Decisão Monocrática nº 50238175320178210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 27-09-2022

Data de Julgamento27 Setembro 2022
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50238175320178210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002746643
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5023817-53.2017.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Adicional de Insalubridade

RELATOR(A): Des. NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO

APELANTE: VALDENIR DE PAULA DORNELLES (AUTOR)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. AGENTE educacional I – MANUTENÇÃO DE INFRAESTRUTURA. GRATIFICAÇÃO PELO EXERCÍCIO DE ATIVIDADES INSALUBRES. ATIVIDADES GERAIS EM ESCOLA PÚBLICA. PROVA PERICIAL. aferição em grau máximo. DIREITO AO PAGAMENTO EM GRAU MÉDIO. limitação do pagamento à data do laudo judicial. IMPOSSIBILIDADE DE CONFERIR EFEITOS RETROATIVOS À PERÍCIA.

1. A autora é servidora pública detentora do cargo de Agente Educacional I – Manutenção de infraestrutura e não recebe adicional de insalubridade, pois o laudo pericial elaborado pelo órgão competente do Poder Executivo (DMEST), concluiu pela ausência de agentes insalubres a ensejar o pagamento.
2. No entanto, o laudo pericial elaborado pela Engenheira de Segurança do Trabalho constatou que a servidora está exposta à agentes biológicos de modo habitual correspondentes ao grau máximo de insalubridade, tendo em vista a atividade de limpeza de sanitários de uso coletivo dos alunos sem a devida proteção adequada.
3. Embora a perícia judicializada tenha concluído pela existência de insalubridade em grau máximo, é caso de deferimento de insalubridade em grau médio, relevando que, nos termos do art. 479 do CPC-15, o juiz não está adstrito ao laudo pericial. A atividades gerais desenvolvidas pela servidora não acarretam o contato com lixo urbano, mas apenas doméstico o que não enseja o pagamento do adicional de insalubridade, conforme disposições do Anexo 14 da NR – 15 da Portaria nº 3.214/78 do MTB.
4. De acordo com o STJ no julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei nº 413/RS, o termo inicial das parcelas eventualmente devidas é a data da elaboração do laudo pericial, sendo incabível presumir a insalubridade em período anterior e conferir efeitos retroativos à perícia.
5. O deferimento do adicional de insalubridade pelo Poder Judiciário não implica em violação aos princípios constitucionais da legalidade, independência dos poderes e autonomia administrativa dos entes federados quando há constatação de ilegalidade no agir da Administração Pública. O adicional de insalubridade é vantagem propter laborem e, portanto, a servidora receberá tal pagamento enquanto laborar nesta condição.
6. Ônus sucumbenciais redimensionados.

APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
DECISÃO MONOCRÁTICA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

Trata-se de apelação interposta por VALDENIR DE PAULA DORNELLES, uma vez que está inconformada com a sentença que julgou improcedente os pedidos por ela formulados na ação de cobrança ajuizada em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL pretendendo o pagamento de diferenças vencimentais decorrentes do reconhecimento ao direito do adicional de insalubridade (51.1).

Em suas razões, a apelante sustentou que o laudo pericial concluiu que as atividades por ela desenvolvidas são consideradas insalubres em grau máximo, bem como que os EPIs fornecidos não elidem o contato com o agente biológico. Referiu que a jurisprudência dessa Colenda Corte, tem entendido que, quando não demonstrado o regular fornecimento de equipamentos de proteção, o agente educacional, tanto merendeira quanto manutenção e infraestrutura, possui direito a receber a gratificação de insalubridade. Pediu o provimento do recurso para reconhecer o direito ao recebimento do adicional de insalubridade nos termos do laudo pericial (60.1).

O Estado ofertou contrarrazões destacando que a caracterização das atividades insalubres e o seu respectivo grau é feita mediante avaliação pericial do órgão próprio do Estado. Em caso de condenação, pugnou pelo reconhecimento da prescrição quinquenal e pela limitação da condenaçao ao período de efetivo exercício da atividade insalubre (63.1).

Os autos foram remetidos a esta Corte, indo com vista ao Dr. Ricardo Alberton do Amaral, Procurador de Justiça, que opinou pelo provimento da apelação (7.1).

É o relatório.

Decido.

Encaminho decisão monocrática pelo parcial provimento da apelação, fazendo-o com lastro no art. 932, IV, “b”, do CPC.

Como sempre digo em meus votos ao analisar a relação entre o servidor e a administração, o que não é diferente neste caso concreto, a Administração é livre para organizar o quadro de seus servidores em virtude da estrutura do Direito Administrativo se fundar na perspectiva de que as relações mantidas entre a Administração e seus funcionários não se baseiam em qualquer vínculo puramente privado, dito contratual; no âmbito da Administração todas as relações com os servidores são marcadas pela natureza institucional do vínculo. A propósito disso, é importante referir que “o Estado, ressalvadas as pertinentes disposições constitucionais impeditivas, deterá o poder de alterar a legislativamente o regime jurídico de seus servidores, inexistindo a garantia de que continuarão sempre disciplinados pelas disposições vigentes quando de seu ingresso. Então, benefícios ou vantagens, dantes previstos podem ser ulteriormente suprimidos. Bem por isso, os direitos que deles derivem não se incorporam integralmente, de imediato, ao patrimônio jurídico do servidor... (Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 28ª Ed, p. 286).

Em segundo lugar, destaco que a Administração, ao contrário do que sucede com os particulares, só pode atuar conforme a lei (art. 37 da CF-88 e 19 da CE-89). É a materialização do que a doutrina e a jurisprudência chamam de primado da legalidade, consoante a lição de Hely Lopes Meirelles, in verbis:

A legalidade, como princípio de administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e dele não pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil ou criminal, conforme o caso.

(...).

Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa “poder fazer assim”; para o administrador público significa “deve fazer assim”. (in Direito Administrativo Brasileiro, 25ª edição, p. 82).

Em terceiro lugar, a atuação administrativa também deve se pautar pelo respeito ao princípio da proporcionalidade (razoabilidade), mesmo não estando expresso diretamente em quaisquer dos artigos da CF-88, opera como critério de interpretação inseparável da Constituição e de aplicação obrigatória pelo administrador em seu agir, estando agora inserido expressamente no art. 19 da CE-89.

Nesta parte deve ser ressaltado que a EC nº 19/98, ao retirar do texto da Carta Política e Social da República a garantia ao servidor público do pagamento da gratificação pelo desempenho de atividades sujeitas a agentes perigosos ou insalubres, deve ser interpretada em consonância com todas as demais disposições inseridas no seu texto e também na legislação infraconstitucional. Não querendo aqui adentrar na discussão sobre a natureza jurídica do adicional de insalubridade, inserindo-o diretamente como garantia social fundamental, portanto cláusula pétrea que não poderia ser simplesmente suprimida, mesmo que pela via da emenda constitucional, proclamo que a sua promulgação não revogou as legislações dos entes federados que disciplinavam a concessão da aludida gratificação aos servidores públicos, em vista do princípio da autonomia a eles concedida pela própria CF-88 para disciplinar as relações ditas estatutárias.

Por outro lado, como disse Hely Lopes Meirelles, “... a gratificação por risco de vida ou saúde é uma vantagem pecuniária vinculada diretamente às condições especiais de execução do serviço”. E prosseguiu dizendo: “... não é uma retribuição genérica pela função desempenhada pelo servidor; é uma compensação específica pelo trabalho realizado em condições potencialmente nocivas para o servidor. O que se compensa com esta gratificação é o risco, ou seja, a possibilidade de dano à vida ou à saúde daqueles que executam determinados trabalhos classificados pela Administração como perigosos”. E arrematou o raciocínio destacando que “... essa gratificação só pode ser instituída por lei, mas cabe ao Executivo especificar, por decreto, quais os serviços e os servidores que irão auferi-la. Não será o servidor, nem o judiciário, que dirá se ocorre o risco gratificável, porque o conceito de risco, para fins de vantagem pecuniária não é técnico, nem jurídico: é meramente administrativo. O risco só existe, para efeito da gratificação, onde a Administração o admitir, e cessará quando ela o considerar inexistente. Por esse motivo, a gratificação por risco de vida ou saúde pode ser suprimida, ampliada ou restringida a todo o tempo, sem ofensa a direito dos que a estavam percebendo” (Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, 30ª edição, p. 478).

De outro giro, na Justiça do Trabalho a solução não seria diferente. Neste ponto, é importante salientar que no art. 190 da CLT, o legislador fez reserva: só as atividades listadas pelo Ministério do Trabalho podem gerar o direito à percepção do adicional de insalubridade. Por isso que, ao comentar a Consolidação das Leis do Trabalho, Eduardo Gabriel Saad faz a seguinte consideração: de conseguinte, só é atividade ou operação insalubre aquela que figure na relação oficial a cargo do Ministério do Trabalho. Não basta provar que este ou aquele trabalho seja prejudicial à saúde do trabalhador; é mister que ele apareça na relação...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT