Decisão Monocrática nº 50053197020228210020 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 19-05-2023

Data de Julgamento19 Maio 2023
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50053197020228210020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003792304
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5005319-70.2022.8.21.0020/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR(A): Desa. MIRIAM ANDREA DA GRACA TONDO FERNANDES

APELANTE: CRISTIANO DE CASTRO ALBIERO (AUTOR)

APELADO: BANCO VOLKSWAGEN S.A. (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO.

Código de Defesa do Consumidor. Aplicável às operações de concessão de crédito e financiamento. Súmula n. 297 do STJ.

Juros remuneratórios. São abusivos apenas se fixados em valor expressivamente superior à taxa média do mercado divulgada pelo BACEN para o período da contratação (REsp n. 1.061.530/RS).

Capitalização de juros. Possibilidade de incidência de capitalização de juros em periodicidade inferior à anual após a edição da Medida Provisória n. 2.170-36/2001 (art. 5º), presente inclusive o RE n. 592.377/RS, com repercussão geral reconhecida. “A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.” - REsp n. 973.827/RS.

Comissão de permanência. É permitida sua cobrança desde que contratualmente prevista, de forma exclusiva para o período da inadimplência, não cumulada com correção monetária, juros moratórios, juros remuneratórios e/ou multa. Súmulas n. 30, 294, 296 e 472 do STJ. Precedentes desta Corte. Porém, no caso concreto, não havendo previsão de incidência de comissão de permanência no contrato bancário, e não tendo sido de qualquer forma demonstrada sua incidência, resta prejudicada a análise de tal ponto.

Compensação e/ou repetição simples. Cabível caso verificada a cobrança de valores indevidos.

Descaracterização da mora e tutela provisória. Depende do reconhecimento de abusividade em encargo(s) previsto(s) para o período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização de juros).

Do prequestionamento. Desnecessária a indicação expressa de todos os fundamentos legais eventualmente incidentes no caso, sendo suficiente prequestionamento implícito.

APELO IMPROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

I – Relatório.

CRISTIANO DE CASTRO ALBIERO ingressou com Ação revisional de contrato em face do BANCO VOLKSWAGEN S/A, na qual foi prolatada sentença julgando improcedente o feito, contra o que interpõe o recorrente a presente apelação.

Desde logo aponto que todos os eventos aqui mencionados são relativos aos autos originários, exceto quando expressamente indicado em contrário.

A sentença recorrida assim decidiu:

"(...) Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE a ação revisional ajuizada por CRISTIANO DE CASTRO ALBIERO contra BANCO VOLKSWAGEN S.A., relativa ao(s) contrato(s) objeto(s) dos autos. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, que restam suspensas em tendo havido o deferimento da AJG. (...)" - evento 23.

Em suas razões (evento 27), o apelante requer a reforma da sentença para:

  1. limitar os juros remuneratórios em 12% ao ano;
  2. vedar a capitalização de juros;
  3. excluir a comissão de permanência ou, alternativamente, limitá-la ao patamar da taxa média de mercado, não superior à taxa do contrato, não podendo ser cumulada com juros remuneratórios, correção monetária, juros moratórios e multa moratória;
  4. autorizar a compensação/repetição dos valores pagos a maior; e
  5. reconhecer a descaracterização da mora e conceder a tutela provisória para manter-se na posse do bem e vedar a inscrição de seu nome em cadastros restritivos de crédito e/ou protesto de títulos, tudo sob pena de multa diária de R$1.000,00.

Apresentadas contrarrazões (evento 33, contrarrazões 1), subiram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

II – Fundamentação.

Encontram-se preenchidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade do recurso interposto, razão pela qual recebo o presente apelo, tornando-se cabível o julgamento de plano do recurso, forte no art. 932, inciso IV, alíneas “a” e/ou “b”, do Código de Processo Civil/2015.

Do(s) contrato(s) objeto de revisão.

