Decisão Monocrática nº 50090548320188210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Terceira Câmara Cível, 21-01-2022

Data de Julgamento21 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50090548320188210010
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoVigésima Terceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001442068
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

23ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5009054-83.2018.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Cartão de Crédito

RELATOR(A): Des. ALBERTO DELGADO NETO

APELANTE: ARACI VITORINA DA SILVA (AUTOR)

APELADO: BANCO AGIBANK S.A (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. AFASTAMENTO DA MORA COMPENSAÇÃO OU REPETIÇÃO DE INDÉBITO.

JUROS REMUNERATÓRIOS. OS JUROS REMUNERATÓRIOS, EM REGRA, NÃO ESTÃO LIMITADOS A 12% AO ANO, NOS TERMOS DA SÚMULA N. 596/STF. ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS NÃO É APLICÁVEL A LEI DE USURA. POSSÍVEL A REVISÃO CONTRATUAL NA HIPÓTESE DE OS JUROS REMUNERATÓRIOS EXORBITAREM A TAXA MÉDIA DE MERCADO. SITUAÇÃO OCORRIDA NOS AUTOS.

NO CASO, A PRÁTICA DOS JUROS REMUNERATÓRIOS MOSTROU-SE EXCESSIVA PARA O CONTRATO EM QUESTÃO. OS DOCUMENTOS REVELAM A PRÁTICA DE JUROS REMUNERATÓRIOS EM PATAMAR SUPERIOR À MÉDIA AFERIDA PELO BACEN PARA AS MESMAS MODALIDADES, NOS MESMOS PERÍODOS DE INCIDÊNCIA.

CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. A JURISPRUDÊNCIA NACIONAL RECONHECE A POSSIBILIDADE DE CAPITALIZAÇÃO DE JUROS, DESDE QUE EXPRESSAMENTE PACTUADA. PRECEDENTES DESTA CÂMARA.

ENCARGOS DE INADIMPLÊNCIA. COM PREVISÃO EXPRESSA É POSSÍVEL A COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. NÃO HÁ POTESTATIVIDADE NA CLÁUSULA, NOS TERMOS DA SÚMULA N. 296 DO STJ. NA HIPÓTESE, NÃO HÁ COMPROVAÇÃO DE QUE O RÉU TENHA COBRADO COMISSÃO DE PERMANÊNCIA NO CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. A PREVISÃO CONTRATUAL É LÍCITA, CONFORME LEGISLAÇÃO VIGENTE E ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DA CORTE SUPERIOR.

AFASTAMENTO DA MORA. A COMPREENSÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTÁ LIGADA À EXISTÊNCIA DE COBRANÇAS QUE IMPEÇAM OU CRIEM DIFICULDADES NO ADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATADAS. EM OUTRAS PALAVRAS, A PARTE DEIXA DE ADIMPLIR SUAS OBRIGAÇÕES PORQUE SÃO EXCESSIVAMENTE ONEROSAS. AFASTADA A MORA CONTRATUAL NÃO CABE A INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES, OU OUTROS ATOS TENDENTES À COBRANÇA DO DÉBITO.

COMPENSAÇÃO. REPETIÇÃO. DEVEM SER DEVOLVIDOS OU COMPENSADOS, DE FORMA SIMPLES, OS VALORES EVENTUALMENTE PAGOS A MAIOR PELO CONSUMIDOR.

APELAÇÃO parcialmente PROVIDA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Apelação Cível interposta por ARACI VITORINA DA SILVA da sentença (Evento 3, PROCJUDIC4, página 27 dos autos originários) que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação revisional manejada contra BANCO AGIBANK S.A.

Em razões de recurso (Evento 3, PROCJUDIC4, Página 35 dos autos originários), a Apelante rogou pela reforma da sentença. Discorreu sobre a configuração da relação de consumo. Rogou pela observância da taxa média de mercado quanto aos juros remuneratórios, tomando-se tal por parâmetro para a revisão dos encargos remuneratórios. Referiu ilegal a capitalização mensal de juros remuneratórios, posto que não prevista em contrato. Rogou pela descaracterização da mora. Postulou pela exclusão da comissão de permanência mascarada. Pugnou pela repetição de indébito na forma simples, bem como o redimensionamento dos honorários advocatícios. Pugnou pelo prequestionamento dos dispositivos ventilados.

Apresentadas contrarrazões (Evento 3, PROCJUDIC5, Página 8).

É o relatório.

Pretende a parte Autora a reforma da sentença cujo dispositivo segue transcrito (Evento 3, PROCJUDIC4, página 27 dos autos originários):

ISSO POSTO, revogo a liminar deferida às fls. 25/25v e julgo improcedente o pedido formulado por IRACI VITORINA DA SILVA contra BANCO AGIBANK S.A., nos termos do art. 487, I do CPC.

Julgo extinto o processo, sem resolução de mérito, relativamente aos pedidos de vedação das cobranças a título de tarifa de cadastro (TC) e comissão de permanência ou, subsidiariamente, vedação da cobrança da comissão de permanência cumulada aos demais encargos da inadimplência; declaração de nulidade do contrato de seguro vinculado ao cartão de crédito, por venda casada, e repetição do indébito correspondente, por falta de interesse processual, nos termos do art. 485, VI do CPC.

Condeno a autora ao pagamento das custas e demais despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios aos procuradores do réu, equivalentes a 10% do valor atualizado da causa, a ser corrigido pelo IGP-M a contar desta data e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a partir do trânsito em julgado, observando o disposto no art. 85, § 2º do CPC, considerando-se a natureza e a complexidade da demanda, o tempo de tramitação e o trabalho que se fez necessário.

Fica suspensa a exigibilidade da sucumbência imposta à autora, em virtude da assistência judiciária gratuita, concedida à fl. 25.

Retifique-se o polo passivo para constar BANCO AGIBANK S.A., conforme requerido às fls. 27 e 35, e consoante o instrumento das fls. 29/32v e 86/89v.

LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS

Sustenta a parte Apelante a existência de abusividade nas taxas de juros empregadas no contrato.

A sentença não reconheceu abuso no contrato e julgou improcedente o pedido no ponto.

Embora esteja reconhecida a ausência de limitação dos juros, de uma forma geral, nesse tipo de contrato não é possível uma estipulação segundo a conveniência das partes. Isso, porque o consumidor não possui poder de barganha.

Em princípio, até por ser contrato de adesão, não há barganha ou negociação a respeito do valor da taxa a ser aplicada. Ao contrário, o consumidor se submete à taxa aplicada pela instituição, com a confiança de que será aplicada a taxa necessária, porém sem abusos.

É exatamente por isso que a jurisprudência tem dado importância à taxa média publicada pelo Banco Central. Procura-se equilibrar as dificuldades dos consumidores, prevenindo ou corrigindo abusos.

Essa é a conclusão que o Poder Judiciário, por intermédio de um julgamento do Superior Tribunal de Justiça, assentou. As decisões paradigmas são o Recurso Especial n. 1.061.530 e o Recurso Especial n. 1.112.880, julgados na dinâmica de recursos repetitivos pela Segunda Seção daquela Corte:

BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONTRATO QUE NÃO PREVÊ O PERCENTUAL DE JUROS REMUNERATÓRIOS A SER OBSERVADO.

I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.

ORIENTAÇÃO - JUROS REMUNERATÓRIOS

1 - Nos contratos de mútuo em que a disponibilização do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios praticados deve ser consignado no respectivo instrumento. Ausente a fixação da taxa no contrato, o juiz deve limitar os juros à média de mercado nas operações da espécie, divulgada pelo Bacen, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente.

2 - Em qualquer hipótese, é possível a correção para a taxa média se for verificada abusividade nos juros remuneratórios praticados.

II - JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO

- Invertido, pelo Tribunal, o ônus da prova quanto à regular cobrança da taxa de juros e consignada, no acórdão recorrido, a sua abusividade, impõe-se a adoção da taxa média de mercado, nos termos do entendimento consolidado neste julgamento.

- Nos contratos de mútuo bancário, celebrados após a edição da MP nº 1.963-17/00 (reeditada sob o nº 2.170-36/01), admite-se a capitalização mensal de juros, desde que expressamente pactuada.

Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

Ônus sucumbenciais redistribuídos.

(REsp 1112880/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/05/2010, DJe 19/05/2010)

Em tal contexto, a praxe judicial procura cotejar o valor da taxa aplicada pelo Banco com o montante da taxa média publicada pelo BACEN, no sentido de verificar eventual exagero de cobrança de juros remuneratórios.

No caso dos autos verifica-se que se tratar de contrato de cartão de crédito. Há incidência de juros rotativos e juros de cartão de crédito parcelado.

As faturas colacionadas aos autos compreendidas entre os meses de novembro de 2017 a março de 2018 (Evento 3, PROCJUDIC1, Página 32 a 39) revelam incidência de juros remuneratórios.

Ilustrativamente, refiro:

A fatura com vencimento em novembro de 2017 (Evento 3, PROCJUDIC1, Página 38), indica juros remuneratórios para o cartão de crédito rotativo de 19,99% ao mês. Para o mesmo período, a aferição do Banco Central do Brasil relativamente aos contratos de cartão de crédito rotativo foi de 12,95% ao mês;

A fatura com vencimento em fevereiro de 2018 (Evento 3, PROCJUDIC1, Página 34), indica juros remuneratórios para o cartão de crédito rotativo de 19,99% ao mês. Para o mesmo período, a aferição do Banco Central do Brasil relativamente aos contratos de cartão de crédito rotativo foi de 12,96% ao mês;

A fatura com vencimento em março de 2018 (Evento 3, PROCJUDIC1, Página 32), indica juros remuneratórios para o cartão de crédito rotativo de 19,99% ao mês. Para o mesmo período, a aferição do Banco Central do Brasil relativamente aos contratos de cartão de crédito rotativo foi de 13,03% ao mês.

Em outras palavras, as taxas aplicadas no contrato referido na peça exordial ultrapassam os valores médios de mercado, razão pela qual está preenchido o requisito da abusividade na cobrança de juros. E, no caso, não está demonstrada a justificativa para a manifesta disparidade entre a taxa contratual e a taxa de mercado, de forma que a taxa contratual deve ser limitada.

Recurso provido no ponto.

CAPITALIZAÇÃO DE JUROS

Impugna a Apelante a ocorrência da capitalização de juros e roga pelo afastamento.

A sentença reputou legal a capitalização de juros no caso.

De início, importa observar que os contratos bancários são típicos contratos de consumo e sobre eles incide o Código de Defesa do Consumidor, que veda a incidência de normas implícitas, de difícil compreensão. Note-se:

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores,...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT