Decisão Monocrática nº 50024125220178210003 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 15-03-2022

Data de Julgamento15 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50024125220178210003
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoTerceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001891643
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002412-52.2017.8.21.0003/RS

TIPO DE AÇÃO: Data base

RELATOR(A): Des. EDUARDO DELGADO

APELANTE: LUCAS CARVALHO STUMPF (AUTOR)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. REMUNERAÇÃO. PAGAMENTO DIFERIDO OU ATRASADO - ARTS. 35 DA C. E.; E IRDR Nº 12 DO ÓRGÃO ESPECIAL DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DANO MORAL. FALTA DE PROVA – ART. 373, I, DO CPC DE 2015.

NÃO OBSTANTE INCONTROVERSO E NOTÓRIO O PARCELAMENTO DOS VENCIMENTOS Do SERVIDOR RECORRENTE, AUSENTE COMPROVAÇÃO DO PREJUÍZO E DO DANO MORAL ALEGADO – ART. 373, I, DO CPC DE 2015, E IRDR Nº 12 DO E. ÓRGÃO ESPECIAL DESTE TRIBUNAL.

ALÉM DO MAIS, A FALTA DE ELEMENTOS ACERCA DOS INFORTÚNIOS ALEGADOS.

PRECEDENTES DA JURISPRUDÊNCIA.

RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

Trata-se de recurso de apelação interposto por LUCAS CARVALHO STUMPF, em face da sentença - evento 3, PROCJUDIC16, fls. 183-187 - proferida nos autos da ação de rito ordinário ajuizada contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.

Os termos do dispositivo da sentença hostilizada:

(...)

DIANTE DO EXPOSTO, com fundamento no art. 487, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, para o fim estrito fim de, desacolhendo a pretensão indenizatória e tornando definitivos os efeitos da decisão que concedeu a liminar em favor da parte autora (fls. 12-13), condenar o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL a proceder ao pagamento integral dos proventos da parte autora até o último dia útil de cada mês, abstendo-se de fazê-lo de forma parcelada, sob pena de bloqueio de valores.

Tendo sido julgados parcialmente procedentes os pedidos, condeno ambos os litigantes, nos termos do art. 86, caput, do NCPC, a ratearem as despesas processuais na proporção de 50% para cada parte. Suspendo, contudo, observadas as disposições do art. 98, §3º, do NCPC, a exigibilidade de tal condenação quanto à parte autora, tendo em vista o benefício da gratuidade judiciária que ora lhe concedo. Inviável, por outro lado, a condenável do ERGS quanto ao pagamento das custas por haver confusão entre credor e devedor, razão pela qual também afasto a exigibilidade da obrigação.

Outrossim, arbitro honorários advocatícios ao procurador da parte autora no valor de R$ 750,00, com fundamento nos §§ 2º e 8º do art. 85 do NCPC, e aos procuradores da requerida honorários em igual patamar, considerando, em ambos os casos, a natureza da causa e a ausência de dilação probatória, vedada a compensação, tendo em vista o disposto no §14 do art. 85 do NCPC. Suspendo, porém, nos termos acima apontados, a exigibilidade de cumprimento de tal obrigação pela parte autora, porquanto beneficiária de assistência judiciária gratuita.

(...)

Nas razões, a parte apelante, servidor público estadual, defende o direito à indenização correspondente ao dano extrapatrimonial, decorrente do pagamento atrasado e diferido da remuneração, a configurar ato ilícito, tendo em vista o caráter vexatório situado no abalo do crédito perante os credores, e no não adimplemento das dívidas dentro do prazo de vencimento, com base no art. 5º, V e X, da Constituição da República.

Requer o provimento do recurso, para fins da condenação do Estado do Rio Grande do Sul na indenização por dano moral - evento 3, PROCJUDIC16, fls. 189-196.

Contrarrazões, na defesa do desprovimento (fls. 197-202).

Nesta sede, o parecer do Ministério Público, da lavra da i. Procuradora de Justiça, Dra. Elaine Fayet Lorenzon Schaly, no sentido do desprovimento - evento 13.

Os autos vieram conclusos.

É o relatório.

Decido.

Passo ao julgamento na forma monocrática, amparado no art. 932, IV, c, do CPC1; no Enunciado da Súmula 568 do e. STJ2; e no art. 206, XXXVI do RITJRS3.

A matéria devolvida reside no direito da parte recorrente, servidor público estadual, à indenização correspondente ao dano extrapatrimonial, decorrente do pagamento atrasado e diferido da remuneração, a configurar ato ilícito, tendo em vista o caráter vexatório situado no abalo do crédito perante os credores, e no não adimplemento das dívidas dentro do prazo de vencimento, com base no art. 5º, V e X, da Constituição da República.4.

No mérito, a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul:

Art. 35. O pagamento da remuneração mensal dos servidores públicos do Estado e das autarquias será realizado até o último dia útil do mês do trabalho prestado. (Vide ADI n.º 657/STF, DJ de 28/09/01)

(...)

(grifei)

Com respeitosa licença de posição diversa, o fundamento da notória incapacidade financeira do recorrido situa-se em motivação de cunho eminentemente econômico e político, a indicar a falta de aptidão jurídica para suplantar preceito de estatura constitucional, por mais sedutora que seja tal argumentação, em violação do estado de direito, na esteira da posição sedimentada por parte do e. Ministro Celso de Mello, do STF, no julgamento da ADin n. 482-RJ:

“(...)

A situação configuradora do “perculum in mora” evidencia-se claramente, a partir da ocorrência de danos – até mesmo de difícil reparação – provocada pelo injusto retardamento do Estado na execução de sua obrigação jurídica de pagar, em toda a sua integralidade, os vencimentos devidos aos agentes públicos do Estado do Rio de Janeiro.

A invocação de situação possivelmente configuradora de incapacidade financeira do Estado-membro não se reveste de aptidão exoneradora da obrigação estatal, imposta validamente por lei, de pagar integralmente os vencimentos devidos, por título jurídico legítimo, aos servidores públicos estaduais.

Razões de ordem social, de caráter metajurídico, por mais louváveis que sejam, não podem superpor-se à imperatividade e supremacia de que se revestem as normas constitucionais, cuja indeclinável observância se impõe a todos, especialmente ao Poder Público.

(...)”.

(grifei)

De outra parte, ausente exceção no comando constitucional para o comportamento adotado por parte do Estado do Rio Grande do Sul, ora apelado, notadamente diante da estatura constitucional dos créditos trabalhistas, dada a sua relevância.

Em que pese a histórica dificuldade financeira do Poder Executivo para o cumprimento das obrigações, independentemente da estatura normativa – constitucional; legal ou infralegal -, com base no Decreto de calamidade pública nº 53.303/2016, devido o sopeso dos direitos envolvidos, a fim de se evitar a franca e reiterada violação literal do comando constitucional, e, em especial, o risco da legitimação de eventual predileção pelo confisco da remuneração dos servidores, em favor de outros compromissos de menor envergadura.

Peço licença para transcrever trecho da decisão recente do Supremo Tribunal Federal, da lavra do e. Ministro Ricardo Lewandowski, proferida em sede liminar na Ação Cautelar nº 883, ajuizada pelo agravante, in verbis:

“(...)

Com efeito, o salário do servidor público trata-se de verba de natureza alimentar, indispensável para a sua manutenção e de sua família.

É absolutamente comum que os servidores públicos realizem gastos parcelados e assumam prestações e, assim, no início do mês, possuam obrigação de pagar planos de saúde, estudos, água, luz, cartão de crédito, etc. Como fariam, então, para adimplir esses pagamentos? Quem arcaria com a multa e os juros, que, como se sabe, costumam ser exorbitantes, da fatura do cartão de crédito, da parcela do carro, entre outros?

Não é por outro sentido que, por exemplo, a Lei de Recuperação Judicial elenca no topo da classificação dos créditos as verbas derivadas da legislação do trabalho e os decorrentes de acidentes de trabalho. Por seu caráter alimentar, elas possuem preferência no pagamento dos créditos.

Frise-se, ademais, que a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul possui dispositivo que determina expressamente: “O pagamento da remuneração mensal dos servidores públicos do Estado e das autarquias será realizado até o último dia do mês do trabalho prestado”.

Dessa forma, em que pesem as alegações do Estado do Rio Grande do Sul de que, para o enfrentamento da crise financeira, está promovendo as medidas necessárias para regularizar as finanças públicas, cortando, inclusive, gastos públicos, e buscando receitas extraordinárias a fim de que a situação não se repita, não é possível deixar de tratar os salários dos servidores como verba prioritária, inclusive ante determinação constitucional, como se viu acima.

(...)”

(grifei)

E a jurisprudência deste Tribunal de Justiça, em precedentes análogos:

APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. PARCELAMENTO DE SALÁRIOS. PAGAMENTO ATÉ O ÚLTIMO DIA DO MÊS. ART. 35 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.

A impossibilidade jurídica do pedido, capaz de afastar uma das condições da ação e extinguir o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inc. IV, do Código de Processo Civil, está intimamente ligada à inadmissibilidade em abstrato, pelo ordenamento jurídico, do pedido do autor, o que não é o caso dos autos. SENTENÇA CONDICIONAL. Não há falar em afronta ao disposto nos artigos 141 e 492 do CPC/15, porquanto o autor, na inicial, requereu expressamente a condenação do Estado à "obrigação de fazer, consistente no correto, regular e contínuo pagamento dos salários (vencidos e vincendos, inclusive 13º)", sob pena de multa. MÉRITO. De acordo com a posição majoritária formada nesta Corte, não faculta à Administração Pública escolher o momento de realizar os pagamentos dos servidores públicos estaduais, o que deve ocorrer até o último dia útil do mês de trabalho prestado, em adstrição ao princípio da legalidade, inteligência do art. 35 da Constituição Estadual. Configurada situação de anomia constitucional, quando muito embora existente a regra no texto da...

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