Decisão Monocrática nº 50057583720198210004 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 09-02-2023

Data de Julgamento09 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50057583720198210004
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003152819
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5005758-37.2019.8.21.0004/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR: Desembargador ROBERTO SBRAVATI

APELANTE: CASSIA FABIANE RODRIGUES DIAS (AUTOR)

APELADO: INTACTO COMPANHIA SECURITIZADORA DE CREDITOS FINANCEIROS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por CASSIA FABIANE RODRIGUES DIAS contra sentença de improcedência proferida nos autos da Ação de Revisão de Contrato que, a ora apelante, ajuizou em face de INTACTO COMPANHIA SECURITIZADORA DE CREDITOS FINANCEIROS.

Apela a Autora. Requer o provimento do recurso para a reforma da sentença a fim de possibilitar a revisão das quantias cobradas em excesso, pleiteando pela exclusão das tarifas administrativasde avaliação do bem, de registro do contrato e pelo afastamento do seguro prestamista; pela declaração de ilegalidade da forma como é cobrado do IOF; pela permissão da compensação de valores e da repetição do indébito em dobro; pela declaração de ofício das abusividades contratuais, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor; e pela condenação do banco em danos morais em face as abusividades contratuais.

Com as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.

Vieram os autos conclusos e em condições de julgamento.

Foram observadas as disposições legais dos artigos 931 e 934, ambos do CPC.

É o relatório.

VOTO

DA APLICAÇÃO DO CDC

Enfrenta-se a questão da aplicabilidade do CDC ao caso em tela.

É consabido que se tem matéria sumulada – verbete 297, do colendo STJ.

Contudo, oportuno referir que, mesmo antes da edição de dita Súmula, já se admitia a incidência da lei consumerista para casos como o que se está a examinar.

O conceito de fornecedor e consumidor está plenamente caracterizado e o tema encontra-se pacificado nos Tribunais, razão pela qual a aplicabilidade do CDC, no caso concreto, é irrefragável.

DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO

A questão relativa à impossibilidade de o julgador conhecer de ofício da abusividade das cláusulas em contratos bancários é questão sumulada – in verbis:

“Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas." (Súmula 381/STJ – DJe 05/05/2009; RSTJ vol. 214 p. 537).

Estima-se que a parte há de provocar a manifestação judicial, que está limitada ao pedido, portanto. Cuida-se singelamente de obedecer ao Princípio da Adstrição (ou da congruência), consubstanciado nos artigos 141 e 492 do CPC.

E em relação ao exame de ofício em segundo grau, entende-se que a análise de ofício da abusividade de cláusula contratual também ofenderia o princípio tantum devolutum quantum appellatum. A análise do contrato é limitada ao teor do recurso, vedada a apreciação de ofício de eventuais abusividades contratuais se não houve pedido na irresignação interposta. Tal limitação, vale dizer, harmoniza-se com a necessidade de segurança jurídica e, ainda, evita a supressão de instância.

Anote-se que o colendo STJ mantinha entendimento dominante em tal sentido, ou seja, de que eventuais nulidades do pacto, não tendo sido suscitadas pela parte, não são passíveis de apreciação ex officio, tendo sido tal jurisprudência dominante tornada paradigma mediante o julgamento do RESP 1061.530/RS, que, no ponto, preconiza: “(...) DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO - É vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários”. É esta a orientação que adotamos, portanto.

Assim, como a sentença analisou de ofício a abusividade na taxa de abertura de crédito, merece ser desconstituída nesta parte, em razão de ser ultra petita. Ressalto que não correrá sua nulidade de forma total, mas apenas quanto à análise do referido encargo, a fim de se adequar aos pedidos efetuados pelo autor na exordial.

Portanto, afasto o exame no que tange à taxa de abertura de crédito, e por consequência resta prejudicado o pedido do réu neste ponto.

DESPESA DE REGISTRO DO CONTRATO E TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM

No que se refere à tarifa de avaliação do bem, embora sua incidência não conflita com a regulação bancária vigente, a questão que se destaca é a comprovação da efetiva prestação de tal serviço contratado.

A cobrança jamais deve preceder um serviço que poderá ou não ser realizado pela instituição financeira. Logo, cabe ao credor demonstrar, através de laudo que, de fato, ocorreu a realização da avaliação do veículo.

Ainda assim, o valor contratado deve ser objeto de exame, a fim de manter os princípios da boa-fé e da transparência nas relações de consumo, bem como evitar eventual onerosidade excessiva.

Com relação ao registro do contrato convém gizar que a Resolução 807/20 do CONTRAN é clara e objetiva ao imputar a responsabilidade integral do agente financeiro para inclusão do gravame mediante simples meio eletrônico, in verbis:

Art. 9º Para o registro de contratos de financiamento com garantia real de veículo, a instituição credora deverá fornecer, por meio eletrônico, ao órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, ou à empresa registradora especializada por ele credenciada, os seguintes dados: I - tipo de operação realizada; II - número do contrato; III - identificação do devedor e do credor, contendo respectivos endereço, telefone e, quando possível, o endereço eletrônico (e-mail); IV - a descrição do veículo objeto do contrato e os elementos indispensáveis à sua identificação nos termos do CTB; V - o valor total da dívida ou sua estimativa; VI - o local e a data do pagamento; VII - a quantidade de parcelas do financiamento; e VIII - o prazo ou a época do pagamento; IX - taxa de juros, comissões cuja cobrança for permitida, cláusula penal e correção monetária, com a indicação dos índices aplicados, se houver.

§ 1º É vedado o envio das informações previstas no caput por outra empresa ou entidade que não seja a própria instituição credora ou a empresa registradora especializada credenciada.

Ademais, com relação à alienação fiduciária, o registro da garantia se trata de dever procedimental previsto na Lei nº 10.931/04, em seu art. 34, § 1º, que confere ao credor a faculdade do registro:

Art. 34. A garantia da obrigação abrangerá, além do bem principal constitutivo da garantia, todos os seus acessórios, benfeitorias de qualquer espécie, valorizações a qualquer título, frutos e qualquer bem vinculado ao bem principal por acessão física, intelectual, industrial ou natural.

§ 1o O credor poderá averbar, no órgão competente para o registro do bem constitutivo da garantia, a existência de qualquer outro bem por ela abrangido.

Sua cobrança, da mesma forma que ocorre com a tarifa de avaliação, deve estar sujeita a comprovação da efetiva prestação do serviço, bem como do exame de eventual onerosidade excessiva.

Tais entendimentos foram sedimentados pelo julgamento do REsp. repetitivo n. 1.578.553/SP – Tema 958/STJ ao fixar as seguintes teses:

2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a:

2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a

2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto.

No caso concreto, o montante pactuado referente ao registro de contrato (R$151,41) não se mostra excessivo, razão pela qual vai mantido conforme pactuado.

Compulsando o contrato acostado aos autos, verifico a existência do laudo de avaliação do bem (fl 56, dos autos físicos). No caso, o montante pactuado (R$392,00) não se mostra excessivo, razão pela qual vai mantido conforme ajustado.

SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA

Conforme restou definido no julgamento dos Recursos Especiais representativos de controvérsia nºs 1.639.259/SP e 1.639.320/SP – Tema 972/STJ: “Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada.”

Portanto, tanto a contratação de seguro pelo consumidor, quanto com qual seguradora contratar, devem ser uma opção a ele oferecida, sob pena de configurar-se venda casada, prática esta vedada pelo disposto no art. 39, I, do CDC.

No caso em comento, verifica-se que foi oportunizado ao consumidor que optasse pela contratação do seguro, porém tal contratação restou vinculada a uma seguradora pré-determinada pelo credor fiduciário, conforme se constata na fl. 55, dos autos físicos. Assim, verificada a venda casada, deve ser afastada sua pactuação.

IOF

No que se refere ao parcelamento do IOF, não se observa qualquer abusividade/ilegalidade, tendo em vista tratar-se de contratação entre o financiado (contribuinte) e a instituição financeira (responsável pela sua cobrança e recolhimento ao Tesouro Nacional).

O artigo 153, V, da Constituição...

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