Decisão Monocrática nº 50002219120188210102 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50002219120188210102
ÓrgãoNona Câmara Cível
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001567424
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000221-91.2018.8.21.0102/RS

TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de Energia Elétrica

RELATOR(A): Des. TASSO CAUBI SOARES DELABARY

APELANTE: RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. (RÉU)

APELADO: CASEMIRO BIALOZOR (AUTOR)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. SUSPENSÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. TEMPORAL. COMARCA DE GUARANI DAS MISSÕES. OUTUBRO E NOVEMBRO DE 2017. FORÇA MAIOR CARACTERIZADA. ROMPIMENTO DO NEXO CAUSAL. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO.

  1. A CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO FORNECEDORA DE ENERGIA ELÉTRICA RESPONDE PELOS PREJUÍZOS CAUSADOS AOS CONSUMIDORES, POR DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO, DE FORMA OBJETIVA DE ACORDO COM O ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  2. HIPÓTESE DOS AUTOS EM QUE configurada a excludente de responsabilidade. Força maior. Fato notório já reconhecido em várias oportunidades e julgamentos. TEMPORAIS E Excesso de chuvas em proporções fora dos padrões normais de previsibilidade e inevitabilidade acarreta o rompimento no nexo causal, pela caracterização da excludente de responsabilidade da força maior. Precedentes jurisprudenciais. Sentença reformada.

RECURSO PROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

1. Trata-se de recurso de apelação cível interposto por RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. contra sentença [Evento 5, PROCJUDIC16, fls. 12/21] que, nos autos da ação de indenização por danos materiais e morais promovida por CASEMIRO BIALOZOR, julgou procedente o pedido, condenando a concessionária de energia ao pagamento de danos morais no valor de R$ 2.500,00, corrigido monetariamente pelo IGPM a contar da data da sentença e acrescido de juros legais desde a citação, bem como ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em favor do procurador da parte adversa, fixados em 10% sobre o valor da condenação.

Nas suas razões de recurso [Evento 5, PROCJUDIC16, fl. 24 - Evento 5, PROCJUDIC17, fl. 9], a concessionária de energia defendeu que inexiste prova do abalo moral. Alegou que os períodos de interrupção do fornecimento de energia estão dentro dos limites fixados pela ANEEL. Mencionou que nos meses de outubro e novembro de 2017 o Estado foi atingido por uma série de temporais e quantidades expressivas de precipitações pluviométricas, inclusive com a decretação de situação de emergência em quatorze municípios por conta dos temporais, não se tratando de um evento corriqueiro mas uma verdadeira catástrofe natural. Referiu sobre as imagens acostadas com a contestação em relação à dimensão dos fatos que revelam a força dos ventos, postes de concreto quebrados, lavouras devastadas, grande quantidade de arvores caídas e casas danificadas. Apontou relatórios extraídos so sistema Indica apontando os diás críticas no conjunto elétrico e o trabalho e esforços pelos seus prepostos a fim de restabelecer o serviço de energia no menor tempo possível, não se podendo considerar a falta de energia elétrica como falha na prestação do serviço em face da magnitude dos temporais. Alegou a incidência das excludentes da responsabilidade civil apontando precedentes jurisprudenciais e lições doutrinárias, assim como a inviabilidade de manutenção do fornecimento de energia de forma rigorosamente contínua. Mais adiante, discorreu acerca dos danos morais reclamados pela parte autora, a ausência de prova de sua ocorrência e a necessidade de que sejam demonstrados, e que acaso eventualmente mantidos, devem ser estabelecidos de forma adequada, sendo os juros de mora estabelecidos a partir de sua fixação. Ao final, postulou a improcedência do pedido e, sucessivamente, a redução do valor da condenação e o estabelecimento dos juros de mora a contar da publicação da decisão que o fixar, com a redistribuição do ônus da sucumbência.

Apresentadas contrarrazões [Evento 5, PROCJUDIC17, fl. 48 - Evento 5, PROCJUDIC18, fl. 6], os autos foram remetidos a esta Corte. Sobreveio parecer do Ministério Público opinando pelo conhecimento e pelo desprovimento do recurso [evento 9, PARECER1].

Após declinada a competência pela Segunda Câmara Cível [Evento 19, DESPADEC1], os autos vieram a mim conclusos para julgamento.

É o relatório. Decido.

2. Conheço do recurso, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

O recurso admite julgamento na forma monocrática, já que a ação versa sobre alegação de danos morais sofridos em razão de interrupção no fornecimento de energia elétrica, matéria cujo entendimento está sedimentado na jurisprudência desta Corte.

A parte autora ajuizou ação indenizatória requerendo indenização pelos danos morais em razão de alegada suspensão no fornecimento de energia elétrica. Da sentença de procedência recorreu a parte ré.

No caso, cuida-se de examinar a configuração dos danos morais sofridos pela parte autora – residente na localidade de Linha Estefânia, interior do município de Guarani das Missões, em decorrência da interrupção do fornecimento de energia elétrica, no mês de outubro de 2017, nos dias 01, 02, 12, 13, 14, 19, 20, 21 e 22, e no dia 03 de novembro de 2017.

Pois bem.

De saída, consigno que a responsabilidade da ré em reparar os prejuízos sofridos em razão da prestação dos serviços é objetiva, tanto por força do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal1, quanto pela incidência do artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor2. Tal responsabilidade decorrente da norma constitucional é em razão do serviço público de fornecimento de energia desempenhado pela ré, ao passo que, em relação à norma consumerista, é oriunda da relação de consumo mantida entre as partes, nos termos do art. 3º, § 2º, da Lei 8.078/90.

Nesses termos é o entendimento jurisprudencial:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. AÇÃO REGRESSIVA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. A autora, na qualidade de Seguradora, poderá se sub-rogar no direito de seu cliente/segurado ao pagar-lhe indenização por danos cobertos pela apólice contratada, tendo direito de regresso contra o verdadeiro causador dano se este não tiver sido produzido por culpa exclusiva de seu cliente. A demandada, na qualidade de concessionária de serviço público, responde objetivamente pelos danos decorrentes de defeito na prestação dos seus serviços que danifica bens de consumidor, nos termos do art. 37, §6º, da CF/88 e do art. 14, caput, do CDC. Na distribuição do ônus da prova, caberia à autora comprovar os fatos constitutivos do seu direito e à demandada, as causas extintivas, modificativas ou suspensivas do direito alegado. No caso, a autora não se desincumbiu satisfatoriamente do seu ônus, pois a prova produzida não é suficiente para demonstrar o nexo de causalidade entre o serviço prestado pela concessionária de serviço público (distribuição/fornecimento de energia elétrica) e o dano suportado pelos seus clientes/segurados. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70076994714, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 30/05/2018)

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. RESSARCIMENTO. AÇÃO DE REGRESSO. PAGAMENTO DE SEGURO. SOB-ROGAÇÃO. DESCARGAS ATMOSFÉRICAS (RAIO). DANOS ELÉTRICOS EM EQUIPAMENTOS ELETRONICOS RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA. FATO DO SERVIÇO. 1. A concessionária responsável pelo fornecimento de energia elétrica responde objetivamente pelos danos causados ao consumidor, independentemente de culpa, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Consumidor. Comprovada a ocorrência do fato, do prejuízo dele advindo e do nexo causal, impõe-se o dever de indenizar. Fato do serviço. Art. 14, §1º, do CDC. 2. Falha na prestação do serviço em razão de ser previsível a ocorrência de descargas atmosféricas, sendo dever de concessionária de energia elétrica tomar as precauções necessárias e realizar investimentos para que não ocorram alterações de tensão e, por consequência, danos aos consumidores. 3. Dever da demandada de ressarcir à seguradora os valores pagos relativamente aos danos elétricos ocorridos aos beneficiários segurados. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70076054808, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Julgado em 18/12/2017)

A doutrina de Rui Stoco não se afasta deste norte:

Portanto, a companhia de energia elétrica de geração ou distribuição, embora possa se constituir em sociedade de natureza privada, será sempre uma concessionária de serviço público, prestando-o por delegação do Estado.

Nessa condição, é alcançada pela disposição muito mais garantidora, do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, ao dispor que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

Desse modo, essas empresas ficam enquadradas na teoria do risco administrativo, sendo, assim, objetiva a sua responsabilidade pelos danos causados a terceiros.

Evidente, não se descarta a incidência obrigatória do Código de Defesa do Consumidor, naquilo que favoreça e proteja a vítima, considerando que o fornecimento de energia elétrica para consumo enquadra-se nos conceitos ali estabelecidos, devendo a energia elétrica ser considerada como produto, posto que é um bem consumível ou fungível.

O CDC, por sua vez, no art. 22 preceitua: “Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos”.

Em se tratando de relação de consumo, a responsabilidade civil é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, somente isentando de responsabilidade o...

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