Decisão Monocrática nº 50005314220218215001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 18-01-2022

Data de Julgamento18 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50005314220218215001
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoTerceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001555204
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000531-42.2021.8.21.5001/RS

TIPO DE AÇÃO: Irregularidade no atendimento

RELATOR(A): Des. NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO

APELANTE: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D (RÉU)

APELADO: ROSSANA DE FATIMA TEIXEIRA CARVALHO (AUTOR)

EMENTA

DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO. INOBSERVÂNCIA DO PROCEDIMENTO PREVISTO NO ART. 129 DA RESOLUÇÃO-ANEEL Nº 414/10. COBRANÇA IRREGULAR VERIFICADA. INSCRIÇÃO DA PARTE AUTORA NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO INDEVIDA. DANO MORAL CARATERIZADO.

1. A simples alegação de que os lacres do medidor de consumo de energia foram violados e o equipamento manipulado não justifica a recuperação de consumo nos termos do art. 130 da Resolução - ANEEL nº 414/10. É necessária a demonstração efetiva de que houve redução ou alteração significativa na medição da energia que passou pelo medidor da unidade consumidora, na medida em que a própria legislação de regência garante à concessionária o direito ao ressarcimento das despesas para a verificação e cobrança dos débitos oriundos de fraude, nos termos do art. 131 da Resolução nº 414/10, desde que devidamente comprovados, consoante a orientação desta Câmara. E esta verificação deve observar o regular procedimento previsto na Resolução-ANEEL nº 414/10, em especial nos §§ 2º e 5º do seu art. 129, o que não ocorreu no caso dos autos.

2. Hipótese em que a prova dos autos não traz parâmetros seguros para configurar a possibilidade de levar a efeito a recuperação de consumo.

3. O dano moral está bem configurado pelos transtornos causados à apelada ao ser inscrita nos órgãos de proteção ao crédito por conta de débito irregularmente apurado pela concessionária.

4. Valor da indenização fixado na sentença mantido no patamar de R$ 5.000,00, diante da gravidade dos fatos que circundam a questão, o porte econômico da concessionária, bem como o caráter pedagógico da condenação desta natureza. Precedentes catalogados.

APELAÇÃO IMPROVIDA.

DECISÃO MONOCRÁTICA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de apelação interposta pela COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D, porquanto está inconformada com a sentença (evento 40, na origem) proferida nos autos da ação declaratória de inexistência de débito cumulada com pedido de indenização ajuizada por ROSSANA DE FATIMA TEIXEIRA CARVALHO, cujo dispositivo restou assim redigido:

Isso exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO para:

a) declarar a inexistência do débito de R$ 3.438,64 (evento 1 – outros 10), tornando hígida a antecipação de tutela concedida;

b) condenar a requerida a pagar ao demandante, a título de danos morais, R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigidos monetariamente pelo IGP-M, e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, tudo a partir da data desta sentença.

Condeno a ré sucumbente no pagamento das despesas processuais, e a honorários advocatícios que fixo em R$ 2.000,00, ao patrono da parte autora, o que deverá ser corrigido pelo IGPM, a contar do ajuizamento da ação, mais juros de 1% ao mês, contados do trânsito em julgado, conforme art. 85, §§ 8° e 16º, do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Caso haja recurso, intime-se a parte contrária para contrarrazões. Após, remetam-se os autos ao Tribunal de Justiça.

Não havendo mais postulações das partes após o trânsito em julgado da sentença, recolhidas eventuais custas pendentes, ao arquivo com baixa.

Nas razões, a concessionária sustentou que a sentença merece reforma, porquanto foi realizada inspeção na unidade consumidora da parte autora, momento em que foi constatado defeito no medidor de energia. Destacou a regularidade do procedimento adotado, bem como a presunção de veracidade quanto aos documentos e declarações e suas consequências. Disse que não há conduta ensejadora de danos morais. Alternativamente, defendeu a redução da indenização. Pediu o provimento da apelação (evento 45 na origem).

Intimada, a parte autora ofertou contrarrazões, nas quais defendeu a manutenção da sentença (evento 51 na origem).

Os autos foram remetidos a esta Corte, indo com vista ao Dr. José Túlio Barbosa, Procurador de Justiça, que opinou pelo parcial provimento da apelação (evento 08).

É o relatório.

Encaminho decisão monocrática pelo improvimento da apelação, nos termos do verbete nº 568 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça1, bem como no que está previsto no art. 206, XXXVI, do RITJRS2.

Ressalto que os autos versam sobre o fornecimento de energia elétrica pela ré, matéria que foi objeto de alteração regimental desta Corte através da Resolução nº 01/2005, publicada no DOJ do dia 18NOV05, que em seu art. 1º, modificou o inciso I do art. 11 da Resolução nº 01/98, excluindo dos contratos administrativos as demandas relativas ao fornecimento de água potável e energia elétrica, inserindo a matéria no chamado direito público não especificado.

Prosseguindo, tenho que constatada a fraude ou mesmo defeito no medidor de energia, a recuperação de consumo não-faturado de energia elétrica é possível e está prevista na Resolução - ANEEL nº 414/10, que é um instrumento normativo que regulamenta a Lei nº 9.427/96 e fundamenta-se na Lei nº 8.987/95 (Lei das Concessões Públicas) e na própria CF-88, em seu art. 175, tratando-se de um ato administrativo geral que nas palavras de Hely Lopes Meirelles tem a seguinte definição:

Atos administrativos gerais ou regulamentares são aqueles expedidos sem destinatários determinados, com finalidade normativa, alcançando todos os sujeitos que se encontrem na mesma situação de fato abrangida por seus preceitos. São atos de comando abstrato e impessoal, semelhantes aos da lei, e, por isso mesmo, revogáveis a qualquer tempo pela Administração, mas inatacáveis por via judicial, a não ser pelo questionamento da constitucionalidade (art. 102, I, “a”, da CF).
(Direito Administrativo Brasileiro, 30ª edição, Malheiros, São Paulo, 2005, p.163).

Entretanto, em que pese tenha sido realizada a fiscalização na unidade consumidora da parte autora, isso em 03MAR2020, lavrando-se o Termo de Ocorrência de Irregularidade - TOI (evento 21 - OUT2, pág. 11-2, na origem) dando conta da manipulação do medidor de energia, não há prova material suficiente para demonstrar o desvio de energia ou mesmo o benefício auferido pela parte autora.

Consta do TOI:

Fase desviada por trás da caixa de medição.

No ponto, denota-se que o procedimento não foi acompanhado pelo titular da unidade consumidora ou qualquer outra testemunha, o que revela evidente inobservância do disposto no art. 129, §§ 2º e 5º, da Resolução - ANEEL nº 414/10:

Art. 129. (...).

§ 2º Uma cópia do TOI deve ser entregue ao consumidor ou àquele que acompanhar a inspeção, no ato da sua emissão, mediante recibo.

(...).

§ 5º Nos casos em que houver a necessidade de retirada do medidor ou demais equipamentos de medição, a distribuidora deve acondicioná-los em invólucro específico, a ser lacrado no ato da retirada, mediante entrega de comprovante desse procedimento ao consumidor ou àquele que acompanhar a inspeção, e encaminhá-los por meio de transporte adequado para realização da avaliação técnica.

(...).

Ademais, não há maiores elementos de prova a justificar a recuperação de consumo. Sequer um laudo metrológico de medidor de energia elétrica, mesmo aquele elaborado pelo INMETRO, às mais das vezes inconclusivo. No ponto, a questão restou bem examinada na sentença, cujo excerto agrego às razões de decidir, in verbis:

Os documentos juntados pela ré (evento 21 – outros 3/6), por serem unilaterais e desprovidos de evidências seguras do procedimento irregular imputado à parte autora, não se mostram suficientes para legitimar a conduta sancionatória da empresa demandada.

Observe-se, na confecção da ordem de fiscalização e o termo de ocorrência de irregularidade, não houve preocupação no sentido de buscar o arrolamento de testemunha do ato, no momento da realização da vistoria e da autuação, fato que mitigaria a unilateralidade do procedimento.

Sinalo, não há provas que esclareçam, de forma cabal, tenha ocorrido a alegada irregularidade no relógio medidor pertencente à demandante, não corroborando a materialidade da fraude descrita pela empresa demandada.

Todas essas providências eram ônus que à empresa demandada se impunham, máxime porquanto foi quem descreveu a fraude no medidor de energia elétrica na residência da parte autora.

Também não foi realizado qualquer levantamento seguro de queda vertiginosa de consumo de energia, que confirmasse a utilização fraudulenta da energia elétrica, tanto que a empresa ré sequer colacionou as contas relativas ao consumo do demandante.

Nesse cenário, diante dos erros de procedimento perpetrados pela demandada e à míngua de provas seguras da ocorrência dos fatos que foram imputados à autora, não há como ser acolhida a pretensão da empresa no sentido de ver recuperados consumos que sequer comprovou.

Assim, imperiosa a declaração de inexistência do débito de R$ 3.438,64 (evento 1 – outros 10).

Se, por um lado, o art. 167, III, da Resolução ANEEL nº 414/10 dispõe pelos danos causados aos equipamentos de medição ou ao sistema elétrico da distribuidora, decorrentes de qualquer procedimento irregular ou deficiência técnica da unidade consumidora; por outro, a empresa deve demonstrar a existência do crédito que diz ter em seu favor, mediante a fiscalização e apuração das irregularidades nos equipamentos guarnecidos nas unidades consumidoras. No caso dos autos, o funcionário da concessionária, conforme fiscalização que realizou, preencheu os formulários de Termo de Ocorrência de Inspeção, dando conta do defeito no medidor de energia, não trazendo maiores elementos.

Neste particular, destaco que incumbia...

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