Decisão Monocrática nº 50041836120208210035 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 03-03-2022

Data de Julgamento03 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50041836120208210035
ÓrgãoSétima Câmara Cível
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001777865
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5004183-61.2020.8.21.0035/RS

TIPO DE AÇÃO: Sucessões

RELATOR(A): Des. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMENTA

APELAÇÕES CÍVEIS. FAMÍLIA. FAMÍLIA. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL “POST MORTEM”. REQUISITOS DO ARTIGO 1.723 DO CÓDIGO CIVIL NÃO COMPROVADOS. MERO NAMORO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO.

Para o reconhecimento de união estável como entidade familiar, há necessidade de convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família, nos exatos termos do art. 1.723 do Código Civil.

Hipótese em que a prova documental e testemunhal produzida não demonstrou a existência de união estável vivida entre o falecido e a autora, tratando-se de relação com contornos de simples amizade ou namoro.

Precedentes do TJRS.

Apelação da parte ré provida.

Apelação da autora desprovida.

DECISÃO MONOCRÁTICA

PAULO O. S. (Evento 91) e MONIQUE N. O. (Evento 93) apelam da sentença de parcial procedência proferida nos autos da "ação declaratória de reconhecimento de união estável post mortem" que a segunda move contra a SUCESSÃO DE VINICIOS V. S., representada por seu genitor, PAULO O. S., nomeado inventariante em ação de inventário, dispositivo sentencial assim lançado (Evento 86):

ISSO POSTO, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por M.N.O. na AÇÃO DECLARATÓRIA DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL POS MORTEM proposta contra S.V.V.S., representada por P.O.S., para reconhecer a união estável entre a autora e V.V.S. de mar./2017 até 23/10/2019.

Junte-se cópia do evento 1/5 (certidão de óbito) dos autos do inventário relacionados 50003495020208210035.

Condeno a autora ao pagamento de 30% das custas, bem como de honorários ao procurador da parte adversa, que arbitro em R$300,00, em face do zelo profissional e da natureza da causa, restando suspensa a exigibilidade em razão da GJ.

Condeno a parte ré ao pagamento de 70% das custas, bem como de honorários ao procurador da parte adversa, que arbitro em R$500,00, em face do zelo profissional e da natureza da causa, restando suspensa a exigibilidade em razão da GJ que ora defiro.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após, arquive-se.

PAULO O. S., em razões, aduz pretender a autora o reconhecimento de união estável post mortem com o falecido VINICIOS V., filho do réu/apelante, no período de 2013 até seu óbito, em 2019. Expõe que o juízo de origem identificou, assertivamente, que entre 2013 a 2017 a apelada não comprovou ter vivido em união estável com o de cujus; contudo, manifestou, equivocadamente, que restaria comprovada a relação amorosa em questão no período de março de 2017 até a data do óbito de VINICIOS, levando em consideração os documentos acostados pela apelada, bem como decisão proferida pela Justiça Federal, nos autos de ação previdenciária que buscava o percebimento de pensão por morte. Contudo, sustenta, os referidos documentos anexados pela apelada - atinentes a contas de telefone emitidas em seu nome e destinadas ao endereço da Av. Carneiro - são apenas dos anos de 2019 e de 2020, não sendo aptos a comprovar a existência de união estável desde 2017. Sustenta que o documento referido pelo juízo, Evento 1, documento 5, conta de energia emitida em nome do falecido no endereço da Av. Carneiro, não possui qualquer relação com os documentos anexados pela apelada. Alega que o de cujus de fato viveu no apartamento em questão, sendo lógico que existam documentos em seu nome no período em que alugou o imóvel, mas não comprovam que a apelada vivia no imóvel com o falecido no mesmo período. Expõe ainda que os documentos acostados pela apelada, referentes apenas ao ano de 2019 em diante, não havendo comprovação de união estável em período anterior, muito menos em 2017, entregue o imóvel em 21/11/2019, Evento 11, documento 3, posteriormente à entrega do imóvel que estava locado pelo falecido podendo a apelada alugar o bem da proprietária, o que não comprova nada.

Ressalta que a apelada acosta contas de celular em seu nome, com vencimentos em 09/2019, 10/2019 e 11/2019 (e mais nada anterior a este período), endereçadas ao apartamento do de cujus, porém, o período dos documentos acostados corresponde com o período em que VINICIOS ficou internado e deixou MONIQUE cuidando dos cachorros, não havendo nenhum outro documento comprovando que antes de tal período morasse com o de cujus. Por fim, refere a apelada não era dependente no plano de saúde do falecido na Cia. Carris, onde laborava, o que causa estranheza, alegando ter convivido em união estável com VINICIOS desde 2013, sem nenhuma fotografia ou documentos relativos ao mesmo interregno. Relativamente à decisão que deferiu a pensão por morte no processo previdenciário, sustenta que não deve ser considerada para o reconhecimento da união estável, uma vez que tal processo não há documento diferente dos juntados no presente, considerando o processo previdenciário apenas a versão unilateral da apelada, sem ampla defesa e contraditório, não conseguindo o INSS refutar as alegações da recorrida. Diferentemente, enfatiza que na presente ação demonstrou-se que a apelada nunca foi companheira de VINICIOS, contrapondo o recorrente todos os argumentos e documentos por ela colacionados. Requer, pois, o provimento do recurso, para reformar a sentença, julgando-se improcedentes os pedidos.

