Decisão Monocrática nº 50178503420228210039 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 11-11-2022

Data de Julgamento11 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50178503420228210039
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002960236
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5017850-34.2022.8.21.0039/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR(A): Des. ROBERTO SBRAVATI

APELANTE: VANESSA LIMA DA SILVA (AUTOR)

APELADO: BANCO DIGIMAIS S.A. (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. ART. 932, V, ‘A’ e ‘B’, DO CPC.

TARIFA DE CADASTRO. A Tarifa de Cadastro somente poderá incidir no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira, desde que contratado expressamente, ressalvado a análise da abusividade no caso concreto, se comparada com a média mensal divulgada pelo BACEN. Súmula nº 566 do STJ. Abusividade caracterizada no caso concreto.

SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO EXARADO NOS RESP N. 1.639.259/SP E RESP N. 1.639.320/SP – TEMA 972/STJ. “NOS CONTRATOS BANCÁRIOS EM GERAL, O CONSUMIDOR NÃO PODE SER COMPELIDO A CONTRATAR SEGURO COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA OU COM SEGURADORA POR ELA INDICADA.” VENDA CASADA CONFIGURADA, AFASTADA SUA PACTUAÇÃO.

DA MORA. É a constatação da existência de abusividade no período da normalidade que tem o condão de afastar a mora do devedor. Presente a ilegalidade contratual, a mora deve ser afastada.

COMPENSAÇÃO DE VALORES E REPETIÇÃO DO INDÉBITO. A fim de evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes, a compensação de valores e a repetição do indébito são devidas, respeitando o disposto nos artigos 369 e 876, ambos do CC. A restituição deve ocorrer de forma simples, e como consequência lógica do julgado.

DA TUTELA ANTECIPADA. Estando presentes todos os requisitos necessários para a concessão da tutela antecipada, seu deferimento está condicionado à realização dos depósitos nos valores recalculados conforme esta decisão.

APELO PARCIALMENTE PROVIDO. EM DECISÃO MONOCRÁTICA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de apelação interposta por VANESSA LIMA DA SILVA contra sentença proferida nos autos da Ação de Revisão de Contrato que, o ora apelante, litiga em face de BANCO DIGIMAIS S.A.

A sentença recorrida assim decidiu:

Assim, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação revisional ajuizada por VANESSA LIMA DA SILVA contra BANCO DIGIMAIS S.A., para:

1) determinar a revisão do(s) contrato(s) objeto(s) dos autos para:

- limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado, para o mês da contratação, permitida a capitalização, na forma da fundamentação.

2) condenar a parte ré a compensar o débito com o crédito da parte autora decorrente desta revisão, corrigindo-se monetariamente as parcelas pagas a maior pelo IGP-M, a contar de cada desembolso, com juros moratórios de 1% ao mês desde a citação e, remanescendo saldo credor em favor da parte autora, os valores deverão ser restituídos, na forma simples, com a mesma forma de atualização monetária e juros determinados na compensação;

3) revogar a antecipação de tutela, em razão do descumprimento dos requisitos impostos na decisão concessiva da liminar, mantendo-se hígida a mora contratual;

4) rejeitar os demais pedidos, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Condeno cada uma das partes ao pagamento de 50% das custas processuais, além de honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa. Suspensa a exigibilidade da parte autora em tendo havido o deferimento da AJG.

Apela o Autor (evento 29). Requer o provimento do recurso para a reforma da sentença a fim de possibilitar a revisão das quantias cobradas em excesso, pleiteando pela exclusão da cobrança da tarifa de cadastro, e seguro prestamista; pela declaração da inexistência da mora, afastando-se todos os encargos moratórios; e pelo deferimento da tutela antecipada.

Com as contrarrazões (evento 34), subiram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

Decido.

Na forma do art. 932, V, alíneas ‘a’ e ‘b’, do CPC, dou parcial provimento ao recurso, tendo em vista que a decisão profligada encontra-se em dissonância parcial com as Súmulas e o entendimento firmado em recursos repetitivos julgados pelo Superior Tribunal de Justiça quanto ao tema, senão vejamos.

Em 21.10.21 as partes ajustaram uma Cédula de Crédito Bancário, com cláusula de alienação fiduciária referente ao automóvel modelo Fiat/ Siena, placa EJS0H72, objeto da presente revisão.

TARIFA DE CADASTRO

Consoante sedimentado no Resp paradigmático nº 1.251.331-RS, da relatoria da Eminente Min. Maria Isabel Gallotti, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, a tarifa de cadastro possui como fato gerador a remuneração do serviço de “pesquisa em serviços de proteção ao crédito, base de dados e informações cadastrais, e tratamento de dados e informações necessários ao início de relacionamento decorrente da abertura de conta de depósito à vista ou de poupança ou contratação de operação de crédito ou de arrendamento mercantil, não podendo ser cobrada cumulativamente”.

Nesta esteira, segundo a conclusão daquele Sodalício, a Tarifa de Cadastro “somente pode incidir no início do relacionamento entre o cliente e instituição financeira, e se justifica pela necessidade de ressarcir custos com realização de pesquisas em cadastros, bancos de dados e sistemas”.

Ainda, a Súmula nº 566 do STJ assim orienta:

“Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira."

Portanto, tem-se que a cobrança de referida tarifa mostra-se passível de contratação, desde que a instituição financeira limite a sua incidência somente na primeira relação contratual com o consumidor, ou seja, no início do relacionamento entre consumidor – fornecedor, não sendo permitida sua cobrança a cada novo contrato firmado entre as partes.

Ainda, convém salientar que embora permitida a sua cobrança, desde que pactuada de forma clara e objetiva, o fato é que se mostra cabível a análise, caso a caso, de eventual excessiva onerosidade em sua contratação, mediante comparativo a ser feito pela média mensal divulgada pelo BACEN.

Nesse sentido, transcrevo o trecho do voto da Eminente Min. Maria Isabel Gallotti, no Resp paradigmático nº 1.251.331 – RS:

“Reafirmo o entendimento acima exposto, no sentido da legalidade das tarifas bancárias, desde pactuadas de forma clara no contrato e atendida a regulamentação expedida pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central, ressalvado abuso devidamente comprovado, caso a caso, em comparação com os preços cobrados no mercado.

Esse abuso há de ser objetivamente demonstrado, por meio da invocação de parâmetros objetivos de mercado e circunstâncias do caso concreto, não bastando a mera remissão a conceitos jurídicos abstratos ou à convicção subjetiva do magistrado.

Anoto que o Banco Central do Brasil divulga os valores mínimo, máximo, a periodicidade de cobrança, e a média das diversas tarifas cobradas pelos bancos, o que permite, a exemplo do que já ocorre com os juros remuneratórios, e em conjunto com as demais circunstâncias de cada caso concreto, notadamente o tipo de operação e o canal de contratação, aferir a eventual abusividade, em relação às práticas de mercado, das tarifas cobradas.”

Desta forma, a cobrança da Tarifa de Cadastro não está limitada pelos lindes legais, mas tampouco está de todo liberada, devendo estar em harmonia com a média do mercado divulgada pelo BACEN, e sem resultar em vantagem exagerada por parte da instituição financeira.

Logo, no caso concreto, como o pacto prevê tarifa de cadastro (TC) no patamar de R$ 1.250,00, excessivamente superior à de mercado apurada para o período em que se celebrou o ajuste, a mesma vai reduzida ao valor da tarifa média do mercado, qual seja, R$ 683,10, eis que nenhuma justificativa plausível trouxe o Banco para a sua cobrança neste patamar.

SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA

Conforme restou definido no julgamento dos Recursos Especiais representativos de controvérsia nºs 1.639.259/SP e 1.639.320/SP – Tema 972/STJ: “Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada.”

Portanto, tanto a contratação de seguro pelo consumidor, quanto com qual seguradora contratar, devem ser uma opção a ele oferecida, sob pena de configurar-se venda casada, prática esta vedada pelo disposto no art. 39, I, do CDC.

No caso em comento, verifica-se que foi oportunizado ao consumidor que optasse pela contratação do seguro, porém tal contratação restou vinculada a uma seguradora pré-determinada pelo credor fiduciário, conforme se constata no evento 13.2. Assim, verificada a venda casada, deve ser afastada sua pactuação.

DA MORA

Quanto à mora, entende-se, na esteira do acórdão paradigmático (RESP 1.061.530/RS), que o ajuizamento isolado de ação revisional não descaracteriza a mora. Tal faz sentido, decerto, mormente porquanto a demanda pode vir sem qualquer substrato jurídico consistente, por primeiro, ou em face de...

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