Decisão Monocrática nº 50195493220228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 07-02-2022
Data de Julgamento | 07 Fevereiro 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Agravo de Instrumento |
Número do processo | 50195493220228217000 |
Tipo de documento | Decisão monocrática |
Órgão | Décima Quarta Câmara Cível |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20001695005
14ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Agravo de Instrumento Nº 5019549-32.2022.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária
RELATOR(A): Des. ROBERTO SBRAVATI
AGRAVANTE: CAROLINE CARVALHO VICENTE
AGRAVADO: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL. MORA. CADASTROS EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO E MANUTENÇÃO NA POSSE DO BEM. CONDICIONAMENTO AOS DEPÓSITOS. COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA. POSSIBILIDADE.
1. Estando presentes todos os requisitos necessários para a concessão da tutela antecipada, seu deferimento está condicionado à realização dos depósitos das parcelas em valores recalculados, extirpando-se do cálculo as ilegalidades contratuais.
2. FIXADA multa diária em caso de descumprimento de ordem judicial.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
DECISÃO MONOCRÁTICA
Trata-se de agravo de instrumento interposto por CAROLINE CARVALHO VICENTE contra decisão proferida na ação revisional que o ora agravante litiga contra OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, a qual indeferiu as tutelas cautelares nos seguintes termos:
Recebo a inicial. Defiro a gratuidade da justiça ao autor.
Trata-se de ação de revisão de contrato na qual a parte autora pretende a nulidade da cobrança de tarifas indevidas. Requer, em sede de antecipação de tutela, que o réu se abstenha ou exclua o seu nome dos órgãos de proteção ao crédito, pugnando ainda pela manutenção na posse do veículo objeto do contrato em discussão.
Consoante estabelece o Código de Processo Civil, em seu art. 300, caput e § 3º: "a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. (…) a tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão".
No caso em tela, entendo que a parte autora não logrou demonstrar a verossimilhança de suas alegações.
Ademais, conforme orientação do Superior Tribunal de Justiça exarada, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.061.530/RS, para a concessão de tutela antecipada no sentido da abstenção/cancelamento da inscrição do nome do consumidor nos órgãos de restrição ao crédito, imprescindível o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos “ação fundada em questionamento integral ou parcial do débito; demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; depósito da parcela incontroversa ou prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz (...)”.
Desse modo, como não restaram cumpridos os requisitos para a concessão da antecipação da tutela, não há justificativa para impedir que o nome da parte autora seja inscrito nos cadastros de restrição ao crédito.
Com base nos mesmos argumentos, inviável a concessão da manutenção da posse do bem objeto do contrato, visto que não vislumbro prova inequívoca a convencer acerca da verossimilhança das alegações da parte autora.
Diante do exposto, INDEFIRO o pedido de tutela antecipada, nos termos da fundamentação, mas oportunizo que a parte autora efetue os depósitos judiciais, mediante comprovação nos autos, enquanto pendente a lide, no valor que entende como devido, por sua conta e risco, sem efeito liberatório e sem que isso implique juízo de mérito sobre a correção dos valores.
Cite-se.
O requerido deverá juntar aos autos o(s) contrato(s) celebrado(s) com a parte autora, bem como a documentação pertinente, no prazo contestacional, com fulcro no artigo 355 e seguintes do Código de Processo Civil e no artigo 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor.
Alegadas quaisquer das temáticas constantes do art. 301 do Código de Processo Civil, intime-se o autor para réplica.
Intimem-se.
Cumpra-se.
Em suas razões, o agravante requer o deferimento da liminar de manutenção de posse do bem, mediante a efetivação de depósitos judiciais nos valores que entende devido, a abstenção do réu em inscrever seu nome em cadastros de inadimplentes e a vedação do protesto de títulos vinculados ao contrato, com a cominação de multa diária em caso de descumprimento de ordem judicial.
Vieram os autos conclusos e em condições de julgamento.
É o relatório.
Decido.
Na forma do art. 311, II, c/c art. 932, V, ‘a’ e ‘b’, ambos do CPC, dou parcial provimento ao presente recurso, conforme ora passo a expor.
Em 27.11.2018 as partes ajustaram uma cédula de crédito bancário com cláusula de alienação fiduciária nº 101777000093118, referente a um automóvel modelo VW/ Gol, placa IUH 5592.
DA MORA
Da análise da exordial da ação revisional de contrato se extrai que o ora agravante ajuizou a presente ação arguindo existir abusividades no contrato de financiamento firmado perante a instituição financeira, postulando pela revisão das cláusulas contratuais que seriam contrárias ao disposto no Código de Defesa do Consumidor.
A concessão da tutela, como remédio processual capaz de dar efetiva aplicação ao direito, merece cuidadosa interpretação, para que não venha a se transformar em verdadeira panacéia, em prejuízo das relações jurídicas e do sistema processual vigente.
Segundo orientação sedimentada no REsp paradigma nº 1061530/RS, “A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) houver depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz.”
No caso, o agravante alega existir abusividades contratuais capazes de afastar a mora, postulando, então, pela concessão da tutela.
Quanto à mora, entende-se, na esteira do acórdão paradigmático (RESP 1.061.530/RS) e da Súmula nº 380, que o ajuizamento isolado de ação revisional não descaracteriza a mora. Tal faz sentido, porquanto a demanda pode vir sem qualquer substrato jurídico consistente, por primeiro, ou em face de situações em que o inadimplemento se faz presente desde o começo da contratação, e já advém a ação revisional que não denotaria um agir de boa-fé por parte do consumidor.
Ademais, sustenta-se que o reconhecimento da abusividade sobre os encargos incidentes para o período de inadimplência contratual tampouco arreda a mora solvendi, uma vez que já se verificou o inadimplemento.
Portanto, entendo que apenas descaracterizaria a mora o reconhecimento da abusividade em relação aos encargos cobrados no período da normalidade contratual – i.é., juros remuneratórios e capitalização. Quando, no período da normalidade, o credor está a exigir do devedor mais do que o correto, mais do que o devido, a mora não resta configurada. É a constatação da existência de abusividade no período da normalidade contratual que tem o condão de afastar a mora do devedor.
Tudo na esteira do acórdão paradigma acima referido (voto da relatora, p. 22):
“(...) o eventual abuso em algum dos encargos moratórios não descaracteriza a mora. Esse abuso deve ser extirpado ou decotado sem que haja interferência ou reflexo na caracterização da mora em que o consumidor tenha eventualmente incidido, pois a configuração dessa é condição para incidência dos encargos relativos ao período da inadimplência, e não o contrário. - Os encargos abusivos que possuem potencial para descaracterizar a mora são, portanto, aqueles relativos ao chamado “período da normalidade”, ou seja, aqueles encargos que naturalmente incidem antes mesmo de configurada a mora”.
Quanto ao tema, o colendo STJ já o pacificou, preconizando que é livre a pactuação da taxa de juros entre os contraentes, exceto em havendo excesso manifestamente comprovado (na forma do decisório tornado paradigma – RESP 1.061.530/RS, rela. Min. Nancy Andrighi, j. 22/10/08), ocasião em que se limitam os juros.
Então, cumpre dizer que os juros serão limitados, a um patamar razoável, para expungir abusividade, e que a diretriz que se adota para fixar tal patamar é a taxa média do mercado, tal como fornecida pela BACEN em seu site, consoante estipulado no acórdão paradigma supramencionado. Os juros são limitados, então, em hipótese excepcional, qual seja, quando ultrapassada a taxa média de mercado.
No caso, o pacto prevê juros...
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