Decisão Monocrática nº 50023518320218210026 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 08-08-2022

Data de Julgamento08 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50023518320218210026
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoNona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002526241
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002351-83.2021.8.21.0026/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano moral

RELATOR(A): Des. TASSO CAUBI SOARES DELABARY

APELANTE: BANCO C6 CONSIGNADO S.A. (RÉU)

APELADO: ALCEU GABE (AUTOR)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AUSÊNCIA DE PROVA DA CONTRATAÇÃO. DESCONTO INDEVIDO SOBRE PROVENTOS DE APOSENTADORIA. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. honorários advocatícios. MANUTENÇÃO.

  1. ANTE A ALEGAÇÃO DA PARTE AUTORA DE INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO DOS SERVIÇOS DA PARTE DEMANDADA, CUMPRIA À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA A PROVA DE QUE EFETIVAMENTE AJUSTOU NEGÓCIO COM O CONSUMIDOR, O QUE NÃO RESTOU VERIFICADO. ÔNUS DE COMPROVAÇÃO DA AUTENTICIDADE DA ASSINATURA QUE RECAI SOBRE A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. TEMA 1.061 STJ.
  2. INEXISTINDO PROVA DA CONTRATAÇÃO DOS SERVIÇOS PELA PARTE AUTORA, PROSPERA O PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO.
  3. AQUELE QUE TEM DESCONTADO INDEVIDAMENTE DE SEU BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA VALORES REFERENTES A EMPRÉSTIMO BANCÁRIO QUE NÃO CONTRATOU SOFRE DANOS MORAIS IN RE IPSA.
  4. NÃO COMPORTA MINORAÇÃO O VALOR DA CONDENAÇÃO FIXADO NA ORIGEM (R$ 8.000,00), OBSERVADAS A NATUREZA JURÍDICA DA CONDENAÇÃO E OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE.
  5. DIANTE DO PAGAMENTO INDEVIDO DE VALORES IRREGULARMENTE COBRADOS E DESCONTADOS EM CONTA CORRENTE DO DEMANDANTE, E NÃO SENDO O CASO DE ENGANO JUSTIFICÁVEL, FAZ JUS À REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO (ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC).
  6. o valor estabelecido na origem referente aos honorários advocatícios mantido, porquanto adequado a remunerar o labor do procurador da parte autora, bem como o trabalho adicional em grau recursal, observadas as diretrizes do artigo 85, §§ 2º e 11, do Código de Processo Civil.

RECURSO DESPROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

1. Trata-se de recurso de apelação interposto por BANCO C6 CONSIGNADO S.A., nos autos de ação declaratória de inexistência de débito cumulada com pedido de indenização por danos morais ajuizada por ALCEU GABE, contra sentença [Evento 57, SENT1] que julgou procedentes os pedidos deduzidos na exordial para: a) declarar a nulidade dos débitos representados pelas Cédulas de Crédito Bancário (CCB) n° 010013428947 e n° 010016095560; c) condenar o demandado a restituir ao autor, em dobro, os valores consignados no benefício previdenciário n° 188.164.393-7 a título de contraprestação das Cédulas de Crédito Bancário (CCB) n° 010013428947 e n° 010016095560. Os valores devidos deverão ser corrigidos monetariamente pelo IGP-M e acrescidos de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, ambos desde cada consignação indevida e até o efetivo pagamento; e d) condenar o requerido a pagar ao demandante, a título de reparação de dano moral, o montante de R$8.000,00 (oito mil reais), corrigido monetariamente pelo IGP-M a partir desta data e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação. Ainda, a parte ré restou condenada ao pagamento/reembolso da Taxa Única de Serviços Judiciais e das despesas processuais, bem como de honorários ao patrono do requerente, fixados em 20% do valor da condenação.

Em suas razões [Evento 63, APELAÇÃO1], após uma sinopse dos fatos, a instituição financeira demandada manifestou sua contrariedade ao julgamento asseverando a regularidade das contratações, sendo os descontos realizados no benefício da parte autora legítimos. Defendeu a ausência de configuração de dano moral indenizável, colacionando precedentes. Combateu o quantum indenizatório estabelecido pela sentença, defendendo, ainda, sua minoração. Alegou ser indevida a restituição em dobro dos valores descontados, uma vez que jamais cobrou qualquer quantia indevida do demandante. Por fim, sustentou que os juros de mora devem ser computados a partir do arbitramento e a minoração dos honorários advocatícios, pugnando pelo provimento do recurso.

Apresentadas as contrarrazões pela parte autora [Evento 68, CONTRAZAP1], os autos foram remetidos a esta Corte e vieram a mim após redistribuídos por sorteio em razão de incompetência.

É o relatório.

Decido.

2. Conheço do recurso, uma vez que preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Além disso, o recurso comporta julgamento monocrático com fundamento nos artigos 5°, inciso LXXVIII, da CF, e 932 do CPC, e 206 XXXVI, do Regime Interno desta Corte, considerando o princípio da razoável duração do processo e que se trata de matéria há muito sedimentada no âmbito desta Corte, conforme adiante se verá.

No caso, observo que se trata de ação em que a parte autora reclama a declaração de inexistência de relação contratual e indenização por danos morais em razão dos descontos indevidos sobre seus proventos de aposentadoria pela instituição financeira demandada, alegando a ausência de qualquer relação material entre as partes.

Ressalto que a matéria retratada nos autos versa sobre relação de consumo. Portanto, a responsabilidade da demandada é objetiva nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, restando à parte demandante tão somente a prova da existência do fato, do dano e do nexo causal, competindo à demandada, por outro lado, demonstrar que não houve o defeito na prestação do serviço e que a culpa foi exclusivamente da parte autora ou de terceiro (§ 3º, inciso I e II, do art. 14).

Denota-se que a parte ré não logrou comprovar a regularidade da contratação, deixando de trazer aos autos qualquer indicação da autenticidade do contrato que originou a dívida [Evento 27, CONTR2]. Nesse aspecto, observo que a autora sustenta que nada deve à demandada em face da ausência de relação contratual entre as partes, uma vez que não reconhece a sua assinatura no contrato juntado pela instituição financeira demandada.

Observo que a demandada não apresentou qualquer comprovação da autenticidade da assinatura lançada no contrato supostamente assinado pela parte autora, ônus que lhe incumbia, seja porque produziu o documento, a teor do disposto no artigo 429, inciso II, do CPC, verbis:

Art. 429. Incumbe o ônus da prova quando:

I - se tratar de falsidade de documento ou de preenchimento abusivo, à parte que a arguir;

II - se tratar de impugnação da autenticidade, à parte que produziu o documento.

Com efeito, considerando as circunstâncias dos autos, verifica-se recair sobre a demanda o ônus de comprovação quanto à autenticidade dos documentos acostados com a contestação para comprovar a regularidade da contratação, do qual não se desincumbiu satisfatoriamente.

Quanto ao ônus da instituição financeira comprovar a autenticidade da assinatura, verifica-se que a questão encontra-se pacificada pelo Colendo STJ a partir da tese firmada quando do julgamento do Tema 1.061 dos Recursos Especiais Repetitivos, verbis:

Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a sua autenticidade (CPC, arts. , 368 e 429, II).

In casu, observo que a ré não se desincumbiu do ônus - que era seu - de demonstrar que a firma lançada no contrato acostado aos autos foi efetivamente aposta pela autora, uma vez ter expressamente impugnado a sua autenticidade.

A circunstância, aliás, foi bem examinada pela douta magistrada de origem, Dra. Josiane Caleffi Estivalet, razão pela qual transcrevo parte de seus fundamentos a efeito de evitar fastidiosa tautologia, verbis:

"(...)

Com efeito, inexiste nesta demanda provas mínimas que convençam da regularidade da contratação das Cédula de Crédito Bancário (CCB) n° 010013428947 e n° 010016095560, cujos instrumentos foram anexados à contestação do requerido (evento 27, CONTR2).

Isto porque o cotejo da assinatura aposta nos aludidos instrumentos contratuais com aquelas existentes nos documentos anexados à exordial (evento 01, PROC2 e DECLPOBRE3) não permite estabelecer uma perfeita identidade entre elas sem o auxílio técnico-científico.

Também evidencia a irregularidade da contratação o fato de os instrumentos contratuais terem sido intermediados por correspondentes bancários situados nos Municípios de Wenceslau Escobar/MG e Sooretama/ES consoante denotam os documentos anexados ao evento 33.

Assim, é forçoso reconhecer que, na hipótese sob exame, além da ocorrência de falsificação, também possa ter havido recortes e colagens de assinaturas digitalizadas, obtidas a partir de outras contratações ou de instrumentos subscritos pelo autor e que transitam pelo mundo digital.

(...)"

Tal situação constitui, em verdade, falha na prestação do serviço por não terem sido observados os cuidados objetivos necessários no momento da conferência, de forma eficiente, das informações que a ré recebe para a contratação do serviço. Assim, deve arcar com o ônus de sua conduta, não havendo que se falar em aplicação da culpa de terceiro, prevista do Código de Defesa do Consumidor (art. 14, § 3º, III).

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
(...)
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

A respeito da teoria do risco-proveito, cumpre enfatizar, ademais, os ensinamentos de Sérgio Cavallieri Filho :

Risco é perigo, é probabilidade de dano, importando, isso, dizer que aquele que exerce uma atividade perigosa deve-lhe assumir os riscos e reparar o dano dela decorrente. A doutrina do risco pode ser, então, assim resumida: todo prejuízo deve ser atribuído ao seu autor e reparado por quem o causou, independentemente de ter ou não...

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