Decisão Monocrática nº 50061089420218210023 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 07-06-2022

Data de Julgamento07 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50061089420218210023
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002211664
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5006108-94.2021.8.21.0023/RS

TIPO DE AÇÃO: Abandono Intelectual

RELATOR(A): Des. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. COMPROVADA SITUAÇÃO DE FALTA DE CONDIÇÕES DA GENITORA E DA FAMÍLIA EXTENSA, FACE OMISSÃO E NEGLIGÊNCIA, HAVENDO RISCO À MENOR, CORRETA A DETERMINAÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. SENTENÇA MANTIDA. MEDIDA QUE MELHOR ATENDE À PROTEÇÃO E AO INTERESSE DO MENOR.

Evidenciado que a genitora não reúne condições para garantir o desenvolvimento sadio da menor, não ostentando qualidades mínimas para o desempenho do poder familiar, assim como a família extensa, face omissão e negligência constatada de todos, especialmente pelo uso de drogas e envolvimento com a criminalidade, inexistindo possibilidade de reintegração familiar, prevalecendo os princípios da proteção integral, da prioridade absoluta e do melhor interesse da criança, correta a sentença de procedência da ação para destituir o poder familiar da genitora.

Precedentes do TJRS.

Apelação desprovida.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de apelação interposta por SHERON V. DE O. em face da sentença que julgou procedente a ação de destituição do poder familiar, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, em favor de KYARA V. DE O., conforme dispositivo abaixo transcrito:

"(...).

Em face do exposto, forte no artigo 24 do ECA c/c o artigo 1638, inciso II, do Código Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido para decretar a perda do poder familiar de Sheron V. de O. em relação à filha Kyara V. de O., confirmando a liminar que suspendeu o poder familiar, julgando extinto o feito com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Sem custas, em face da isenção legal do artigo 141, §2°, do ECA.

Em relação ao pedido de inserção antecipada no SNA, ainda que tenha sido sugerido pela equipe técnica da instituição na última audiência concentrada, bem como tenha sido requerido pelo Ministério Público em memorial, por cautela, deixo de antecipar a tutela para deferir a inserção, haja vista que está em tramitação neste juízo ação de guarda em que a avó materna postula a guarda dos netos Kyara e Brayan e, deste modo, entendo prudente aguardar o julgamento de eventual recurso interposto pela avó ou pela requerida.

Com o trânsito em julgado desta sentença, façam-se as anotações necessárias e expeça-se mandado de averbação da decretação da perda do poder familiar da genitora à margem do registro de nascimento da protegida, nos termos do que determina o parágrafo único, do art. 163, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Ainda, expeça-se PPA e voltem os autos conclusos para deliberação.

Saliento que eventual recurso, deverá ser recebido somente no efeito devolutivo, nos termos do art. 199-B do ECA.

Remeta-se cópia desta sentença à instituição onde está acolhida a menina.

Por fim, junte-se cópia desta sentença nos autos da medida protetiva de acolhimento institucional.

(...)."

Em suas razões recursais, a apelante sustenta que a perda do seu poder familiar não é a solução mais adequada à situação posta nos autos. De início, a agravante ressalta não se extrair, da análise da prova constante nos autos, de que tenha havido, de sua parte, abandono e negligenciamento deliberado da filha. Observa que, em verdade, o que se identifica, in casu, é a carência de uma mãe desprovida de recursos financeiros. Pondera, pois, que a situação que gerou a violação de direitos da infante se deu exclusivamente em virtude de extrema vulnerabilidade social e hipossuficiência econômica familiar, o que não pode, por si só, demonstrar a incapacidade protetiva da genitora, até porque mesmo diante de todas as dificuldades, SHERON demonstra inequívoco interesse em reaver a guarda da menor, empreendendo esforços para se reestruturar e estar apta a se responsabilizar pelos cuidados da infante.

Vai além. Salienta não terem sido esgotadas as tentativas de reintegração da infante no seio da família de origem, restando evidente que a genitora necessita de suporte assistencial para restabelecer-se e, então, reunir condições para retomar a guarda em questão. Tece considerações mais acerca de sua dependência química, que foi aventada no julgamento. No ponto, esclarece ser, esta questão, considerada uma doença crônica, devendo, portanto, ser tratada como enfermidade e não como mero descaso da genitora em cuidar de si mesma e da menina. Cita em seu favor as disposições dos art. 100, X; e art. 19, ambos do ECA.

Assim, ao afirmar a excepcionalidade da suspensão e destituição do poder familiar, em observância ao princípio da manutenção dos vínculos familiares, postula pela reforma da sentença, de maneira a ser julgada integralmente improcedente a presente demanda, nos termos do art. 23 do ECA.

Foram apresentadas contrarrazões.

Em parecer, o Ministério Público opina pelo desprovimento do apelo.

É o relatório.

Efetuo o julgamento na forma monocrática, forte no art. 206, XXXVI, do RITJRS, combinado com o art. 932, VIII, do CPC.

O presente apelo não merece provimento, observadas as disposições legais e a orientação jurisprudencial a respeito do tema.

No tocante ao poder familiar, assim dispõem os artigos 1.634, 1.637 e 1.638, todos do Código Civil:

Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

I - dirigir-lhes a criação e educação;

II - tê-los em sua companhia e guarda;

III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;

IV - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

V - representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

VI - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

VII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.

(...)

Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.

Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:

I - castigar imoderadamente o filho;

II - deixar o filho em abandono;

III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;

IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, em seus artigos 22 e 24, assim dispõe:

Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.

Art. 24. A perda e a suspensão do pátrio poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22.

Em face de tais normas, observo que a prova dos autos revela, sem sombra de dúvida, que a genitora não possui condições de assumir responsabilidades em relação à proteção da menor, cujo melhor interesse deve ser priorizado, confirmando-se a sentença.

Compulsando os autos, constato que Kyara conta atualmente com 1 ano e 6 meses de idade (nasc. 02.11.2020 - evento 1, anexo 2, pg. 109 dos autos eletrônicos, do processo de origem).

A partir do exame das informações prestadas pela equipe diagnóstica da casa de passagens, onde os filhos da demandada foram acolhidos, percebe-se a grave situação que envolve a bebê (evento 1, anexo 2, pg. 90/91 dos autos eletrônicos, do processo de origem):

"(...).

Em conversa com Sheron, a mesma relatou que verbalizou no hospital que havia feito uso de substâncias psicoativas alguns dias antes do nascimento da filha, mas que não é dependente química. Sheron refere que entende não estar organizada para assumir os cuidados dos filhos, que precisaria de suporte da família e dos genitores dos filhos.

(...).

Em contato com o suposto genitor Paulo Correa, o mesmo referiu que não tem como assumir os cuidados com a filha, pois reside cerca de 60km distante da cidade, e sozinho, não demonstrando nenhum tipo de sentimento pela filha, deixando claro que a menina não é responsabilidade dele, não dando importância ao fato da RN possivelmente ser acolhida institucionalmente.

(...).

Foi realizada conversa conjunta com Sheron, genitora das crianças, e Iasmin Vaz de Oliveira, tia materna . Iasmin se disponibilizou a dar suporte para a irmã, porém, há indícios de que Iasmin esteja envolvida com atos ilícitos, chegando a ser detida no dia 20/11/2020 junto de seu companheiro.

(...)."

Igualmente, dos documentos constantes no evento 1, ANEXO 2, pgs. 101 e 113 dos autos eletrônicos, do processo de origem, extrai-se as informações de que a menor foi entregue à instituição acolhedora, com quadro de candidíase; e que vem sendo acompanhada por pediatra infectologista, devido sua exposição à sífilis.

De se chamar a atenção, também, para as observações relativas à família de Kyara, levadas a efeito pelo Plano Individual de atendimento (PIA - evento 1, ANEXO 2, pg. 134 dos autos eletrônicos, do processo de origem) :

"(...).

Família materna com histórico de envolvimento com atos ilícitos e uso de drogas;

Dinâmica familiar materna com comportamento violento;

Genitora usuária de drogas sem...

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