Decisão Monocrática nº 50067562220218210008 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 06-02-2023

Data de Julgamento06 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50067562220218210008
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002123683
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara CÃvel

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação CÃvel Nº 5006756-22.2021.8.21.0008/RS

TIPO DE AÇÃO: Cartão de Crédito

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: JAQUELINE PALHARES CARDOSO (AUTOR)

APELADO: HIPERCARD ADMINISTRADORA DE CARTÕES (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por JAQUELINE PALHARES CARDOSO em face da sentença prolatada nos autos da ação de revisão de cláusulas contratuais em que contende com HIPERCARD ADMINISTRADORA DE CARTÕES S/A. Constou na sentença apelada (Evento 50):

Â

Assim, considerando a inépcia da petição inicial, não emendada pela parte autora, INDEFIRO A PETIÇÃO INICIAL, julgando extinto o processo, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, I, do CPC.

Taxa Única e eventuais despesas processuais pela parte autora, suspensa a exigibilidade por ser beneficiária da gratuidade processual.

Intime-se.

Transitada em julgado, dê-se baixa.

Â

Em suas razões recursais (Evento 53), a parte autora alega que a petição inicial da ação revisional não é inepta, pois cumpre todos os requisitos do artigo 330 do CPC. Salienta que a apresentação do contrato objeto da demanda não constitui um requisito legal para o ajuizamento da ação. Ressalta que não obteve acesso ao contrato na seara administrativa. Assevera ter fornecido todos os documentos que estavam a seu alcance. Sustenta que não pode ter o seu direito de ação obstaculizado em decorrência da ausência de fornecimento de documentos pela parte ré. Alega que o recebimento da inicial é necessário para facilitação da defesa dos seus interesses como consumidor. Requer, ao final, a desconstituição da sentença, a fim de que o feito tenha o seu regular prosseguimento.

Mantida a decisão pela Julgadora singular por seus próprios fundamentos (Evento 58).

Foram apresentadas contrarrazões no Evento 69.

É o relatório.

VOTO

A presente apelação, interposta no Evento 53, é tempestiva, pois o prazo para recorrer da sentença iniciou em 12/04/2022 e findou em 04/05/2022 (Evento 51) e o recurso foi interposto em 04/05/2022 (Evento 53). Além disso, a parte apelante resta dispensada do recolhimento do preparo, tendo em vista que é beneficiária da gratuidade da justiça (Evento 10).Â

Dessa forma, considerando que é própria e tempestiva, recebo a apelação.

Vejamos.

Com efeito, conforme se depreende do art. 330, § 2º, do CPC, cumpre à parte autora indicar de forma precisa, na inicial, quais contratos/operações pretende revisar, indicando as cláusulas que entende abusivas, bem como quantificando o valor incontroverso, sob pena de inépcia da inicial. Vejamos.

Â

Art. 330. A petição inicial será indeferida quanto:

I – for inepta;

[...]

§ 2º Nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens, o autor terá de, sob pena de inépcia, discriminar na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de quantificar o valor incontroverso do débito.

§ 3º Na hipótese do § 2º, o valor incontroverso deverá continuar a ser pago no tempo e modo contratados. (grifei)

Â

As determinações do diploma têm por intuito evitar o ajuizamento de ações genéricas, razão pela qual o pedido deve ser certo e determinado, sendo atribuição da parte autora apontar com clareza e objetividade sua insurgência.

Acerca do tema, esclarecem Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogério Licastro Torres de Mello1:

Â

[...] Entretanto, houve um equÃvoco cometido nos primeiros tempos de aplicação do Código de Defesa do Consumidor: o de se pressupor estar diante de um contrato com cláusulas necessariamente abusivas, tão somente pela desigualdade das posições das partes, na formação do contrato de adesão. Talvez, por essa razão, em muitas dessas ações em que o autor se dizia hipossuficiente, obtinha liminarmente a suspensão de certas cláusulas contratuais. Essas liminares foram concedidas, não raras vezes, em razão do simples ingresso em juÃzo para discussão do contrato de adesão celebrado, como decorrência de uma espécie de presunção de que o contrato, por ser de adesão, conteria cláusulas abusivas. 4.5. Muitas dessas ações foram ajuizadas sem um mÃnimo de fundamento fático ou jurÃdico, no intuito exclusivo de protelar o cumprimento de obrigações contratuais, sendo evidente a má-fé (processual e contratual) por parte desses autores. Não é difÃcil prever o impacto negativo dessa prática, em todo o sistema de captação de recursos e, em última análise, para próprio tomador de crédito, diante da elevação do custo da intermediação financeira e consequente redução da oferta do crédito. 4.6. O histórico de leis e decisões para combater esta situação começou em 2004 (Lei 10.931/2004, tendo havido inúmeras decisões relevantes e acabou por desembocar na inclusão de dispositivo de igual conteúdo no CPC/73). 4.7. A decretação da inépcia da petição inicial dessas ações destituÃdas de fundamento jurÃdico, com pedido genérico,17 já era a solução prevista pelo sistema jurÃdico, nos termos dos arts. 286 e 295, parágrafo único, ambos do CPC/73, ou seja, mesmo antes da inclusão do art. 285-B do CPC/73. Assim, ao invés de, indevidamente, se relegar a análise da fundamentação mÃnima do pedido do autor para a instrução processual, as ações devem ser extintas ab initio, por inépcia da inicial, desde que, tendo-se dado ao autor a oportunidade de emendar a petição inicial (art. 321 do NCPC), não fosse atendido o comando judicial.18 4.8. Além dessas regras processuais, a conduta dos autores de má-fé já poderia, e pode, ser devidamente afastada, pela aplicação do princÃpio da boa-fé, que orienta todas essas normas processuais e rege os contratos. (grifei)

Â

Há que ressaltar que o valor incontroverso não pode ser aleatório, devendo ser demonstrado mediante memória de cálculo, discriminando os contratos e os valores efetivamente recebidos em cada operação na qual se busca a revisão, com a incidência dos encargos legais embasados nas súmulas e jurisprudência do STJ.

No caso...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT