Decisão Monocrática nº 50008448420198210082 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 31-01-2023

Data de Julgamento31 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50008448420198210082
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoNona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003251609
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000844-84.2019.8.21.0082/RS

TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de Energia Elétrica

RELATOR(A): Des. CARLOS EDUARDO RICHINITTI

APELANTE: AMARILDO FLORIANO (AUTOR)

APELANTE: CERFOX - COOPERATIVA DE GERACAO E DESENVOLVIMENTO FONTOURA XAVIER (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. SECAGEM DE FUMO. PERDA DE QUALIDADE DO TABACO. suspensão do fornecimento de energia no município de arvorezinha. duas interrupções, entre 12 e 14 de fevereiro de 2019 e entre 24 e 25 de fevereiro de 2019, ambas superiores a 24 horas, com responsabilidade integral da concessionária. danos materiais configurados. quantum majorado. alteração dos consectários LEGAIS.

1. responsabilidade objetiva de PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO. O ARTIGO 37, § 6º, DA CF ESTENDEU ÀS PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO, PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICO, A RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELOS DANOS CAUSADOS A TERCEIROS. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 14, § 1º, E 22, AMBOS DO CDC. APLICÁVEL A LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA AO CASO.

2. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DO SERVIÇO. O FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA, PELAS PRÓPRIAS CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA, ESTÁ SUJEITO A FATORES QUE PODEM LEVAR À INTERRUPÇÃO DO SERVIÇO, O QUE PODE SER LEGAL, SE O RESTABELECIMENTO OCORRER DENTRO DOS PRAZOS E PARÂMETROS EXIGIDOS PELA LEGISLAÇÃO QUE REGULA O SETOR.

3. SECAGEM DE FUMO. O PEQUENO PRODUTOR RURAL, NO CASO ESPECÍFICO, O FUMICULTOR, EM TENDO COMO SE PRECAVER PARA INTERRUPÇÕES NORMAIS E ACEITÁVEIS, SÓ PODE BUSCAR A REPARAÇÃO JUNTO À CONCESSIONÁRIA QUANDO A FALTA DE ENERGIA FOR SUPERIOR A PERÍODO RAZOÁVEL QUE, COM PEQUENO INVESTIMENTO, PODE E DEVE EVITAR A PERDA DO CULTIVADO OU DA QUALIDADE DO QUE ESTÁ PRODUZINDO. LOGO, AINDA QUE SE ESTEJA TRATANDO DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA, O RAZOÁVEL É SE ENTENDER QUE SÓ HÁ O DEVER DA CONCESSIONÁRIA RESPONDER POR PERDAS DECORRENTES DA INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO QUANDO ESSA SE DER POR PRAZO SUPERIOR ÀQUELE QUE O CONSUMIDOR PODERIA, OU MELHOR, DEVERIA, DE FORMA ABSOLUTAMENTE RAZOÁVEL, SEM CUSTO SIGNIFICATIVO, ESTAR PREPARADO PARA EVITAR.

4. CRITÉRIO OBJETIVO. O NOVO ENTENDIMENTO DESTA CÂMARA RESTRINGE-SE ÀS HIPÓTESES EM QUE OS DANOS COMPROVADAMENTE SOFRIDOS PELO FUMICULTOR DERIVAREM DA INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA DURANTE TEMPO INFERIOR A 24 HORAS ININTERRUPTAS, CONJUNTURA EM QUE OS PREJUÍZOS SERÃO POR ELE SUPORTADOS À RAZÃO DE 2/3, IMPUTANDO-SE À CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA A RESPONSABILIDADE PELO RESSARCIMENTO DE 1/3. JÁ NAS HIPÓTESES DE DANOS ADVINDOS DE INTERRUPÇÕES POR PERÍODO SUPERIOR À 24 horas, A RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA É INTEGRAL.

5. CASO CONCRETO. demonstrada a ocorrência das suspensões de energia, dos danos materiais e do nexo de causalidade. interrupções superiores a 24 horas, entre 12 e 14 de fevereiro de 2019 e entre 24 e 25 de fevereiro de 2019, que ensejam responsabilidade integral da concessionária. quantum majorado de modo a corresponder com o valor apurado pelo laudo técnico.

6. cONSECTÁRIOS LEGAIS. POR SE TRATAR DE RESPONSABILIDADE CONTRATUAL, OS CONSECTÁRIOS LEGAIS INCIDENTES SOBRE O VALOR FIXADO A TÍTULO DE CONDENAÇÃO POR DANOS MATERIAIS RESTAM FIXADOS EM CORREÇÃO MONETÁRIA PELO IPCA DESDE A EMISSÃO DO LAUDO TÉCNICO QUE APUROU AS PERDAS ATÉ A CITAÇÃO, A PARTIR DE QUANDO INCIDIRÁ EXCLUSIVAMENTE A TAXA SELIC.

APELAÇão DO AUTOR provida. apelação da RÉ PARCIALMENTE PROVIDA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

1. Trata-se de apelações cíveis interpostas por AMARILDO FLORIANO e CERFOX - COOPERATIVA DE GERACAO E DESENVOLVIMENTO FONTOURA XAVIER em face da sentença (evento 36, SENT1) que, nos autos da ação indenizatória por danos materiais que o primeiro move em desfavor da segunda, julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos do dispositivo:

"(...) Diante do exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado pal parte autora em face de COOPERATIVA DE GERAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA FONTOURA XAVIER – CERFOX para fim de condená-la ao pagamento de R$ 17.800,02, montante que deverá ser corrigido pelo IGP-M desde a data do efetivo prejuízo (data dos laudos do Evento 3, LAUDO5, fls. 29/38) e acrecido de juros de mora a contar da citação.

