Decisão Monocrática nº 50012931920148210017 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 09-04-2022

Data de Julgamento09 Abril 2022
ÓrgãoSétima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50012931920148210017
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001985444
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001293-19.2014.8.21.0017/RS

TIPO DE AÇÃO: Reconhecimento/Dissolução

RELATOR(A): Desa. SANDRA BRISOLARA MEDEIROS

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DECLARATÓRIA DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL POST MORTEM CUMULADA COM PARTILHA DE BENS. 1. NOS TERMOS DA LEGISLAÇÃO CIVIL VIGENTE, PARA O RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL, INCUMBIRÁ A PROVA, A QUEM PROPUSER O SEU RECONHECIMENTO, DE QUE A RELAÇÃO HAVIDA ENTRE O CASAL FOI PÚBLICA, CONTÍNUA, DURADOURA E DESTINADA À CONSTITUIÇÃO DE UM NÚCLEO FAMILIAR. 2. NÃO COMPROVADA A PRESENÇA DA AFFECTIO MARITALIS NO RELACIONAMENTO AMOROSO DESCRITO NOS AUTOS, MISTER A CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE A PRETENSÃO. 3. PRECEDENTES. 4. SENTENÇA MANTIDA.

APELAÇÃO DESPROVIDA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

1. Trata-se de apelação cível interposta por MARLI HELENA C. D. contra a decisão interlocutória que, nos autos da ação declaratória de reconhecimento de união estável post mortem, cumulada com partilha de bens, ajuizada em face de CHARLENE N. e JAQUELINE I. N., filhas do falecido José N., julgou improcedente o pedido principal e a reconvenção (Evento 3, PROCJUDIC1, fls. 02-09, dos autos originários).

Marli Helena opôs embargos de declaração (Evento 3, PROCJUDIC11, fls. 16-19, dos autos originários).

Charlene N., por sua vez, também opôs embargos de declaração (Evento 3, PROCJUDIC11, fls. 23-31, dos autos originários).

O juízo singular desacolheu ambos os declaratórios (Evento 3, PROCJUDIC11, fls. 37, dos autos originários).

Em razões de apelação, Marli Helena (Evento 3, PROCJUDIC11, fls. 42-49) afirma ter convivido em união estável com José no período compreendido entre os anos de 2006 e 2013, momento do falecimento do companheiro. Disse que a união era pública, contínua e duradoura, com intenção de constituir família, conforme demonstram as fotografias colacionadas aos autos. Salienta que as fichas de atendimento médico prestado ao de cujus no município de Progresso, cidade onde sempre residiu, representa forte indicativo de que moravam juntos no ano de 2009, o que se estendeu até sua morte. Menciona que além da prova documental, a testemunha Edson Albino S. não deixa dúvidas acerca da existência da união estável havida entre as partes, sendo possível afirmar que o casamento de José e Rita, mãe de Charlene, existia apenas no papel. Consigna que o depoimento de Terezinha, funcionária de José, também chancela a existência da união e, da mesma forma, não foi levado em consideração pelo juízo singular quando do julgamento do pedido. Lembra ter requerido a vinda e Rita aos autos, mãe de Charlene, pedido indeferido pelo juízo, embora esteja recebendo pensão por morte do falecido de forma indevida. Pede, assim, a reforma da sentença para fins de reconhecer a união estável havida com José, invertendo-se os ônus sucumbenciais. Requer o provimento do recurso de apelação.

Foram ofertadas contrarrazões (Evento 3, PROCJUDIC12, fls. 03-10 e 11-, dos autos originários).

Nesta instância, a ilustre Procuradoria de Justiça lançou parecer pelo conhecimento e desprovimento do recurso de apelação (Evento 7, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

Decido.

2. Antecipo que o recurso não merece provimento.

Nos termos da legislação civil vigente, para que o reconhecimento da união estável, àquele que propuser a demanda incumbirá a prova de que a relação havida entre o casal foi pública, contínua, duradoura e destinada à constituição de um núcleo familiar, a teor do disposto no art. 1.723 do Código Civil.

Ademais, às uniões estáveis se estende a affectio maritalis (art. 1.566 do CCB), que se trata de princípio norteador do casamento civil, englobando os conceitos de fidelidade recíproca, vida em comum, mútua assistência, além do sustento e guarda de eventual prole.

Além disso, cumpre anotar que o conceito de vida em comum não é sinônimo de convivência do casal sob o mesmo teto, hodiernamente, e, portanto, a divisão de um domicílio não se trata de requisito absoluto para a identificação da existência, ou não, de união estável.

Há considerar a complexidade estrutural atual da vida em sociedade que, muitas vezes, pode exigir o afastamento físico dos entes familiares entre si, em razão da necessidade de trabalho, por exemplo, sem, contudo, descaracterizar o núcleo familiar. E esse conceito se estende às uniões estáveis.

Outrossim, também é importante observar que, tratando-se a união estável de uma relação havida entre um casal, esses requisitos devem estar comprovados de forma cumulativa e paralela, ou seja, na conduta de ambas as partes.

A matéria trazida a exame é eminentemente fática, passando, pois, pela análise da prova produzida pela parte autora, ora apelante, já que era seu encargo a comprovação da existência da união estável até o decesso de José, ocorrido em 23/08/2013 (Evento 3, PROCJUDIC1, fl. 25, dos autos originários).

No sistema processual vigente não basta alegar, cumprindo àquele que se diz detentor de um direito prová-lo. Significa dizer que aquele que afirma um direito é responsável – tem, portanto, o ônus – pela produção de provas suficientes a sustentar suas argumentações.

Trata-se, o ônus da prova, de um encargo atribuído por lei a cada uma das partes, mas não se confunde com obrigação probatória. Não há obrigatoriedade, pelo sistema processual, de produção de prova, mas quem não a produzir, quando necessária, assume o risco da própria omissão.

Nelson Nery Junior refere que “o não atendimento do ônus de provar coloca a parte em desvantajosa posição para a obtenção do ganho de causa. A produção probatória, no tempo e na forma prescrita em lei, é ônus da condição de parte”.

Ainda, acerca do ônus da prova, Daniel Amorim Assumpção Neves doutrina:

Segundo a regra de distribuição estabelecida pelo art. 333, do CPC, cabe ao autor o ônus de provar os fatos constitutivos, de seu direito, ou seja, deve provar a matéria fática que traz em sua petição inicial e que serve como origem da relação jurídica deduzida em juízo. Em relação ao réu, também o ordenamento processual dispõe sobre ônus probatórios, mas não concernentes aos fatos constitutivos do direito do autor. Naturalmente, se desejar, poderá tentar demonstrar a inverdade das alegações de fato feitas pelo autor por meio de produção probatória, mas, caso não o faça, não será colocado em situação de desvantagem, a não ser que o autor comprove a veracidade de tais fatos. Nesse caso, entretanto, a situação prejudicial não se dará em consequência da ausência de produção de prova pelo réu, mas sim pela produção de prova pelo autor.

Caso o réu alegue por meio de defesa de mérito indireta um fato novo, impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, terá o ônus de comprová-lo. (...)

O ônus da prova carreado ao réu pelo art. 333, II, do CPC só passa a ser exigido no caso concreto na hipótese de o autor ter se desincumbido de seu ônus probatório, porque só passa a ter interesse na decisão do juiz a existência ou não de um fato impeditivo, modificativo ou extintivo do autor, após se convencer da existência do fato constitutivo do autor”.

No presente caso, a apelante não cumpriu com o ônus que lhe incumbia, qual seja, comprovar de forma suficiente a existência da aventada união estável.

Conforme menciona a ilustre Procuradora de Justiça que aqui oficiou, Dra. Maria Regina Fay de Azambuja, no parecer do Evento 7:

"(...)

No mérito, não prospera a irresignação.

A Constituição Federal, em seu art. 226, § 3°, reconhece a união estável como entidade familiar, estabelecendo que deve ser facilitada a sua conversão em casamento.

O Código Civil, por sua vez, regulamenta os requisitos necessários ao reconhecimento da união estável, “é reconhecida como entidade familiar a união entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida co m o objetivo de constituição de família” (art. 1.723).

Com o presente recurso, pretende a Apelante ver julgada procedente a demanda, com a declaração de reconhecimento da união estável havida com o de cujus JOSÉ, falecido em 23/08/2013 (evento 3 – PROCJUDIC1, fl. 25).

Compulsando os...

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