Decisão Monocrática nº 50009299220168210141 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 01-12-2022

Data de Julgamento01 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50009299220168210141
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003384047
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000929-92.2016.8.21.0141/RS

TIPO DE AÇÃO: Administração judicial

RELATOR(A): Desa. ISABEL DIAS ALMEIDA

APELANTE: VALTER LUKIAN MOREIRA MATTOS (AUTOR)

APELADO: MAGAZINE INCORPORACOES S.A. (RÉU)

APELADO: LUIZA ADMINISTRADORA DE CONSORCIOS LTDA (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA DE BEM IMÓVEL. MASSA FALIDA NO POLO PASSIVO. COMPETÊNCIA INTERNA.

O FATO DE A PARTE REQUERIDA SER EMPRESA FALIDA OU EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL, POR SI SÓ, NÃO DETERMINA A INSERÇÃO DO RECURSO NA SUBCLASSE “RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA”. INTELIGÊNCIA DO ITEM 22, “A”, DO OFÍCIO CIRCULAR Nº 01/2016-1ª.VP. PRECEDENTES.

SUSCITADA DÚVIDA DE COMPETÊNCIA, EM DECISÃO MONOCRÁTICA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

1. Trata-se de recurso de apelação interposto por VALTER LUKIAN MOREIRA MATTOS contra a sentença que, nos autos da ação judicial de liberação de alienação fiduciária c/c adjudicação compulsória e reparação de danos ajuizada em desfavor de MAGAZINE INCORPORACÕES S.A. e LUIZA ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIOS LTDA, restou proferida nos seguintes termos:

Valter Lukian Moreira Mattos ajuizou a presente ação contra Massa Falida de Magazine Incorporações S/A e Luíza Administradora de Consórcios Ltda., alegando ter permutado com o primeiro requerido três terrenos onde pretendia construir um imóvel. Disse que houve a quitação do contrato sem que, contudo fosse escriturado em seu nome o terreno matriculado sob o número 36.916, RI de Capão da Canoa, pois foi alienado fiduciariamente em favor da segunda requerida, pessoa jurídica pertencente ao mesmo grupo econômico da primeira. Referiu ter notificado a ré para cumprimento da avença, sem sucesso. Postulou fosse determinado o levantamento dos registros de hipoteca, a adjudicação compulsória do imóvel descrito na inicial e condenação ao pagamento de danos decorrentes pela perda de uma chance, no montante de R$ 30.000,00. Juntou documentos (fls.02/33).
A parte autora postulou antecipação de tutela para ver determinado o levantamento da alienação fiduciária, o que foi deferido (fl. 44).

A requerida Luíza Administradora de Consórcios apresentou contestação e juntou documentos.
Suscitou sua ilegitimidade passiva para a causa. Disse que é administradora de consórcios e a primeira requerida ofereceu o bem objeto da demanda em garantia a uma confissão de dívida. Alegou que autor e primeira ré pactuaram sem notificar a parte credora fiduciária que, em verdade, e´a titular do domínio sobre o bem. Impugnou os danos alegadamente sofridos pelo autor. Requereu a improcedência da ação.
Magazine Incorporações igualmente contestou, noticiando ter sido decretada sua falência e, por tal razão, não poder cumprir com a liminar pois não dispõe mais de seus bens.

Houve réplica (fls.120/139).

Foi revogada a liminar em reanálise da questão pelo Juízo(fl.159).

Conclusos os autos para sentença, foram baixados em diligência, oportunidade em que foi extinta a ação em face da Luiza Consórcios pelo reconhecimento de sua ilegitimidade passiva para a causa (fls.
195/195verso).
Houve regularização da representação processual da Massa Falida e provimento do agravo de instrumento interposto pela parte autora da decisão que reconheceu a ilegitimidade passiva da Luiza Consórcios.

Sem mais provas a serem produzidas, vieram os autos conclusos para sentença.

É o relatório.
Passo a decidir.
Fundamentação.
Pretende a parte autora a procedência da ação para ver levantado o registro de alienação fiduciária existente no imóvel por ela adquirido por permuta com a primeira ré, a adjudicação do referido bem e a condenação da parte demandada ao pagamento de indenização por danos materiais.
Da análise dos documentos acostados ao feito, verifica-se que a requerente celebrou com a primeira demandada contrato de permuta de três terrenos por um veículo, sendo que o registrado sob a matrícula número 36.916, RI de Capão da Canoa, estava alienado fiduciariamente à segunda requerida (R4).

A alienação fiduciária em garantia, como é sabido, transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta do bem, sendo vedado ao devedor fiduciante, no caso a primeira ré, nesta condição, negociar o imóvel sem a anuência da credora fiduciária – segunda ré -, haja vista que o possuidor direto detém todas as responsabilidades e encargos contratuais que lhe incumbe de acordo com a lei civil e penal, consoante os termos do Decreto-Lei nº 911/69, alterado pela Lei nº 4.728/65.

Em suma, quem realiza um negócio ciente de tal circunstância assume os riscos advindos de sua conduta, especialmente, o de não obter a liberação do gravame sem a anuência do credor fiduciário, o que, em tese, inexiste até o momento.

Tal argumentação objetiva evidenciar que o contrato de permuta firmado pela parte autora com o réu Magazine Incorporações, agora Massa Falida, é ineficaz perante a Administradora de Consórcios Luiza.

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a transferência de bem com alienação fiduciária sem a anuência da instituição financeira é ato clandestino ilícito.

DIREITO CIVIL. USUCAPIÃO. BEM MÓVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AQUISIÇÃO DA POSSE POR TERCEIRO SEM CONSENTIMENTO DO CREDOR. IMPOSSIBILIDADE. ATO DE CLANDESTINIDADE QUE NÃO INDUZ POSSE. INTELIGÊNCIA DO ART. 1.208 DO CC DE 2002. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. 1. A transferência a terceiro de veículo gravado como propriedade fiduciária, à revelia do proprietário (credor), constitui ato de clandestinidade, incapaz de induzir posse (art. 1.208 do Código Civil de 2002), sendo por isso mesmo impossível a aquisição do bem por usucapião. 2. De fato, em contratos com alienação fiduciária em garantia, sendo o desdobramento da posse e a possibilidade de busca e apreensão do bem inerentes ao próprio contrato, conclui-se que a transferência da posse direta a terceiros ? porque modifica a essência do contrato, bem como a garantia do credor fiduciário ? deve ser precedida de autorização. 3. Recurso especial conhecido e provido. RECURSO ESPECIAL Nº 881.270 - RS (2006/0187812-1) RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO.

A jurisprudência colacionada, assim, mostra o entendimento de que é ilícita a transferência de bem imóvel alienado fiduciariamente sem anuência do credor fiduciário, sendo contrato ineficaz em relação a ele.
A alegação de quitação integral do contrato pelo autor não tem o condão de obrigar ao credor fiduciário levantar o gravame instituído em seu favor.
Além disso, não há prova nos autos de que credor e devedor fiduciário sejam empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico, pois os documentos juntados pelo autor demonstram que Luiza Consórcios é empresa do mesmo grupo do Magazine Luíza e não do Magazine Incorporações S/A.
Assim, não havendo a possibilidade de dar-se pela procedência da obrigação de fazer, viável, de outra banda, converter-se o pedido em indenização por perdas e danos, com a rescisão parcial do contrato de permuta relativamente ao imóvel matriculado sob o número 36.916, RI de Capão da Canoa/RS, na forma do postulado sucessivamente pela parte autora.

Para fins de indenização a ser condenada a primeira ré, fixo o valor proporcional ao lote em questão, ou seja, 1/3 do preço do contrato, R$ 72.333,33, que deverá ser atualizado pelos índices do IGP-M e acrescido de juros de mora à taxa legal desde a data do inadimplemento da obrigação, isto é, 18 de abril de 2015, conforme prazo assinalado na cláusula quinta do contrato de fls.
23/26.
Corolário natural e óbvio da extinção, ainda que parcial, é o retorno das partes às posições ocupadas antes da contratação, na forma do disposto no artigo 182 do CC/02.
Desconstituída a avença, portanto, tudo se passa como se o contrato nunca tivesse existido, devendo, inclusive, a posse ser retornada à Massa Falida.
Saliento não se aplicar aqui o enunciado da Súmula 308 do STJ, pois se trata de alienação fiduciária e, ainda que fosse hipoteca, não é o caso de garantia estabelecida entre o banco financiador da obra e a construtora.

Passo, por fim, à análise quanto ao pedido cumulado, qual seja, indenização de danos causados decorrentes de ato ilícito.

A parte autora alega que deve ser indenizada no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) uma vez que, por mais de um ano, deixou de investir no imóvel, sem poder construir ou vender, sendo que sua principal finalidade é a construção civil e a venda de imóveis visando lucro, pelo que deve ser ressarcida pela perda da oportunidade de obter determinada vantagem ou evitar certo prejuízo.

Cumpre esclarecer que a perda de uma chance consubstancia- se em teoria doutrinária, segundo a qual determinada conduta ilícita,
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT