Decisão Monocrática nº 50003161620208210082 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 08-08-2022

Data de Julgamento08 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50003161620208210082
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoNona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002459505
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000316-16.2020.8.21.0082/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Material

RELATOR(A): Des. CARLOS EDUARDO RICHINITTI

APELANTE: CELSO ROQUE SALVINI (AUTOR)

APELANTE: RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

APELAÇão CÍVEl. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO de indenização POR danos MATERIAIS. preliminar de inépcia da inicial afastada. SECAGEM DE FUMO. PERDA DE QUALIDADE DO TABACO. suspensões do fornecimento de energia superior a 24 horas ininterruptas NOs meses de janeiro e fevereiro de 202o. responsabilidade integral da concessionária. INDENIZAÇÃO mantida. ausência de contraprova e de indícios de inidoneidade do pareceR.

1. INÉPCIA DA INICIAL. CASO EM QUE O PEDIDO É CLARO E OBJETIVO, ALÉM DE SER JURIDICAMENTE POSSÍVEL E DECORRER LOGICAMENTE DA NARRAÇÃO DOS FATOS EXPOSTOS EM JUÍZO. NÃO EVIDENCIADA, PORTANTO, QUALQUER IRREGULARIDADE TÉCNICA DA PEÇA INAUGURAL QUE JUSTIFIQUE A DECLARAÇÃO DE SUA INÉPCIA. PREFACIAL REJEITADA.

2..Pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público. Responsabilidade objetiva. O artigo 37, § 6º, da CF estendeu às pessoas jurídicas de direito privado, prestadoras de serviço público, a responsabilidade objetiva pelos danos causados a terceiros. Inteligência dos artigos 14, § 1º, e 22, ambos do CDC. Aplicável a legislação consumerista ao caso.

2. Princípio da continuidade do serviço. O fornecimento de energia elétrica, pelas próprias características do sistema, está sujeito a fatores que podem levar à interrupção do serviço o que pode ser legal se o restabelecimento ocorrer dentro dos prazos e parâmetros exigidos pela legislação que regula o setor.

3. Secagem de Fumo. O pequeno produtor rural, no caso específico o fumicultor, em tendo como se precaver para interrupções normais e aceitáveis, só pode buscar a reparação junto à concessionária quando a falta de energia for superior a período razoável que, com pequeno investimento, pode e deve evitar a perda do cultivado ou da qualidade do que está produzindo. Logo, ainda que se esteja tratando de responsabilidade objetiva, o razoável é se entender que só há o dever da concessionária responder por perdas decorrentes da interrupção do fornecimento quando essa se der por prazo superior àquele que o consumidor poderia, ou melhor, deveria, de forma absolutamente razoável, sem custo significativo, estar preparado para evitar.

4. Critério Objetivo. O novo entendimento desta Câmara restringe-se às hipóteses em que os danos comprovadamente sofridos pelo fumicultor derivarem da interrupção do fornecimento de energia elétrica durante tempo inferior a 24 horas ininterruptas, conjuntura em que os prejuízos serão por ele suportados à razão de 2/3, imputando-se à concessionária de energia elétrica a responsabilidade pelo ressarcimento de 1/3. Já nas hipóteses de danos advindos de interrupções por período superior à 24h, a responsabilidade é integralmente da concessionária.

5. Caso concreto. três Interrupções de energia superiores a 24h (janeiro e fevereiro de 2020) dos danos materiais e do nexo de causalidade. Responsabilidade integral da Concessionária. na ausência de contraprova e de indícios de inidoneidade do parecer.

7. por se tratar de responsabilidade contratual, os consectários legais incidentes sobre o valor fixado a título de condenação por danos materiais restam fixados em correção monetária pelo IPCA desde o desembolso até a citação, a partir de quando incidirá exclusivamente a Taxa SELIC.

preliminar afastada. apelação parcialmente provida.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de apelação interposta por RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. em face da sentença (evento 85, SENT1) que, nos autos da ação indenizatória proposta por CELSO ROQUE SALVINI, julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos do dispositivo:

Diante do exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado pela parte autora CELSO ROQUE SALVINI em face de RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., para o fim de condená-la ao pagamento de R$ 27.621,00 (vinte e sete mil seiscentos e vinte e um reais), montante que deverá ser corrigido pelo IGP-M desde a data do efetivo prejuízo (14 de abril de 2020) e acrecido de juros de mora a contar da citação.

Condeno a requerida ao pagamento de 40% das custas judiciais e de honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da condenação. De outro lado, condeno o autor ao pagamento de 60% das custas judiciais e de honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre a diferença entre o valor do pedido e o valor da condenação. Esclareço que não é admitida a compensação dos honorários advocatícios (art. 85, § 14, CPC). Entretanto, a exigibilidade fica suspensa à parte autora em face da gratuidade de justiça anteriormente deferida, a qual ora mantenho.

Nas razões (evento 97, APELAÇÃO1), sustenta, preliminarmente, que é caso de indeferimento da inicial por desobediência ao disposto no art. 320 do CPC, porquanto o pedido de indenização por dano material por perda da qualidade de fumo, está embasado unicamente em laudo técnico produzido unilateralmente. No mérito, alega que a sentenciante ignorou completamente que a apelante informou que nenhuma interrupção de energia elétrica foi registrada em nenhuma das datas informadas pela parte apelada em sua inicial. Ressalta que implementa anualmente planos de podas de árvores a vegetação próxima até 2 metros de distância rede de distribuição, porém, durante a ocorrência de temporais com fortes rajadas de vento, árvores e galhos são arremessados sobre a rede elétrica. Reforça que ao longo dos anos vem realizando diversos investimentos e melhorias em suas estruturas de atendimento, através de novos canais de comunicação, do incremento de equipes de emergência, novas tecnologias de rede e sistemas, novos padrões de rede, equipamentos de manobra telecomandados à distância, planos de contingência, planos específicos para épocas do ano, visando melhorar o atendimento aos seus clientes. Aduz, outrossim, que apesar de o apelado indicar reiteradamente que sofre prejuízos de ordem financeira com as supostas faltas de energia elétrica, jamais solicitou à apelante, administrativa ou judicialmente, a correção dos problemas, nem mesmo adquiriu um gerador de energia elétrica, ou seja, se conforma em suportar os alegados danos. Afirma que não restou comprovado, sequer remotamente que ocorreram as faltas de energia elétrica descrita na petição vestibular, nada podendo ser imputado à concessionária apelante, devendo ser reformada integralmente a sentença combatida. Advoga que um dos eventos que exclui o nexo de causa no âmbito da responsabilidade objetiva (via aplicação da teoria do risco administrativo) é a culpa exclusiva da vítima e que, no caso concreto, endo a energia elétrica essencial à atividade de produção de fumo do apelado, deveria ele, por cautela, também possuir um gerador próprio de energia, por medida de segurança, como acontece em todas as empresas em que é ínsito à sua atividade o risco decorrente da falta de energia elétrica. Diz, todavia, que o apelado não dispunha de gerador ou qualquer outro meio alternativo para a utilização da estufa, não obstante considere o serviço de energia essencial à cura do fumo, é porque preferiu assumir os riscos do negócio, razão pela qual o episódio narrado ocorreu, provavelmente, por culpa exclusiva do apelado. Destaca que o custo da aquisição de um gerador de energia elétrica pelos fumicultores, o representante da ABRADEE informou ter realizado levantamento de custos na ordem de 4 a 6 mil reais, financiáveis em 10 anos. Assevera que entendeu a juíza a quo que a concessionária deveria produzir prova negativa, beneficiando-se o apelado de tal posicionamento e determinando a procedência total do pedido inicial, quando a prova documental produzida pelo apelado carece de idoneidade, pois confeccionado unicamente com base nas informações do apelado para o avaliador, o que suscita dúvidas se era o fumo que estava na estufa e se de fato estava nas datas informadas, o que é corroborado pela ausência de comprovação da venda do fumo à época, prova acessível ao apelado. Discorre sobre as regras da agência reguladora do setor elétrico e alegações de precariedade da rede elétrica em Arvorezinha/RS. Traça tópico sobre o dever de mitigar e a respectiva repercussão na indenização postulada. Argumenta a presunção de legitimidade dos atos administrativos. Defende a inadmissibilidade da inversão do ônus da prova. Pugna pela reforma da sentença para o reconhecimento da inépcia da inicia e, alternativamente, pela improcedência do pedido e, ainda, sucessivamente, pea incidência da taxa SELIC para fins de correção monetária. Requer o provimento do recurso.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 102, CONTRAZ1).

Digno de registro que o autor aviou apelação (evento 89, APELAÇÃO1), que foi contrarrazoada (evento 99, CONTRAZ1), sobrevindo manifestação de desistência do recurso (evento 4, PET1), qe restou homoogada (evento 5, DESPADEC1).

É o relatório.

O presente recurso deve ser conhecido, comprovado o preparo (evento 97, COMP3); comportando julgamento monocrático, com amparo na Súmula 568 do STJ1 e artigo 206, XXXVI do RITJRS2.

Na inicial, o autor postula o ressarcimento dos danos materiais causados em virtude da falta de energia ocorrida das 10h do dia 07/01/2020 até às 16h30min do dia 08/01/2020 (30 horas e 30 minutos); das 23h do dia 03/02/2020 até às 17h do dia 05/02/2020 (42 horas); e das 06h do dia 14/02/2020 até às 11h do dia 15/02/2020 (29 horas), alegando perda de 3.000 kg de fumo em processo de secagem em estufas de ar forçado.

De início cumpre analisar a preliminar de inépcia da inicial, o que faço destacando que a causa de pedir diz...

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