Decisão Monocrática nº 50001028820208212001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 21-02-2022

Data de Julgamento21 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50001028820208212001
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001657803
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000102-88.2020.8.21.2001/RS

TIPO DE AÇÃO: Reconhecimento/Dissolução

RELATOR(A): Desa. VERA LÚCIA DEBONI

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL POST MORTEM. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DOS REQUISITOS da CONVIVÊNCIA PÚBLICA, CONTÍNUA E DURADOURA E ESTABELECIDA COM O OBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA. RELACIONAMENTO AFETIVO DA AUTORA COM O DE CUJUS QUE OCORREU DURANTE O PERÍODO DE CASAMENTO, aplicando-se ao caso o disposto no Tema 529 do stf, no sentido de que A preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1.723, § 1º, do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro. APELAÇÃO PROVIDA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de apreciar recurso de apelação interposto por Zeli R. da R., 74 anos, através de advogado constituído, por inconformidade com a sentença do 2° Juízo da Vara de Família do Foro Regional do Alto Petrópolis da Comarca de Porto Alegre, que nos autos da ação de reconhecimento de união estável post mortem com o de cujus Romar R. ajuizada por Maria Helena N., 65 anos, julgou procedentes os pedidos da inicial, a fim de reconhecer a existência de união estável entre a autora e o falecido de 1987 até 22/06/2017, declarando-a dissolvida (Evento 183, SENT1, autos originários).

Em suas razões recursais, a apelante narrou que o falecido era casado com a apelante desde 20 de novembro de 1984 até a data de seu óbito ocorrido em 22 de junho de 2017. Afirmou que houve um relacionamento entre a apelada e o de cujus, todavia não há prova inconteste de que tal situação denote verdadeiramente uma união estável. Aduziu que a apelada não demonstrou o preenchimento dos requisitos que abarcam uma união estável. Informou que, pouco antes de falecer, o de cujus ainda mantinha vínculo com a genitora de Keith. Disse que as informantes apontaram que o de cujus não comparecia nas festas de familiares, causando até mesmo a impressão de ser uma pessoa com comportamento antissocial. Apontou que, quando de seu falecimento, o de cujus não morava com a apelada. Asseverou que a apelada e o de cujus se separaram por algum tempo e voltaram, vindo a se separar novamente. Afirmou que tal comportamento denota não haver continuidade na relação. Alegou que a apelada tinha conhecimento do estado civil do de cujus, antes mesmo de se relacionar com ele. Pediu a gratuidade de justiça. Pugnou, nesses termos, pela reforma da sentença (Evento 193, APELAÇÃO1, autos originários).

Em contrarrazões, a parte apelada sustentou que, ainda que o de cujus estivesse na condição de casado com Zeli, faticamente vivia com a companheira Maria Helena, a qual inclusive declarou o seu falecimento. Destacou ser indubitável que a convivência estabelecida entre a apelada e o de cujus, ao longo de mais de trinta anos, deu-se nos moldes de uma entidade familiar, não se tratando de mero namoro ou concubinato. Pediu o desprovimento do recurso (Evento 198, CONTRAZAP1, autos originários).

O Ministério Público declinou intervenção (Evento 7, PARECER1).

Os autos vieram-me conclusos em 25/11/2021 (Evento 8).

É o relatório.

Decido.

Analisando o feito, tenho que seja caso de julgamento monocrático, nos termos da Súmula nº 568 do Superior Tribunal de Justiça, bem como previsão do art. 932, VIII, do Código de Processo Civil, e do art. 206, XXXVI do Regimento Interno desta Corte.

O recurso é apto, tempestivo e estão presentes os demais requisitos de admissibilidade.

Não foram suscitadas preliminares, de forma que passo à análise do mérito.

No caso dos autos, é incontroverso que no período em que alegadamente a recorrente vivia em união estável com o de cujus, este e a apelante Zeli estavam casados.

Por esse motivo, inclusive, a recorrente foi citada para contestar a presente ação, alegando o que segue, conforme constou da sentença vergastada:

Em contestação, as filhas do de cujus não reconheceram a união estável entre a parte autora e seu genitor, referindo que o falecido manteve matrimônio de 20 de novembro de 1984 até a data de seu óbito com a genitora das requeridas. Afirmaram que o genitor teve outros relacionamentos extraconjugais, inclusive acostaram documento de K.D.S.R, também filho do falecido (Evento 1, CONT4).

Aditada a inicial, para que a esposa do de cujus, assim como seu outro filho, passassem a integrar a lide. Em contestação, Z.R.D.R, viúva, informou que nunca esteve separada de fato do de cujus e que tinha conhecimento do comportamento do falecido no que tange às relações extraconjugais, sendo a autora apenas "amante", não companheira de Romar. Reforçou que o falecido também teve um relacionamento extraconjugal com E.M.A.D.S, advindo uma filha, K.D.S.R.

Ao que verifica do caderno processual, a apelada alegou que conviveu com o falecido, como se marido e mulher fossem, por mais de trinta anos, até a morte de Romar, em 22/06/2017. Ainda, disse que, do relacionamento, sobreveio o nascimento de filho Petro.N.R, que, atualmente, é maior e capaz.

No ponto, inclusive, quando da audiência de instrução e julgamento virtual (Eventos 162 e 163), a autora corroborou com o alegado na inicial (Evento 163, VÍDEO1), dizendo em seu depoimento pessoal que no início da união, Romar ainda estava com Zeli, passando posteriormente a ficar só com ela.

Por outro lado, a viúva Zeli, ora apelante, informou que nunca esteve separada de fato do de cujus e que tinha conhecimento do comportamento do falecido no que tange às relações extraconjugais. Afora isso, reforçou que Romar também teve um relacionamento com outra mulher, Elisete M.A.D.S, advindo inclusive o nascimento de um filho, Keith D.S.R.

Nesse contexto, frisa-se que a união estável se caracteriza como sendo um fato social ao qual a lei empresta efeitos jurídicos, desde que preenchidos determinados requisitos, que estão elencados no art. 1.723 do Código Civil como sendo: a convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família, entre pessoas não impedidas de casar.

Como situação de fato que é, ao seu reconhecimento deve haver cuidadosa análise das provas produzidas pelas partes, porquanto somente o caso concreto poderá evidenciar se existia o ânimo de viverem com se casados fossem.

A respeito do tema, cito a lição de Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald:

(...)

Equivale a dizer: cuida-se, em verdade, de um 'casamento de...

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