Decisão Monocrática nº 50096357120188210019 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 05-12-2022

Data de Julgamento05 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50096357120188210019
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003087876
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5009635-71.2018.8.21.0019/RS

TIPO DE AÇÃO: Abandono Intelectual

RELATOR(A): Desa. SANDRA BRISOLARA MEDEIROS

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. eca. destituição do poder familiar. cerceamento de defesa. incorrência. desnecessidade de renovação da avaliação psiquiátrica. DESCUMPRIMENTO DOS DEVERES INERENTES AO PODER FAMILIAR. ART. 1.638 DO CÓDIGO CIVIL E ARTS. 22 E SEGUINTES DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. PRINCÍPIO cONSTITUCIONAl da MáXIMA PROTEÇÃO À CRIANÇA. situação de risco demonstrada. negligência e conduta agressiva do GENITOR, QUE NÃO DEMONSTRA APTIDÃO PARA OS CUIDADOS BÁSICOS DOs FILHOs. ausência de condições de proporcionar às crianças DESENVOLVIMENTO saudável. sentença mantida.

APELO DESPROVIDo.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

Trata-se de recurso de apelação interposto por PAULO ROBERTO DE S. em face da sentença (evento 2, PROCJUDIC6, fls. 11-9). proferida nos autos da Ação de Destituição do Poder Familiar proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra o apelante e Camila Graziela P. da S., que julgou procedentes os pedidos para decretar a perda do poder familiar dos réus sobre os filhos Nátali Vitória e Vinícius Gabriel, na forma do artigo 1.638, incisos II e III, do Código Civil, e do artigo 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Preliminarmente, argui cerceamento de defesa diante do indeferimento do pedido de realização de estudo social ou renovação de avaliação psiquiátrica.

No mérito, alega que a destituição do poder familiar é medida excepcional e extrema, que exige prova plena e cabal da incapacidade dos genitores, a qual não foi constituída nos autos. Afirma empenho para se vincular afetivamente com os filhos e alega que a genitora sempre obstaculizou o exercício da paternidade, praticando alienação parental. Alega que a prova requerida é fundamental para que se verifique a ausência de riscos para os menores se forem submetidos a sua guarda. Invoca o princípio da prevalência da família natural. Nesses termos, requer o provimento do apelo, para que seja julgada improcedente a ação (evento 2, PROCJUDIC6, fls. 21-31).

Com as contrarrazões (evento 14, CONTRAZAP1) e parecer do Ministério Público (evento 8, PROMOÇÃO1), vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

Decido.

Inicialmente, rejeito preliminar, porquanto a renovação da avaliação psiquiátrica, realizada initio litis, ao que tudo indica, não teria o condão de alterar a concluão da proca técnica, icorrendo, portanto, o aventado cerceamento de defesa.

Superada a questão, passo ao exame do mérito.

O poder familiar requer paternidade responsável, mediante tutela especial à família, ao dever de convivência familiar e à proteção integral da criança e do adolescente.

Ausente a efetiva demonstração de que os genitores, ou um deles, estejam cumprindo a contento tal múnus, ostenta-se imprescindível a intervenção estatal para afastar a criança ou o adolescente de situação de risco ou contrária de qualquer outra forma ao seu interesse.

Com efeito, estabelece o art. 229 da Constituição Federal que “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.

Outrossim, no que importa ao presente feito, compete a ambos os pais, a teor do disposto no art. 1.634 do Código Civil, “(...) qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos: dirigir-lhes a criação e a educação; exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584; (...) representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição”.

Precisamente no que tange aos filhos que ainda não alcançaram a maioridade, o art. 227 da Constituição Federal, dispõe que “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

A norma constitucional foi recepcionada pelo art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente ao afirmar que “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.

Assim sendo, dúvida não há de que é dever básico dos genitores estarem presentes (acompanharem, prestarem auxílio, socorrerem, ampararem, guardarem) na vida de seus filhos, não bastando apenas prestar-lhes alimentos. Devem se interessar por sua integridade física, moral e psíquica, concedendo-lhes suporte bastante e necessário para seu amplo desenvolvimento.

Leciona Maria Regina Fay de Azambuja, in verbis:

“Com a nova lei, o que se busca é a aproximação com eficácia do legal com o social, por meio da força de intervenção da lei no centro dos dramas e dos problemas do cotidiano comunitário. O Estatuto da Criança e do Adolescente, de forma não vislumbrada anteriormente no ordenamento jurídico brasileiro, exige uma postula de prontidão e de alerta, por parte da família, da sociedade e do poder público, no que tange à proteção integral da criança, dando ênfase às ações de caráter preventivo. Assim, diferentemente do que vinha sendo observado nas legislações que antecederam à Carta de 1988, a sociedade é chamada a adotar providências diante de uma simples ameaça a qualquer dos direitos arrolados no art. 227 da Constituição Federal e no art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente, a fim de dar eficácia à prioridade absoluta que foi atribuída à referida população”.

Porém, nas hipóteses de os genitores não cumprirem com as obrigações parentais, e estando a criança ou o adolescente em situação de risco, possível a destituição do poder familiar, que vem regulamentada no art. 1.638 do CCB e nos arts. 19, 22 e 24 do ECA.

Trata-se, a destituição do poder familiar, de medida excepcional, pois exclui dos genitores o exercício de um direito natural, mostrando-se justificável somente nas situações em que a inobservância dos deveres inerentes ao poder parental atenta contra os direitos fundamentais dos filhos, cuja integridade competia aos pais resguardar e desenvolver. A carência de recursos materiais não constitui motivo satisfatório para a perda ou suspensão do poder familiar; porém, o abandono afetivo, que se traduz na falta de cuidados e de comprometimento, impõe a perda do poder familiar.

Não obstante a preferência que a legislação confere à manutenção ou reintegração das crianças ou adolescentes na família biológica, não há olvidar que o princípio maior que norteia as normas atinentes ao direito posto em liça é o interesse dos menores.

É, e sempre deverá será sob essa ótica, e não sob a ótica do interesse dos pais ou de terceiros, que as situações deverão ser analisadas judicialmente.

No caso concreto, não há qualquer indicativo de que o melhor, do ponto de vista de Nátali Vitória e Vinícius Gabriel, seja o exercício do poder familiar pelo genitor, cuja pretensão recursal se mostra dissociada dos princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente e, objetivamente, dos interesses do filho.

A prova colacionada aos autos evidencia a inaptidão do apelante para o exercício do poder familiar sobre os menores de idade, os quais devem ser mantidos sob a tutela estatal.

Com essas considerações iniciais, adoto, como razões de decidir, o parecer da lavra do ilustre Procurador de Justiça, Dr. Luiz Claúdio Varela Coelho, evitando a desnecessária tautologia e, igualmente, homenageio o subscritor, Confira-se:

“(...)

Ao reverso do afirmado nas razões recursais, existe prova segura e suficiente no sentido de que PAULO ROBERTO não possui minimamente condições para o exercício do poder familiar em relação à Nátali Vitória e Vinícius Gabriel, nascidos, respectivamente, em 04/02/2006 e em 16/12/2003.

Para evitar tautologia, transcreve-se excerto das contrarrazões de apelação...

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