banhados ou outras Áreas de Preservação Permanente sem autorização do órgão florestal competente (SEMA/DEFAP), bem como de exercer atividade de agricultura em distância inferior a 50 metros dos banhados e outras APPs, sob pena de multa de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a cada fiscalização realizada pelos órgãos competentes, consolidada em R$ 200.000,00 (duzentos mil reais). A sentença determinou, também, que o requerido Rogério apresente, no prazo de 60 dias projeto de recuperação de área degradada - PRAD, prevendo a regeneração da área de preservação permanente e sua vegetação nativa, representada pela faixa marginal de 50 metros de largura ao longo do banhado existente no local degradado, a ser aprovado pelo DEFAP/SEMA, a ser elaborado por profissional legalmente habilitado (com ART) e a partir da sua aprovação, execute-o no prazo estabelecido pelo órgão ambiental estadual, estabelecendo, por fim, que em caso de impossibilidade da implementação das providências in espécie ou diante de outros fatores, como mora excessiva por parte dos réus, a obrigação será convertida em perdas e danos. A sentença, ainda, condenou os requeridos ao pagamento do valor de R$ 195.500,00 (cento e noventa e cinco mil e quinhentos reais) a título de indenização pelos danos ambientais, a ser atualizado pelo índice IGP-M a partir de 06/12/2011 (data do cálculo), e acrescido de juros de 1% ao mês, a contar da data do evento danoso – 12/08/2011, conforme súmula 54 do STJ, até o efetivo pagamento, que deverá ser recolhido ao Fundo Municipal do Meio Ambiente de Jóia, nos termos da Lei 7.347/85, artigo 13, ou outro órgão a ser indicado pelo MP (evento 3 -PROCJUDIC11 - 1° grau).

Em suas razões recursais, a parte apelante busca a reforma da decisão. Argumenta que a prova produzida não é apta a ensejar a condenação. Aduz que as valas existem desde 2003, quando não eram proprietária do terreno, não sendo de sua responsabilidade. Defende a inexistência de dano ambiental. Requer o provimento do recurso (evento 3 - PROCJUDIC11- 1° grau).

Foram apresentadas contrarrazões (evento 3 - PROCJUDIC12- 1° grau).

Recebidos os autos por redistribuição.

Ministério Público opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso - evento 13, PARECER1.

Relatei.

O recurso devolve à Corte a sentença de procedência da ação civil pública ajuizada em face de dano ambiental (limpeza de valas para drenagem de banhado, sem licenciamento ambiental) na propriedade da parte demandada, ora apelante, em Carajá Grande, zona rural do Município de Joia. O juízo singular condenou a parte recorrente ao pagamento de R$ 195.500,00 (cento e noventa e cinco mil e quinhentos reais) a título de indenização pelos danos ambientais.

Segundo consta do inquérito que deu ensejo à ação, a drenagem do banhado tinha o escopo de aumentar a área de cultivo agrícola, sem autorização do órgão florestal, em Área de Preservação Permanente, com drenos de banhado e lavoura em distância inferior a 50 metros dos espaços protegidas.

A controvérsia trazida à apreciação desta Corte diz com a negativa da parte em relação ao dano ambiental.

A questão não é nova, já tive oportunidade de me debruçar sobre o tema quando da análise do Agravo de Instrumento nº 70067401422 e Agravo Interno nº 70068564327.

Em ambas oportunidades afirmei que o Código Estadual do Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul, Lei nº 11.520/2000, define, no art. 14, XIV, os banhados “como extensões de terras normalmente saturadas de água onde se desenvolvem fauna e flora típicas”, arrolando-os como área de preservação permanente, no art. 155, in verbis:

Art. 155 - Consideram-se de preservação permanente, além das definidas em legislação, as áreas, a vegetação nativa e demais formas de vegetação situadas:

(...)

VI - nos manguezais, marismas, nascentes e banhados;

Em razão da função ambiental, os banhados são considerados área de preservação ambiental. Dito isso, importa esclarecer que, além de incontroversa a propriedade dos demandados, ora apelantes, às fls. 46 e 47 do processo 5000049-13.2015.8.21.0149/RS, evento 3, PROCJUDIC4 consta a carta de anuência, legitimando para a ação pai e filho [sendo que o primeiro veio a óbito ao longo da instrução, razão pela qual ROGERIO CEOLIN e responde pela demanda por si e na qualidade de inventariante do pai].

Postas as premissas, justo que se diga que a natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental é matéria que encontra divergência em sede doutrinária, como destaca Edis Milaré1:

“Uma primeira corrente, ancorada no mito da responsabilidade objetiva, pioneiramente defendida por Hely Lopes Meirelles, aduz que quando a Lei 9.605/1998 se referiu à infração administrativa como toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente, não a condicionando a uma voluntariedade do sujeito que as violou, acabou por estabelecer, como regra geral, a teoria da responsabilidade objetiva no âmbito administrativo-ambiental. A culpa será a exceção, nas hipóteses prefixadas no ordenamento. Perfilham esse entendimento Paulo Affonso Leme Machado, Vladimir Passos de Freitas, Joel Ilan Paciornik, Theo Marés, Flávio Dino e Nicolao Dino Neto.

Em outra frente, sob a bandeira da responsabilidade subjetiva, pugna-se pela imprescindibilidade da culpa, lato sensu, como elemento necessário para a caracterização da infração administrativa, forte nas garantias expressas no art. 5.º, LV e LVII, da CF/1988, que asseguram aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, o contraditório e a mais ampla defesa, além da presunção de inocência. De tal arte, admitir-se a responsabilidade objetiva do suposto infrator, in casu, equivaleria a tornar letra morta ditas garantias. Entre os defensores dessa corrente, encontramos Fábio Medina Osório Heraldo Garcia Vitta, Ricardo Carneiro, Edilson Pereira Nobre Júnior, Daniel Ferreira e Regis Fernandes de Oliveira.”

No âmbito jurisprudência, a controvérsia também impera. Contudo, o Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o EREsp 1.318.051/RJ, da relatoria do Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, publicado em 08/05/2019, pacificou o entendimento no sentido de que a aplicação de penalidades administrativas não obedece à lógica da responsabilidade objetiva da esfera cível (para reparação dos danos causados), devendo obedecer à sistemática da teoria da culpabilidade. Ou seja, a conduta deve ser cometida, pelo alegado transgressor, com demonstração do elemento subjetivo, e com demonstração do nexo causal entre a conduta e o dano. Eis a ementa do referido julgado:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA SUBMETIDOS AO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 2/STJ. EMBARGOS À EXECUÇÃO. AUTO DE INFRAÇÃO LAVRADO EM RAZÃO DE DANO AMBIENTAL. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SUBJETIVA.

1. Na origem, foram opostos embargos à execução objetivando a anulação de auto de infração lavrado pelo Município de Guapimirim - ora embargado -, por danos ambientais decorrentes do derramamento de óleo diesel pertencente à ora embargante, após descarrilamento de composição férrea da Ferrovia Centro Atlântica (FCA).

2. A sentença de procedência dos embargos à execução foi reformada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro pelo fundamento de que "o risco da atividade desempenhada pela apelada ao causar danos ao meio ambiente consubstancia o nexo causal de sua responsabilidade, não havendo, por conseguinte, que se falar em ilegitimidade da embargante para figurar no polo passivo do auto de infração que lhe fora imposto", entendimento esse mantido no acórdão ora embargado sob o fundamento de que "[a] responsabilidade administrativa ambiental é objetiva".

3. Ocorre que, conforme assentado pela Segunda Turma no julgamento do REsp 1.251.697/PR, de minha relatoria, DJe de 17/4/2012), "a aplicação de penalidades administrativas não obedece à lógica da responsabilidade objetiva da esfera cível (para reparação dos danos causados), mas deve...

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