Decisão Monocrática nº 50130759820208210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Terceira Câmara Cível, 19-01-2022

Data de Julgamento19 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50130759820208210021
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoVigésima Terceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001553078
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

23ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5013075-98.2020.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Tarifas

RELATOR(A): Des. ALBERTO DELGADO NETO

APELANTE: VOLMAR MARTINS (AUTOR)

APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

APELAÇÕES CÍVEIS. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). FALTA DE INFORMAÇÕES. PRÁTICA ABUSIVA. dano moral.

RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. DEMONSTRADA A ABUSIVIDADE CONTRATUAL PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. A PARTE RÉ DEIXOU DE COMPROVAR A DEVIDA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES DA CONTRATAÇÃO DE CARTÃO COM COMPROMETIMENTO DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC), AO INVÉS DE EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO, IMPONDO EXCESSIVA ONEROSIDADE À PARTE HIPOSSUFICIENTE. CONFIGURADA A INCIDÊNCIA DE VANTAGEM DEMASIADA, VIOLANDO O DISPOSTO NO ARTIGO 51, INC. IV, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. A NULIDADE DA CLÁUSULA CONTRATUAL IMPLICA MANUTENÇÃO DO ACOLHIMENTO DO PEDIDO DE CONVERSÃO DO EMPRÉSTIMO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC) PARA EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO, MEDIANTE ADAPTAÇÕES PONTUAIS.

COMPENSAÇÃO. REPETIÇÃO. DEVEM SER DEVOLVIDOS OU COMPENSADOS, DE FORMA SIMPLES, OS VALORES EVENTUALMENTE PAGOS A MAIOR PELO CONSUMIDOR.

DANO MORAL. NAS RELAÇÕES DE CONSUMO, A RESPONSABILIDADE DOS PRESTADORES DE SERVIÇO E FORNECEDORES DE PRODUTOS É OBJETIVA EM RAZÃO DA PRESUMIDA HIPOSSUFICIÊNCIA DO CONSUMIDOR.

IMPRESCINDÍVEL HAVER TRANSPARÊNCIA NAS INFORMAÇÕES TRANSMITIDAS AO CONSUMIDOR DE FORMA A GARANTIR SEGURANÇA NAS RELAÇÕES JURÍDICAS HAVIDAS ENTRE AS PARTES.

NA HIPÓTESE, HOUVE QUEBRA DA BOA-FÉ OBJETIVA A QUE ESTÃO VINCULADOS OS CONTRATANTES A PARTIR DA FALHA DA OBRIGAÇÃO INFORMACIONAL PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.

RECONHECE-SE O DANO MORAL IN RE IPSA NA CONDUTA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE VINCULA INDEFINIDAMENTE O CONSUMIDOR A CONTRATO DE CRÉDITO, SUPRIMINDO-LHE MENSALMENTE VERBAS DE NATUREZA ALIMENTAR NA MEDIDA EM QUE A DÍVIDA CONSTITUÍDA NÃO DIMINUI.

A QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL DEVE TER COMO BALIZAS CRITÉRIOS QUE CONSIDEREM A EXTENSÃO DO DANO, GRAU DE INTENSIDADE DO SOFRIMENTO ENFRENTADO, BEM COMO AS CONDIÇÕES PESSOAIS DOS ENVOLVIDOS, TENDO O CONDÃO DE INIBIR A INCIDÊNCIA OU REINCIDÊNCIA DE CONDUTAS ILÍCITAS, BEM COMO PUNI-LAS.

APELAÇÃO do réu NÃO PROVIDA.

apelação do autor provida.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Apelações Cíveis interpostas por ambas as partes da sentença (Evento 29) que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados nos autos da ação manejada por VOLMAR MARTINS em face de BANCO BMG S.A.

A parte Autora/Apelante (Evento 35), rogou pela condenação do Banco em indenização por danos morais e pugnou seja a Ré condenada à integralidade dos ônus sucumbenciais.

Em razões de recurso (Evento 36), pugnou a parte Ré/Apelante pela reforma da sentença. Referiu à legalidade da forma de contratação via reserva de margem consignável (RMC). Destacou que a parte Autora/Apelada tinha conhecimento do tipo de contrato a que estaria aderindo. Discorreu sobre a prática comercial e que seria impossível a declaração de nulidade de cláusula contratual. Argumentou que a parte Autora/Apelada teria promovido saques. Insurgiu-se contra a declaração de inexistência do débito, referindo que a parte Autora/Apelada recebeu o numerário contratado. Insurgiu-se também contra a repetição do indébito. Afirmou inviável a conversão do contrato RMC em empréstimo consignado.

Foram apresentadas contrarrazões (Eventos 42 e 43).

É o relatório.

Pretendem as partes Apelantes a reforma da sentença cujo dispositivo segue transcrito:

DISPOSITIVO

Isto posto, confirmando a tutela provisória de urgência deferida, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido de VOLMAR MARTINS em face de BANCO BMG S/A para o fim de determinar:

(I) a suspensão da cobrança objeto da inicial no benefício previdenciário da parte autora NB 605.688.036-6 (RESERVA DE MARGEM CONSIGNAVEL (RMC) – EMPRESTIMO SOBRE A RMC);

(II) que os valores sacados no cartão de crédito sejam convertidos e descontados como empréstimo pessoal consignado no benefício da parte autora;

(III) que o valor da dívida seja recalculado como empréstimo pessoal consignado – pessoa física – observando a taxa média anual de juros remuneratórios divulgada pelo BACEN para a espécie da contratação (no caso, crédito pessoal consignado para aposentados e pensionistas do INSS), com o valor da parcela mensal devendo observar o limite da margem de empréstimo consignável que a parte autora pode dispor;

(IV) que sejam abatidos os valores já pagos pela parte autora, atualizados nas mesmas bases acima estabelecidas, realizando-se a repetição simples e a compensação, caso ainda exista débito, respeitando a prescrição dos valores descontados anteriores aos três anos que antecederam o ajuizamento da ação;

(V) acaso constatada persistência do débito, fica autorizado o prosseguimento dos descontos em prol do réu, respeitadas as restrições dos itens anteriores, tudo a ser calculado em liquidação de sentença, na forma mencionada.

Sucumbentes, CONDENO as partes a pagarem a metade das custas processuais totais cada uma e a pagarem os honorários dos mandatários da parte adversa, fixados em R$ 900,00 conforme autoriza o art. 85, parágrafo 8°, CPC, vedada a compensação conforme o parágrafo 14 do mesmo dispositivo e suspensa a exigibilidade em relação à autora pois litigou com amparo na AJG.

Publique-se.

Intimem-se.

NULIDADE DA CONTRATAÇÃO - RECURSO DO RÉU

A parte Ré/Apelante pugna pela reforma da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais. Aduz legal a contratação do cartão de crédito para fins de viabilizar saque e comprometimento de margem consignável. Destacou que a parte Autora teria conhecimento do tipo de contratação.

Pela documentação carreada aos autos percebe-se que o Réu/Apelado demonstrou que a Autora/Apelante firmou contrato junto à empresa Apelada de “Termo de Adesão Cartão de Crédito Consignado Banco BMG e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento” (Evento 14, CONTR2, dos autos originários).

Nesta modalidade contratual (utilização de cartão de crédito com Reserva de Margem Consignável -RMC) é exigível a autorização formal firmada por escrito pela beneficiária, nos do artigo 3º, III, da Instrução Normativa do INSS n. 28/2008, alterada pela Instrução Normativa do INSS n. 39/20091.

Acrescento que a cláusula que prevê a reserva de margem consignável para operações com cartão de crédito está prevista na Resolução n. 1.305/2009 do Conselho Nacional de Previdência Social, artigo 1º:

RESOLUÇÃO Nº 1.305, DE 10 DE MARÇO DE 2009.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL, no uso da atribuição que lhe confere o inciso V do art. 21 do Regimento Interno, aprovado pela Resolução nº 1.212, de 10 de abril de 2002, torna público que o Plenário, em sua 151ª Reunião Ordinária, realizada em 10 de março de 2009, resolveu:

Art. 1º Recomendar ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS que, relativamente aos empréstimos consignados, e respeitado o limite de margem consignável de 30% (trinta por cento) do valor do benefício, torne facultativo aos titulares dos benefícios previdenciários a constituição de Reserva de Margem Consignável – RMC de 10% (dez por cento) do valor mensal do benefício para ser utilizada exclusivamente para operações realizadas por meio de cartão de crédito.

Ou seja, dito procedimento não se revela, por si só, ilegal ou abusivo, tendo em vista que objetiva permitir o uso do cartão de crédito na modalidade consignada.

Não obstante a demonstração da regularidade formal exigível à espécie de contratação firmada entre as partes, o cerne da questão diz respeito à informação robusta ao consumidor do tipo de contrato ao qual estava aderindo.

O Autor/Apelante lançou asserção na peça de ingresso no sentido de que pretendeu contratar empréstimo pessoal em consignação no benefício previdenciário, negando a intenção de contratação de empréstimo com margem consignável.

Verifica-se do extrato do benefício previdenciário do Autor/Apelante que são debitados mensalmente em razão do negócio em questão duas parcelas de R$ 47,22 e R$ 52,25 (Evento 1, EXTR6).

A parte Ré/Apelada apresentou as faturas do cartão de crédito emitido em favor da parte Autora/Apelante (Evento 10, FATURA3 e FATURA4), em que se verificam somente os descontos referentes ao negócio jurídico reportado nos autos, além de rubricas incidentes em razão de financiamento do saldo devedor. Não há utilização relativamente à função cartão de crédito.

Ou seja, embora haja a contratação do cartão de crédito juntamente com o contrato de empréstimo, não há provas nos autos da devida informação ao consumidor da forma de utilização da espécie contratual. Tampouco demonstrou a entrega do plástico ao autor, embora o instrumento contratual cite a contração do cartão de crédito.

Essa ausência agrega verossimilhança à alegação da parte Apelada de que não recebeu informações suficientes a respeito da contratação dos serviços de cartão de crédito, e a forma necessária à quitação, suas condições, consignações e reserva, assim como outros detalhes relevantes, de modo a diferenciá-lo de um empréstimo pessoal consignado, real objetivo da parte Apelada.

Vale ressaltar que se trata de típica relação de consumo, e cabe ao fornecedor do serviço prestar todas as informações ao consumidor no ato da contratação, a respeito do serviço/produto que adquire, nos termos do artigo 52 do Código de Defesa do Consumidor2.

Analisando a forma como se desenrola a contratação, verifica-se que nesta modalidade é creditado na conta bancária do consumidor o valor solicitado para empréstimo, independentemente de envio e/ou desbloqueio de cartão de crédito, e sem que seja necessária a utilização deste.

Tal fato induz o consumidor a acreditar que está diante de um...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT