Decisão Monocrática nº 50032030220218212001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 10-01-2022

Data de Julgamento10 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50032030220218212001
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001528242
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003203-02.2021.8.21.2001/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR(A): Des. JOAO MORENO POMAR

APELANTE: MARION BARBOSA DA SILVA (AUTOR)

APELADO: BANCO INTER S.A. (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. - CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. NULIDADE. PROVA. a contratação de crédito com reserva de margem consignável (RMC) é lícita quando o seu destino é a utilização por cartão de crédito; e o reconhecimento de sua nulidade exige prova de vício na pactuação. Circunstância dos autos em que, embora a contratação, o crédito foi utilizado para pagamento de mútuo fraudando o propósito de uso por cartão de crédito; e se impõe a reforma da sentença para a conversão em empréstimo pessoal consignado.

recurso provido.

DECISÃO MONOCRÁTICA

MARION BARBOSA DA SILVA apela da sentença proferida nos autos da ação de obrigação de fazer ajuizada em face de BANCO INTER S.A., assim lavrada:

Vistos etc.
Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com restituição de valores e tutela de urgência proposta por MARION BARBOSA DA SILVA em face de BANCO INTER S.A., na qual alegou ser aposentada pelo INSS e, na intenção de contrair um empréstimo consignado, foi induzida em erro pelo réu.
Afirmou que a modalidade constante do contrato é cartão de crédito com reserva de margem consignável, discorrendo acerca dele. Informou não ter utilizado o cartão de crédito, o que autoriza a conversão do contrato em empréstimo consignado comum. Invocou a aplicação do CDC. Postulou a concessão da gratuidade judiciária, o deferimento da tutela de urgência, a fim de que sejam suspensos os descontos, e, no mérito, requereu a abstenção, por parte do réu, de reserva da margem consignável, bem como a readequação ou conversão do contrato para empréstimo consignado e a restituição em dobro dos valores pagos a maior. Acostou documentos (evento 1).
Deferida a gratuidade judiciária, dispensada a realização de audiência conciliatória, postergada a análise da tutela (evento 3).

Declinada a competência, o processo foi redistribuído a esta Vara (evento 9).

Processo recebido e ratificado na presente Vara Cível (evento 15).

Citado, o réu apresentou contestação (evento 22), impugnando o benefício da gratuidade judiciária concedido ao autor.
Afirmou que a parte autora firmou contrato de cartão de crédito consignado, autorizando a averbação da reserva de margem consignável e o desconto em seu benefício previdenciário do valor mínimo da fatura. Destacou a ausência de vício de consentimento e impossibilidade de alteração da modalidade contratada. Informou que a parte autora solicitou saques que lhes foram disponibilizados através de transferência bancária. Disse ter atuado dentro dos limites legais e defendeu a inexistência de ato ilícito. Requereu a improcedência dos pedidos. Juntou documentos.
Sobreveio réplica (evento 27).

Vieram-me conclusos os autos para julgamento.

É o relatório.
DECIDO.
O feito tramitou regularmente.
Não há nulidades ou irregularidades processuais a sanar e foram observados os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, nos termos do art. 5º, LV, da Constituição Federal de 1988.
Não havendo necessidade de produção de outras provas para a resolução da lide, autorizado o seu julgamento antecipado, no estado em que se encontra, conforme o disposto no art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil.

Inicialmente, rejeito a impugnação à gratuidade judiciária, visto que a parte autora aufere renda inferior a cinco salários mínimos, como bem reconhecido pelo réu, circunstância que se amolda ao entendimento fixado na Conclusão 49ª do Centro de Estudos do TJRS.

Ademais, pretendendo a revogação do benefício, competia ao réu trazer elementos capazes de demonstrar a ausência de veracidade nas informações prestadas ou de que a situação da parte autora se modificou no curso da ação, ônus do qual não se desincumbiu.

Nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. SERVIÇO DE HOME CARE, FONOAUDIÓLOGA E FISIOTERAPEUTA. INCLUSÃO DA UNIÃO. DESNECESSIDADE. PLEITO DE TUTELA DE URGÊNCIA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS. PRELIMINAR. REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE. IMPOSSIBILIDADE. 1. O benefício da Assistência Judiciária Gratuita pode ser impugnado a qualquer tempo. Para a revogação do benefício processual, é necessário que a parte adversa comprove nos autos que a parte que teve deferido o benefício possui plenas condições de arcar com as custas do processo e honorários de advogado; caso contrário, deve prevalecer a decisão de concessão do benefício. 2. O agravante não instruiu o recurso com os documentos referente aos rendimentos da parte agravada, a fim de comprovar suas alegações e sustentar o seu pedido de revogação do benefício concedido, razão pela qual vai indeferido o referido pleito. (...) AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 50322514420218217000, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Julgado em: 22-04-2021) -Grifei-

No mérito, alega a parte autora que não contratou empréstimo na modalidade de cartão de crédito consignado, requerendo a declaração da nulidade de tais descontos, bem como a repetição dos valores descontados indevidamente e, ainda, a conversão do pacto em empréstimo consignado.
Importante mencionar que a parte autora e o réu se adéquam aos conceitos de consumidor e fornecedor, conforme os artigos e do CDC e entendimento sumulado do STJ1, restando, assim, configurada a relação de consumo.

Outrossim, invertido o ônus da prova, competia à parte ré comprovar a efetiva contratação de cartão de crédito na modalidade de reserva de margem consignável, demonstrando a existência de autorização para os descontos em sua folha de pagamento e/ou benefício previdenciário.

A esse respeito, a parte requerida demonstrou inequivocamente a contratação do cartão de crédito consignado, em 25/08/2015 e 05/07/2016, sob o nº de adesão 21642 e 10028064, plástico n.º 5362.
xxxx.xxxx.7024, através do "Termo de Adesão a cartão de crédito consignado e autorização para desconto em folha", conforme se vê do CONTR2 e CONTR3 (evento 22), bem como comprovou a disponibilização na conta corrente da parte autora do valor por ela postulado (COMP4 e FATURA5, evento 22).
Cumpre referir que o instrumento contratual foi devidamente firmado pelo autor, havendo identidade de assinatura em relação ao seu documento de identidade e expressa referência ao desconto mensal em seu benefício do valor mínimo da fatura:

IX-AUTORIZAÇÃO PARA DESCONTO 1. Através do presente documento o(a) ADERENTE autoriza a sua fonte pagadora/empregadora, de forma irrevogável e irretratável, a realizar o desconto mensal em sua remuneração/salário/beneficio, em favor do BANCO INTERMEDIUM S.A. para o pagamento correspondente ao valor mínimo indicado na fatura mensal do cartão de crédito consignado ora contratado. 2. O(A) ADERENTE declara que está de acordo com o valor a ser averbado, conforme disposto no quadro IV, constante no preâmbulo deste termo, estando o mesmo em conformidade com o pactuado, não sendo-lhe exigido qualquer outro encargo e/ou aquisição de outro(s) produto(s). O(A) ADERENTE declara, ainda, estar ciente de que o referido valor será automaticamente majorado na mesma proporção de eventuais e futuros aumentos em sua margem consignável. 3. Ocorrendo a inadimplência e/ou a impossibilidade do desconto em folha de pagamento/beneficio, nos moldes aqui convencionados, o(a) ADERENTE autoriza desde já o BANCO INTERMEDIUM S.A., diretamente ou através de empresas terceirizadas, em caráter irrevogável e irretratável, a debitar em qualquer conta corrente de sua titularidade, mantida junto ao BANCO INTERMEDIUM S.A ou em outra Instituição Financeira, o valor vencido e não pago, destinando os recursos única e exclusivamente para amortizar o saldo devedor do Cartão de Crédito Consignado ora contratado. Neste ato, o(a) ADERENTE autoriza, ainda, o BANCO INTERMEDIUM S.A a ter acesso aos seus dados de depósitos e aplicações em outras instituições financeiras, nos termos do artigo 1°, § 3°, V da Lei Complementar n° 105/01 que dispõe a não configuração de quebra de sigilo bancário a revelação de informações sigilosas com o expresso consentimento do interessado.

Outrossim, descabe à parte autora negar conhecimento sobre a contratação de cartão de crédito no lugar de empréstimo consignado, já que a modalidade contratual não vem expressa em cláusulas digitadas em letras minúsculas ou sem destaque, mas do próprio título do contrato, o qual está escrito em letras maiúsculas e de tamanho relevante, não deixando qualquer dúvida no contratante, salvo se ele não se permitir ler o instrumento pelo qual está se obrigando, o que, por si só, corre por sua conta e risco.
Releva destacar que a possibilidade de reserva de margem consignável para operações com cartão de crédito é regulada, atualmente, pela Instrução Normativa nº 802 do Ministério da Previdência Social, datada de agosto de 2015, em seu artigo 3º, inexiste óbice legal à sua contratação:

Art. 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito, concedidos por instituições financeiras, desde que:
I - o empréstimo seja realizado com instituição financeira que tenha celebrado Convênio e/ou Acordo com o INSS/Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência - Dataprev, para esse fim;
II - mediante contrato firmado e assinado com apresentação do documento de identidade e/ou Carteira
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