Decisão Monocrática nº 50016807420218210086 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 12-01-2022

Data de Julgamento12 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50016807420218210086
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001538705
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001680-74.2021.8.21.0086/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATOR(A): Des. JOAO MORENO POMAR

APELANTE: SEDINEI SCHMIDT (AUTOR)

APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. - CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. NULIDADE. PROVA. A CONTRATAÇÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) É LÍCITA QUANDO O SEU DESTINO É A UTILIZAÇÃO POR CARTÃO DE CRÉDITO; E O RECONHECIMENTO DE SUA NULIDADE EXIGE PROVA DE VÍCIO NA PACTUAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA DOS AUTOS EM QUE, EMBORA A CONTRATAÇÃO, O CRÉDITO FOI UTILIZADO PARA PAGAMENTO DE MÚTUO FRAUDANDO O PROPÓSITO DE USO POR CARTÃO DE CRÉDITO; E SE IMPÕE A REFORMA DA SENTENÇA PARA A CONVERSÃO EM EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO.

RECURSO PROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

SEDINEI SCHMIDT apela da sentença proferida nos autos da ação de obrigação de fazer ajuizada contra BANCO BMG S.A., assim lavrada:

I - Relatório

SEDINEI SCHMIDT ajuizou Ação de Obrigação de Restituição de Valores c/c Indenização por Danos Morais em face do BANCO BMG S.A, ambos qualificados nos autos.

Na inicial, narrou que é aposentada junto ao INSS, percebendo em seu benefício previdenciário, mensalmente, a quantia bruta de R$ 2.091,26 e como renda líquida o valor de R$ 1.284,41 conforme documentos anexos. Referiu que contratou com o réu empréstimo consignado em fevereiro de 2017, sendo contratado o valor de R$ 3.197,00. Sustentou que os valores são debitados de seu benefício mensalmente, porém jamais havia reparado o desconto referente a sua RMC - constituição da reserva de margem consignável. Referiu que os descontos praticados são superiores aos contratados. Teceu considerações sobre a reserva de margem consignável (RMC). Pugnou pela concessão da tutela antecipada. Requereu a procedência dos pedidos iniciais, para que a parte ré se abstenha de descontar tais valores, com o respectivo cancelamento do serviço, bem como seja realizada a readequação/conversão do “empréstimo” via cartão de crédito consignado (RMC) para empréstimo consignado. Pediu a concessão do benefício da gratuidade de justiça. Acostou documentos (E1).

Foi concedido o benefício da gratuidade de justiça, indeferido o pedido liminar e determinada a citação da parte ré (E3).

A parte ré acostou documentos no E8 e apresentou contestação no E9, suscitando, em preliminar, a aplicação da pena de litigância de má-fé ao advogado do autor. Em prejudicial de mérito, pugnou pela aplicação da prescrição e em preliminar a falta de interesse de agir. No mérito, informou que os fatos narrados na exordial não correspondem à realidade, uma vez que o autor firmou contrato de cartão de crédito consignado, na qual, originou a averbação da reserva de margem consignável. Teceu considerações sobre o cartão de crédito consignado e sua diferenciação com o empréstimo consignado. Impugnou o pedido de repetição do indébito. Pugnou pelo acolhimento das preliminares, com a extinção do feito, bem como pela prejudicial e, no mérito, a improcedência dos pedidos iniciais. Juntou documentação.

Foi determinada vista à parte autora (E10).

O autor apresentou réplica no E13, postulando pela inversão do ônus da prova e impugnando as preliminares apresentadas. No mérito, teceu considerações sobre a abusividade do contrato efetuado, reiterando os pedidos iniciais, a antecipação de tutela e postulando a condenação da parte ré a litigância de má-fé.

A preliminar de prescrição foi afastada e aberto o prazo para indicação de outras provas a serem produzidas (E15).

O banco réu apresentou manifestação e postulou o depoimento pessoal do autor (E30), designada audiência de instrução no E33.

Realizada a audiência, foi coletado o depoimento pessoal do autor e apresentadas razões finais orais remissivas (E42).

Vieram os autos conclusos para sentença.

DECIDO.

II - Fundamentação

Trata-se de obrigação de fazer, em razão de contrato bancário firmado entre as partes.

Julgo antecipadamente o presente feito, de acordo no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, porquanto não há necessidade de produção de prova em audiência.

Preliminarmente

Da ausência de interesse de agir/carência de ação

O réu arguiu ausência de interesse processual, ao fundamento de que o autor não possuía margem disponível para a contratação de empréstimo consignado.

A preliminar confunde-se com a questão de fundo, razão pela qual será juntamente com esta analisada.

Do mérito

A controvérsia na presente demanda se dá sobre a contratação da parte autora, referente aos descontos que foram realizados em seu contracheque, referente a contratação na modalidade Reserva de Margem Consignável (RMC).

Da relação de consumo

Antes de entrar na questão de fundo, necessário asseverar que, no caso em tela, a relação havida entre as partes é de consumo, sendo aplicadas as disposições trazidas pelo Código de Defesa do Consumidor. Por conseguinte, no caso em tela, aplica-se a inversão do ônus da prova, à luz do art. 6º, VIII, do referido diploma legal. Destarte, milita a favor do consumidor a presunção de defeito da prestação do serviço, e incumbe ao fornecedor desfazê-la, produzindo inequívoca prova liberatória. Igualmente quanto ao dano e o quantum devido cumpre ao fornecedor demonstrar a sua inexistência ou inconsistência.

Outro princípio fundamental do referido Diploma é o da responsabilidade objetiva do fornecedor do produto ou serviço, nos termos dos artigos 12 e 14, sendo desnecessária a perquirição da culpa deste, bastando, por parte do consumidor, para a responsabilização do fornecedor, a comprovação do dano. No âmbito do CDC são desconsideradas quaisquer investigações relacionadas com a culpa do prestador do serviço. A responsabilidade do fornecedor, em verdade, decorre da exteriorização de um defeito capaz de frustrar a legítima expectativa do consumidor. Também não há necessidade de perquirição das causas do evento, sendo suficiente a constatação de sua existência. Assim, basta a sua constatação com o fim de ensejar a responsabilização do fornecedor.

Da análise dos autos, verifico que resta controverso o ponto acerca da existência ou não da relação jurídica mantida entre as partes, bem como da legalidade dos descontos efetuados na conta da parte autora.

Diante disso, a documentação acostada pela parte ré comprova que o autor firmou, em 04 de agosto de 2015, Termo de adesão cartão de crédito consignado Banco BMG, com autorização para desconto, consoante o contrato acostado no E9, CONTR3.

Além disso, em que pese a parte autora tenha narrado na exordial que desconhece e não concordou com os valores que estão sendo descontados do seu benefício, há concordância expressa no contrato de tais cláusulas, conforme sua assinatura. Outrossim, em seu depoimento pessoal, o autor reconheceu sua assinatura nos contratos, conforme mídia dos autos e termo de audiência do E42.

Observo que os documentos em questão foram devidamente assinados pelo autor, não tendo havido qualquer impugnação da veracidade/legitimidade das assinaturas apostas.

Embora tenha referido na réplica que tratava-se de mera proposta de crédito e que os valores nunca foram contratados, restou comprovado nos autos que o contrato foi devidamente assinado, sendo válido e produzindo seus efeitos, inclusive, sendo utilizado o serviço disponível.

Diante do exposto, embora a parte autora tenha afirmado que não reconhece os valores que geraram os descontos em sua folha de pagamento, a parte ré demonstrou, a contento, que as cédulas de crédito bancária foram devidamente assinadas pela parte, atendendo às exigências legais. Além disso, nos termos do artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil, se desincumbiu do ônus, demonstrando a validade, existência e eficácia do negócio jurídico firmado entre as partes.

No mais, com relação aos pedidos de aplicação de litigância de má-fé, por ambas as partes, não assistem razão, uma vez que as alegações não estão amparadas pelo exposto no artigo 142 do Código de Processo Civil.

III - Dispositivo

Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na Ação de Obrigação de Fazer c/c Antecipação de Tutela ajuizada por SEDINEI SCHMIDT contra o BANCO BMG S.A..

Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios da parte ré, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, corrigidos pelo IGP-M desde a data da publicação desta sentença, tendo em vista a natureza da causa e o trabalho desenvolvido, com força no art. 85, § 8º, do CPC, suspensa a exigibilidade em razão da AJG concedida nos autos.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Nas razões sustenta que o cartão não foi desbloqueado e tampouco utilizado, o que reforça não ser conhecedor da modalidade escolhida; que a reforma da sentença é medida que se impõe, aos efeitos de que seja realizada a readequação/conversão do “empréstimo” via cartão de crédito consignado (RMC) para empréstimo consignado, sendo os valores já pagos a título de RMC utilizados para amortizar o saldo devedor, o qual deverá ser feito com base no valor liberado (negociado) a parte Recorrente, desprezando-se o saldo devedor atual, ou seja, não deverá ser considerado para o cálculo o valor acrescido de juros e encargos e, em sendo o caso, determinando a repetição em dobro dos valores pagos a maior, os quais deverão ser corrigidos monetariamente pelo IGP-M desde o efetivo pagamento até a repetição, bem como acrescidos de juros legais de 1% ao mês, a ser apurado em fase de liquidação de sentença; que requer a reforma da sentença aos efeitos de condenar a Recorrida em honorários sucumbenciais e redimensionar os ônus da sucumbência,...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT