Decisão Monocrática nº 50010224620118210039 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 08-02-2022

Data de Julgamento08 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Número do processo50010224620118210039
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001695754
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação/Remessa Necessária Nº 5001022-46.2011.8.21.0039/RS

TIPO DE AÇÃO: Oncológico

RELATOR(A): Des. MIGUEL ANGELO DA SILVA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMENTA

APELAÇÕES CÍVEIS. Direito à Saúde (ECA e Idoso). ESTADO E MUNICÍPIO. FORNECIMENTO DE TRATAMENTO. TERAPÊUTICA ESPECIALIZADA. Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. ARTS. E , AMBOS DA Lei n° 12.764/2012. SAÚDE. GARANTIA CONSTITUCIONAL. DIREITOS SOCIAIS PRESTACIONAIS.

LEGITIMIDADE PASSIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. PRONUNCIAMENTO DO STF EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL.

União, Estados, Distrito Federal e Municípios ostentam legitimidade concorrente para responder às demandas que visam ao fornecimento gratuito de medicamentos, exames ou procedimentos, inclusive cirurgias. Responsabilidade solidária dos entes federativos. Competência comum expressa no art. 23, inc. II da CF/88. A divisão de competências no âmbito da gestão interna do SUS não é oponível ao particular que acode à via judicial.

AMBIENTOTERAPIA (FONOAUDIOLOGIA, ATENDIMENTO PSIQUIÁTRICO, PSICOLÓGICO E TERAPIA OCUPACIONAL). TEMA 793 DO STF. TRATAMENTO ELENCADO NO RENAME E/OU APROVADO PELO CONITEC.

Situação concreta em que se discute a dispensação de terapêutica que integra a política do SUS para tratamento da patologia de que padece a parte autora, circunstância que não enseja a inclusão da União no polo passivo da ação.

ACESSO À SAÚDE. DIREITO FUNDAMENTAL QUE EXIGE PROTEÇÃO SUFICIENTE.

O acesso à saúde é direito fundamental e as políticas públicas destinadas a implementá-lo, embora vinculem o Estado e os cidadãos, devem gerar proteção suficiente ao direito garantido, afigurando-se suscetíveis de revisão judicial, sem que daí se possa vislumbrar ofensa aos princípios da divisão de poderes, da reserva do possível ou da isonomia e impessoalidade.

A outro turno, as normas internas de organização, funcionamento e gestão do Sistema Único de Saúde, de natureza administrativa, não arredam a legitimidade solidária dos entes federativos para responder às demandas de fornecimento de medicamentos, exames ou procedimentos deduzidos pelos desprovidos de recursos financeiros indispensáveis ao seu custeio.

ALTO CUSTO DO FÁRMACO OU TRATAMENTO SEM O CONDÃO DE AFASTAR O DEVER PRESTACIONAL DOS ENTES FEDERADOS.

O alto custo da medicação ou tratamento, por si só, não tem o condão de afastar o dever constitucional do ente público de assegurar o direito fundamental à saúde, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana.

O STF, no RE 566.471, Tema nº 06, reconheceu a repercussão geral quanto à ‘obrigatoriedade, ou não, de o estado fornecer medicamento de alto custo a portador de doença grave que não possui condições financeiras para comprá-lo’. Todavia, até o presente momento, referido tema ainda não foi julgado e não há determinação quanto à suspensão nacional dos processos que versem sobre essa matéria. (“ut” trecho da ementa da Apelação Cível Nº 70080243363).

AMBOS OS APELOS DESPROVIDOS.

DECISÃO MONOCRÁTICA

1 - De saída, adoto o relatório do parecer ministerial lançado nesta instância revisora, que sumariou a espécie nestes termos (Evento 21), “in verbis”:

"Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo Estado do Rio Grande do Sul e pelo Município de Viamão, ambos inconformados com a decisão exarada pelo Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Viamão que, nos autos de ação ordinária aforada pelo infante Luis Fernando Zemor Lucini, julgou procedente o pedido veiculado, ao efeito de condenar os entes púbicos a, solidariamente, disponibilizarem ao autor atendimento especializado e multidisciplinar em instituição adequada à sua condição, uma vez portador de patologias catalogadas sob os CIDs F84 e F71 (Transtorno do Espectro Autista e Retardo Mental Moderado). Pelo resultado da lide, restou imposto ao ente municipal o pagamento de honorários ao FADEP, à razão de 10% sobre o valor devido pela respectiva Fazenda. (Evento 3, PROCJUDIC21, fls. 32/39).

Para tanto, consigna o ente estadual que a postulação veiculada na demanda não se identifica com tutela à saúde, uma vez estranha às políticas do SUS, inserindo-se no âmbito afeto à educação especializada a pessoa portadora de deficiência. Nesse contexto, aduz que o interessado, conforme informação do Município de Viamão, está recebendo atendimento pela APAE daquela localidade, restando já contemplado pelo atendimento disponível no sistema público educacional, ao que não se mostra cabível exigir-se o custeio do serviço no âmbito particular, tendo em vista o vetor da reserva do possível, frente aos limites orçamentários existentes, nos termos dos artigos 167, II e 154, II, ambos da Constituição Federal. Por fim, no que tange ao transporte até a instituição de ensino, consigna que a aludida obrigação pertence ao Município de Viamão, uma vez ter aderido ao PAETE/RS (Programa Estadual de Apoio ao Transporte Escolar), que lhe confere a disponibilização pelo Estado dos recursos necessários à execução do mencionado serviço. Com base em tais argumentos, pugna pela improcedência da demanda aforada em seu desfavor (Evento 3, PROCJUDIC22, fls. 02/09)

O Município de Viamão, por sua vez, alega que a prestação reclamada pertence exclusivamente ao estado federado, porquanto reflete serviço de média complexidade, nos termos das NOAS 95/2001 e 373/2002, merecendo seu cumprimento ser direcionado a tal ente público, notadamente diante do julgamento do Tema 793 pelo STF. Nesse contexto, pugna igualmente pela reversão do julgado (Evento 3, PROCJUDIC22, fls. 17/22)

Ofertadas contrarrazões (Evento 3, PROCJUDIC22, fls. 11/15 e Evento 18), vieram os autos."

A douta Procuradoria de Justiça exarou parecer opinando pelo conhecimento e desprovimento dos apelos.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

2 - Os recursos comportam julgamento monocrático realizado de plano.

A Súmula 568 do STJ enuncia: "O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema."

De igual modo, é possível invocar o art. 932, inciso VIII, do CPC combinado com o art. 169, XXXIX, do Regimento Interno desta Corte de Justiça

Da responsabilidade solidária dos entes federativos.

A Constituição Federal, em seus artigos 196 e seguintes, estabelece a responsabilidade solidária dos entes federativos pelo fornecimento dos serviços de saúde. Com efeito, as ações e os serviços públicos de saúde compõem um sistema único, de tal modo que qualquer dos entes da Federação é parte legítima para responder à demanda que objetiva a sua prestação.

Saliente-se que a distribuição de competência dentro do Sistema Único de Saúde (Lei nº 8.080/90) não tem o condão de afastar a responsabilidade solidária dos entes públicos, porquanto deve prevalecer o disposto na Constituição Federal. A organização interna dos serviços, com a distribuição de competências para a gestão da saúde pública, não pode servir de embaraço ou obstáculo à faculdade de o particular exigir a devida prestação dos serviços de saúde de quaisquer dos entes federados.

A propósito, o Excelso Pretório assim decidiu em Recurso Extraordinário com repercussão geral:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. (RE 855178 RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe 16-03-2015) - grifei

Na mesma linha, refiro julgados do Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ.

1. O legislador pátrio instituiu regime de responsabilidade solidária entre as pessoas políticas para o desempenho de atividades voltadas a assegurar o direito fundamental à saúde, que inclui o fornecimento gratuito de medicamentos e congêneres a pessoas desprovidas de recursos financeiros para o tratamento de enfermidades.

2. O Superior Tribunal de Justiça, em reiterados precedentes, tem decidido que o funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária dos entes federados, de forma que qualquer deles tem legitimidade para figurar no polo passivo de demanda que objetive o acesso a medicamentos.

3. O acórdão recorrido está em sintonia com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça. Incidência da Súmula 83 do STJ.

4. Agravo Interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp 1597299/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, julgado em 08/11/2016, DJe 17/11/2016) - grifei

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. TRATAMENTO DE SAÚDE. AGRAVADA PORTADORA DE PSORÍASE EM ESTÁGIO AVANÇADO. MEDICAMENTO NÃO INCORPORADO

À LISTA DO SUS. DEVER DO ESTADO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. ART. 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

1. A norma prevista no artigo 196 da CF estabelece que a saúde é direito de todos e dever do Estado, tendo ele, por conseguinte, a obrigação de zelar pela saúde de seus cidadãos, obrigação que abrange o fornecimento de medicamentos necessários ao tratamento de saúde de quem não tenha condições para custeá-lo.

2. A recorrente comprovou a doença que lhe acomete, bem como a necessidade de seu fornecimento.

3. O argumento de que, por não constar da lista do SUS, não deve ser fornecido o medicamento pleiteado pela...

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