Condeno a requerida ao pagamento de 30% das custas judiciais e de honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da condenação. De outro lado, condeno o autor ao pagamento de 70% das custas judiciais e de honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre a diferença ente o valor do pedido e o valor da condenação. Esclareço que não é admitida a compensação dos honorários advocatícios (art. 85, § 14, CPC). Entretanto, a exigibilidade fica suspensa à parte autora em face da gratuidade de justiça anteriormente deferida, a qual ora mantenho. (...)"

O autor, em suas razões (evento 43, APELAÇÃO1), defende que a indenização deve abranger a integralidade do prejuízo apontado no laudo que anexou à inicial, considerando que a parte ré não fez prova em contrário. Explica que, para comprovar o dano material, juntou, além do laudo desenvolvido por profissional da área, fotos do fumo danificado e a tabela de preço aplicado no ano de 2019 pela AFUBRA, bem como providenciou prova testemunhal. Destaca que os documentos produzidos unilateralmente pela ré não demonstram a incidência de temporais ou outros eventos que contribuíssem com a falta de energia na sua propriedade. De qualquer forma, mesmo após fortes temporais são exigidas apenas algumas horas para o reparo, sendo inconcebível que se fique mais de 24 horas sem energia elétrica. Ainda, contesta, expressamente, os documentos juntados com a contestação. Indica omissão de informação por parte da ré no documento que mostra o cadastro do autor, visto que não marcou opção "ocorrências com interrupção na unidade consumidora", de modo que, obviamente, não aparece qualquer reclamação no histórico. Ressalta que a ré sequer mencionou ter diligenciado nas áreas atingidas pelo desabastecimento a fim de averiguar a afetação da produção de agricultores e apurar a magnitude dos prejuízos. Além disso, diz que a ré juntou parecer técnico de falsificação de assinaturas de outros processos, de 2014, envolvendo outras partes, outro perito e outro escritório de advocacia, sem qualquer relação com a demanda do autor. Posto isso, requer o provimento do recurso para reformar a sentença, condenando a ré ao pagamento de indenização no valor aferido pelo laudo constante no evento 3, LAUDO5, com devida inversão do ônus sucumbencial e fixação de honorários advocatícios no importe de 20% do valor atualizado da condenação, em atenção ao trabalho adicional realizado. Em hipótese diversa, pugna pela manifestação acerca dos itens "IV, V, VI e VII", para fins de prequestionamento.

Por sua vez, nas razões da ré (evento 41, APELAÇÃO1), ela alega que não houve interrupção no fornecimento de energia elétrica na região da propriedade do autor e que ele não a comunicou acerca das supostas ocorrências e danos, o que impossibilitou verificação in loco de sua parte. Menciona que isso é comprovado por documentos acostados junto à contestação, os quais não foram objeto de impugnação específica por parte do autor. Argumenta que não estão presentes os requisitos caracterizadores da responsabilidade civil. Aduz que as provas trazidas pelo autor são frágeis, resumindo-se a declarações parciais. Aponta não ser possível precisar se foi a secagem ou a falta de energia que provocou danos ao fumo, nem ter certeza da quantidade de fumo afetado. Discorre sobre as ações em massa envolvendo danos na produção do fumo, que firma na maioria das vezes serem forjadas, inclusive no que toca aos laudos juntados. Diz que o autor ingressou com a demanda em Soledade, e não em Arvorezinha, pois nessa os magistrados passaram a julgar improcedentes os pedidos. Quanto à prova oral produzida, sustenta que as testemunhas Mario Drum e Joelson Ferreira Lima demonstraram a inexistência de falta de energia e comunicação sobre interrupções nas datas em questão. Já as testemunhas autorais não passam credibilidade, chegando a expressar indícios de recebimento de instrução acerca do que deveriam relatar. Nesse contexto, defende que não há dano material indenizável. Subsidiariamente, pondera que o valor dos danos deve observar o valor médio entre a alta quantia apontada pelo autor (R$ 10,96) e a menor quantia segundo a tabela oficial de preços (R$ 0,63), resultando em R$ 5,79, que levam ao montante total de R$ 14.434,47. Também subsidiariamente, alega que a culpa concorrente do autor deve impor a redução dos danos a serem ressarcidos à razão de 1/3, que representa R$ 4.811,49. No que se refere à atualização da verba indenizatória, entende que deve incidir correção monetária pelo IPCA-E desde o efetivo prejuízo, considerado aqui a data do laudo, e, a contar da citação, por incidirem também juros de mora, deve ser utilizada apenas a Taxa SELIC. Em suma, requer o provimento do recurso para reformar a sentença, julgando totalmente improcedente a demanda, ou, subsidiariamente, reconhecendo o valor médio do produto e limitando a indenização a 1/3 do prejuízo, assim como determinando a correção da verba pelo IPCA-E desde o laudo até a citação e, a partir de então, a incidência somente da Taxa SELIC.

Foram apresentadas contrarrazões por ambas as partes (evento 49, CONTRAZAP1 e evento 47, CONTRAZ1).

Vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório.

2. Recebo os recursos interpostos, porquanto atendidos os seus pressupostos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, comprovado o preparo pela ré (evento 41, COMP3) e dispensado o autor, que litiga sob o pálio da AJG (evento 3, DESPADEC7); comportando julgamento...

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