Decisão Monocrática nº 50103828820228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 17-02-2022

Data de Julgamento17 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50103828820228217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001746743
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5010382-88.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Rescisão / Resolução

RELATOR(A): Des. JOAO MORENO POMAR

AGRAVANTE: CLARO S.A.

AGRAVADO: FLAVIO DUVAL DE SOUZA

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. Direito Privado não especificado. ação de cobrança. - COMPETÊNCIA TERRITORIAL. CONSUMIDOR. A competência à demanda que versa sobre relação de consumo é fixada em razão do domicilio do consumidor; e não pode ser alterada por cláusula de eleição. Precedentes do e. STJ. Circunstância dos autos em que se impõe manter a decisão recorrida.

RECURSO DESPROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

CLARO S.A. agrava da decisão proferida nos autos da ação de cobrança ajuizada por FLAVIO DUVAL DE SOUZA. Constou da decisão agravada:

Vistos.

Trata-se de ação de cobrança em que alega a parte demandada, em preliminar de contestação, incompetência do Juízo para processar e julgar a ação e ilegitimidade passiva.

Primeiramente, considerando a relação de consumo existente entre as partes, não há falar em incompetência do Juízo em razão da existência de cláusula de foro de eleição, já que esta é inválida frente à condição de hipossuficiente do consumidor, devendo a ação tramitar no domicílio deste.

Outrossim, também não há falar em ilegitimidade passiva, tendo em vista que no documento de resilição unilateral juntado aos autos consta a indicação expressa da parte demandada, tanto no logotivo constante no documento quanto nas assinaturas da correspondência.

Desta forma, verificada a existência de grupo econômico entre a empresa demandada e a por ela indicada na contestação, resta afastada a ilegitimidade arguida, sendo que eventual divisão interna das empresas só produz efeitos entre elas mesmas, não interferindo na relação posta em Juízo.

Assim, afasto as preliminares invocadas.

Preclusa a presente decisão, voltem para prosseguimento.

Intimem-se.

Diligências Legais.

Nas razões sustenta que há no mencionado Contrato firmado entre as partes cláusula de eleição de foro absolutamente legítima, que deve ser observada; que contrariando a referida cláusula, a Agravada ajuizou ação indevidamente perante a Vara Cível de Bagé/RS, sem nem mesmo apresentar qualquer tipo de justificativa, situação equivocada a qual, inclusive, foi perpetrada pela r. decisão agravada ao manter a competência deste r. juízo; que a cláusula de eleição do foro é legítima e excepciona a regra geral contida no artigo 46, do Código de Processo Civil; que dúvidas não há acerca da legitimidade da Cláusula convencionada entre as partes, sendo o r. Juízo a quo, consequentemente, incompetente para processar e julgar a presente demanda, devendo este recurso ser julgado procedente, de modo a determinar a remessa dos autos para a livre distribuição na Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, foro eleito contratualmente pelas partes. Postula o provimento do recurso.

Vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório.

O art. 932 do CPC/15 dispõe que incumbe ao relator não conhecer de recurso inadmissível (se não sanado vício ou complementada a documentação exigível), prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida (inc. III); negar provimento ao recurso contrário à súmula do STF, do STJ ou do próprio tribunal, a acórdão proferido em recursos repetitivos ou entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência (inc. IV); provê-lo quando a decisão recorrida for contrária a súmula do STF, do STJ, ou acórdão proferido em recursos repetitivos, entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência, ou do próprio tribunal (inc. V); e decidir o incidente de desconsideração da personalidade jurídica instaurado no tribunal (VI). Acresce-se, ainda, o enunciado sumular do e. STJ:

Súmula n. 568 - O relator, monocraticamente e o Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema.

Assim, naquelas hipóteses é expressa a possibilidade de julgamento por decisão monocrática que somente será passível de agravo interno que impugne especificamente os seus fundamentos (§ 1º do art. 1.021 do CPC/15), sob pena de não ser conhecido; e sujeitar-se à aplicação de multa (§§ 4º e 5º do mesmo artigo), vez que o interno não é via para mera inconformidade com o resultado do julgamento e nem requisito ou sucedâneo de recurso aos tribunais superiores.

O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece conhecimento. Assim, analiso-o.

COMPETÊNCIA TERRITORIAL. CONSUMIDOR.

A matéria requisita harmonização das regras do Código de Processo Civil, do Código de Defesa do Consumidor e da Súmula n. 33 do e. STJ em face do princípio constitucional do juízo natural.

O CPC estabelece a regra de que a ação deve ser ajuizada no domicilio do réu, ao dispor:

Art. 46. A ação fundada em direito pessoal e a ação fundada em direito real sobre bens móveis serão propostas, em regra, no foro do domicílio do réu.

Aquele dispositivo estabelece regra geral, visto que os artigos seguintes tratam de pontuar exceções, algumas especiais, de foro privilegiado, relativizando a regra geral. Quanto ao caráter absoluto ou relativo da competência dispôs nos arts. 62 e 63:

Art. 62. A competência determinada em razão da matéria, da pessoa ou da função é inderrogável por convenção das partes.

Art. 63. As partes podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obrigações.

A incompetência absoluta pode ser alegada em qualquer tempo e grau de jurisdição; e deve ser decretada de ofício. Assim dispõe o CPC:

Art. 64. A incompetência, absoluta ou relativa, será alegada como questão preliminar de contestação.
§ 1º A incompetência absoluta pode ser alegada em qualquer tempo e grau de jurisdição e deve ser declarada de ofício.

(...)

A competência relativa, à exceção dos contratos de adesão, como prevê o caput do art. 64 do CPC, deve ser alegada em preliminar de contestação; e caso não seja alegada será prorrogada, como disposto no art. 65 do mesmo diploma:

Art. 65. Prorrogar-se-á a competência relativa se o réu não alegar a incompetência em preliminar de contestação.

Cabe ressaltar que aqueles dispositivos decorrem da alteração do CPC pela Lei n. 11.280/06 harmonizando-se com a linha da Súmula n. 33 do STJ, editada em 1991, que enunciando que a incompetência relativa não pode ser declarada de ofício interpretava o texto anterior sem enfrentar os princípios do então recente CDC que contém preceitos de ordem pública, de natureza material e substancial, como nos artigos seguintes:

Art. 1° O presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias.

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
(...)

Art. 101. Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços, sem prejuízo do disposto nos Capítulos I e II deste título, serão observadas as seguintes normas:
I – a ação pode ser proposta no domicílio do autor;

(...)

A lei especial, CDC, aplica o princípio da facilitação da defesa dos direitos do consumidor e permitindo que ajuíze ação no seu domicílio quando pretenda responsabilização civil inovando nos tradicionais critérios de competência absoluta ou relativa. Neste ponto é exemplo, discutindo foro de eleição, a construção jurisprudencial consubstanciada em decisão do e. STJ sob o fundamento de critério de competência híbrida:

RECURSO ESPECIAL - CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO, INSERIDO EM CONTRATO DE ADESÃO, SUBJACENTE À RELAÇÃO DE CONSUMO - COMPETÊNCIA ABSOLUTA DO FORO DO DOMICÍLIO DO CONSUMIDOR, NA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA - PRECEDENTES - AFERIÇÃO, NO CASO CONCRETO, QUE O FORO ELEITO ENCERRE ESPECIAL DIFICULDADE AO ACESSO AO PODER JUDICIÁRIO DA PARTE HIPOSSUFICIENTE - NECESSIDADE - RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. I - O legislador pátrio conferiu ao magistrado o poder-dever de anular, de ofício, a cláusula contratual de eleição de foro, inserida em contrato de adesão, quando esta revelar-se abusiva, vale dizer, dificulte a parte aderente em empreender sua defesa em juízo, seja a relação jurídica subjacente de consumo, ou não; II - Levando-se em conta o caráter impositivo das leis de ordem pública, preponderante, inclusive, no âmbito das relações privadas, tem-se que, na hipótese de relação jurídica regida pela Lei consumerista, o magistrado, ao se deparar com a abusividade da cláusula contratual de eleição de foro, esta subentendida como aquela que efetivamente inviabilize ou dificulte a defesa judicial da parte hipossuficiente, deve necessariamente declará-la nula, por se tratar, nessa hipótese, de competência absoluta do Juízo em que reside o consumidor; III - "A contrario sensu", não restando patente a abusividade da cláusula contratual que prevê o foro para as futuras e eventuais demandas entre as partes, é certo que a competência territorial (no caso, do foro do domicílio do consumidor) poderá, sim, ser derrogada pela vontade das partes, ainda que expressada em contrato de adesão (ut artigo 114, do CPC). Hipótese, em que a competência territorial assumirá, inequivocamente, a natureza relativa (regra, aliás, deste critério de competência); IV - Tem-se, assim, que os artigos 112, parágrafo único, e 114 do CPC, na verdade, encerram...

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