Decisão Monocrática nº 50017602320178210007 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Câmara Cível, 09-06-2022

Data de Julgamento09 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50017602320178210007
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002277028
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5001760-23.2017.8.21.0007/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATOR(A): Des. JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA

APELANTE: VALNI LOSKER (AUTOR)

APELADO: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. SECAGEM DE FUMO. DEMORA NO RESTABELECIMENTO DO SERVIÇO DE ENERGIA ELÉTRICA. LAUDO TÉCNICO PRODUZIDO PELA RÉ. INDICAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PREJUÍZO A PARTIR DA FALTA DE ENERGIA. DEVER DE INDENIZAR INOCORRENTE.

Pretensão do autor de indenização por danos materiais a partir de alegado prejuízo sofrido quando do processo de secagem de fumo que encontrava-se em estufa elétrica. Laudo técnico produzido pela concessionária que demonstra que a perda da qualidade não decorreu da suspensão do serviço. O laudo de vistoria técnica coligido pela concessionária, confeccionado por profissional habilitado, concluiu que o fumicultor não obteve perda qualitativa em seu tabaco por causa da interrupção de energia elétrica no momento da cura e, assim, não obteve prejuízos financeiros. - Apelação Cível, Nº 70083692012 TJ/RS. Dever de indenizar inexistente.

NEGADO PROVIMENTO À APELAÇÃO. DECISÃO MONOCRÁTICA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

A princípio, reporto-me ao relatório da sentença (fls. 151 e verso do processo digitalizado).

O Dr. Juiz de Direito julgou improcedente o pedido.

O autor apela. Defende ser aplicável o CDC ao caso em tela. Argumenta ter restado evidenciado a falha na prestação do serviço de fornecimento de energia elétrica pela ré. Assevera que a parte adversa deve responder pela má qualidade do serviço. Sustenta acerca dos prejuízos sofridos com a perda de fumo que encontrava-se em processo de cura em estufa elétrica. Aduz ter anexado laudo técnico indicando os danos sofridos na plantação de tabaco. Pede a condenação da demandada ao pagamento de indenização pelos danos materiais a que deu causa. Pugna pelo provimento.

Apresentadas contrarrazões de Apelação.

Subiram os autos.

É o relatório.

Decido.

A improcedência é de ser mantida, porém por fundamentos diversos da sentença.

De pronto, assinalo que se aplicam, na espécie, os ditames do Código de Defesa do Consumidor, valendo-me, para tanto, a título de fundamentação, do que dito pelo douto Des. PAULO ROBERTO LESSA FRANZ quando do julgamento da Apelação Cível n.º 70065662595, in verbis:

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. FALTA DE ENERGIA ELÉTRICA. DANOS À PRODUÇÃO DE FUMO. APLICAÇÃO DO CDC. TEORIA FINALISTA APROFUNDADA. VULNERABILIDADE DO AUTOR. A expressão destinatário final, de que trata o art. 2º, caput, do Código de Defesa do Consumidor, abrange quem adquire produtos e serviços para fins não econômicos, e também aqueles que, destinando-os a fins econômicos, enfrentam o mercado de consumo em condições de vulnerabilidade. A vulnerabilidade referida no CDC abrange aspectos econômicos, sociais e técnicos. Aplicação da teoria finalista aprofundada. Lições doutrinárias e precedentes do Col. STJ. Hipótese em que o autor, pequeno agricultor, embora utilize indiretamente o serviço de energia elétrica para a realização de sua atividade lucrativa, não figurando como destinatário final, é evidentemente vulnerável frente à requerida, sendo caso de aplicação do CDC à espécie. (...). APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70065662595, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Roberto Lessa Franz, Julgado em 30/07/2015)

Em reforço, sobre a aplicabilidade da mitigação da Teoria Finalista, trago julgado do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. EXISTÊNCIA. APLICABILIDADE DO CDC. TEORIA FINALISTA. MITIGAÇÃO. POSSIBILIDADE. VULNERABILIDADE VERIFICADA. REVISÃO. ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. ÓBICE DA SÚMULA N. 7⁄STJ. DECISÃO MANTIDA.

1. A Segunda Seção desta Corte consolidou a aplicação da teoria subjetiva (ou finalista) para a interpretação do conceito de consumidor. No entanto, em situações excepcionais, esta Corte tem mitigado os rigores da teoria finalista para autorizar a incidência do CDC nas hipóteses em que a parte (pessoa física ou jurídica), embora não seja propriamente a destinatária final do produto ou do serviço, apresenta-se em situação de vulnerabilidade ou submetida a prática abusiva.

(...)

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no AREsp 415244/SC. Relator: Min. ANTONIO CARLOS FERREIRA. Órgão Julgador: QUARTA TURMA. Data do Julgamento: 07/05/2015. DJe: 19/05/2015) – grifei.

Concernente ao regime jurídico legal, é de se ter que a responsabilidade da requerida ao presente caso é objetiva, à luz do disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, não sendo necessária a comprovação da culpa para configurar a responsabilidade civil, independentemente de se tratar de um agir comissivo ou omissivo pela empresa concessionária de serviços públicos:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

...

§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Acerca do assunto, lição de SÉRGIO CAVALIERI FILHO:

Em nosso entender, o art. 37, § 6°, da Constituição, não se refere apenas à atividade comissiva do Estado; pelo contrário, a ação a que alude engloba tanto a conduta comissiva como omissiva.

(...)

Merece, ainda, destaque o fato de ter o constituinte, afastando controvérsia que se travou na vigência do sistema constitucional anterior, estendido a responsabilidade objetiva às pessoas jurídicas de Direito Privado prestadoras de serviços públicos.” (Programa de Responsabilidade Civil, 11. ed. São Paulo: Atlas, 2014, pp. 297-301)

Nestes termos, precedente do Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DE CONCESSIONÁRIA DO SERVIÇO PÚBLICO. NEXO CAUSAL RECONHECIDO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. NECESSIDADE DE NOVA ANÁLISE DOS FATOS E DO MATERIAL PROBATÓRIO. SÚMULA 279/STF. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal se orienta no sentido de que as pessoas jurídicas de direito privado, prestadoras de serviço público, respondem objetivamente pelos prejuízos que causarem a terceiros. Precedentes. (...). Agravo regimental a que se nega provimento.

(ARE 793046 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 20/05/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-125 DIVULG 27-06-2014 PUBLIC 01-07-2014) – grifei.

Por outra, também aplicável à espécie o disposto no art. 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

A respeito da matéria, valho-me do magistério de SÉRGIO CAVALIERI FILHO:

“Portanto, para quem se propõe fornecer produtos e serviços no mercado de consumo a lei impõe o dever de segurança; dever de fornecer produtos seguros, sob pena de responder, independentemente de culpa (objetivamente) pelo danos que causar ao consumidor.

(...)

A responsabilidade por fato de serviço vem disciplinada no art. 14 do Código, nos mesmos moldes da responsabilidade pelo fato do produto: ‘O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.’. Também aqui teremos acidentes de consumo, acontecimentos externos que causem dano material ou moral ao consumidor, só que decorrentes de defeitos do serviço, aos quais serão aplicáveis, com o devido ajuste, os mesmos princípios emergentes do art. 12, pelo que dispensam maiores considerações.

O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o...

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