Decisão Monocrática nº 50097996720228210028 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 25-05-2023

Data de Julgamento25 Maio 2023
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50097996720228210028
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003816720
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5009799-67.2022.8.21.0028/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR(A): Desa. MIRIAM ANDREA DA GRACA TONDO FERNANDES

APELANTE: ANA LUCIA DA ROSA (AUTOR)

APELANTE: BANCO VOTORANTIM S.A. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO.

Preliminar. Ainda que conste eventual omissão na sentença vergastada, tal importaria em hipotética desconstituição da sentença, mas, com a redação do art. 1.013 do Código de Processo Civil/2015, acarretaria em julgamento pelo Juízo ad quem das questões devolvidas, o que efetivamente aqui se fará. Preliminar rejeitada.

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICÁVEL ÀS OPERAÇÕES DE CONCESSÃO DE CRÉDITO E FINANCIAMENTO. SÚMULA N. 297 DO STJ.

JUROS REMUNERATÓRIOS. SÃO ABUSIVOS APENAS SE FIXADOS EM VALOR EXPRESSIVAMENTE SUPERIOR À TAXA MÉDIA DO MERCADO DIVULGADA PELO BACEN PARA O PERÍODO DA CONTRATAÇÃO (RESP N. 1.061.530/RS).

CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE CAPITALIZAÇÃO DE JUROS EM PERIODICIDADE INFERIOR À ANUAL APÓS A EDIÇÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA N. 2.170-36/2001 (ART. 5º), PRESENTE INCLUSIVE O RE N. 592.377/RS, COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. “A CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS EM PERIODICIDADE INFERIOR À ANUAL DEVE VIR PACTUADA DE FORMA EXPRESSA E CLARA. A PREVISÃO NO CONTRATO BANCÁRIO DE TAXA DE JUROS ANUAL SUPERIOR AO DUODÉCUPLO DA MENSAL É SUFICIENTE PARA PERMITIR A COBRANÇA DA TAXA EFETIVA ANUAL CONTRATADA.” - RESP N. 973.827/RS.

DA MORA CONTRATUAL. SUA DESCARACTERIZAÇÃO DEPENDE DO RECONHECIMENTO DE ABUSIVIDADE EM ENCARGO(S) PREVISTO(S) PARA O PERÍODO DA NORMALIDADE CONTRATUAL (JUROS REMUNERATÓRIOS E CAPITALIZAÇÃO DE JUROS).

JUROS MORATÓRIOS. CABÍVEL SUA FIXAÇÃO EM 1% AO MÊS. PRECEDENTES.

MULTA MORATÓRIA. DEVE RESPEITAR O PERCENTUAL DE 2% SOBRE PARCELA(S) EFETIVAMENTE EM ATRASO (ART. 52, §1º, DA LEI N. 8078/90).

CLÁUSULA RESOLUTÓRIA. É VÁLIDA A CLÁUSULA RESOLUTÓRIA, QUE TRATA DO VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA, NO CASO DE INADIMPLEMENTO DO DEVEDOR.

DA TARIFA DE ABERTURA DE CRÉDITO (TAC) E DA TARIFA DE EMISSÃO DE CARNÊ (TEC). AUSENTE COBRANÇA NO CONTRATO. RECURSO PREJUDICADO NO PONTO.

IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES FINANCEIRAS - IOF. RESPONSABILIDADE DO CONSUMIDOR POR SEU PAGAMENTO, CUJO VALOR PODE SER FINANCIADO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA (RESP N. 1.251.331/RS).

DA MINORAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DEVEM REMUNERAR ADEQUADAMENTE O ADVOGADO. NO CASO PRESENTE, INCABÍVEL SUA MINORAÇÃO.

DANO MORAL. NÃO HÁ QUE SE FALAR EM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS EM RAZÃO DA PRESENÇA DE CLÁUSULAS ILEGAIS NO CONTRATO, POR SI SÓ.

COMPENSAÇÃO E/OU REPETIÇÃO SIMPLES. CABÍVEL CASO VERIFICADA A COBRANÇA DE VALORES INDEVIDOS.

DO PREQUESTIONAMENTO. DESNECESSÁRIA A INDICAÇÃO EXPRESSA DE TODOS OS FUNDAMENTOS LEGAIS EVENTUALMENTE INCIDENTES NO CASO, SENDO SUFICIENTE PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO.

preliminar(es) rejeitada(s). apelos improvidos.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

I – Relatório.

ANA LUCIA DA ROSA ingressou com Ação revisional de contrato em face do BANCO VOTORANTIM S/A, na qual foi prolatada sentença julgando parcialmente procedente o feito, contra o que interpõe o recorrente a presente apelação.

Desde logo indico que todos os eventos aqui mencionados são relativos aos autos originários, exceto quando expressamente indicado em contrário.

A sentença recorrida assim decidiu:

"(...) Assim, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação revisional ajuizada por ANA LUCIA DA ROSA contra BANCO VOTORANTIM S.A., para: 1) determinar a revisão do(s) contrato(s) objeto(s) dos autos para: - limitar os juros remuneratórios incidentes sobre as parcelas em atraso ao percentual previsto para o período de normalidade contratual; - limitar os juros moratórios a 1% ao mês. 2) condenar a parte ré a compensar o débito com o crédito da parte autora decorrente desta revisão, corrigindo-se monetariamente as parcelas pagas a maior pelo IGP-M, a contar de cada desembolso, com juros moratórios de 1% ao mês desde a citação e, remanescendo saldo credor em favor da parte autora, os valores deverão ser restituídos, na forma simples, com a mesma forma de atualização monetária e juros determinados na compensação; 3) rejeitar os demais pedidos, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Condeno cada uma das partes ao pagamento de 50% das custas processuais, além de honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa. Suspensa a exigibilidade da parte autora em tendo havido o deferimento da AJG. (...)" - evento 19.

A parte autora interpõe recurso de apelação (evento 29), arguindo preliminar, e, no mérito, requerendo, em suas razões, a reforma da sentença para:

  1. limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil;
  2. vedar a capitalização de juros;
  3. reconhecer a descaracterização da mora;
  4. afastar a cobrança dos juros moratórios e multa moratória;
  5. afastar a cláusula resolutória;
  6. vedar a cobrança das taxas/tarifas bancárias;
  7. afastar a forma de cobrança do IOF;
  8. proceder à indenização por danos morais; e
  9. autorizar a compensação/repetição dos valores pagos a maior.

Por sua vez, a parte ré também interpõe recurso de apelação (evento 25, apelação 1), requerendo, em suas razões, a modificação da sentença para:

  1. manter a cobrança dos juros moratórios pactuados;
  2. minorar os honorários advocatícios; e
  3. vedar a compensação/repetição de indébito.

Apresentadas contrarrazões pelas partes (evento 33 e 34, contrarrazões ao recurso de apelação 1), subiram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

II – Fundamentação.

Encontram-se preenchidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade do recurso interposto, razão pela qual recebo o presente apelo, tornando-se cabível o julgamento de plano do recurso, forte no art. 932, incisos IV e/ou V, alíneas “a” e/ou “b”, do Código de Processo Civil/2015.

Do(s) contrato(s) objeto de revisão.

Trata o presente feito de revisão de contrato de financiamento com cláusula de alienação fiduciária – cédula de crédito bancário nº 331202432, relativa ao veículo Fiat Idea 1.8, placas EFV-1706, celebrado pelas partes em 24.03.2021. O valor financiado foi de R$22.844,19, a ser adimplido em quarenta e oito (48) parcelas mensais e sucessivas de R$659,00. Os juros remuneratórios foram fixados em 1,39% ao mês e 18,06% ao ano (evento 13, contrato 2).

Da(s) preliminar(es).

Rejeito a(s) preliminar(es) argüida(s) em razões recursais do autor, vez que, ainda que constante eventual omissão na sentença vergastada, tal importaria em hipotética desconstituição da sentença, mas, com a redação do art. 1.013 do Código de Processo Civil/2015, acarretaria em julgamento pelo Juízo ad quem das questões devolvidas, o que efetivamente aqui se fará, consignando-se, outrossim, que deve ser simplificada a interpretação e a aplicação dos dispositivos do Código de Processo Civil/2015 para que, na medida do possível, seja decidido o direito material, em função da primazia do julgamento de mérito1.

Da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor – CDC.

Cabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor às operações de concessão de crédito e financiamento como a do presente caso concreto, conforme entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça, restando caracterizados os conceitos de consumidor (art. 2°) e fornecedor (art. 3°) previstos no referido Diploma Legal.

O Superior Tribunal de Justiça, aliás, consolidou tal entendimento ao editar a Súmula n. 297: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às Instituições Financeiras”.

No mesmo sentido, a jurisprudência desta Corte:

APELAÇÃO CIVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. AÇÃO REVISIONAL. 1. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ÀS OPERAÇÕES DE CONCESSÃO DE CRÉDITO E FINANCIAMENTO. SÚMULA N. 297 DO STJ. (...). RECURSO PROVIDO EM PARTE. (Apelação Cível, Nº 50004499820168210017, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Judith dos Santos Mottecy, Julgado em: 07-12-2022)

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. 1. Mostra-se vedado ao juízo a revisão ex officio de cláusulas inscritas nos contratos bancários (STJ, REsp nº. 1.061.530/RS, Tema 36; Súmula nº. 381). 2. Os negócios jurídicos bancários estão sujeitos às normas inscritas no CDC (Súmula n. 297 do STJ), com consequente relativização do ato jurídico perfeito e do princípio pacta sunt servanda. (...). APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. (Apelação Cível, Nº 50005537320228216001, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mário Crespo Brum, Julgado em: 07-12-2022)

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. REVISÃO DE CONTRATO. DA APLICAÇÃO DO CDC E DOS CONTRATOS DE ADESÃO. RELAÇÃO CONSUMERISTA CONFIGURADA. PRESENÇA DE CONSUMIDOR E FORNECEDOR; ARTS. E DA LEI 8009/90. SÚMULA 297, STJ. LEI PROTETIVA APLICÁVEL AO CASO CONCRETO. (...). APELO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO. (Apelação Cível, Nº 50555939520228210001, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto Sbravati, Julgado em: 19-12-2022)

Dos juros remuneratórios.

No que diz com a limitação dos juros remuneratórios, a Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça estabelece que “a estipulação de juros remuneratórios superior a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”.

Ainda, pacificou-se a jurisprudência no sentido de que não incide a Lei de Usura quanto à taxa de juros remuneratórios nas operações realizadas com as instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, consoante Súmula n. 596 do Supremo Tribunal Federal2.

Tal questão também foi tratada pelo Superior Tribunal de Justiça ao analisar o Recurso Especial nº 1.061.530-RS, com o propósito de...

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