Decisão Monocrática nº 50031907320188210007 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 31-01-2023

Data de Julgamento31 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50031907320188210007
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoNona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003251147
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003190-73.2018.8.21.0007/RS

TIPO DE AÇÃO: Direito Autoral

RELATOR(A): Des. CARLOS EDUARDO RICHINITTI

APELANTE: GILNEI PINTO DA SILVA (AUTOR)

APELANTE: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. SECAGEM DE FUMO. PERDA DE QUALIDADE DO TABACO. suspensão do fornecimento de energia no município de camaquã. interrupção inferior a 24 horas, em 17 de dezembro de 2017, com responsabilidade da concessionária limitada a 1/3 do prejuízo. danos materiais configurados. quantum reduzido. alteração dos consectários LEGAIS. suspensão da exigibilidade das custas processuais e honorários advocatícios devidos pelo autor em razão da ajg.

1. responsabilidade objetiva de PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO. O ARTIGO 37, § 6º, DA CF ESTENDEU ÀS PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO, PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICO, A RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELOS DANOS CAUSADOS A TERCEIROS. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 14, § 1º, E 22, AMBOS DO CDC. APLICÁVEL A LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA AO CASO.

2. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DO SERVIÇO. O FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA, PELAS PRÓPRIAS CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA, ESTÁ SUJEITO A FATORES QUE PODEM LEVAR À INTERRUPÇÃO DO SERVIÇO, O QUE PODE SER LEGAL, SE O RESTABELECIMENTO OCORRER DENTRO DOS PRAZOS E PARÂMETROS EXIGIDOS PELA LEGISLAÇÃO QUE REGULA O SETOR.

3. SECAGEM DE FUMO. O PEQUENO PRODUTOR RURAL, NO CASO ESPECÍFICO, O FUMICULTOR, EM TENDO COMO SE PRECAVER PARA INTERRUPÇÕES NORMAIS E ACEITÁVEIS, SÓ PODE BUSCAR A REPARAÇÃO JUNTO À CONCESSIONÁRIA QUANDO A FALTA DE ENERGIA FOR SUPERIOR A PERÍODO RAZOÁVEL QUE, COM PEQUENO INVESTIMENTO, PODE E DEVE EVITAR A PERDA DO CULTIVADO OU DA QUALIDADE DO QUE ESTÁ PRODUZINDO. LOGO, AINDA QUE SE ESTEJA TRATANDO DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA, O RAZOÁVEL É SE ENTENDER QUE SÓ HÁ O DEVER DA CONCESSIONÁRIA RESPONDER POR PERDAS DECORRENTES DA INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO QUANDO ESSA SE DER POR PRAZO SUPERIOR ÀQUELE QUE O CONSUMIDOR PODERIA, OU MELHOR, DEVERIA, DE FORMA ABSOLUTAMENTE RAZOÁVEL, SEM CUSTO SIGNIFICATIVO, ESTAR PREPARADO PARA EVITAR.

4. CRITÉRIO OBJETIVO. O NOVO ENTENDIMENTO DESTA CÂMARA RESTRINGE-SE ÀS HIPÓTESES EM QUE OS DANOS COMPROVADAMENTE SOFRIDOS PELO FUMICULTOR DERIVAREM DA INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA DURANTE TEMPO INFERIOR A 24 HORAS ININTERRUPTAS, CONJUNTURA EM QUE OS PREJUÍZOS SERÃO POR ELE SUPORTADOS À RAZÃO DE 2/3, IMPUTANDO-SE À CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA A RESPONSABILIDADE PELO RESSARCIMENTO DE 1/3. JÁ NAS HIPÓTESES DE DANOS ADVINDOS DE INTERRUPÇÕES POR PERÍODO SUPERIOR À 24 horas, A RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA É INTEGRAL.

5. CASO CONCRETO. demonstrada a ocorrência da suspensão de energia, dos danos materiais e do nexo de causalidade. interrupção inferior a 24 horas, em 17 de dezembro de 2017, que enseja responsabilidade DA CONCESSIONÁRIA LIMITADA A 1/3 DO PREJUÍZO.

6. cONSECTÁRIOS LEGAIS. POR SE TRATAR DE RESPONSABILIDADE CONTRATUAL, OS CONSECTÁRIOS LEGAIS INCIDENTES SOBRE O VALOR FIXADO A TÍTULO DE CONDENAÇÃO POR DANOS MATERIAIS RESTAM FIXADOS EM CORREÇÃO MONETÁRIA PELO IPCA DESDE A EMISSÃO DO LAUDO TÉCNICO QUE APUROU AS PERDAS ATÉ A CITAÇÃO, A PARTIR DE QUANDO INCIDIRÁ EXCLUSIVAMENTE A TAXA SELIC.

7. suspensão da exigibilidade das custas processuais e honorários advocatícios devidos pelo autor. deferida a ajg, resta suspensa a exigibilidade da verba devida pelo autor a título de custas processuais e honorários advocatícios.

APELAÇões DO AUTOR e dA RÉ PARCIALMENTE PROVIDAs.

DECISÃO MONOCRÁTICA

1. Trata-se de apelações cíveis interpostas por GILNEI PINTO DA SILVA e COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D em face da sentença (evento 3, PROCJUDIC3, p. 44-49) que, nos autos da ação indenizatória por danos materiais que o primeiro move em desfavor da segunda, julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos do dispositivo:

"(...) Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação para condenar a ré a pagar à parte autora a quantia de R$ 2.001,83 (dois mil e um reais e oitenta e três centavos), com correção monetária pelo IGP-M a partir da data do laudo e juros de 1% ao mês a contar da citação.

Custas na proporção de 2/3 para a parte autora e 1/3 para a parte ré. Quanto aos honorários de sucumbência, fixo em R$ 1.500,00, que serão divididos na mesma proporção das custas (R$ 1.000,00 e R$ 500,00), seguindo os parâmetros do art. 85, §8º, do CPC, não sendo admitida a compensação da verba honorária (art. 85, §14, do CPC).

Considerando que a sentença reconhece crédito em favor da parte autora, do qual não depende seu sustento e de sua família, reconheço que as verbas sucumbenciais que cabem à parte autora deverão ser abatidas do crédito que tem a receber, pelo que o benefício da assistência judiciária gratuita vai mantido até o final do feito, apenas para dispensar o preparo prévio de atos processuais. Quando do recebimento do valor da condenação, as verbas sucumbenciais deverão ser descontadas e liberado para a parte autora apenas o que restar. (...)"

O autor, em suas razões (evento 3, PROCJUDIC4, p. 2-15), defende que deve ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor ao caso. Diz que os fumicultores não têm condições de comprar um gerador, que custa milhares de reais, e que a ré não realiza financiamentos ou planos para aquisição desse equipamento. Afirma que a culpa concorrente é inaplicável ao caso, pois impor essa obrigação aos fumicultores seria penalizar o consumidor pela má prestação dos serviços da concessionária, muito embora seja dela a obrigação de bem fornecer a energia. Explica que não tem conhecimento sobre energia elétrica, uma vez que a utiliza indiretamente na atividade exercida, não como um insumo. Sustenta que a falta de energia e os danos materiais são incontroversos, logo, o dever de indenizar é obrigatório. Requer o provimento do recurso para reformar a sentença, condenando a ré aos pedidos da inicial (pagamento dos valores correspondentes ao prejuízo sofrido) com juros e correção, bem como ao pagamento de honorários advocatícios no valor de 20% da condenação. Além disso, pugna pela dispensa do pagamento de custas e honorários mediante abatimento do valor da condenação, determinado em primeiro grau, visto que necessita desses valores para manutenção familiar.

Por sua vez, nas razões da ré (evento 3, PROCJUDIC4, p. 29-39), ela alega a presença de força maior, causa excludente da responsabilidade civil. Relata ser fato público e notório que diversos municípios do estado foram atingidos por uma frente fria no dia 17/12/2017, a qual provocou chuvas fortes e temporais isolados, atingindo, inclusive, Camaquã, de modo a afastar a indenização pleiteada. Outrossim, destaca que a interrupção do fornecimento de energia durou apenas 8 horas e 17 minutos, o que indica atendimento do prazo para religação em unidades consumidoras da área rural, não cabendo se cogitar prestação defeituosa do serviço. Argumenta, ainda, que inexiste nos autos prova dos danos alegados, ônus que competia ao autor. Menciona que não foram acostados documentos que comprovassem a recusa da empresa fumageira em receber o produto ou seu recebimento em classificação inferior à esperada, nem notas fiscais da venda do produto, sendo os valores apontados na inicial incertos, meramente estimativos. Por sua vez, afirma que o laudo do autor, por si só, não pode ensejar o deferimento do pedido indenizatório, especialmente por não condizer com a realidade fática, não apontar o método utilizado para alcançar a conclusão e constituir prova unilateral, dado que não possibilitada sua participação na vistoria. Diferentemente, considera o laudo acostado por ela mais robusto e bem fundamentado, oriundo de vistoria acompanhada pelo autor, o qual teve a oportunidade de impugnar os dados coletados. Entende que a conclusão do laudo juntado à contestação, que informa não ter sido o fumo afetado pela interrupção de energia, deve ser acolhida em detrimento do laudo anexado pelo autor, devendo ser afastada a indenização, ou, subsidiariamente, reconhecido apenas o dano ali apurado. Ainda, aduz que houve culpa do autor, que não providenciou geradores de eletricidade. Refere que condená-la desestimularia a adoção de ferramentas capazes de impedir a ocorrência do dano por parte dos fumicultores, bem como implicaria em prejuízos à sociedade como um todo, já que os custos da indenização seriam repassados aos usuários. Entende que deve ser afastada a condenação ou, em caráter sucessivo, reconhecida a culpa concorrente do autor, repartindo os danos em 1/3 para si e em 2/3 para ele. Por fim, defende a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Requer o provimento do recurso para reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos e condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios de sucumbência. Caso mantida a condenação, pede que seja aplicado o IPCA-E a contar da confecção do laudo que apontou o prejuízo e, a partir da citação, a taxa SELIC.

Foram apresentadas contrarrazões por ambas as partes (evento 3, PROCJUDIC4, p. 46-50, continuando no evento 3, PROCJUDIC5, p. 1-7; e evento 3, PROCJUDIC5, p. 8-16 ).

Vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório.

2. Recebo os recursos interpostos, porquanto atendidos os seus pressupostos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, comprovado o preparo pela ré (evento 3, PROCJUDIC4, p. 40-41) e dispensado o autor, que litiga sob o pálio da AJG (evento 3, PROCJUDIC1, p. 22); comportando julgamento monocrático, com amparo na Súmula n. 568 do STJ1 e artigo 206, XXXVI, do RITJRS2.

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