Decisão Monocrática nº 50070617320168210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 10-08-2022

Data de Julgamento10 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50070617320168210010
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002583289
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5007061-73.2016.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Material

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA

APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU)

APELADO: TERESINHA DE SALETE KURTZ (AUTOR)

RELATÓRIO

De início, adoto o relatório da sentença (fls. 225/230v.):

TERESINHA DE SALETE KURTZ ajuizou a presente ação ordinária contra BANCO BMG S.A., postulando a declaração de inexistência de débito para com a demandada, bem como a repetição dos valores indevidamente descontados do seu benefício previdenciário. Pediu, ainda, a condenação da ré ao pagamento de indenização pelos danos morais que alega ter sofrido.

Em sede de tutela antecipada, pediu que fosse cancelada a inscrição do seu nome nos cadastros de proteção ao crédito.

Afirmou que tomou conhecimento de que o réu passou a a descontar valores no seu benefício previdenciário, negando ter celebrado qualquer contato com o demandado. Alegou que tentou resolver a questão administrativamente, sem êxito.

Com a inicial, foram juntados aos autos os documentos das fls. 12-29.

A decisão das fls. 30-31 deferiu o pedido feito em sede de tutela de urgência.

Citado, o demandado apresentou contestação, suscitando a falta de interesse de agir da autora, alegando que não foi demonstrado o dano sofrido. Quanto ao mérito, alegou que celebrou contrato de cartão de crédito com a autora, que utilizou o cartão para pagar compras feitas no mês de maio de 2016. Disse que o valor contratado foi devidamente depositado na conta da autora. Sustentou não ter praticado ato ilícito, não havendo dano moral a ser indenizado.

Juntou documentos às fls. 88-100.

Réplica às fls. 62-75.

Vieram os autos conclusos para sentença.

A Dra. Juiz de Direito sentenciou o feito nos seguintes termos:

ISSO POSTO, confirmo a tutela de urgência anteriormente deferida, determinando a exclusão definitiva do nome da autora dos cadastros de proteção ao crédito. Julgo procedentes os pedidos para declarar a inexistência de débito da autora para com o demandado, condenando o réu à repetição, em dobro, dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da autora, corrigos pelo IGP-M e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar de cada desconto feito pelo requerido. Condeno, ainda, o réu ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) à autora, a titulo de indenização pelos danos morais sofridos. Tal valor deverá ser corrigido pelo IGP-M, desde esta data, bem como acrescido de juros de mora de 1% ao mês, desde a data da inscrição nos cadastros de proteção ao crédito, em razão de se tratar de ato ilícito.

Ambas as partes apresentaram Embargos de Declaração (fls. 232/234 e 235/236), os quais foram rejeitados (fl. 244/v.).

O réu apelou (fls. 245/258). Juntou comprovante de devolução dos valores e discorreu sobre a admissibilidade da prova documental após sentença. Asseverou ter resolvido administrativamente a questão, de modo que não houve pretensão resistida, e que, por isso, a autora carece de interesse de agir. Defendeu a nulidade da sentença por ser ultra petita, porquanto o pedido indenizatório se limitou a R$ 5.000,00 e a condenação se deu em R$ 100.000,00. Apesar de reconhecer a existência de fraude, destacou ter procedido de boa-fé, inclusive absorvendo todos os prejuízos do evento, que é de responsabilidade exclusiva do terceiro fraudador. Ressaltou ter devolvido administrativamente os valores descontados, pelo que inexistem danos materiais, sendo descabida a condenação para restituição. Alegou ainda que a requerente confunde “EMPRÉSTIMO SOBRE A RMC” com “RESERVA DE MARGE CONSIGNÁVEL” ao cobrar a restituição sobre ambas as rubricas, mas que só a primeira representa valores efetivamente descontados. Pontuou que os danos morais alegados não foram comprovados, bem como que o valor fixado para a indenização não observou os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Discorreu também sobre a exorbitância dos honorários advocatícios arbitrados na origem. Alegou a inadequação do IGP-M para corrigir o valor das condenações. Pediu a improcedência da demanda. Subsidiariamente, pugnou pela redução do montante indenizatório, pela compensação das condenações com o valor já restituído, pela redução dos honorários advocatícios e pela substituição do índice de correção monetária para o INPC. Requereu ainda a conversão do julgamento em diligência para confirmar a devolução administrativa dos valores.

A apelada apresentou contrarrazões (fls. 266/273).

Subiram os autos.

É o relatório.

VOTO

Colegas,

O recurso merece parcial provimento, no quanto conhecido.

Das preliminares

a) do não conhecimento parcial do recurso

Ao contestar a demanda, o réu simplesmente defendeu a regularidade do negócio, tomando como pressuposto a autenticidade do contrato; não apresentou fundamentos subsidiários.

De outra sorte, ao apelar, o requerido acatou a fraude reconhecida pelo Juízo sentenciante e a partir dela erigiu suas razões recursais. Esse cenário, todavia, não fora considerado em contestação, de modo que todos os argumentos a ele conexos caracterizam inovação recursal; é o caso das questões atinentes à culpa exclusiva de terceiro e ao agir diligente e de boa-fé.

Pelo princípio da eventualidade, incumbia ao réu alegar em contestação a totalidade de sua defesa, como se vê:

Art. 336. Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir.

Logo, a matéria arguida fora do momento oportuno não pode ser conhecida por este órgão recursal, sob pena de suprimir a análise pelo julgador de piso e de cercear o contraditório da parte autora.

Remanescem em exame as questões já trazidas na contestação, relativas à repetição do indébito e à indenização por danos extrapatrimoniais.

b) da nulidade da sentença

Não há de se falar em nulidade da sentença por julgamento ultra petita.

Conforme se depreende da exordial, a autora pediu indenização por danos morais nos seguintes termos (fl. 09):

5) A fixação da indenização do dano moral suportado pela parte autora, em valor a ser fixado por V. Excelência, em patamar não inferior à R$ 5.000,00 (cinco mil reais), em conformidade ao artigo 292, inciso V do CPC/15, acrescida dos acréscimos a que faz jus e corrigida monetariamente até data da sentença condenatória.

Já a sentença assim arbitrou (fl. 230 verso):

ISSO POSTO, confirmo a tutela de urgência anteriormente deferida, determinando a exclusão definitiva do nome da autora dos cadastros de proteção ao crédito. Julgo procedentes os pedidos para declarar a inexistência de débito da autora para com o demandado, condenando o réu à repetição, em dobro, dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da autora, corrigos pelo IGP-M e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar de cada desconto feito pelo requerido. Condeno, ainda, o réu ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) à autora, a titulo de indenização pelos danos morais sofridos.

"Ora", tem-se que o valor indicado pela demandante foi apenas mera sugestão quanto ao montante indenizatório postulado, tanto é assim que há referência de ser fixado "em patamar não inferior", pelo que não configurado julgamento ultra petita a partir do arbitramento de danos morais em quantia que ultrapassou o montante referencial.

Sobre o tema, já tive a oportunidade de manifestar:

Ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. OFENSAS E ACUSAÇÕES EM LOCAL DE TRABALHO. CONDUTA ILÍCITA. PROVA TESTEMUNHAL. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS PENAL E CIVIL. DANOS MORAIS. CABIMENTO. QUANTUM. (...) 4. Ausência de julgamento extra petita. Pleito de indenização "não inferior" a determinado valor. Além disso, "Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca." Súmula nº. 326 do STJ. (...) NEGARAM PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 70071512776, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em: 30-03-2017)

Na mesma linha, julgados do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. REVISÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. VALOR DA INDENIZAÇÃO. PEDIDO. CONDENAÇÃO. QUANTUM DEBEATUR INFERIOR AO PEDIDO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. NÃO OCORRÊNCIA. SÚMULA N. 326/STJ. SUBSISTÊNCIA NO CPC/2015. RECURSO DESPROVIDO.
(...)
3. O valor sugerido pela parte autora para a indenização por danos morais traduz mero indicativo referencial, apenas servindo para que o julgador pondere a informação como mais um elemento para a árdua tarefa de arbitrar o valor da condenação.
(...)
5. Recurso especial a que se nega provimento.
(REsp n. 1.837.386/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 23/8/2022.)

AGRAVO REGIMENTAL - AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - RESPONSABILIDADE CIVIL - RESOLUÇÃO DE CONTRATO DE ALUGUEL DE SALÃO DE FESTAS - DANOS MATERIAIS E MORAIS - JULGAMENTO MONOCRÁTICO - POSSIBILIDADE - FALTA DE PREQUESTIONAMENTO - JULGAMENTO ULTRA PETITA - INOCORRÊNCIA - QUANTUM INDENIZATÓRIO - MANUTENÇÃO - DECISÃO AGRAVADA MANTIDA - IMPROVIMENTO.
(...)
3.- In casu, a Agravada, na petição inicial, não discriminou expressamente os valores a serem pagos a título de dano moral, havendo somente o pedido de condenação pelos danos causados, "em valor a ser prudentemente arbitrado por V. Exa., que desde já requer não seja inferior a R$ 6.200,00 (seis mil e duzentos reais)" (e-STJ fls. 14). Portanto, não houve julgamento extra petita; nem é...

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