Decisão Monocrática nº 50008684420198210137 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 12-03-2023

Data de Julgamento12 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50008684420198210137
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003357317
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000868-44.2019.8.21.0137/RS

TIPO DE AÇÃO: Abandono Material

RELATOR(A): Desa. SANDRA BRISOLARA MEDEIROS

EMENTA

Apelação Cível. estatuto da criança e do adolescente. ação de destituição de poder familiar. DESCUMPRIMENTO DOS DEVERES INERENTES AO PODER FAMILIAR. ART. 1.638 DO CÓDIGO CIVIL E ARTS. 22 E SEGUINTES DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. 1. NO CASO EM EXAME, RESULTANDO COMPROVADA a negligência da genitora EM RELAÇÃO aos filhos, DEMONSTRANDO INAPTIDÃO PARA OS CUIDADOS BÁSICOS E AUSÊNCIA DE CONDIÇÕES DE PROPORCIONAR aos INFANTEs DESENVOLVIMENTO SAUDÁVEL, IMPERATIVA A DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR, EM ATENÇÃO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA MÁXIMA PROTEÇÃO À CRIANÇA. 2. SENTENÇA CONFIRMADA.

APELO DESPROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

1. Trata-se de recurso de apelação interposto por VITÓRIA da S. B., inconformada com a sentença proferida no Evento 181 - processo de origem, que julgou procedente a ação de destituição de poder familiar promovida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO para o fim de destituir a demandada do poder familiar em relação aos filhos gêmeos, Raphael e Enzo, com fulcro nos arts.1.637 e 1.638, II e IV, do CC, e nos arts. 22 e 24 da Lei n.º 8.069/1990.

Nas razões, alega que foi usuária de drogas, mas já não faz uso de entorpecentes há longa data, sendo infundadas as alegações de que voltou a se drogar. Afirma que, embora tenha história de vida conturbada, não há motivo hábil a justificar a medida drástica de destituição do poder familiar. Aduz que o laudo psicológico pericial lhe foi amplamente favorável, bem como atestou que a família extensa tem todas as condições para prestar o auxílio que ela e os infantes necessitam, não sendo indicada a perda ou suspensão do poder familiar. Acrescenta que o estudo social concluiu que o imóvel em que reside apresenta todas as condições para moradia e que os infantes devem ficar sob os cuidados da família extensa, no caso, a avó materna, Cleusa, e o tio Johnny, sendo, igualmente, contrário à perda ou suspensão do poder familiar. Salienta que a avaliação detalhada da situação concluiu que a apelante sofre de transtorno de personalidade dependente com comorbidade de transtorno de depressão de gravidade moderada, o que, apesar do acompanhamento feito pela rede, jamais foi diagnosticado, inclusive, foram mal interpretados por seus familiares, como falta de iniciativa e de maturidade. Refere que o fato de possuir problemas dessa ordem não justifica o rompimento do forte vínculo que possui com os filhos, pois se trata de enfermidades em relação às quais o Poder Público tem o dever de oferecer tratamento adequado. Diz que o laudo psicológico é taxativo quando afirma que os transtornos enfrentados não a incapacitam para o exercício da maternidade. Ressalta que toda a prova técnica é no sentido de que a apelante e sua família apresentam condições para prover os cuidados dos infantes, sendo a retirada destes do convívio materno por que não mais subsistem contrária ao melhor interesse das crianças. Enfatiza que há perspectiva concreta de capacitação e reestruturação da genitora para o exercício do poder familiar, ainda que em médio prazo. Destaca que o processo de adoção é inapropriado, estando em andamento o processo de perda/suspensão do poder familiar. Pondera que tem envidado todos os esforços na tentativa de recobrar o poder familiar e a guarda dos filhos, com o afastamento da medida drástica. Menciona que a escassez de recursos materiais jamais pode lastrear o afastamento da criança do seio de sua família natural, não sendo argumento suficiente para a destituição do poder familiar. Assevera a inexistência das hipóteses legais que justifiquem a medida imposta na sentença. Prequestiona todos os dispositivos legais e constitucionais invocados na irresignação.

Requer o provimento do recurso para que seja determinado o desacolhimento das crianças e a sua restituição à apelante (Evento 187 - origem).

Foram anexadas contrarrazões (Evento 190 - origem).

O parecer do Ministério Público de segundo grau é pelo desprovimento do recurso (Evento 7).

É o relatório.

Decido.

2. O recurso não merece provimento.

Com efeito, em que pese a preferência que a legislação confere à manutenção ou reintegração das crianças ou adolescentes na família biológica, não há olvidar que o princípio maior que norteia as normas atinentes ao direito posto em liça é o interesse do menor.

É, e sempre deverá ser, sob essa ótica, e não sob a ótica do interesse dos pais ou de terceiros, que as situações deverão ser analisadas judicialmente.

Cumpre observar que a perda da guarda ou tutela, a suspensão e a destituição do poder familiar (regulamentada no art. 1.638 do CCB e nos arts. 192, 223 e 244 do ECA), são as medidas aplicáveis aos pais ou responsáveis que negligenciam os cuidados de que os menores necessitam, expondo-os a situações de risco. Tratam-se das medidas mais graves aplicáveis contra os genitores, de acordo com o rol disposto no art. 129 do ECA, in verbis:

"Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:

I - encaminhamento a serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família;

II - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;

IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;

V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua frequência e aproveitamento escolar;

VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado;

VII - advertência;

VIII - perda da guarda;

IX - destituição da tutela;

X - suspensão ou destituição do pátrio poder familiar.

Parágrafo único. Na aplicação das medidas previstas nos incisos IX e X deste artigo, observar-se-á o disposto nos arts. 23 e 24".

De salientar que a perda da guarda e a suspensão do poder familiar não são medidas preparatórias ou acautelatórias da destituição do poder familiar, necessariamente, mas medidas diferentes e independentes.

A suspensão do poder familiar é medida que apenas restringe o exercício dos deveres e direitos dos pais sobre os filhos temporariamente – enquanto perdurar a necessidade dos menores –, ao passo que a destituição do poder familiar é a medida extrema que extingue definitivamente esses deveres e direitos.

No caso concreto, não há qualquer indicativo de que o melhor, do ponto de vista dos gêmeos Raphael e Enzo, nascidos em 24/07/2018, seja a manutenção do poder familiar da demandada, sua genitora.

Ao contrário, são inúmeras as evidências nos autos que levam à conclusão inarredável de que a apelante, assim como a famíia extensa, não apresenta condições suficientes para exercer o poder familiar sobre os menores, porquanto evidenciado da prova colacionada que as situações de negligência e abandono perpetradas pela genitora, bastando observar que os meninos foram institucionalizados em três oportunidades, isso porque nem a apelante, que já esteve acolhida porque submetida a situações de negligência na sua infância, nem sua família extensa, ostentavam condições de protegê-los.

Ademais, como bem observado na sentença, "embora ambos os laudos tenham sido...

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