Decisão Monocrática nº 50002857020168210135 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 12-08-2022

Data de Julgamento12 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50002857020168210135
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002576158
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000285-70.2016.8.21.0135/RS

TIPO DE AÇÃO: De Análise de Crédito

RELATOR(A): Des. JOAO MORENO POMAR

APELANTE: CLEOMAR FATIMA BOEIRA DA SILVA (AUTOR)

APELADO: NADIR FOSCARINI (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE DESCONSTITUIÇÃO DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. - OS RECURSOS EM AÇÕES QUE TEM COMO CAUSA A INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO E PEDIDO DE REPARAÇÃO DE DANOS POR DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO SÃO DE COMPETÊNCIA DAS CÂMARAS QUE INTEGRAM O 3º E 5º GRUPOS CÍVEIS POR PREVALÊNCIA DA ESPECIALIZAÇÃO NA MATÉRIA. APLICAÇÃO DO REGIMENTO E ORIENTAÇÃO DO OFÍCIO CIRCULAR Nº 01/2016 (ITEM 15).

COMPETÊNCIA DECLINADA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

CLEOMAR FÁTIMA BOEIRA DA SILVA apela da sentença proferida nos autos da ação declaratória de desconstituição de débito c/c indenização por danos morais ajuizada em face de NADIR FOSCARINI, assim lavrada:

Vistos etc.
Cleomar Fátima Boeira da Silva propôs ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenização por danos morais em face de Nadir Foscarini ME- Stylus Bazar (ambas qualificadas na fl. 02) sustentando, em suma, o seguinte: ao ser-lhe negado financiamento bancário por conta de registro em cadastro de devedores no SPC SERASA, constatou que a restrição foi levada a efeito pela ré por dívida de R$2.210,00 sem qualquer comunicação prévia.
Alega que não efetuou nenhuma compra no estabelecimento comercial, sobretudo em tal valor, razão por que entende indevida a inscrição. Sustenta fazer jus à compensação pelo dano moral elencando a presença dos requisitos legais para tanto. Postulou a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, a gratuidade da justiça, o deferimento de medida liminar para exclusão de seu nome dos cadastros de devedores e, ao final, a procedência da demanda com a condenação da ré ao pagamento dos encargos sucumbenciais. Juntou documentos das fls. 11 a 17.
Deferida a liminar (fl. 18-19).

Citada, a ré ofereceu contestação (fls.
30-34) sustentando sua ilegitimidade passiva, uma vez que a não comunicação prévia à inscrição é responsabilidade do SPC SERASA, e, no mérito, disse que a ré adquiriu inúmeras peças de vestuário em seu estabelecimento sem realizar o pagamento, e que tal negócio encontra-se demonstrado por uma nota promissória firmada pela autora. De resto, discorreu sobre a ausência dos requisitos do dever de indenizar ou , no mínimo, o reconhecimento da concorrência de culpas e postulou a improcedência do pedido e condenação da autora nos encargos sucumbenciais. Juntou documentos (fls. 36 e 37).
Nas fls. 38 a 40, a ré propôs reconvenção sustentando a existência da dívida espelhada na nota promissória assinada pela autora, postulando a execução do título de crédito com expedição de mandado de citação, penhora e avaliação ou, não sendo encontrada a reconvinda, proceda o oficial de justiça ao arresto (art. 830 do CPC), postulou também a penhora de valores existentes em contas bancárias bem como condenação nos encargos sucumbenciais. Juntou documentos das fls. 41 a 43.
Réplica nas fls. 45-53 em que a autora sustentou a nulidade e prescrição da nota promissória , uma vez que as compras realizadas no estabelecimento da ré ocorreram em 2002 e 2003, e que, mesmo realizados os pagamentos e as compras quitadas, a ré não restituiu a nota promissória a qual foi assinada em branco pela autora e preenchida pela ré com data posterior e valor diverso da compra realizada. Aduziu que não há registros fiscais do negócio. De resto, ratificou as alegações da inicial. Acostou documentos nas fls. 54 a 57.
Sobreveio contestação à reconvenção nas fls.
58-64 em que a reconvinda sustenta ausência de representação da reconvinte, nulidade , inexigibilidade e prescrição da nota promissória que consubstancia a suposta dívida, impossibilidade de tramitação da reconvenção como execução, e, no mérito, ratifica a argumentação já desenvolvida nas demais manifestações, bem como postula a condenação da reconvinte nas penas previstas para o agir com má-fé processual em razão de não ter restituído a nota promissória. Postula, caso não seja o entendimento, que se suspenda a execução e seja recebida a peça como embargos à execução, e novamente o benefício da gratuidade da justiça. Acostou documentos nas fls. 65 a 72.
Réplica à contestação da reconvenção nas fls.
75-6.
Deferida a gratuidade para a ré reconvinte, as partes foram instadas à produção probatória (fl.89), nada requerendo (fl. 71).

É o relatório. Decido.
Examino conjuntamente ação e reconvenção.
E, de início, importa reconhecer a falta de interesse no manejo da reconvenção, por inadequação da via.

Na compreensão de Marinoni[1] é de se observar que a reconvenção corresponde a uma forma de cumulação objetiva de demandas.
Significa dizer que o cabimento da figura há de respeitar os pressupostos enumerados pela lei para qualquer cumulação de ações (artigo 307, parágrafo 1°). Assim, e ressalvada a questão da compatibilidade dos pedidos – já que , em tema de reconvenção, a incompatibilidade pode ser natural ao antagonismo em que se encontram os sujeitos autores (da ação e da reconvenção) - , é necessário que o procedimento previsto para a ação e para a reconvenção sejam compatíveis (art. 327. parágrafo 1°, inc III). Eventualmente , se for previsto procedimento diverso para cada qual, ainda assim a reconvenção pode ser admitida, desde que processada sob o procedimento comum (art. 327, parágrafo 2°), sendo este também o procedimento adotado para a ação ordinária.
Na hipótese dos autos, a reconvinte formula pedidos não compatíveis com o procedimento ordinário, quando postula (fl. 39v) expedição de mandado de citação, penhora e avaliação nos termos do artigo 827 do CPC, de modo que, incompatíveis os pedidos à veiculação em um mesmo procedimento (art.
327, parágrafo 1°, inciso III, do CPC), é inviável a cumulação, por ausência de interesse de agir, de modo que ausente pressuposto processual previsto no art. 17 do mesmo estatuto em relação à reconvenção.
No que se refere à ação, a representação da pessoa jurídica restou regularizada com os documentos das fls.
87-88. As demais preliminares confundem-se com o mérito, e assim serão examinadas.
A relação jurídica é consumerista, ajustando-se autora e ré às figuras de consumidor e fornecedor previstos nos artigos e da Lei 8078/90.

Dito isso, entendo que a regra de inversão do ônus da prova, ainda que não explicitada como regra de proceder na primeira decisão exarada nos autos, pode ser adotada no presente momento de prolação da sentença, uma vez que, como parece evidente, a regra do artigo 6° daquele estatuto deve ser de conhecimento dos operadores do direito.

O cerne da controvérsia é a existência ou não do negócio jurídico celebrado entre as partes apto a preencher os requisitos legais que legitimaram a inscrição da autora em cadastros de maus pagadores.

Apesar de na inicial a autora afirmar que “não efetuou aquisição neste estabelecimento” (fl.03) e “não adquiriu produtos” (fl.04), sua versão alterou-se após aportar aos autos uma nota promissória (fl. 42) cuja assinatura não nega ser sua.

Após o documento, diz a autora que o título de crédito com vencimento previsto para o dia 10 de agosto de 2014, refere-se à compra realizada no ano de 2003 a qual, mesmo se encontrando quitada, foi usada pela ré para inscrever a autora no SPC e SERASA, além de ter sido preenchida com valor superior ao devido, ou seja, a autora afirma tê-la assinado em branco e os dados inseridos pela ré não correspondem à compra realizada.

Pois bem, a solução da controvérsia deverá dar-se com base nas regras de distribuição do ônus da prova.
E, invertido o ônus a teor do que dispõe o artigo 6° do CDC, em princípio, cumpria à ré demonstrar a existência e validade da relação jurídica.
Com o título de crédito da fl. 42, estabeleceu-se a controvérsia acerca da data, valor e quitação do débito das compras que, a esta altura, a autora não nega ter realizado no estabelecimento da ré.

E alegando pagamento, a autora deveria promover sua demonstração , mesmo que testemunhal, descabendo argumentos como a ausência de nota fiscal ou o fato de estar residindo em cidade diversa da qual se situava o estabelecimento da ré na data da compra.
Nada obsta que , mesmo residindo em cidade diversa, as compras pudessem ser realizadas. Também a ausência de notas fiscais não demonstra que negócio não houve. Sabe-se que a prova da compra e venda de bens móveis pode ser de natureza documental, testemunhal e pericial, abarcando o legislador o princípio da liberdade da prova, quando a demonstração do fato não exija forma especial, nos termos do artigo 212 do Código Civil.
Como se sabe, a inversão do ônus da prova não isenta a parte que alega da comprovação de fatos mínimos constitutivos de seu direito.

Nesse sentido, cito os precedentes:

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS DE CARTÃO DE CRÉDITO. AÇÃO DECLARATÓRIA NEGATIVA CUMULADA COM PEDIDO CONDENATÓRIO. DANO MORAL INEXISTENTE. DÍVIDA COMPROVADA. NEGATIVAÇÃO. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. VEROSSIMILHANÇA. SENTENÇA MANTIDA. 1. A condenação por danos morais depende da comprovação da ocorrência do ato ilícito, do dano sofrido, e do nexo de causalidade entre o ato e o dano. 2. No caso a Autora alega ter sido vítima de conduta ilícita do Réu. Entretanto, os elementos dos autos mostram a regularidade da constituição da dívida. A inserção do nome nos cadastros de maus pagadores é medida de direito. 3. A inversão do ônus da prova não se confunde com isenção da comprovação de fatos mínimos, constitutivos do direito do consumidor. Precedentes. Sentença mantida. APELAÇÃO DESPROVIDA(Apelação Cível, Nº 70081573669, Vigésima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:...

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