Decisão Monocrática nº 50075554520208210026 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 05-04-2022

Data de Julgamento05 Abril 2022
ÓrgãoSétima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50075554520208210026
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001992710
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5007555-45.2020.8.21.0026/RS

TIPO DE AÇÃO: Maus Tratos

RELATOR(A): Des. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMENTA

apelação cível. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. COMPROVADA SITUAÇÃO DE FALTA DE CONDIÇÕES DOS GENITORES E Da avó/bisavó materna e avós paternos, FACE OMISSÃO E NEGLIGÊNCIA, HAVENDO RISCO AO MENOR, CORRETA A DETERMINAÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. SENTENÇA MANTIDA. MEDIDA QUE MELHOR ATENDE À PROTEÇÃO E AO INTERESSE DO MENOR.

Evidenciado que os genitores não reúnem condições para garantir o desenvolvimento sadio do filho menor, não ostentando qualidades mínimas para o desempenho do poder familiar, assim como a avó e bisavó materna e avós paternos avós do menor, face omissão e negligência constatada de todos, inclusive sendo a mãe portadora de transtornos psicológicos definitivos, inexistindo possibilidade de reintegração familiar, prevalecendo os princípios da proteção integral, da prioridade absoluta e do melhor interesse da criança, correta a sentença de procedência da ação para destituir o poder familiar dos genitores.

Precedentes do TJRS.

Apelação desprovida.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de apelação interposta por ANA CLÁUDIA DE O. G. em face da sentença que julgou procedente a ação de destituição do poder familiar manejada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, em defesa do menor EZEQUIEL G. DE C..

Em suas razões recursais, a recorrente, inicialmente, invoca a disposição do art. 19 do ECA, de forma a assentar a ideia de que toda a criança tem o direito de ser criada e educada no seio da sua família biológica e, apenas excepcionalmente, em lar substituto, sendo esta última alternativa somente autorizada quando houver prova inequívoca de uma das causas contempladas no art. 1638 do CCB c/c art. 24 do ECA. No caso concreto, deixa claro que, por ser a mãe; e por seu quadro de saúde psicológica encontrar-se estável, já que assídua no tratamento, habilitada está a reaver a guarda de seu filho Ezequiel. Refere que, hoje, recebe o apoio de sua mãe e sua avó para manter-se plena. Cita depoimentos prestados em audiência por pessoas que deram boas referências da autora e da avó e bisavó no que tange aos cuidados com os menores. Pondera que, apesar de reconhecer o enfrentamento de alguns percalços em seu trato com suas crianças, não restou comprovado que os menores, especialmente, Ezequiel, tenham sido vítimas de violência ou maus tratos ou que lhes tenha faltado cuidados de higiene e de alimentação. Neste passo, conclui que a melhor solução para o caso é que o pedido de destituição do poder familiar seja afastado, ensejando o desacolhimento do menino em favor da genitora. Subsidiariamente, requer que a guarda do infante seja outorgada à avó materna, a qual, apesar de ter sido denunciada por prática de "Exploração sexual de pessoa menor de idade", restou absolvida no processo respectivo, em razão da insuficiência de provas.

Foram apresentadas contrarrazões e parecer pelo Ministério Público, oportunidades em que se manifestou pela necessidade de desprovimento do apelo.

É o relatório.

Efetuo o julgamento na forma monocrática, forte no art. 206, XXXVI, do RITJRS, combinado com o art. 932, VIII, do CPC.

A apelação não merece provimento, observadas as disposições legais e a orientação jurisprudencial a respeito do tema.

Com efeito, a destituição do poder familiar consiste em retirar de algum dos familiares a função ou a autoridade de que era investido pelo conjunto de direitos e deveres que traduzem o dever de criar, educar, cuidar, dar assistência material e emocional, enfim, proporcionar saúde física e psíquica ao filho, para que ele possa ter autonomia e possa ser sujeito de sua própria vida, e, quando os pais deixam de cumprir suas funções, podem ser destituídos do poder familiar, em atenção ao princípio do melhor interesse da criança, servindo também a destituição como instrumento para proteger a formação e desenvolvimento do menor, afastando pai e mãe na hipótese de a gravidade do caso exigir tal providência, conforme lição de Rodrigo da Cunha Pereira, in Dicionário de Direito de Família e Sucessões: ilustrado, p. 226, São Paulo, Saraiva, 2015, observados os arts. 1.634 e 1.638, do Código Civil e 22 e 24, do ECA, ora colacionados:

Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos: (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

I - dirigir-lhes a criação e a educação; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

II - exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

IV - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

V - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

VI - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

VII - representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

VIII - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; (Incluído pela Lei nº 13.058, de 2014)

IX - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. (Incluído pela Lei nº 13.058, de 2014)

(...)

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:

I - castigar imoderadamente o filho;

II - deixar o filho em abandono;

III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;

IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

V - entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção. (Incluído pela Lei nº 13.509, de 2017)

(...)

Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.

(...)

Art. 24. A perda e a suspensão do pátrio poder poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009)

Como se vê, inúmeras podem ser as causas que justifiquem a perda do poder familiar, salientando-se “As vidas desregradas dos pais, cujos comportamento são imorais ou criminosos, ordem expor o filho menor a situações e a ambientes promíscuos e inadequados à sua idade e à condição de um ser e processo de formação. Tal conduta desrespeitosa para com o desenvolvimento psíquico do filho poderá acarretar a perda da autoridade parental.”, conforme Curso de Direito da Criança e do Adolescente, Aspectos teóricos e práticos, Coordenação de Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel, P. 180-, 3ª edição, Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009, pp. 180-181.

Em relação ao abandono previsto no inciso II do art. 1.638 do CC, colaciono trecho da obra Curso de Direito da Criança e do Adolescente. Aspectos teóricos e práticos, com Coordenação de Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel, pp. 180-182, 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009:

O abandono de filho menor de família brasileira de baixa renda deve ser examinado com muita cautela pelos operadores da lei. Lamentavelmente, mas notória, é a desassistência de milhares de famílias pelo Poder Público em nosso País, redundando em desemprego dos pais, fome e miséria dos filhos.

(...)

Com efeito, a negligência significa a omissão dos pais em prover as necessidades básicas para o desenvolvimento do filho. O abandono físico, hodiernamente, tem-se utilizado instrumentos processuais que compelem os genitores a assistir material e imaterialmente a prole

(...)

Impende destacar que a tipificação do abandono deve ser robustamente comprovada, seja intelectual ou material (...)”

Compulsando os autos, vê-se que se trata de ação de destituição do poder familiar movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra os recorrentes, em favor do menor EZEQUIEL.

A inicial menciona que no momento da instauração do procedimento administrativo, envolvendo os menores Ezequiel e Marcela, estariam sob os cuidados da mãe, usuária de drogas e portadora de problemas psiquiátricos (transtorno bipolar com episódios maníacos e sintomas psicóticos), não adepta aos tratamentos prescritos pelo CAPS II, condições que geravam risco à vida, a saúde e a integridade dos menores (irmãos).

Relata, a título exemplificativo, que o Conselho Tutelar, em 16 de janeiro de 2019, foi acionado pela Brigada Militar para atender "um caso de agressão contra criança", oportunidade em que Marcela teria verbalizado que: 1) "correu para a casa da avó, pois sua mãe estava lhe agredindo pelo motivo de não querer ler a bíblia naquele momento"; 2) "sua mãe bate no seu irmão" no momento do banho em razão do bebê chorar; 3) "apanham por todo e qualquer motivo e que não quer mais morar com a mãe."

Observado, igualmente, a falta de condições da avó e bisavó materna de cuidarem dos infantes, por motivos de briga com a genitora e por afastamento de uma delas, por vezes, da cidade onde moram os infantes, estando clara a falta de comprometimento, especialmente no tocante à vó, em relação aos netos.

Mais, aduz a impossibilidade, do pai do menino e respectiva...

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