Decisão Monocrática nº 50022671520198210071 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 06-11-2022

Data de Julgamento06 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50022671520198210071
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002948124
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002267-15.2019.8.21.0071/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR(A): Des. ROBERTO SBRAVATI

APELANTE: ELOI JOSE RODRIGUES (AUTOR)

APELADO: BV FINANCEIRA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. REVISÃO DE CONTRATO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ART. 932, IV e V, ‘A’ e ‘B’, DO CPC.

DA APLICAÇÃO DO CDC E DOS CONTRATOS DE ADESÃO. RELAÇÃO CONSUMERISTA CONFIGURADA. PRESENÇA DE CONSUMIDOR E FORNECEDOR; ARTS. E DA LEI 8009/90. SÚMULA 297, STJ. LEI PROTETIVA APLICÁVEL AO CASO CONCRETO.

JUROS REMUNERATÓRIOS. Limitação dos juros ao percentual da taxa média do mercado, quando forem abusivos, tal como publicado pelo BACEN em seu site. Posição do STJ consubstanciada no acórdão paradigma - RESP 1.061.530/RS. Inexistência de abusividade no caso concreto.

CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. A incidência da capitalização de juros é permitida, mas desde que conste sua pactuação de forma expressa no instrumento contratual, nos termos do Resp nº 973.827-RS, de relatoria da Min. Maria Isabel Gallotti. Como este é o caso dos autos, a capitalização é mantida.

DOS ENCARGOS MORATÓRIOS. Quanto aos juros moratórios, se não estiver expressamente prevista sua taxa e caracterizada a inadimplência, devem ser fixados no patamar de 1% ao mês, conforme está disposto no artigo 406 do CCB, cumulado com o artigo 161, § 1º, do CTN. Exegese do verbete 379 do STJ.

E a multa moratória de 2% deve incidir sobre a parcela efetivamente em atraso e depois de efetuadas as devidas amortizações na liquidação do contrato., consoante preconiza a súmula 285 do STJ.

Já os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado.

Segundo o entendimento firmado no REsp nº 1.251.331-RS, a revisão de tarifas bancárias deve ser certa e determinada, tendo em vista a diferenciação ocorrente nos fatos geradores das inúmeras tarifas bancárias vigentes. Ausente discriminação de quais as tarifas bancárias pretende a revisão, o apelo do consumidor não deve ser conhecido, nesta parte.

SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. Aplicação do entendimento exarado nos REsp n. 1.639.259/SP e REsp n. 1.639.320/SP – Tema 972/STJ. “Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada.” Venda casada configurada, afastada sua pactuação.

COMPENSAÇÃO DE VALORES E REPETIÇÃO DO INDÉBITO. A fim de evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes, a compensação de valores e a repetição do indébito são devidas, respeitando o disposto nos artigos 369 e 876, ambos do CC. A restituição deve ocorrer de forma simples, e como consequência lógica do julgado.

DA MORA E DA TUTELA ANTECIPADA. Ausente a abusividade nos encargos previstos para a normalidade contratual, a tutela antecipada deve ser indeferida.

APELO PARCIALMENTE CONHECIDO, E NESTA PARCIALMENTE PROVIDO, EM DECISÃO MONOCRÁTICA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de apelação interposta por ELOI JOSE RODRIGUES contra sentença proferida nos autos da ação de revisão contratual proposta contra BV FINANCEIRA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO

A sentença recorrida assim decidiu:

(...) ISSO POSTO, na ação revisional de contrato proposta por ELOI JOSÉ RODRIGUES em face de B.V. FINANCEIRA S/A., JULGO IMPROCEDENTES os pedidos, na forma do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Sucumbente, condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios ao procurador da instituição financeira, os quais fixo em R$ 1.000,00, valor a ser atualizado pelo IGP-M, a contar da prolação desta sentença, e com incidência de juros de mora de 1% ao mês, a partir do trânsito em julgado desta decisão, nos termos do art. 85, §8º, do CPC, observados a singeleza da causa, o trabalho que se fez necessário e o tempo de tramitação do feito.

A exigibilidade do ônus de sucumbência imposto a parte autora ficará suspensa, na forma do §3º do art. 98 do CPC, em razão da gratuidade judiciária deferida.

Considerando que o §3º, do art. 1.010, do Código de Processo Civil retirou o juízo de admissibilidade deste 1º grau de jurisdição, uma vez interposto recurso de apelação, caberá ao Cartório abrir vista à parte contrária para contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias, consoante art. 1.010, §1º, do mesmo diploma legal. Idêntico procedimento deverá ser adotado na hipótese de recurso adesivo, conforme §2º do artigo supramencionado.

Após as formalidades, os autos deverão ser remetidos imediatamente ao Tribunal de Justiça Gaúcho.

Transcorrido o prazo recursal sem interposição de apelação, certifique-se o trânsito em julgado e arquive-se com baixa.

Publique-se, registre-se e intimem-se.

Apela a parte autora, requerendo o provimento do recurso para a reforma da sentença a fim de possibilitar a revisão das quantias cobradas em excesso, pleiteando pela limitação da taxa de juros remuneratórios; pelo afastamento da capitalização de juros; pela exclusão da comissão de permanência sob a alegação de que é ilegal a sua prática; pela declaração da inexistência da mora, afastando-se todos os encargos moratórios; pela exclusão das tarifas administrativas e do seguro prestamista; pela permissão da compensação de valores e da repetição do indébito, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor; e pelo deferimento da tutela antecipada. Pede a redistribuição dos ônus sucumbenciais. Requer a majoração dos honorários advocatícios.

Com as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

Decido.

Na forma do art. 932, IV e V, alíneas ‘a’ e ‘b’, do CPC, conheço, em parte, do apelo, e na parte conhecida, dou-lhe parcial provimento, tendo em vista que a decisão profligada encontra-se em dissonância parcial com as Súmulas e o entendimento firmado em recursos repetitivos julgados pelo Superior Tribunal de Justiça quanto ao tema, senão vejamos.

Em 08/2016 as partes ajustaram contrato de financiamento com cláusula de alienação fiduciária, cédula de crédito bancário referente a um automóvel. Os juros remuneratórios foram fixados em 2,07% ao mês e 27,90% ao ano. E em 07/2017 as partes renegociaram o pacto, sendo juros remuneratórios fixados em 2,08% ao mês e 28,02% ao ano.

DA APLICAÇÃO DO CDC

Enfrenta-se a questão da aplicabilidade do CDC ao caso em tela.

É consabido que se tem matéria sumulada – verbete 297, do colendo STJ.

Contudo, oportuno referir que, mesmo antes da edição de dita Súmula, já se admitia a incidência da lei consumerista para casos como o que se está a examinar.

O conceito de fornecedor e consumidor está plenamente caracterizado e o tema encontra-se pacificado nos Tribunais, razão pela qual a aplicabilidade do CDC, no caso concreto, é irrefragável.

DO CARÁTER DE ADESÃO DOS CONTRATOS BANCÁRIOS

Embora haja insistência das instituições financeiras em realizar uma intransigente defesa na ausência do caráter de adesão dos contratos bancários, não carrego nenhuma dúvida quanto a este aspecto. Com efeito, restando pacificado pelo colendo STJ a aplicação do Código do Consumidor em relação às instituições desta natureza, resta aplicável à espécie o artigo 54, que assim preceitua:

“Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo”.

É fato notório, pois, que quando o consumidor se dirige a uma instituição financeira, seja qual for a modalidade de negócio, recebe um contrato em que a substância do documento, geralmente jungida às cláusulas que pactuam juros, capitalização, comissão de permanência, tarifas, taxas, entre outras, não permite negociação alguma, além de não revelar toda a extensão econômico-financeira a cargo de quem toma o empréstimo, de forma absolutamente compreensível.

Em sendo cláusulas uniformes elaboradas por uma das partes, não restando à outra senão a alternativa de aceitá-la in totum, o contrato de adesão revela-se como materializador de um monopólio de fato, ou de direito, de uma das partes.

Desta forma, o reconhecimento do caráter adesivo do contrato revisando se impõe.

JUROS REMUNERATÓRIOS

No que pertine com a questão dos juros remuneratórios, o colendo STJ já pacificou o tema, preconizando que é livre a pactuação da taxa de juros entre os contratantes, exceto em havendo excesso manifestamente comprovado (na forma do decisório tornado paradigma – RESP 1.061.530/RS, rela. Min. Nancy Andrighi, j. 22/10/08), ocasião em que se limitam os juros.

Decidiu-se, à ocasião, o que segue:

a) que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

b) que a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) que são inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) que vai admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto.

Como asseverado no voto pela eminente relatora, quanto à limitação dos juros remuneratórios, “a dificuldade do tema, que envolve o controle do preço do dinheiro é enorme. Isso não é, entretanto, suficiente para revogar o art. 39, V, CDC, que veda ao fornecedor, dentre outras práticas...

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