Decisão Monocrática nº 50316756220228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 19-11-2022

Data de Julgamento19 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50316756220228210001
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003007321
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5031675-62.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias

RELATOR(A): Desa. MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA

APELANTE: HDL LOGISTICA HOSPITALAR LTDA. (IMPETRANTE)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (INTERESSADO)

EMENTA

MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. DIFAL. LEI COMPLEMENTAR Nº 190/2022. ANTERIORIDADE ANUAL E NONAGESIMAL.

"As leis estaduais ou do Distrito Federal editadas após a EC 87/15 que preveem o ICMS correspondente ao diferencial de alíquotas nas operações ou prestações interestaduais com consumidor final não contribuinte do imposto são válidas, mas não produzem efeitos enquanto não for editada lei complementar dispondo sobre o assunto" (RE 1.287.019/DF (Tema 1093) Min. Dias Toffoli). A partir da edição da Lei Complementar nº 190/2022, prevendo normas gerais sobre o diferencial de alíquota, portanto, passaram a produzir efeitos de forma imediata as normas estaduais, o que viabiliza a cobrança do imposto a partir de então.

Recurso desprovido.

DECISÃO MONOCRÁTICA

1. HDL LOGISTICA HOSPITALAR LTDA. impetrou mandado de segurança contra ato coator do SUBSECRETÁRIO DA RECEITA ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL para "impedir que o Estado do Rio Grande do Sul exija da Impetrante, antes de janeiro de 2023, ICMS decorrente do diferencial de alíquota nas operações interestaduais de circulação de mercadorias destinadas a consumidores finais não contribuintes do imposto".

Nos dizeres da inicial, (I) "conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5469, exige-se lei complementar para regular a nova relação jurídico-tributária prevista pelo artigo 155, inciso II, §2º, incisos VII e VIII, a e b, da Constituição Federal", (II) "apesar da Lei Complementar 190 de 2022 e do Convênio ICMS 236 de 2021, não é possível às Unidades da Federação cobrarem o diferencial de alíquota em questão, isso em razão dos Princípios da Não-surpresa e da Segurança Jurídica", (III) "o Supremo Tribunal Federal estendeu a inconstitucionalidade declarada na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5469 às legislações das Unidades da Federação, de modo que elas perderam eficácia desde 1º de janeiro de 2022", (IV) a Lei Complementar nº 190/2022 está sujeita ao princípio da anterioridade e (V) "as alíneas a, b e c do inciso III do artigo 150 da Constituição Federal representam um esforço do legislador constituinte em busca de previsibilidade e segurança jurídica". Pediu o deferimento da medida liminar (evento 01 - INIC1 - processo originário).

No evento 08, o pedido liminar foi indeferido (evento 08 - DESPADEC1 - processo originário). Interposto agravo de instrumento (processo nº 5069201-18.2022.8.21.7000), foi desprovido (evento 19 - processo originário).

Notificada, a autoridade coatora prestou informações. Sustentou que (I) "a entrada em vigor da lei complementar autoriza a imediata produção de efeitos das leis estaduais que instituíram o DIFAL nas respectivas Unidades da Federação", conforme decidido no julgamento do RE 1.221.330/SP e RE 917.950/SP-AgR, (II) a intenção do art. 3º do Projeto de Lei do qual se originou a Lei Complementar nº 190/2022 era estabelecer um período de vacatio legis de 90 (noventa) dias a contar da data da publicação da Lei, e não submeter a eficácia da cobrança do DIFAL ao princípio da anterioridade, (III) "a hipótese de interpretar e aplicar o art. 3º da Lei Complementar nº 190/2022, em sua parte final, como o Princípio Constitucional Tributário da Não Surpresa viola o pacto federativo, a competência tributária dos Estados e do Distrito Federal, bem como princípios constitucionais caros, tais quais a livre concorrência, a isonomia e a neutralidade tributária", (IV) "a declaração de inconstitucionalidade formal de cláusulas do Convênio ICMS nº 93/2015 em nada atingiu a validade das leis estaduais, as quais, inclusive, continuaram a ser aplicadas, em regra, durante todo o exercício de 2021" e (V) "a previsão da parte final do art. 3º da Lei Complementar nº 190/2022, se interpretada como pretende a Associação requerente, consubstancia verdadeira isenção heterônoma concedida pelo legislador federal" (evento 12 - INF_MAND_SEG1 - processo originário).

Na sentença, a MM. Juíza a quo denegou a segurança pelos seguintes fundamentos:

"Inicialmente, destaco que o art. 1º da Lei 12.016/01 prevê a hipótese de concessão de mandado de segurança para a proteção de direito líquido e certo que, por ilegalidade ou abuso de poder, tiver sido violado ou estiver em vias de sofrer agressão.

Na definição de Hely Lopes Meirelles: o objeto do mandado de segurança será sempre a correção de ato ou omissão da autoridade, desde que ilegal e ofensivo de direito individual ou coletivo, líquido e certo, do impetrante.”1

Considerando que a pretensão da parte demandante consiste em obter decisão judicial que reconheça a inexigibilidade da cobrança do diferencial de alíquota - DIFAL, não se pode olvidar que o Supremo Tribunal Federal, por maioria dos votos, julgou procedente o pedido formulado na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5469, declarando a inconstitucionalidade formal das cláusulas primeira, segunda, terceira, sexta e nona do Convênio n. 93/15. As normas declaradas inconstitucionais regulamentavam a cobrança do imposto nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS, localizado em outra unidade federada, uma vez que o acordo firmado entre as unidades federativas invadiu o campo próprio da lei complementar federal.

Naquela oportunidade, por maioria, o Supremo Tribunal Federal modulou os efeitos da declaração de inconstitucionalidade das referidas cláusulas primeira, segunda, terceira, sexta e nona do convênio questionado para que a decisão produza efeitos, quanto à cláusula nona (a qual determina que exigência se aplica aos contribuintes optantes do Simples Nacional), desde a data da concessão da medida cautelar nos autos da ADI nº 5.464/DF e, quanto às cláusulas primeira, segunda, terceira e sexta, a partir do exercício financeiro seguinte à conclusão deste julgamento, no ano de 2022, ficando ressalvadas da proposta de modulação as ações judiciais em curso.

Dessa forma, diante do entendimento exarado pelo STF, não há dúvida quanto à constitucionalidade das cobranças de DIFAL realizadas até 31/12/2021. Todavia, de acordo com a Suprema Corte, a partir de 01/01/2022, tal cobrança somente poderá ser efetuada depois de editada lei complementar.

Ocorre que a Lei Complementar n. 190/2022, editada para suprir o requisito constitucional exigido pelo STF, foi publicada em 05/01/2022, ou seja, no curso do exercício financeiro de 2022. Vale destacar que o próprio art. 3º da Lei Complementar determina que sua vigência deve observar as regras de anterioridade previstas na alínea "c" do inciso III da art. 150 da Constituição Federal:

Lei Complementar n. 190/2022

Art. 3º Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação, observado, quanto à produção de efeitos, o disposto na alínea "c" do inciso III do caput do art. 150 da Constituição Federal.

Constituição Federal

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

III - cobrar tributos:

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; (Vide Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

Pois bem. No caso em exame, ao contrário do entendimento apresentado na inicial, verifico que não há a instituição de novo tributo ou aumento de cobrança a ensejar a incidência das regras de anterioridade previstas no art. 150 da Constituição Federal. Isso porque, como já mencionado anteriormente, a matéria foi submetida a julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (tema 1093), no qual, diante da modulação de efeitos pro futuro, reconheceu, em natureza dúplice ou ambivalente, a constitucionalidade da cobrança até o final do ano de 2021.

Não se pode negar que a referida declaração proferida pelo Plenário da Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, dotada de eficácia vinculante (art. 927 do CPC), convalidou no ordenamento jurídico a cobrança do Diferencial de Alíquota de ICMS - DIFAL até dezembro de 2021. Logo, mostra-se desarrazoada a interpretação segundo a qual, até dezembro de 2021, o tributo era plenamente existente, válido e exigível e que, na sequência, passou a não mais existir no mundo jurídico, isso durante os 4 primeiros dias deste ano (de 01/01/2022 até 04/01/2022), voltando a ser instituído através da LC 190/2022, publicada em 05/01/2022, para ter incidência somente a partir do ano de 2023.

Ora, os termos da modulação de efeitos pro futuro, firmada pelo STF, fulminam, por inteiro, a alegação de que o DIFAL corresponderia a um tributo novo, inexistente ou estranho ao ordenamento jurídico. Pelo contrário, até dezembro de 2021 o tributo era notoriamente existente, válido e produzia efeitos, razão pela qual inúmeras operações realizadas até então, foram devidamente submetidas à incidência do DIFAL. Entendimento em...

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