MONIQUE N. O., por sua vez, apelando sustenta que o Magistrado decidiu que a entidade familiar perdurou somente de março de 2017 a 23/10/2019, entendendo que, de março de 2013 a março de 2017, a relação se consistiu apenas em um namoro, sendo o fundamento principal para tanto o fato de que não foi comprovada a coabitação do casal. Argumenta que as fotografias anexadas aos autos, que comprovam a relação do casal, se referem a período muito anterior ao ano de 2017, Evento 1, OUT 11, e Evento 53, OUT2, bem como as testemunhas da parte adversa - irmãos do de cujus, ouvidos como informantes - confirmam ter conhecido a apelante no ano de 2014, apresentada pelo falecido e, por serem evidentemente parciais, afirmaram que a autora, que à época reconhecia-se ainda como Tiago, fora apresentada como "amigo" do falecido. Reporta-se ao testemunho de Estela M. D. T., no sentido de que conheceu a recorrente na mesma ocasião, na praia, episódio em que o falecido informara aos irmãos que gostaria de apresentar alguém especial a eles. Expõe que em seu depoimento pessoal a autora registrou que ainda que, em 2013, três meses depois de se conhecerem, já foram residir juntos na Av. Carneiro da Fontoura, 470/477,lá permanecendo por três anos, até que se mudaram para o prédio nº 831 da mesma rua, sendo ambos os apartamentos locados e o contrato de locação registrado em nome do companheiro, motivo pelo qual as contas e correspondência vinham em seu nome, convergindo as narrativas no sentido de que a união estável teve início ainda no ano de 2013.

Menciona que o fato de que não foi possível juntar correspondência também do outro endereço do casal decorre da evidente circunstância de que os companheiros deixaram o referido imóvel há mais de 04 anos, não sendo razoável exigir que a recorrente se mantenha em posse de cartas e boletos bancários por período tão longo, não conseguindo a parte contrária comprovar que a recorrente não residia com o falecido no imóvel situado no prédio nº 470 na Av. Carneiro da Fontoura, confirmando as testemunhas arroladas pelo apelado que a relação do casal subsistia desde o ano de 2014, acostadas declarações de três pessoas próximas ao casal, confirmando que residiam sob o mesmo teto desde o ano de 2013 e não apenas a partir de 2017 (Evento1 – OUT9). Por fim, quanto à menção do falecido, em 29/07/2015, perante à Justiça Federal, de que não possuía nenhum relacionamento fixo, alega que o casal sofria forte discriminação em seu meio social, principalmente junto à família do falecido, motivo pelo qual o de cujus não conseguia declarar que estava em uma relação estável, sendo que sua família não aceitava nem mesmo a sua orientação sexual, considerando o juízo que o fato de constar como solteiro no contrato de locação da Rua Carneiro da Fontoura, nº 831, não afasta a união estável. Destaca que a falta de aceitação da família do falecido se apresentou mais evidente ao longo do feito, nos depoimentos do pai e irmãos do de cujus tentando taxar a apelante como “amiga” e “cuidadora do animal de estimação”, comprovando as mensagens juntadas que a autora contratou seus procuradores ora firmatários, em um primeiro momento, para conseguir ter acesso ao companheiro no quarto de hospital, já que o genitor não permitia a sua entrada (Evento1 – OUT10). Enfatiza que "as uniões mantidas por um casal gay ou formadas por uma pessoa trans (como no caso dos autos), infelizmente, acabam, por vezes, distinguindo-se das uniões entre pessoas cis-heterossexuais no que tange à sua publicidade, devido ao triste preconceito que persiste na sociedade (e, frequentemente, na própria família)", assim não havendo como exigir a mesma densidade probatória exigível nos casos cis-heterossexuais. Citando jurisprudência, pugna pelo provimento do recurso, com a reforma da sentença, a fim de que seja reconhecida a união estável desde março de 2013 até a data do falecimento do de cujus, em 23/10/2019.

Foram apresentadas contrarrazões por ambas as partes (Eventos 97 e 98), cada qual pugnando pelo desprovimento do recurso da parte adversa.

É o relatório.

Efetuo o julgamento na forma monocrática, forte no art. 206, XXXVI, do RITJRS, combinado com o art. 932, VIII, do CPC.

A apelação interposta por MONIQUE não merece acolhimento, devendo ser provida a apelação interposta pela SUCESSÃO...

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