Decisão Monocrática nº 50001963920208210060 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Primeira Câmara Cível, 09-03-2022

Data de Julgamento09 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50001963920208210060
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001515858
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

11ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000196-39.2020.8.21.0060/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR(A): Des. GUINTHER SPODE

APELANTE: HARDI CHRISTMANN (AUTOR)

APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. RMC. DEVER DE PRESTAR INFORMAÇÃO CLARA E ADEQUADA DESCUMPRIDO. EXIGÊNCIA DE VANTAGEM MANIFESTAMENTE EXCESSIVA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. PRÁTICA ABUSIVA - ART. 39, IV E V, CDC. CONVERSÃO DO CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO EM EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO. instrução normativa do inss. vedação da capitalização dos juros. PEDIDO PRINCIPAL REJEITADO. PEDIDO SUBSIDIÁRIO ACOLHIDO.

CONTRATAÇÃO QUE CONFIGURA TER A INSTITUIÇÃO BANCÁRIA EXIGIDO Do CONSUMIDOR VANTAGEM MANIFESTAMENTE EXCESSIVA, DELe PREVALECENDO-SE, PORQUE, ALÉM DE NÃO SE TRATAR DE EMPRÉSTIMO PESSOAL PURO E SIMPLES, SEQUER HÁ DEFINIÇÃO DA QUANTIDADE DE PARCELAS NECESSÁRIAS AO ADIMPLEMENTO DA DÍVIDA ASSUMIDA. PARCELAS ATRELADAS AOS PROVENTOS DE APOSENTADORIA do demandante, CONFIGURANDO A ABUSIVIDADE PREVISTA PELO ARTIGO 39, INCISOS IV E V, DO CDC. ASSIM, CABÍVEL SE MOSTRA A CONVERSÃO DO CONTRATO PARA EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO, INCIDINDO à TAXA MÉDIA DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL, VEDADA A CAPITALIZAÇÃO.

HAVENDO A CONVERSÃO DO CONTRATO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO, CABÍVEL SE MOSTRA A CONDENAÇÃO DO BANCO A COMPENSAÇÃO E RESTITUIÇÃO DOS VALORES. ENTRETANTO, DIANTE DA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE MÁ-FÉ, A REPETIÇÃO DO INDÉBITO DEVERÁ SER NA FORMA SIMPLES.

APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de recurso de apelação cível interposto por HARDI CHRISTMANN, porque inconformado com a sentença que julgou improcedente a ação de restituição de valores c/c indenização por dano moral ajuizada contra o BANCO BMG S.A.

Adoto o relatório do decisum, exarado nos seguintes termos:

HARDI CHRISTMANN ajuizou AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL contra o BANCO BMG S.A. Alegou que recebe benefício previdenciário e firmou com o requerido contrato de empréstimo consignado, cujos pagamentos eram descontados mensalmente de seu benefício. No entanto, após a celebração do contrato percebeu que era descontado valor a título de “empréstimo RMC”, e ao questionar o réu, soube que tal se referia à reserva de margem consignável, por ser o empréstimo consignado pela modalidade cartão de crédito, do que não havia sido informada. Disse que por lei é possível a consignação de até 30% do benefício previdenciário, o que no caso foi extrapolado pelo desconto de 5% a título de RMC, referente a serviço não solicitado pela parte autora, que pretendia realizar empréstimo consignado normal e não por cartão de crédito. Referiu que segundo o Banco Central, o pagamento mínimo da fatura de cartão de crédito é de 15%, o que não vem sendo observado pelo demandado com a consignação de 5% a título de RMC. Discorreu acerca da descaracterização do contrato de empréstimo e da ilegalidade da cobrança de valores não contratados. Invocando o Código de Defesa do Consumidor. Requereu a procedência dos pedidos, com a declaração de nulidade da contratação e cobrança a título de RMC, cancelando os descontos do benefício da parte autora, e a condenação do réu à repetição do indébito, em dobro, do que foi indevidamente descontado, atualizado e acrescido de juros, bem como a indenizar-lhe os danos morais, sugerindo o valor de R$20.000,00 (vinte mil reais); a conversão do empréstimo de cartão de crédito consignado para empréstimo pessoal consignado, utilizando as mesmas taxas e prazos para este tipo de contrato, recalculando o valor do débito, com a condenação do réu nos ônus sucumbenciais. Pediu AJG e juntou documentos.

Foi concedida a AJG à parte autora (evento 03).

Citado, réu contestou (evento 09), discorrendo acerca da improcedência da ação. Disse que a parte autora firmou o contrato de empréstimo, não podendo beneficiar-se da própria torpeza, alegando a nulidade do contrato. Referiu que não há nulidade no contrato, nem razão para repetição de valores cobrados, ou de indenização por danos morais. Postulou a improcedência. Juntou documentos.

Houve réplica (evento 12).

Intimadas as partes acerca das provas que pretendiam produzir, ambas postularam o julgamento do feito.

Acrescento que o dispositivo da sentença possui o seguinte teor:

ISSO POSTO, julgo IMPROCEDENTES os pedidos HARDI CHRISTMANN contra o BANCO BMG S.A., pois comprovada a contratação do serviço questionado, não havendo provas da abusividade ou da prática de ato ilícito pelo réu.

Tendo em vista a sucumbência, arcará o autor com as custas processuais e honorários ao procurador do réu, que fixo em 10% do valor da causa, atualizado, com observância do art. 85, § 2º, NCPC, considerando a ausência de instrução e o rápido deslinde do feito, verbas estas que ficam suspensas em face da AJG deferida.

Em suas razões recursais, o recorrente aduz que jamais contratou cartão de crédito consignado, o que resta comprovado pela ausência de comprovação pelo réu acerca da entrega e utilização do cartão. Assim, pugna pela declaração de nulidade do contrato com a consequente suspensão dos descontos em seu benefício previdenciário, bem como pela condenação do banco a restituir, em dobro, os valores indevidamente cobrados e ao pagamento de indenização por dano moral. Subsidiariamente, pleiteia pela conversão do empréstimo via cartão de crédito para empréstimo consignado. Requer o provimento do recurso.

Ausente preparo, porquanto o recorrente litiga sob o amparo da gratuidade judiciária.

Intimada, a parte recorrida apresentou contrarrazões pugnando pela manutenção da sentença.

Vieram os autos conclusos para o julgamento.

É o relatório.

Passo a decidir de forma monocrática, tendo em vista que outro não seria o resultado alcançado em julgamento colegiado neste órgão julgador.

Pois bem.

A situação posta em mesa de julgamento, mais precisamente o contexto probatório existente nos autos, desnuda prática abusiva reiterada pelas instituições financeiras, mas que, questionada em juízo, vem sendo decidida favoravelmente aos consumidores modo pacífico neste Órgão Fracionário, no caso concreto, em sentido diverso da sentença, de modo que assiste razão ao autor, ora apelante.

O relacionamento das instituições financeiras com seus clientes, por se tratar de prestação de serviço, sem dúvida se constitui em relação de consumo, incidindo, consequentemente, os princípios e as regras do Código de Defesa do Consumidor (Art. 3º, § 2º).

E, nas relações contratuais estabelecidas por meio de contratos de massa (ou de adesão), em que a vontade das partes perde a condição de elemento preponderante, segundo a nova concepção que se deve ter do contrato, o aderente tem de ser protegido. Diante deste panorama, o CDC surge como via legal e obrigatória para o reequilíbrio das relações, especialmente no que respeita ao controle das cláusulas abusivas.

Induvidoso, no presente caso, estarmos diante de um destes contratos, em que uma das partes, na verdade, tem apenas a opção (“liberdade”) de contratar ou não, mas não de discutir as cláusulas do contrato. Nestas circunstâncias, o consumidor que queira debater os termos da contratação, restará unicamente a via judicial.

Para que o consumidor não fique exposto a abusividades é que existem os direitos básicos do consumidor, previstos no artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, importando, no presente caso, modo especial, o direito de receber informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, conforme previsto no inciso III do citado dispositivo.

Já o prestador do serviço tem o dever de prestar ao consumidor informação clara e adequada sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentam.

No mesmo sentido destaca o eminente jurista e Ministro do Colendo STJ, Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, em sua obra “Responsabilidade Civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor”...

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