Decisão Monocrática nº 50025141920148210023 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 14-11-2022

Data de Julgamento14 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50025141920148210023
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002984307
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5002514-19.2014.8.21.0023/RS

TIPO DE AÇÃO: Direito de Vizinhança

RELATOR(A): Des. JOAO MORENO POMAR

APELANTE: FRANCISCO TAVARES DA CUNHA GUIMARAES FILHO (RÉU)

APELANTE: SANDRA CRISTINA BECKER BRAGA (RÉU)

APELADO: OILDA DOS SANTOS (AUTOR)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. - COMPETÊNCIA INTERNA. RESPONSABILIDADE CIVIL. OS RECURSOS EM AÇÕES QUE VISAM À RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITO EXTRACONTRATUAL SÃO DE COMPETÊNCIA DAS CÂMARAS QUE INTEGRAM O 3º E 5º GRUPOS CÍVEIS POR PREVALÊNCIA DA ESPECIALIZAÇÃO NA MATÉRIA. O ENQUADRAMENTO DO RECURSO NA SUBCLASSE DIREITO DE VIZINHANÇA DEVE ATENTAR PARA INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DAS HIPÓTESES DO CÓDIGO CIVIL, COMO ORIENTA O ITEM 21 DO OFÍCIO-CIRCULAR 01/2016 DA 1ª VICE-PRESIDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

COMPETÊNCIA DECLINADA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

FRANCISCO TAVARES DA CUNHA GUIMARÃES FILHO e SANDRA CRISTINA BECKER BRAGA apelam da sentença proferida nos autos da ação indenizatória ajuizada contra OILDA DOS SANTOS, assim lavrada:

Vistos os autos. Cuida-se de ação indenizatória proposta por Oilda dos Santos em face de Sandra Cristina Becker Braga e Francisco Tavares da Cunha, objetivando a condenação dos demandados ao pagamento dos danos materiais suportados pela autora, relacionados à edificação por eles erguida, e, ainda, ao pagamento de indenização pelo abalo de natureza moral advindo da conduta desrespeitosa e constrangedora por eles perpetrada. Para tanto, disse que seu imóvel é lindeiro ao imóvel de Sandra e Francisco. Estes deram início a uma obra que causou transtornos para além do tolerável. O imóvel em que reside sofreu avarias significativas (rachaduras, infiltração, danos na platibanda e algeroza). Não bastasse, atendendo a solicitação dos vizinhos, a autora alterou o traçado da fiação da rede elétrica, pois a ampliação do imóvel lindeiro acarretou em proximidade com os fios de energia elétrica que abasteciam a rede da autora. Ainda, foi aberto um buraco na parede do imóvel vizinho a fim de que servisse de escoamento de água, entretanto as águas verteram para o interior da propriedade da autora. Houve tentativa de solução amigável, mas esta restou inexitosa, razão por que ingressou em juízo a fim de ser ressarcida dos danos experimentados. A inicial veio instruída com documentos (fls. 08/33). Requereu a concessão do benefício da gratuidade de justiça, o que foi deferido (fl. 47).

Citados, os requeridos contestaram o feito, afirmando que a 2 64-1-023/2022/14539 - 023/1.14.0011914-0 (CNJ:.0022195- 60.2014.8.21.0023) obra realizada não causou danos ao imóvel da autora, e esta, ao tempo da obra, nunca se insurgiu contra a edificação ou mesmo comunicou eventuais avarias. A alteração da rede elétrica deu-se porque a fiação invadia a propriedade dos réus. Disseram que as normas de edificação foram observadas, conforme a lei orgânica do município. Por fim, disse que o fato de estacionarem a ambulância que haviam locado não gerava qualquer inconveniente à vizinhança e que acabaram deixando o local porque a convivência tornou-se insustentável até mesmo porque a autora negou-se a colaborar para o reparo da rede elétrica, não havendo justa causa para a ação. Requereram a improcedência da ação (fls. 50/58).

Houve réplica (fls. 60/62).

A instrução do feito consistiu na realização de perícia no imóvel da autora, cujo laudo foi apresentado às fls. 82/98 e do qual não houve insurgência das partes. Ainda, em complementação, a CEEE encaminhou ofício prestando esclarecimento acerca da mudança de traçados de linhas de transmissão (fl. 116).

Sem outros requerimentos, os autos vieram conclusos para sentença.

É o relato.

Passo a decidir.

Julgo o feito nos termos do art. 355, inc. I, do CPC, porquanto a matéria vertida nos autos encontra-se documentalmente delineada, sendo dispensável a produção de outras provas para além daquelas que já constam dos autos, quais sejam, levantamento fotográfico da obra realizada, perícia judicial, esclarecimentos prestados pela CEEE.

Diante da presença dos pressupostos de existência e validade da relação jurídica processual, bem como das condições da ação, infiro a regularidade do feito, razão por que passo, de imediato, ao exame do mérito, porquanto inexistem preliminares a solver.

A pretensão da parte autora diz com condenação dos réus ao pagamento dos danos por ela suportados em virtude de obra de ampliação de imóvel residencial levada a efeito pelos requeridos Sandra e Francisco.

A realização da obra é incontroversa, assim como a alteração do traçado da rede elétrica que abastece a residência da autora. A controvérsia reside se da obra advieram danos a este imóvel e a sua repercussão na esfera pessoal da autora.

Pois bem. Prevê o Código Civil que:

Art. 1.311. Não é permitida a execução de qualquer obra ou serviço suscetível de provocar desmoronamento ou deslocação de terra, ou que comprometa a segurança do prédio vizinho, senão após haverem sido feitas as obras acautelatórias. Parágrafo único. O proprietário do prédio vizinho tem direito a ressarcimento pelos prejuízos que sofrer, não obstante haverem sido realizadas as obras acautelatórias.

Com efeito, embora seja assegurado ao proprietário proceder a alterações da planta de seu imóvel a fim de ampliá-lo, certo é que deve precaver-se da possibilidade de provocar danos nos prédios lindeiros.

Consoante se extrai do ofício da fl. 116, a alteração “em traçados de linhas de transmissão que tenha por finalidade o atendimento ao interesse próprio é de responsabilidade exclusiva do interessado, devendo este arcar com todos os custos (…) o simples fato de construir um imóvel com altura superior aos lindeiros não implica obrigatoriamente na necessidade de alteração da linha de transmissão”.

Da contestação dos réus, percebe-se que estes, em verdade, objetivavam uma comodidade ao seu imóvel próprio, não se tratando de “invasão” da propriedade (fl. 51). Eles reconhecem que solicitaram à autora e esta assentiu com o pedido, devendo, pois, ressarci-la do valor dispendido, qual seja, R$ 380,00 (fls. 19 e 22). A contradita apresentada pelos réus relativamente aos documentos que instruíram a inicial é genérica e argumentativa. Os valores apresentados não demonstram excesso ou destoam da natureza do serviço prestado, havendo indicação de quem os realizou e quando, razão por que reconheço-os como válidos e aptos a indicar a quantia paga pela autora para a alteração do traçado de linha de transmissão de rede elétrica do seu imóvel residencial.

Quanto aos danos estruturais havidos no imóvel sito na Av. Primeiro de Maio n.º 834, o perito concluiu que:

[…] A configuração e padrão das trincas e rachaduras manifestadas no imóvel da Autora em contraste com o não aparecimento dessas patologias no imóvel dos Réus, indica a ocorrência de sinistro originado de recalque absoluto não diferencial excessivo de fundações, provocando recalque diferencial das fundações do imóvel lindeiro (…) interferiu no bulbo de pressões das fundações do prédio limítrofe da Autora (…) com o surgimento de trincas e rachaduras (…) a manifestação patológica representada por infiltrações de águas pluviais, causando danos na pintura e revestimento (reboco) no dormitório da Autora, no encontro do teto com a parede limítrofe com o imóvel dos Réus, indica ter origem no intervalo de tempo decorrido entre a retirada e substituição pelos Réus, das algerozas existentes no imóvel da Autora, associado a falha pontual de vedação demonstrada na foto 2, do item 3. REGISTRO FOTOGRÁFICO: 1ª vistoria do Laudo. […]

Ao responder os quesitos formulados pelas partes, o perito indicou que as anomalias identificadas no imóvel da autora eram decorrentes da obra realizada pelos réus e estes, após a primeira vistoria, substituíram as algerozas existentes, mas permanecia uma fresta que “possibilita a passagem de águas pluviais impulsionadas por vento, podendo causar infiltrações de umidade” (fl. 97). Quanto à platibanda, como as patologias não evoluíram, o perito pontuou que houve estabilização das fundações, e, no tocante às algerozas, não havia defeito, pois eram contemporâneas à época da segunda vistoria.

Em sua manifestação, os réus buscaram minimizar os danos que provocaram no imóvel da autora, afirmando que se tratavam de questões de fácil solução, de baixo custo de material e de mão de obra, finalizando com a afirmação de que não houve maiores prejuízos à idosa. Seriam circunstâncias inaptas a gerar dano de natureza moral (fl. 101).

Após a perícia, portanto, os danos materiais restaram configurados. No ponto, cabe uma observação, os demandados afirmaram que a obra foi realizada por meio de engenheiro e autorizações municipais para ampliação do prédio. Não há singelo documento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT