Decisão Monocrática nº 50033587820208210048 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50033587820208210048
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001666218
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5003358-78.2020.8.21.0048/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATOR(A): Des. JOAO MORENO POMAR

APELANTE: SARA KETLIN DA SILVA (AUTOR)

APELADO: ARCARI EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO C/C REPARAÇÃO DE DANOS. - RESCISÃO DE CONTRATO. INADIMPLEMENTO. ÔNUS DA PROVA. Ao autor cabe provar os fatos constitutivos do direito que alega; e ao réu os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos, como disposto no art. 373 do CPC/15. Circunstância dos autos em que não restou demonstrado o inadimplemento da parte ré a ensejar a rescisão do contrato; e se impõe manter a sentença de improcedência.

RECURSO DESPROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

SARA KETLIN DA SILVA apela da sentença que julgou a ação de rescisão de contrato c/c reparação de danos que promove em face de ARCARI EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, assim lavrada:

SARA KÉTLIN DA SILVA ajuizou ação contra ARCARI EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, inicialmente qualificados. Referiu que firmou contrato particular de compromisso de compra e venda com a ré em 10 de dezembro de 2018. Adquiriu o apartamento 102, bloco J, e vaga de estacionamento 190, do Residencial Vista do Vale, valor total de R$ 117.000,00 (cento e dezessete mil reais). Foi vendida uma unidade com sacada, mas lhe foi entregue um imóvel sem a sacada. Requereu a rescisão contratual, a restituição dos valores pagos, lucros cessantes (perda de aluguéis), quitação do contrato junto à Caixa Econômica Fedral, restituição dos valores pagos e danos morais, bem como a condenação da requerida a efetuar a restituição dos valores pagos à Caixa Econômica Federal, restituição dos valores pagos ao registro de imóveis, o pagamento das despesas de condomínio, energia elétrica e taxa de água até que a ré transfira o imóvel para o seu nome, o ressarcimento de R$ 18.473 em razão da perda do subsídio do programa minha casa minha vida e do subsídio junto ao Município de Farroupilha e danos morais de R$ 15.000,00.

Foi deferida (evento 2) a assistência judiciária gratuita à autora.

A demandada contestou (evento 11). Suscitou a necessária inclusão da Caixa Econômica Federal na lide e a competência de Justiça Federal. Referiu não ter legitimidade passiva para a ação, pois apenas foi a responsável pela construção do empreendimento. No mérito, referiu que houve erro material no contrato particular e constou que o imóvel da autora teria sacada. No entanto, todo a documentação restante é certa no sentido de que o imóvel da autora não teria sacada. O contrato firmado perante a Caixa Econômica Federal, com força de escritura pública, descreve um apartamento sem sacada. O negócio é legítimo; não é cabível a rescisão e tampouco a devolução de valores pagos ou o ressarcimento de outras despesas e danos. Não caracterizados danos morais. Impugnou a concessão da assistência judiciária gratuita à autora. Requereu o acolhimento das preliminares e a improcedência da ação.

Réplica (evento 14).

Foi indeferido (evento 16) o pedido de inclusão no feito da Caixa Econômica Federal e de remessa à Justiça Federal.

As partes não manifestaram interesse na produção de outras provas.

Relatados. Decido.

II

Da Assistência Judiciária Gratuita

A parte autora juntou declaração de necessidade. Preencheu, assim, os requisitos do art. 99, § 3º, do CPC. O demandado não declinou qualquer fato a desmerecer a credibilidade da declaração (evento 1 - DECLPOBRE4), presumindo-se boa. Mantenho, por conseguinte, o benefício da assistência judiciária gratuita à parte autora.

Da legitimidade passiva

Rejeito a preliminar. Conforme dito no despacho do evento 16, a controvérsia da ação diz respeito à negociação havida entre as partes (venda de imóvel com sacada no primeiro pavimento) e não propriamente com o financiamento realizado. Eventual construção da sacada era responsabilidade da ré, o que lhe dá legitimidade para a ação. As demais questões dizem respeito ao mérito a seguir analisado.

Do mérito

O projeto arquitetônico mostra que os apartamentos 102 e 103 do bloco J, não teriam sacada (evento 11 – OUT12 – identificação de cada apartamento dentro do respectivo mapa do apartamento); ao contrário dos apartamentos 101 e 104, que teriam sacada.

Sem embargo, constou ao lado do mapa, equivocadamente, que as sacadas seriam dos apartamentos 102 e 104. Ao se observar o projeto com atenção, percebe-se o equívoco. No desenho dos apartamentos (evento 11 – OUT12), apenas há sacadas nos apartamentos 101 e 104. Nos apartamentos 102 e 103, não aparece construção de sacada, mas apenas 'projeção de sacada do apto. superior' e 'c/grade' na respectiva abertura.

O equívoco fica ainda melhor elucidado ao se atentar para a tabela de vendas (evento 11 – TABELA 15). A tabela de vendas (evento 11 – TABELA15) demonstra que no bloco J, os apartamentos 102 e 103 eram sem sacada e vaga coberta, orientação norte, valor de R$ 117.000,00 e área total de 66,5323 m².

No mesmo bloco J, os apartamentos 101 e 104 eram com sacada e vaga descoberta, orientação sul, valor de R$ 117.000,00 e área total de 68,8938 m².

Fica evidente que o apartamento 102 (adquirido pela autora) tem orientação norte, vaga coberta e área de 55,5323 m²; de forma idêntica ao apartamento 103; mas diferente dos apartamentos 101 e 104 que têm sacada, mas orientação sul e com vaga descoberta. Isso justifica a igualdade dos preços (R$ 117.000,00) apesar de dois deles ter sacada e dois deles não as ter.

O apartamento adquirido pela autora (bloco J – 102) não deve ser comparado aos apartamentos 101 e 104 do mesmo bloco, mas ao apartamento 103 – conforme se pode ver com clareza no projeto arquitetônico de evento 11 – OUT 12. Há previsão de sacada para aos apartamentos 104 e 101, mas não para os apartamentos 103 e 102.

Isto demonstra que não havia (e não há) projeto de construção de sacada para os apartamentos 102 e 103; mas apenas para os apartamentos 104 e 101.

O contrato celebrado com a Caixa Econômica Federal (evento 1 - OUT8), que tem força de escritura pública, faz menção à orientação norte e não refere que haja sacada.

A foto do evento 1, FOTO17, mostra dois apartamentos térreos com sacada; no entanto, presumo que se trata dos apartamento 104 e 101 (orientação sul), projetados para ter sacada – conforme acima fundamentado. Houvesse a foto do outro lado do prédio se constataria que não há sacada, pois lá se localizam os apartamentos 102 e 103 (orientação norte).

Estas circunstâncias demonstram suficientemente que houve erro involuntário ao se fazer constar no contrato de promessa de compra e venda (evento 1 – OUT7) que o apartamento 102 teria sacada.

É evidente pelo restante da documentação juntada que os apartamentos 102 e 103 do bloco J não teriam sacada, mas teriam orientação norte e vaga coberta; o que justifica preço idêntico aos apartamentos 101 e 104, com sacada, vaga descoberta e orientação sul.

Apesar do equívoco (constou equivocadamente no contrato que o apartamento teria sacada), concluo que a elaboração do contrato foi realizada com base nos princípios norteadores das relações contratuais, tais como a boa-fé, a autonomia das vontades e, principalmente, respeitando a pactuação das partes.

A ré, na contestação, referiu que a autora foi contada para assinar um aditivo para corrigir a informação digitada erroneamente, mas se negou, vindo somente agora postular a rescisão.

Não verifico que tenha havido erro substancial ou obscuridade a justificar a rescisão contratual. Houve clareza de informações e um equívoco, ao constar no contrato particular, que o apartamento teria sacada; quando na verdade não teria, igual ao apartamento 103.

A rescisão contratual é medida excepcional e se justifica apenas em situações de inadimplemento substancial, como, por exemplo, nos casos em que não há a entrega do imóvel; ou há vícios construtivos, impeditivos à habitação ou outros que tornem imprestável e abusiva a negociação, o que não ocorreu no caso em tela.

A demandada demonstrou suficientemente que contratou com probidade e boa-fé; houve informação adequada (apesar do erro havido) a respeito do apartamento que estava vendendo à autora. Não verifico que tenha ocorrido ofensa aos princípios de proteção ao consumidor ou subtração de informações capazes de ameaçar o equilíbrio contratual.

Incabível, pelo exposto, a rescisão contratual. E, em decorrência, não cabe a restituição de valores ou o ressarcimento de outros danos, pois teriam como pressuposto o descumprimento contratual por parte da demandada. Houve apenas um erro material, sem que isso tenha força para anular a contratação.

III

Face ao exposto, forte no art. 487, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE a ação proposta por SARA KÉTLIN DA SILVA contra ARCARI EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, para REJEITAR a preliminar de ilegitimidade passiva, MANTER a assistência judiciária gratuita à autora,...

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