Decisão Monocrática nº 50059868720218210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 06-02-2023
Data de Julgamento | 06 Fevereiro 2023 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50059868720218210021 |
Órgão | Vigésima Quarta Câmara Cível |
Tipo de documento | Decisão monocrática |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20002937435
24ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5005986-87.2021.8.21.0021/RS
TIPO DE AÇÃO: Bancários
RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR
APELANTE: JEFERSON MAURICIO TONIOLLO (AUTOR)
APELANTE: COOPERATIVA DE CREDITO POUPANCA E INVESTIMENTO INTEGRACAO DE ESTADOS DO RIO GRANDE DO SUL E SANTA CATARINA - SICREDI INTEGRACAO DE ESTADOS RS/SC (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de examinar apelações interpostas por JEFERSON MAURICIO TONIOLLO e por COOPERATIVA DE CREDITO POUPANCA E INVESTIMENTO INTEGRACAO DE ESTADOS DO RIO GRANDE DO SUL E SANTA CATARINA - SICREDI INTEGRACAO DE ESTADOS RS/SC em face da sentença que julgou parcialmente procedente ação declaratória de inexistência de débito com pedido de indenização por dano material e moral ajuizada por este contra aquele, cujo dispositivo foi redigido nos seguintes termos (Evento 30):
DISPOSITIVO
Isso posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por JEFERSON MAURICIO TONIOLLO em face de COOPERATIVA DE CREDITO POUPANCA E INVESTIMENTO INTEGRACAO DE ESTADOS DO RIO GRANDE DO SUL E SANTA CATARINA - SICREDI INTEGRACAO DE ESTADOS RS/SC para os fins de:
1) declarar a inexistência do débito questionado na inicial;
2) condenar o réu a restituição do valor de R$ 3.000,00, R$ 1.000,00 e R$ 1.000,00, na forma simples, corrigidos pelo IGP-M a contar de cada pagamento da fatura em que estavam inseridos, e acrescido de juros simples de mora em 1% ao mês a contar da citação.
Outrossim, diante da sucumbência recíproca, condeno ambas as partes a arcarem com as custas processuais na proporção metade para cada parte, bem como a pagarem honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, que estabeleço em 20% do valor da condenação a favor do procurador do autor e R$1.000,00 para os advogados dos réus, observada a gratuidade judiciaria deferida ao autor.
Publique-se.
Intimem-se.
Em razões recursais, a parte autora postula a reforma da sentença recorrida no tocante à indenização por danos morais e à devolução em dobro do valor debitado indevidamente. Ressalta que, sendo indevidas as quantias debitados no seu cartão de crédito e débito, cabível a repetição em dobro do indébito. Discorre sobre o entendimento encampado pelo Superior Tribunal de Justiça quando do julgamento do EAREsp 676.608/RS, no sentido de que desnecessária a configuração de má-fé para que seja determinada a repetição em dobro. Pugna pela condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais em decorrência dos prejuízos que alude ter suportado. Requer o redimensionamento dos ônus sucumbenciais, a fim de que a parte ré seja condenada ao pagamento da integralidade destes, bem como a fixação de honorários sucumbenciais no percentual de 20%. Pede provimento (Evento 35).
A parte ré, por sua vez, assevera que o autor possui cartão de crédito/débito vinculado a sua conta corrente. Pondera ter demonstrado nos autos que o demandante solicitou o bloqueio de seu plástico no dia subsequente, 08/02/2021, quando o associado a procurou para informar sobre a ocorrência das transações por ele impugnadas, efetivadas no dia anterior, 07/02/2021. Salienta que as operações questionadas no feito foram realizadas mediante a utilização da tarjeta da parte autora e da aposição de sua senha pessoal. Explana que o bloqueio do cartão poderia ter sido efetuado pela internet ou por intermédio do aplicativo do Sicredi, o qual argumenta que era utilizado pelo demandante. Enfatiza que o cartão em questão permaneceu na posse do autor. Reitera que, tendo o bloqueio sido efetivado tardiamente, somente no dia 08/02/2021, data posterior às transações reputadas indevidas, não há falar na responsabilização do banco réu. Requer a reforma da sentença recorrida, a fim de ser julgada improcedente a demanda.
Foram apresentadas contrarrazões pela parte autora (Evento 94) e pela parte ré (Evento 95).
É o relatório.
VOTO
Os recursos interpostos pela parte autora (Evento 35) e pela parte ré (Evento 36) são tempestivos, pois o prazo para recorrer da sentença iniciou em 06/06/2022 e findou em 27/06/2022 (Eventos 31 e 32), sendo que os recursos foram interpostos em 25/06/2022 e 27/06/2022, respectivamente. Além disso, a parte autora é beneficiária da gratuidade judiciária (Evento 4), sendo dispensada do preparo recursal. A parte ré, por sua vez, efetuou o preparo de sua apelação (Evento 34). Dessa forma, recebo os recursos e passo ao exame das inconformidades, iniciando pelo apelo do réu, porquanto mais abrangente e prejudicial ao recurso da parte autora.
RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. INOCORRÊNCIA.
Verifico que a petição inicial traz hipótese de operações realizadas com o cartão de crédito de titularidade da parte autora, ao que tudo indica, de maneira fraudulenta, pois negada, na inicial, a realização das operações.
Importa destacar que a instituição financeira administradora do cartão de crédito deve responder por eventuais danos causados ao cliente em decorrência de fraudes praticadas por terceiros - risco do empreendimento -, salvo se provar a ocorrência de uma das causas que excluem o próprio nexo causal, enunciadas no § 3º do art. 14 do CDC, quais sejam, a inexistência do defeito (falha na prestação do serviço) e a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Esta é, aliás, a orientação do Superior Tribunal de Justiça decorrente do julgamento do Recurso Especial n. 1.199.782/PR, conforme incidente de processo repetitivo, in verbis:
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS. DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS
RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FORTUITO INTERNO. RISCO DO EMPREENDIMENTO. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno. 2. Recurso especial provido. (REsp 1199782/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/08/2011, DJe 12/09/2011). – grifei.
Acerca do tema, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº. 479, cujo enunciado, por oportuno, ora transcrevo, in verbis:
As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.
Especificamente sobre o caso ora analisado, destaca Sergio Cavalieri Filho que:
Se os riscos do negócio correm por conta do empreendedor, forçoso será então concluir que, à luz do Código do Consumidor, o furto, o roubo ou o extravio do cartão de crédito é risco do empreendimento, e, como tal, corre por conta do emissor. O titular do cartão só poderá ser responsabilizado se ficar provada a sua culpa exclusiva pelo evento, consoante § 3º, II, do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor1.
No caso em comento, entendo que a parte requerida logrou êxito em demonstrar a inexistência do defeito (falha na prestação do serviço), ônus que lhe competia.
Da análise da inicial, denota-se que o autor defende que seu cartão de crédito/débito foi clonado, tendo sido utilizado para realização de despesas que desconhece, uma a débito, no valor de R$ 3.000,00 e duas a crédito, no montante de R$ 1.000,00.
Assim, pleiteia a parte autora sejam declarados inexistentes os débitos lançados em sua tarjeta decorrentes dos gastos em discussão, bem como a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais e materiais.
Entretanto, da análise da documentação colacionada aos autos, tenho que, a despeito da disciplina prevista no art. 373, I, do CPC, inexiste prova mínima a amparar a tese defendida pelo autor, de que seu cartão fora clonado e utilizado indevidamente por terceiro de má-fé para a realização das despesas que não reconhece.
Nota-se que as transações controvertidas pelo demandante afastam conclusão de que fora vítima de golpe, porquanto efetuadas de forma presencial, isto é, mediante a apresentação da via física do cartão de crédito/débito do autor e a aposição de sua senha pessoal, consoante se observa da documentação coligida pela parte ré com a contestação.
Outrossim, depreende-se que os gastos ora debatidos destoam do perfil de fraude, de diversas operações em curto espaço de tempo, uma vez que sequer comprometeram os limites de crédito de que o autor dispunha, notadamente porque sua conta corrente, mesmo após o débito da transação de R$ 3.000,00 por ele impugnada, registrou saldo positivo de R$ 9.261,11 (Evento 1- Extr8).
Ademais, insta consignar que o própria demandante demonstra que o plástico em que efetuadas as despesas permaneceu em sua posse, vez que coligiu documento com cópia do plástico com a exordial (Evento 1 - Out7), circunstância que corrobora a conclusão de que fora ele mesmo quem os efetivou ou pessoa por ele autorizada, devidamente munida com o seu cartão de crédito e de sua senha pessoal.
Anota-se que a alegação trazida pelo autor na exordial, de que estaria em sua residência, no dia 07/02/2021, quando foi realizada a transação com seu cartão de débito no valor de R$ 3.000,00, não tem o condão de ensejar qualquer indício de fraude, visto que, como suficientemente provado pela parte ré, tal despesa foi realizada de forma presencial, pelo autor ou por outrem por ele autorizado a efetuar a aludida operação, às 19h05min do dia 07/02/2021(Evento 17 - Out3):
Como referido pela parte ré, o fato...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO