Decisão Monocrática nº 50009494120208210045 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Cível, 15-03-2022

Data de Julgamento15 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50009494120208210045
ÓrgãoQuarta Câmara Cível
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001970747
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000949-41.2020.8.21.0045/RS

TIPO DE AÇÃO: Rescisão

RELATOR: Desembargador MARCELO BANDEIRA PEREIRA

APELANTE: ANGELA LUCI MACHADO DA LUZ (REQUERENTE)

APELADO: MUNICÍPIO DE ENCRUZILHADA DO SUL (REQUERIDO)

RELATÓRIO

ANGELA LUCI MACHADO DA LUZ interpõe recurso de apelação da sentença que, nos autos da ação de obrigação de fazer (imóvel público municipal) c/c declaratória de inexistência de débito ajuizada em face do MUNICÍPIO DE ENCRUZILHADA DO SUL, julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos (ev. 30):

"(...) III - DISPOSITIVO

Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos de ANGELA LUCI MACHADO DA LUZ expostos na presente ação movida contra o MUNICÍPIO DE ENCRUZILHADA DO SUL/RS, para (i.) DECLARAR a prescrição das parcelas inadimplidas pela Autora, referentes ao Contrato de Concessão de Direito Real de Uso (Evento 1, OUT10, Páginas 1/3), forte no Art. 206, parágrafo 5º, inciso I, do Código Civil, e (ii.) DETERMINAR ao MUNICÍPIO DE ENCRUZILHADA DO SUL/RS que expeça termo de quitação da dívida em favor da parte Autora.

Condeno a parte Autora ao pagamento de 50% das custas processuais e honorários aos patronos da parte Ré, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa (R$6.234,00 – que deve ser atualizado pelo IGP-M desde a data do ajuizamento da ação – 28.10.2020), forte no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil, considerando a complexidade da causa e o trabalho exercido pelos Procuradores, suspensa a exigibilidade diante do deferimento da gratuidade de justiça (Evento 3).

Também sucumbente, condeno o Município de Encruzilhada do Sul ao pagamento de honorários aos patronos da parte Autora, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa (R$6.234,00 – que deve ser atualizado pelo IGP-M desde a data do ajuizamento da ação – 28.10.2020), forte no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil, considerando a complexidade da causa e o trabalho exercido pelos Procuradores.

Destaco que, tendo a ação sido ajuizada em 28.10.2020, incide a Lei n.º 14.634/2014, logo, deixo de condenar o Réu ao pagamento de 50% das custas processuais.(...)"

Sustenta que deve haver a transferência da propriedade mediante registro do título translativo no Registro de Imóveis, com fundamento no art. 1.245 do CC. Alega que o imóvel não precisa passar pelo processo administrativo de desafetação de bem público. Explica que, como foi reconhecida a prescrição dos valores inadimplidos, é fundamental que o Município outorgue escritura definitiva de compra e venda do imóvel mediante título translativo junto ao Cartório de Registro, bem como de acordo com a cláusula sexta do contrato. Requer, ainda, a majoração do percentual dos honorários fixados, considerando o trabalho realizado, natureza da causa, lugar do serviço e grau de zelo profissional, nos termos do art. 85, §2º, do CPC (ev. 35).

Sobrevieram contrarrazões (ev. 38).

A Procuradora de Justiça opina pelo conhecimento e provimento parcial do recurso para majorar os honorários (ev. 9).

É o relatório.

VOTO

A recorrente ajuizou ação de obrigação de fazer cumulada com declaratória de inexistência de débito.

O pedido formulado na inicial foi o de declaração da prescrição das parcelas inadimplidas referentes ao financiamento obtido junto ao Município (Contrato de Concessão de Direito Real de Habitação (ev. 1, OUT10), além do reconhecimento de quitação da dívida e outorga da escritura definitiva do imóvel, com a sua transferência no Registro de Imóveis de Encruzilhada do Sul.

Como relatado, a magistrada julgou parcialmente procedentes os pedidos e a parte autora apela, inicialmente, no ponto relativo à outorga da escritura definitiva do imóvel localizado na Rua Geminiano Castilho, nº 65, Vila Paraíso, Encruzilhada do Sul/RS.

Adianto o não provimento da apelação.

A questão "sub judice" tem a ver com um Contrato de Concessão de Direito Real de Habitação, firmado entre a apelante e o Município de Encruzilhada do Sul.

No contrato consta no objeto "Material para uma casa de alvenaria, lote 12, quadra 10, Vila Paraíso" (ev. 1, OUT10).

Esclareço, porém, que existe mais um contrato idêntico, referente ao mesmo lote e quadra, constando uma casa de alvenaria, realizado entre a Prefeitura e Ivan Pereira Oliveira, datado de 25/05/1995 (ev. 1, OUT7).

Contudo, em 19/08/1996, foi realizado um "contrato de substabelecimento de direito de habitação" entre Ivan e a ora recorrente, Angela, havendo, em tal instrumento, a informação de que a outorgada, após o término do contrato, deveria requerer à municipalidade a escritura definitiva do imóvel - item 4 (ev. 1, OUT8).

Ocorre que, na presente situação, independente do que acordado entre as pessoas físicas, considera-se, para fins da análise "sub judice", o instrumento legal efetivado entre a autora Angela e a Prefeitura de Encruzilhada do Sul, com início do pagamento das parcelas em 10/08/2000 (ev. 1, OUT10, p. 2).

Registro, ainda, que tanto o contrato de Ivan, como o de Angela, firmados com a Prefeitura, são idênticos, ambos referindo o direito de preferência à aquisição em definitivo do imóvel cedido.

Isso significa que, provavelmente, quando realizado o 'contrato de substabelecimento de direito de habitação' entre as pessoas físicas, Ivan e Angela, foi utilizado um contrato padrão, sem atentar para as cláusulas ali previstas. Algo, talvez, bem comum de acontecer naquela época no município de que se trata.

De qualquer modo, pertinente referir que a Concessão do Direito Real de Uso (CDRU) se trata de um direito real com previsão no art. 1.225, XII, do CC1, estando disciplinada no Decreto-Lei nº 271/67 (Dispõe sobre o loteamento urbano, responsabilidade do loteador, concessão de uso e espaço aéreo e dá outras providências).

No art. 7º do citado Decreto está disposto que "é instituída a concessão de uso de terrenos públicos ou particulares remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como direito real resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de interesse social, urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades de interesse social em áreas urbanas".

E o seu §1º prevê que "a concessão de uso poderá ser contratada, por instrumento público ou particular, ou por simples termo administrativo, e será inscrita e cancelada em livro especial".

Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, em Curso de Direito Administrativo2, o CDRU “é o contrato pelo qual a Administração transfere, como direito real resolúvel, o uso remunerado ou gratuito de terreno público ou do espaço aéreo que o recobre, para que seja utilizado com fins específicos por tempo certo ou por prazo indeterminado”.

O contrato em questão cuida de concessão de direito real de habitação, em cujo bojo se contém cláusulas que deveriam ser cumpridas pela mutuária.

Aliás, a sua Cláusula Quinta prevê que a Prefeitura poderia cancelar o contrato de cessão de uso, com a consequente retomada do imóvel cedido, caso houvesse algum descumprimento da cláusula primeira, ou na falta de pagamento de mais de três prestações mensais consecutivas, ou não, por parte do mutuário (ev. 1, OUT10, p. 2):

CLÁUSULA QUINTA: A Prefeitura Municipal poderá cancelar o contrato de cessão de uso e a consequente retomada do imóvel cedido, caso ocorra qualquer hipótese prevista na cláusula primeira ou na falta de pagamento de mais de três prestações mensais consecutivas ou não por parte do mutuário.

Já na Cláusula...

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