Trata o presente feito de revisão de contrato de financiamento com cláusula de alienação fiduciária – cédula de crédito bancário nº 8647050, relativa ao veículo Fiat Siena Fire 1.0, placas INL-6972, celebrado pelas partes em 05.08.2019. O valor financiado foi de R$14.685,05, a ser adimplido em quarenta e oito (48) parcelas mensais e sucessivas de R$487,54. Os juros remuneratórios foram fixados em 2,09% ao mês e 28,17% ao ano (evento 13, contrato 5).

Da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor – CDC.

Cabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor às operações de concessão de crédito e financiamento como a do presente caso concreto, conforme entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça, restando caracterizados os conceitos de consumidor (art. 2°) e fornecedor (art. 3°) previstos no referido Diploma Legal.

O Superior Tribunal de Justiça, aliás, consolidou tal entendimento ao editar a Súmula n. 297: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às Instituições Financeiras”.

No mesmo sentido, a jurisprudência desta Corte:

APELAÇÃO CIVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. AÇÃO REVISIONAL. 1. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ÀS OPERAÇÕES DE CONCESSÃO DE CRÉDITO E FINANCIAMENTO. SÚMULA N. 297 DO STJ. (...). RECURSO PROVIDO EM PARTE. (Apelação Cível, Nº 50004499820168210017, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Judith dos Santos Mottecy, Julgado em: 07-12-2022)

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. 1. Mostra-se vedado ao juízo a revisão ex officio de cláusulas inscritas nos contratos bancários (STJ, REsp nº. 1.061.530/RS, Tema 36; Súmula nº. 381). 2. Os negócios jurídicos bancários estão sujeitos às normas inscritas no CDC (Súmula n. 297 do STJ), com consequente relativização do ato jurídico perfeito e do princípio pacta sunt servanda. (...). APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. (Apelação Cível, Nº 50005537320228216001, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mário Crespo Brum, Julgado em: 07-12-2022)

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. REVISÃO DE CONTRATO. DA APLICAÇÃO DO CDC E DOS CONTRATOS DE ADESÃO. RELAÇÃO CONSUMERISTA CONFIGURADA. PRESENÇA DE CONSUMIDOR E FORNECEDOR; ARTS. E DA LEI 8009/90. SÚMULA 297, STJ. LEI PROTETIVA APLICÁVEL AO CASO CONCRETO. (...). APELO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO. (Apelação Cível, Nº 50555939520228210001, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto Sbravati, Julgado em: 19-12-2022)

Dos juros remuneratórios.

No que diz com a limitação dos juros remuneratórios, a Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça estabelece que “a estipulação de juros remuneratórios superior a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”.

Ainda, pacificou-se a jurisprudência no sentido de que não incide a Lei de Usura quanto à taxa de juros remuneratórios nas operações realizadas com as instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, consoante Súmula n. 596 do Supremo Tribunal Federal1.

Tal questão também foi tratada pelo Superior Tribunal de Justiça ao analisar o Recurso Especial nº 1.061.530-RS, com o propósito de estabelecer paradigma de julgamento, conforme segue:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO. (...) Neste julgamento, os requisitos específicos do incidente foram verificados quanto às seguintes questões: i) juros remuneratórios; ii) configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes e v) disposições de ofício. (...) I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS. a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (...) (REsp 1.061.530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009).

Com fundamento inclusive no referido paradigma, a jurisprudência desta 14ª Câmara Cível firmou entendimento no sentido de que a revisão da taxa de juros remuneratórios estipulada no contrato será permitida apenas nos casos em que restar comprovado que o percentual fixado supera expressivamente a taxa média de mercado da época da contratação, tendo como parâmetro as taxas divulgadas pelo Banco Central do Brasil para o respectivo período.

Nesse sentido:

APELAÇÕES CÍVEIS. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. AÇÃO REVISIONAL. 1. OS JUROS REMUNERATÓRIOS SÃO ABUSIVOS APENAS SE FIXADOS EM VALOR MANIFESTAMENTE EXCEDENTE À TAXA MÉDIA DE MERCADO. (...). RECURSOS IMPROVIDOS. (Apelação Cível, Nº 50134507420228210039, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Judith dos Santos Mottecy, Julgado em: 07-12-2022)

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. REVISÃO DE CONTRATO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT