Decisão Monocrática nº 50093546520208210013 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 07-03-2023

Data de Julgamento07 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50093546520208210013
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003305178
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5009354-65.2020.8.21.0013/RS

TIPO DE AÇÃO: Adoção de Criança

RELATOR(A): Des. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. AÇÃO DE ADOÇÃO CUMULADA COM DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. MENOR AOS CUIDADOS DA PARTE AUTORA, SUA TIA-AVÓ PATERNA, DESDE TENRA IDADE. GENITORA PRESA POR ENVOLVIMENTO COM TRÁFICO DE DROGAS. COMPROVADA SITUAÇÃO DE ABANDONO PELO GENITOR. DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR DO GENITOR E SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR DA GENITORA, COM DEFERIMENTO DA GUARDA DA MENOR À TIA-AVÓ PATERNA. SITUAÇÃO FÁTICA CONSOLIDADA. MEDIDA QUE MELHOR ATENDE À PROTEÇÃO E INTERESSE DA CRIANÇA.

Havendo situação manifesta de abandono pelo genitor, descumprindo os deveres inerentes ao poder familiar, prevalecendo a proteção integral, os princípios da prioridade absoluta e do melhor interesse do menor, correta a sentença de procedência da ação para desconstituir o seu poder familiar no caso.

Inteligência dos artigos 1.638, II, do Código civil e artigo 22 e 24, ambos do Estatuto da Criança e do Adolescente.

No que tange à genitora, não se pode afirmar ter sido o abandono por ela praticado voluntário, pois decorrência direta de sua prisão, a autorizar apenas a suspensão de seu poder familiar, não a destituição, na forma do parágrafo único do art. 1.637 do Código Civil.

Constatando-se que a tia-avó paterna exerce a guarda da menina deste desde meados de 2020, quando o mesmo possuía cerca de 02 (dois) anos de idade, situação então consolidada por anos, cumpre regularizar tal questão, concedendo-se a guarda da menor à tia-avó paterna, que bem exerce os deveres inerentes ao dever familiar, ante a incapacidade dos genitores em exercê-la, não sendo caso, porém, de deferimento da adoção.

Precedentes do TJRS.

Apelação parcialmente provida.

DECISÃO MONOCRÁTICA

DARLISE A. DE O. apela (Evento 103 dos autos na origem) da sentença de procedência proferida nos autos da ação de adoção cumulada com destituição do poder familiar que lhe move MARLEI TERESINHA P. DE O., tia-avó paterna da criança, em favor da menor Nathanaely Eduarda P. de O., nascida em 04/02/2018 (fl. 15 do documento 1 do Evento 3 dos autos na origem; fl. 15 do processo físico), sendo também demandado EDUARDO B. P. DE O., processo Número Themis: 013/5.20.0000347-3; Número CNJ: 0004585-02.2020.8.21.0013; dispositivo sentencial assim lançado (Evento 95 dos autos na origem):

"3. DISPOSITIVO

Diante do acima exposto, julgo procedente o pedido apresentado por MARLEI TERESINHA P. DE O., para o efeito de destituir EDUARDO B. P. DE O. e DARLISE A. DE O. do poder familiar em relação à infante NATHANAELY EDUARDA P. DE O. e conceder a adoção desta à requerente.

Por consequência, determino o cancelamento do registro original da adotanda, conferindo-lhe o nome de NATHANAELY EDUARDA P. DE O., consignando-se a requerente como genitora e os ascendentes desta como avós, nos termos do artigo 47, §§ 1º e 5º, do ECA.

Dispensado o estágio de convivência, consoante disposição do art. 46, § 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Sem custas ou honorários, por se cuidar de Justiça da Infância e da Juventude, nos termos do artigo 141, parágrafo 2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Com o trânsito em julgado, expeça-se mandado ao Cartório de Registro Civil da Comarca de nascimento da infante.

Publicação e registro pelo sistema eletrônico.

Nada mais sendo requerido, arquive-se."

Em suas razões, aduz, não restou demonstrada a ocorrência de nenhuma das hipóteses de cabimento da excepcional, drástica e, via de regra, irreversível, destituição do poder familiar da ré, ou ainda, da adoção da criança em favor da apelada.

Destituir o poder familiar da apelante em relação à filha, por não ter convivido com ela no período que esteve presa é medida flagrantemente ilegal.

Não há nenhuma comprovação de eventual conduta voluntária da parte demandada que se amolde ao que contido no art. 1.638, do Código Civil, hipóteses "numerus clausus" autorizadoras da imposição da drástica medida de destituição do seu poder familiar em relação à prole.

A falta de recursos financeiros do núcleo familiar, à luz do art. 23, do ECA, não é motivo idôneo para destituição do poder familiar.

Discorre acerca do direito de convivência entre filhos e genitores.

Requer o provimento do recurso, com a reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido (Evento 103 dos autos na origem).

Foram apresentadas contrarrazões pela parte adversa, pugnando pela manutenção da sentença (Evento 109 dos autos na origem).

Nesta Corte, manifestou-se o Ministério Público pelo conhecimento e desprovimento do recurso (Evento 9 da APC).

É o relatório.

Efetuo o julgamento na forma monocrática, forte no art. 206, XXXVI, do RITJRS, combinado com o art. 932, VIII, do CPC.

A presente apelação merece parcial provimento, observadas as disposições legais e a orientação jurisprudencial a respeito do tema.

Com efeito, a destituição do poder familiar consiste em retirar de algum dos familiares a função ou a autoridade de que era investido pelo conjunto de direitos e deveres que traduzem o dever de criar, educar, cuidar, dar assistência material e emocional, enfim, proporcionar saúde física e psíquica ao filho, para que ele possa ter autonomia e possa ser sujeito de sua própria vida, e, quando os pais deixam de cumprir suas funções, podem ser destituídos do poder familiar, em atenção ao princípio do melhor interesse da criança, servindo também a destituição como instrumento para proteger a formação e desenvolvimento do menor, afastando pai e mãe na hipótese de a gravidade do caso exigir tal providência, conforme lição de Rodrigo da Cunha Pereira, in Dicionário de Direito de Família e Sucessões: ilustrado., p. 226, São Paulo, Saraiva, 2015, observados os arts. 1.634 e 1.638, do Código Civil e 22 e 24, do ECA, ora colacionados:

"Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos: (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

I - dirigir-lhes a criação e a educação; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

II - exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

IV - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

V - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

VI - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

VII - representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

VIII - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; (Incluído pela Lei nº 13.058, de 2014)

IX - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. (Incluído pela Lei nº 13.058, de 2014)"

"Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:

I - castigar imoderadamente o filho;

II - deixar o filho em abandono;

III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;

IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

V - entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção. (Incluído pela Lei nº 13.509, de 2017)

(...)"

"Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.

(...)"

"Art. 24. A perda e a suspensão do pátrio poder poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009)"

Como se vê, inúmeras podem ser as causas que justifiquem a perda do poder familiar, salientando-se “As vidas desregradas dos pais, cujos comportamento são imorais ou criminosos, ordem expor o filho menor a situações e a ambientes promíscuos e inadequados à sua idade e à condição de um ser e processo de formação. Tal conduta desrespeitosa para com o desenvolvimento psíquico do filho poderá acarretar a perda da autoridade parental.”, conforme Curso de Direito da Criança e do Adolescente, Aspectos teóricos e práticos, Coordenação de Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel, P. 180-, 3ª edição, Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009, pp. 180-181.

Em relação ao abandono previsto no inciso II do art. 1.638 do CC, colaciono trecho da obra Curso de Direito da Criança e do Adolescente. Aspectos teóricos e práticos, com Coordenação de Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel, pp. 180-182, 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009:

“O abandono de filho menor de família brasileira de baixa renda deve ser examinado com muita cautela pelos operadores da lei. Lamentavelmente, mas notória, é a desassistência de milhares...

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