Decisão Monocrática nº 50013298320228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Cível, 12-01-2022

Data de Julgamento12 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50013298320228217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001532646
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5001329-83.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Oncológico

RELATOR(A): Desa. MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA

AGRAVANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVADO: ADAO WOBETO

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SAÚDE. MEDICAMENTO INCORPORADO AO SUS. TEMA 793 DO STF. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. INCLUSÃO DA UNIÃO. DESNECESSIDADE.

Nas ações que tenham por objeto pedido de dispensação de fármaco não incorporado ao SUS, a União deve ser incluída no polo passivo, com a consequente remessa dos autos à Justiça Federal. Tema 793 do STF. Precedentes recentes do STF: RE 1298536 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª Turma, 19/04/2021; ARE 1301670 AgR, Rel. Alexandre de Moraes, 1ª Turma, 13/04/2021; ARE 1308917, Rel. Roberto Barroso, 1ª Turma, 29/03/2021; RE 1307921, Rel. Min. Cármen Lúcia, 2ª Turma, 19/03/2021; RE 1299773 AgR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, 1ª Turma, 08/03/2021; ARE 1298325, Rel. Min Edson Fachin, 2ª Turma, 12/02/2021; RE 1250767, Rel. Min. Edson Fachin, 2ª Turma, 12/02/2020; RE 1303165, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª Turma, 11/02/2021. Jurisprudência deste Tribunal. Hipótese em que o medicamento requerido está incorporado ao SUS, razão pela qual é desnecessária a formação do litisconsórcio passivo para a inclusão da União na demanda.

Recurso desprovido.

DECISÃO MONOCRÁTICA

1. Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL contra decisão do MM. Juiz de Direito da Vara Judicial da Comarca de Dois Irmãos que, nos autos da ação movida por ADAO WOBETO, também contra o MUNICÍPIO DE SANTA MARIA DO HERVAL, para obrigá-los a fornecer o medicamento Keytruda Pembrolizume 100mg, no valor de R$ 44.000,00, conforme o menor orçamento juntado aos autos, deferiu a antecipação de tutela pelos seguintes fundamentos:

1. Recebo a inicial e defiro a gratuidade da justiça ao postulante.

2. Passo à análise da tutela de urgência pleiteada.

São requisitos, para concessão da tutela de urgência, nos termos do art. 300 do CPC, a evidência da probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

Da análise dos autos, verifico a presença de ambos.

O primeiro decorre do próprio bem jurídico a ser tutelado (direito à saúde), o qual é direito indisponível e, por estar amparado na nossa Constituição, deve ser assegurado de forma efetiva aos cidadãos pelo Poder Público.

Nesse sentido é o art. 196 da CF/88, o qual estabelece que a saúde é direito de todos e dever do Estado, em todas as esferas de governo, cumprindo igualmente à União, aos Estados e aos Municípios a elaboração de políticas públicas voltadas à sua promoção e preservação.

O conceito de saúde, por sua vez, é amplo, assim considerados, desde o atendimento médico, hospitalar e cirúrgico, até o fornecimento de medicamentos ou similares, sendo indispensável, no entanto, que sejam necessários à manutenção ou recuperação da saúde e vida do postulante.

Já o perigo de dano é latente, tendo em vista a necessidade na dispensação do medicamento, sob pena de agravamento da enfermidade que acomete à parte autora.

Estabelecidas essas premissas, no caso dos autos, os documentos médicos do Evento 1, ATESTMED4, comprovam que o autor sofre de Doença Neoplásica – Neoplasia Maligna de Pele Tipo Melanoma, classificado sob código CID10:C43, Estado Clinico IV (metástases cerebrais), necessitando do uso do medicamento KEYTRUDA PEMBROLIZUMABE, 100 MG.

O documento do Evento 1, OUT5, por sua vez, demonstra que o requerente solicitou o fornecimento do medicamento administrativamente, porém lhe foi negado o tratamento.

Diante disso, tenho que é imprescindível o fornecimento do fármaco postulado, sob pena de agravamento dos sintomas e da enfermidade que acomete o demandante.

No ponto, registro que não constato qualquer prejuízo à coletividade com o deferimento do pedido, porquanto o que se busca é a plena satisfação do direito de um cidadão, justificando-se ante a necessidade de se ver assegurado tão caro direito constitucional como a saúde e a vida.

Além disso, quanto à impossibilidade de o Poder Judiciário conceder tutela antecipada contra a Fazenda Pública, entendo que, conquanto exista disposição expressa no §3º do art. 1º da Lei nº 8.437/92, estabelecendo que “não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação”, tal restrição à concessão de medida antecipatória cede diante do caso concreto, em que há colisão entre os direitos das partes litigantes: a) direito à vida da parte autora que, premida pela necessidade dos remédios que devem ser fornecidos pelo ente público, postula a concessão da tutela provisória de urgência; b) direito à segurança jurídica do ente federado baseado na impossibilidade da medida antecipatória em razão do interesse patrimonial – tutela do patrimônio público.

Dessarte, invoco o princípio da proporcionalidade, de sorte que, no caso em análise, prevalece o direito à saúde – que é a consagração imediata do fundamento da Constituição Federal de 1988, qual seja, a dignidade da pessoa humana - sobre o direito do Estado, que invoca a segurança jurídica, com fulcro no patrimônio da Fazenda Pública.

Ressalto que não há necessidade de prévio procedimento licitatório para a realização do procedimento que o demandante necessita, pois a Lei Federal nº 8.666/93, em seu artigo 24, inciso IV autoriza a dispensa a licitação “nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares...”.

Em suma: como a proteção à inviolabilidade do direito à vida é bem fundamental para o qual deve o Poder Público direcionar suas ações, entendo que deve prevalecer em relação a qualquer outro interesse do Estado, porquanto, sem ele, os demais interesses socialmente reconhecidos não têm o menor significado ou proveito, de sorte que é imperativa a concessão da tutela provisória de urgência, pois é relevante o fundamento da demanda (dever do Estado a prestar saúde) e há o justificado receio de ineficácia do provimento final a ser concedido só na sentença.

Por fim, saliento que a parte demandante é pessoa de parcos recursos, conforme se depreende dos documentos acostados, de sorte que não pode arcar com os custos exigidos para o controle de sua doença sem prejuízo ao seu próprio sustento.

Sendo assim, presentes os requisitos, CONCEDO A TUTELA DE URGÊNCIA para determinar que os réus forneçam, em 05 (cinco) dias, o medicamento descrito na inicial, através da rede pública, nos termos da indicação médica noticiada, até nova determinação do juízo.

Acaso não disponham de meios para disponibilização na rede pública do medicamento, deverão providenciar o depósito judicial do numerário suficiente para a sua aquisição.

Porventura não cumprida a presente medida no prazo fixado, será determinado o bloqueio do valor correspondente na conta dos entes públicos (art. 536, § 1º, do CPC).

Ainda, diante da notória ausência de disposição da parte ré em compor os processos envolvendo medicamentos e, a fim de preservar a celeridade, evitando a prática de atos processuais inúteis, deixo de designar audiência de conciliação e mediação. (evento 04 - DESPADEC1 - processo originário).

Alega que, nos termos da tese assentada pelo Supremo Tribunal Federal, no Tema 793, é necessário o direcionamento da obrigação à União, visto que o fármaco requerido integra a política oncológica que é de competência daquele ente político. Afirma que "não pode ser responsabilizado pelo fornecimento de medicamentos ou tratamentos não disponibilizados no âmbito da Saúde Pública, sobretudo quando a prestação de saúde requerida é de alto custo". Pede a atribuição de efeito suspensivo ao recurso. Requer, então, o provimento do recurso para revogar a tutela de urgência deferida e determinar a inclusão da União, no polo passivo da lide. (evento 01 - INIC1).

2. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 855.178/SE (TEMA 793), integrado pelos Embargos de Declaração, por maioria, em acórdão publicado em 16 de abril de 2020, assentou a seguinte tese de repercussão geral:

"Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro"(PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-090 DIVULG 15-04-2020 PUBLIC 16-04-2020) (Grifou-se)

Eis a ementa do acórdão dos respectivos Embargos de Declaração:

"CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. DESENVOLVIMENTO DO PROCEDENTE. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE DE SOLIDÁRIA NAS DEMANDAS PRESTACIONAIS NA ÁREA DA SAÚDE. DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente.
2. A fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.
3. As ações que demandem fornecimento de
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