Decisão Monocrática nº 50017293320158210052 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 26-02-2022

Data de Julgamento26 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50017293320158210052
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001768763
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001729-33.2015.8.21.0052/RS

TIPO DE AÇÃO: Padronizado

RELATOR(A): Desa. MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

APELANTE: MUNICÍPIO DE GUAÍBA (RÉU)

APELADO: FAUSTO ANTONIO FIGUEIRA BORGES (AUTOR)

EMENTA

SAÚDE. MEDICAMENTO INCORPORADO AO SUS. SOLIDARIEDADE. REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIA. DIRECIONAMENTO. RESSARCIMENTO. COMPONENTE BÁSICO e especializado DA ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA. DIRECIONAMENTO DO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. MUNICÍPIO e estado. RESSARCIMENTO. TEMA 793 DO STF. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REMESSA NECESSÁRIA.

1. A despeito da responsabilidade solidária dos entes políticos, nas demandas relativas ao direito à saúde, cumpre ao juiz especificar o ente responsável pelo fornecimento dos medicamentos, à luz das regras de repartição de competência decorrentes dos critérios de descentralização e hierarquização, para o efeito de (I) redirecionar o cumprimento da sentença e, se for o caso, (II) determinar o ressarcimento financeiro àquele que antecipou a dispensação do fármaco. Tema 793 (855.178-RG). Precedentes do STF.

2. Em se tratando de fármaco integrante do Componente Básico da Assistência Farmacêutica, cuja aquisição se dá pelo ente municipal, o cumprimento deve ser direcionado ao Município e determinado o ressarcimento dos valores antecipados pelo Estado. Em relação aos medicamentos que integram o Grupo 2 do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica, cuja aquisição se dá pelas Secretarias Estaduais de Saúde, o cumprimento deve ser direcionado ao Estado e determinado o ressarcimento dos valores antecipados pelo Município. RE 1331005/RS, de 24/06/2021, e RE 1338887/RS, de 24/08/2021. RCL 45777, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, 1ª Turma, 02/06/2021. RE 1323725, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2ª Turma, 16/06/2021. ARE 1283092, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2ª Turma, 03/05/2021. RCL 41954, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, 26/04/2021. RE 1310027, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, 1ª Turma, 30/03/2021. RE 1307921, Rel. Min. Cármen Lúcia, 2ª Turma, 19/03/2021.

3. Por força do princípio da causalidade, os encargos da sucumbência devem ser suportados por quem deu causa à demanda.

4. Nas ações patrocinadas pela Defensoria Pública, se vencido, o Município responde pelos honorários advocatícios. Precedentes do STJ e deste Tribunal.

5. A fixação dos honorários advocatícios deve observar o grau de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a par da natureza e importância da causa, o trabalho realizado e o tempo exigido. Art. 85, § 2º, incisos I a IV, do CPC. Hipótese em que deve ser reduzida a verba honorária arbitrada em primeiro grau.

6. Não está sujeita à remessa necessária a sentença condenatória à prestação de serviço de saúde, cujo valor da condenação não ultrapassa os limites do § 3º do art. 496 do CPC, segundo simples cálculo aritmético. Precedentes do STJ e deste Tribunal.

Recurso do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL provido. Recurso do MUNICÍPIO DE GUAÍBA provido em parte. Remessa necessária não conhecida.

DECISÃO MONOCRÁTICA

1. FAUSTO ANTONIO FIGUEIRA BORGES, em 19 de junho de 2015, ajuizou ação contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e o MUNICÍPIO DE GUAÍBA para obrigá-los a fornecer os medicamentos Espironolactona 25mg, Carvedilol 12,5mg e Gabapentina 300mg, no valor mensal de R$ 101,57. Nos dizeres da inicial, (I) é portador de miocardiopatia severa (CID10 I42), necessitando, pois, do uso dos fármacos para o seu tratamento, e (II) a despeito da prescrição médica, o requerimento administrativo foi indeferido pelos Réus (evento 03 - PROCJUDIC1, fls. 02/06 - processo originário).

O MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Guaíba deferiu a tutela de urgência requerida (evento 03 - PROCJUDIC1, fls. 23/24 - processo originário).

Citados, os Réus contestaram a ação (evento 03 - PROCJUDIC1, fls. 38/44 e PROCJUDIC3, fls. 17/22 - processo originário).

O Ministério Público opinou pela procedência da ação (evento 03 - PROCJUDIC5, fls. 25/26 - processo originário).

Na sentença, o MM. Juízo a quo julgou procedente a ação para ratificar os termos da tutela de urgência deferida e condenar (I) os Réus ao fornecimento dos medicamentos Espironolactona 25mg, Carvedilol 12,5mg e Gabapentina 300mg, enquanto perdurar a necessidade, e (II) o MUNICÍPIO DE GUAÍBA ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios de R$ 1.000,00 ao FADEP (evento 03 - PROCJUDIC5, fls. 39/43 - processo originário).

Inconformados, apelam, tempestivamente, os Réus.

O MUNICÍPIO DE GUAÍBA alega que "é responsável por executar e financiar a Assistência Farmacêutica de Atenção Básica, e, quando diante de um cidadão que necessita de medicamentos fora das listas de sua obrigação (Portaria n° 2.982/2009), realiza cadastro junto ao Estado do RS através de Expedientes. Cabe ao Município, após o fornecimento pelo Estado do RS, dispensar os fármacos". Sustenta que apenas o Estado deveria ser condenado, já que não possui atribuição relativa à dispensação dos medicamentos que integram a assistência farmacêutica especializada. Afirma, ainda, que não deve ser condenado ao pagamento dos honorários advocatícios. Subsidiariamente, pede sejam reduzidos. Requer, então, o provimento do recurso (evento 03 - PROCJUDIC5, fls. 45/48 - processo originário).

O ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, por sua vez, sustenta que a obrigação deve ser direcionada ao Município, à luz do Tema 793 do Supremo Tribunal Federal, visto que os medicamentos Espironolactona e Carvedilol integram o componente básico da assistência farmacêutica, o qual é de responsabilidade do ente municipal. Aduz, ainda, que deve ser determinado o ressarcimento dos valores relativos ao custeio dos medicamentos. Ao efeito de prequestionamento, pede a apreciação dos artigos 23, I e II, 37, § 6°, e 196 da Constituição da República, 265 do Código Civil, 927, III, e 988, II, do Código de Processo Civil, e 19-Q e 19-R da Lei n.º 8.080/90 (evento 03 - PROCJUDIC6, fls. 01/23 - processo originário).

Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal de Justiça (evento 03 - PROCJUDIC6, fls. 25/31 - processo originário). É o relatório.

2. Responsabilidade solidária - Tema 793 do STF

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 855.178/SE (TEMA 793), integrado pelos Embargos de Declaração, por maioria, em acórdão publicado em 16 de abril de 2020, assentou a seguinte tese de repercussão geral:

"Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro"(PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-090 DIVULG 15-04-2020 PUBLIC 16-04-2020) (Grifou-se)

Eis a ementa do acórdão dos respectivos Embargos de Declaração:

"CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. DESENVOLVIMENTO DO PROCEDENTE. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE DE SOLIDÁRIA NAS DEMANDAS PRESTACIONAIS NA ÁREA DA SAÚDE. DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente.
2. A fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.
3. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União. Precedente específico: RE 657.718, Rel. Min. Alexandre de Moraes.
4. Embargos de declaração desprovidos." (RE 855178 ED, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 23/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-090 DIVULG 15-04-2020 PUBLIC 16-04-2020) (Grifou-se)

Por pertinente, transcreve-se o seguinte excerto do voto do Redator, o Min. Edson Fachin, verbis:

"3) Quanto ao desenvolvimento da tese da solidariedade enuncia-se o seguinte:
i) A obrigação a que se relaciona a reconhecida responsabilidade solidária é a decorrente da competência material comum prevista no artigo 23, II, CF, de prestar saúde, em sentido lato, ou seja: de promover, em seu âmbito de atuação, as ações sanitárias que lhe forem destinadas, por meio de critérios de hierarquização e descentralização (arts. 196 e ss.
CF);
ii) Afirmar que “o polo passivo pode ser composto por qualquer um deles (entes), isoladamente ou conjuntamente” significa que o usuário, nos termos da Constituição (arts. 196 e ss.)
e da legislação pertinente (sobretudo a lei orgânica do SUS n. 8.080/90) tem direito a uma prestação solidária, nada obstante cada ente tenha o dever de responder por prestações específicas ;
iii) Ainda que as normas de regência (Lei 8.080/90 e alterações, Decreto 7.508/11, e as pactuações realizadas na Comissão Intergestores Tripartite) imputem expressamente a determinado ente a responsabilidade principal (de financiar a aquisição) pela prestação pleiteada, é lícito à parte incluir outro ente no polo passivo, como responsável pela obrigação, para ampliar sua garantia, como decorrência da adoção da tese da solidariedade pelo dever geral de
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