Decisão Monocrática nº 50008820920148210006 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 30-12-2022

Data de Julgamento30 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50008820920148210006
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003160191
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000882-09.2014.8.21.0006/RS

TIPO DE AÇÃO: Nulidade e Anulação de Partilha e Adjudicação de Herança

RELATOR(A): Desa. VERA LÚCIA DEBONI

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DAS SUCESSÕES. AÇÃO DE NULIDADE DE PARTILHA. INCONFORMIDADE CONTRA SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS PELA SEDIZENTE COMPANHEIRA DO HERDEIRO QUE, ALEGADAMENTE, SERIA O PROPRIETÁRIO DO BEM PARTILHADO NO INVENTÁRIO DOS ESPÓLIOS DE SEUS GENITORES.
1. A LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DA SEDIZENTE COMPANHEIRA DO HERDEIRO PÓS-MORTO DEVE SER COMPROVADA MEDIANTE PROVA DOCUMENTAL IDÔNEA DA EXISTÊNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL (DECISÃO JUDICIAL OU ESCRITURA PÚBLICA DECLARATÓRIA EMITIDA PELO DE CUJUS RECONHECENDO A CONVIVÊNCIA MARITAL).
2. A ESCRITURA PÚBLICA É ESSENCIAL À VALIDADE DE NEGÓCIOS JURÍDICOS QUE VISEM À CONSTITUIÇÃO, TRANSFERÊNCIA, MODIFICAÇÃO OU RENÚNCIA DE DIREITOS REAIS SOBRE IMÓVEIS (ARTIGO 108 DO CÓDIGO CIVIL), E A PROPRIEDADE DE BENS IMÓVEIS SÓ SE ADQUIRE MEDIANTE REGISTRO DO TÍTULO TRANSLATIVO (ARTIGOS 1.227 E 1.245 DO CÓDIGO CIVIL). TRATANDO-SE DE IMÓVEL QUE ESTAVA REGISTRADO EM NOME DOS INVENTARIADOS E NÃO HAVENDO PROVA DE QUE HOUVESSE SIDO ALIENADO ANTES DA ABERTURA DAS RESPECTIVAS SUCESSÕES, NÃO HÁ FALAR-SE EM NULIDADE DA PARTILHA MEDIANTE SIMPLES ASSERÇÃO DE QUE PERTENCIA AO HERDEIRO FILHO PÓS-MORTO.
3. A HERANÇA DE PESSOA VIVA NÃO PODE SER OBJETO DE NEGÓCIO JURÍDICO (ARTIGO 426 DO CÓDIGO CIVIL), RAZÃO POR QUE A AFIRMAÇÃO DE QUE O FALECIDO COMPANHEIRO DA AUTORA HAVIA ADQUIRIDO O QUINHÃO DOS IRMÃOS NA HERANÇA DOS GENITORES, ANTES MESMO DO ÓBITO DESTES, NÃO PODE SER ADMITIDA COMO CAUSA DE PEDIR A AMPARAR PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DA PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA.
4. NÃO É VIÁVEL CONHECER-SE DE NOVOS PEDIDOS DEDUZIDOS DIRETAMENTE NA SEARA RECURSAL, SOB PENA DE VIOLAÇÃO AO CONTRADITÓRIO E PROLAÇÃO DE DECISÃO EXTRA PETITA.
RECURSO CONHECIDO EM PARTE E DESPROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de apelação interposta por Marli Rodrigues Pinto, por si e na condição de inventariante do espólio de João Clécio Cezar, inconformada com sentença da 1ª Vara Cível de Cachoeira do Sul, que julgou improcedente o pedido formulado em ação de nulidade de partilha cumulada com petição de herança e perdas e danos movida em face dos apelados, espólios de Ary de Carvalho Cezar e Maria Orilda Cezar, representados pelo inventariante, Leoni Cláudio Cezar, e Anderson André Cezar.

Narrou a apelante que ajuizou a presente demanda com o fim de ver anulado o inventário dos espólios recorridos, visto que, segundo afirmou, foi partilhado imóvel que era de propriedade e posse de seu falecido companheiro, João Clécio Cezar. Explanou que o bem ainda se encontrava registrado em nome do genitor do de cujus e foi rapidamente inventariado, o que frustrou a conclusão do inventário de João Clécio, por ela ajuizado. Referiu que “as vendas, no interior, são comumente procedidas de forma verbal, ainda mais entre familiares, o que ocorreu no caso em tela” (sic). Ponderou que o falecido companheiro não teria pago o imposto do imóvel rural caso não fosse sua a propriedade, “tampouco realizado levantamento topográfico, frente profissional habilitado, datado de 1991, onde justamente delimita a propriedade a que alega ter adquirido” (sic). Discorreu sobre as provas produzidas, ressaltando a existência de declarações de vizinhos, contrato de arrendamento e testemunhas. Salientou que “os contratos firmados após o óbito não tiveram vigência, eis que poucos dias depois que firmou com a esposa do João Clécio, os cunhados dela, lhe obrigaram a desocupar o imóvel rural, narrando que houve inclusive, uma ‘invasão’ pelos irmãos, logo após o óbito” (sic). Lamentou que a intenção de regularizar a propriedade não tenha sido “oficializada em tempo, eis que seu óbito foi repentino e inesperado, mas todas as provas demonstram cabalmente que a apelante e seu companheiro exerciam não só a posse, mas como a propriedade do referido imóvel rural, desde 1991” (sic). Obtemperou que, se eventualmente não reconhecida a propriedade e a nulidade da partilha, deve, então, ser reconhecido, pelo menos, o seu direito à quota-parte que lhe cabia na herança dos sogros, na condição de única herdeira de João Clécio. Ressaltou que não há prova, nos autos, de que tenha renunciado à herança de seu companheiro. Argumentou, ainda, que foi “vítima da esperteza do profissional que contratou para representá-la, e, imediatamente, passou a representar os seus cunhados no inventário que partilha seu próprio bem” (sic). Pugnou, nesses termos, pelo provimento do recurso e reforma da sentença, a fim de que seja anulada a partilha do imóvel e reconhecido o seu direito de propriedade sobre o bem, assim como a condenação dos apelados em perdas e danos; subsidiariamente, postulou a anulação da partilha, para que possa herdar a parte que lhe cabe, na condição de sucessora de João Clécio Cezar.

Aportaram contrarrazões (evento 24).

O Ministério Público declinou de intervir (evento 10).

Vieram os autos conclusos em 06/09/2022 (evento 11).

É o relatório. Decido.

O recurso é apto e tempestivo, embora só possa ser conhecido em parte, como se verá adiante.

Não há preliminares a serem analisadas, razão porque é possível adentrar-se, de imediato, ao exame das pretensões recursais.

Antes, porém, transcrevo os fundamentos da sentença recorrida (evento 3, PROCJUDIC11, fls. 31-34):

PRELIMINARMENTE

Da impossibilidade jurídica do pedido

Quanto à sustentação da parte requerida de que se tem a impossibilidade jurídica do pedido, tenho que essa questão se confunde com o mérito e com ele será analisada.

Superado esse ponto, passo à análise de mérito.

MÉRITO

Trata-se de ação de anulação de partilha em que a representante do Espólio de João Clécio Cezar, Marli Rodrigues Pinto, pretende a desconstituição da partilha ocorrida no processo de inventário do Espólio de Ary de Carvalho Cezar e Maria Orilda Cezar.

A requerente argumenta que seu companheiro João Clécio, filho dos também falecidos Ary de Carvalho Cezar e Maria Orilda Cezar, havia adquirido de seus irmãos uma fração de terras com área de 5ha, em 1991, quando todos vivos. Explicou que a propriedade de fato do imóvel rural era dos pais do de cujus, mas que ele comprou diretamente a parte que caberia aos seus irmãos quando da partilha da herança. Referiu que o imóvel não chegou a ser regularmente transferido para o de cujus. Alegou que o advogado que ajuizou o processo de inventário dos bens deixados pelo de cujus, também foi quem iniciou com o processo de inventário dos requeridos, sendo que o procurador arrolou o bem que já havia sido vendido ao seu companheiro. Mencionou que o inventário dos requeridos foi julgado e o imóvel que anteriormente havia sido vendido ao seu companheiro foi partilhado, com as formalidades pertinentes. Disse que, após a expedição dos formais de partilha, parte do imóvel discutido foi vendido forjadamente, transferindo a propriedade para um filho de um dos irmãos do de cujus, com fins de cercear os direitos da ora inventariante, uma vez que é herdeira legítima.

Os requeridos, herdeiros da sucessão de Ary de Carvalho Cezar e Maria Orilda Cezar, em sede de contestação, argumentaram que o casal falecido havia apenas permitido que o filho João Clécio ocupasse o local e construísse um chalé, não havendo que se falar em venda da propriedade. Discorreram que não há falar em venda forjada ao filho de um dos herdeiros.

Pois bem.

Num primeiro momento, importante analisar a efetiva propriedade do imóvel aqui discutido, qual seja, a fração de terras com área de 5 hectares, situada na localidade Bosque, no Distrito Ferreira, em Cachoeira do Sul.

Apesar de a representante do Espólio autor alegar que o de cujus era o proprietário de fato do imóvel, pois adquirido de seus irmãos, em 1991, bem como apresentar comprovantes de serviços realizados no local, em nome do falecido, não há provas...

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