Decisão Monocrática nº 50389442620208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 06-02-2023

Data de Julgamento06 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50389442620208210001
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002899152
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5038944-26.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: REGINA MARIA FERREIRA DOS SANTOS (AUTOR)

APELANTE: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Nos autos da ação revisional ajuizada por REGINA MARIA FERREIRA DOS SANTOS em desfavor de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. apelaram ambas as partes em face da sentença que assim dispôs:

Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para o fim de limitar os juros remuneratórios do contrato de empréstimo à taxa média de mercado à época da contratação (2,07% a.m.) e descaracterizar a mora, condenando o réu à devolução dos valores cobrados em excesso, subtraindo-os, se for o caso, das parcelas vincendas, com a repetição simples do indébito caso exista crédito em favor da parte autora após a compensação dos valores, quantia corrigida monetariamente pelo IGP-M a partir de cada desembolso e acrescida de juros de mora de 1% ao mês a contar da data da citação.

Considerando a sucumbência que toca à parte autora, decorrente da ausência de prova da má-fé, o decaimento é mínimo, a ensejar a condenação da parte demandada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao procurador da parte adversa, fixados em R$1000,00 (um mil reais).

Em razões, a parte ré alega a ausência de abusividade dos juros remuneratórios a ensejar a limitação realizada na sentença. Refere a impossibilidade da descaracterização da mora e da repetição do indébito. Pede provimento (evento 66).

Em razões, a parte autora alega que a sentença é extra petita no tocante à compensação, eis que esta não foi postulada. Requer que os valores repetidos sejam corridos pelo IGP-M, com incidência de juros de mora, ambos desde cada desembolso. No tocante à verba honorária, refere a necessidade de atualização conforme a variação do IGP-M/FGV, desde a data da sentença, e juros de mora de 12% ao ano, desde a data do trânsito em julgado. Postula a majoração da verba honorária para 20% sobre o valor da causa. Pede provimento (evento 68).

Foram apresentadas contrarrazões por ambas as partes (eventos 72 e 73).

É o relatório.

VOTO

A apelação do evento 66 é tempestiva, pois a parte ré tomou ciência da sentença em 14/03/2022 (evento 61) e o recurso foi interposto em 28/03/2022. Além disso, restou comprovado o pagamento do preparo (evento 66 - COMP2).

O mesmo ocorre com a apelação do evento 68, uma vez que a parte autora tomou ciência da sentença em 15/03/2022 (evento 62) e o recurso foi interposto em 01/04/2022. Quanto ao preparo, a parte autora, intimada para o recolhimento em dobro, cumpriu tal determinação (evento 9).

Dessa forma, considerando que os recursos são próprios e tempestivos, recebo as apelações, as quais passo ao exame.

Inicialmente, saliento que é objeto da revisão o Contrato de Empréstimo pessoal nº 802087213, firmado em 07/11/2014, no valor de R$ 34.000,00, com juros remuneratórios de 3,51 % ao mês (evento 1 – CONTR4).

1. JUROS REMUNERATÓRIOS.

Relativamente aos juros remuneratórios estabelecidos nos contratos bancários e sua limitação, esta Câmara posiciona-se em consonância com o entendimento sedimentado pelo STJ, que, com o advento da Lei n. 4.595/1964, diploma que disciplina de forma especial o Sistema Financeiro Nacional e suas instituições, afastou a incidência da Lei de Usura, tendo ficado delegado ao Conselho Monetário Nacional poderes normativos para limitar as referidas taxas, salvo as exceções legais.

Inclusive, a Súmula n° 596 do STF dispõe que: As disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional”.

O STJ, por intermédio da Súmula 382, sedimentou a matéria, no sentido de que a estipulação dos juros remuneratórios em percentual acima de 12% ao ano não indica abusividade, in verbis:

A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.

Conquanto aplicável o CDC às instituições bancárias, o STJ consolidou o entendimento de que o pacto referente à taxa de juros só pode ser alterado se reconhecida sua abusividade em cada hipótese, uma vez que a pactuação é livre entre as partes.

Portanto, a limitação dos juros remuneratórios, quando demonstrada a taxa contratada, somente ocorrerá se comprovado que a taxa contratada é superior à taxa média para as operações financeiras similares. A limitação dos juros remuneratórios é medida excepcional, quando demonstrado que a taxa contratada apresenta significativa discrepância em relação à taxa média de mercado.

Neste caso, far-se-á a limitação com base nas taxas divulgadas e publicadas pelo Bacen, que reflete a média de mercado.

Nesse sentido, já decidiu esta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. OBJETO. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL Nº 1210274873, CELEBRADO EM 27/04/2017, NO VALOR DE R$ 3.522,05. ENCARGOS DA NORMALIDADE JUROS REMUNERATÓRIOS. APLICAÇÃO DAS ORIENTAÇÕES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, EXTRAÍDAS DOS JULGAMENTOS DOS RECURSOS ESPECIAIS REPRESENTATIVOS DE CONTROVÉRSIA N. 1.061.530/RS E N. 1.112.879/PR. AFINADO A ISSO, O ENTENDIMENTO DESTA CÂMARA É DE QUE A TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS DEVE SER LIMITADA SOMENTE QUANDO FOR SUPERIOR À TAXA MÉDIA DE MERCADO REGISTRADA PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL – BACEN, À ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO E EM CONFORMIDADE COM A RESPECTIVA OPERAÇÃO, SOMADA DO PERCENTUAL DE 30% (TRINTA POR CENTO), TIDO COMO A MARGEM TOLERÁVEL. NO CASO, ASSISTE RAZÃO À PARTE AUTORA COM RELAÇÃO À TAXA ADEQUADA À OPERAÇÕA PRESENTE NO CONTRATO ORA REVISANDO. DESSE MODO, CONSIDERANDO QUE AS TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONSTANTES NO CONTRATO REVISANDO FORAM PACTUADAS ACIMA DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN, AINDA QUE ACRESCIDA DA MARGEM DE 30% UTILIZADA COMO PARÂMETRO POR ESTA CÂMARA, TEM-SE COMO CARACTERIZADA A ALEGADA ABUSIVIDADE. CABÍVEL, POIS, A PRETENSÃO DE REDUÇÃO DOS JUROS, DEVENDO SER APLICADA A TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN À ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO (20743 E 25465 - TAXA MÉDIA MENSAL E ANUAL DE JUROS DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO COM RECURSOS LIVRES - PESSOAS FÍSICAS - CRÉDITO PESSOAL NÃO CONSIGNADO VINCULADO À COMPOSIÇÃO DE DÍVIDAS), E NÃO A TAXA DE 8,48% ESPECIFICADA NA SENTENÇA. NO PONTO, RECURSO PROVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. MAJORAÇÃO. INOCORRÊNCIA. EM SE TRATANDO DE AÇÃO REVISIONAL DE CUNHO DECLARATÓRIO, OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA NÃO PODEM SER ARBITRADOS PELO VALOR DA CONDENAÇÃO E TAMPOUCO SOBRE O VALOR DA CAUSA, MAS SIM DE FORMA EQUITATIVA. ADEMAIS, TAMPOUCO É O CASO DE MAJORAÇÃO, COMO PRETENDE A AUTORA, POIS ARBITRADOS DE ACORDO COM OS PARÂMETROS DESTA CÂMARA EM CASOS SIMILARES. NO PONTO, APELAÇÃO DESPROVIDA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 50364904420188210001, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Maraschin dos Santos, Julgado em: 15-12-2021) (grifei)

Cumpre mencionar que a apuração da abusividade dos juros remuneratórios é verificada pela taxa média de mercado registrada pelo BACEN, como já acima referido, somada a esta o percentual de 30% (trinta por cento), tido pela Câmara como margem tolerável.

Cito:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE CRÉDITO PESSOAL. - Juros remuneratórios. A aplicação de taxa substancialmente superior à média de mercado divulgada pelo BACEN (30% acima, conforme entendimento desta Câmara) é abusiva, sendo passível de limitação à referida taxa média. Na hipótese, há abusividade dos juros contratados, devendo ser mantida limitados à taxa média de mercado para as operações de crédito pessoal não consignado, e não à taxa de crédito pessoal total pretendida. Desprovido no ponto. - Honorários advocatícios. Os honorários advocatícios devem ser majorados para adequarem-se aos parâmetros adotados pela Câmara em casos semelhantes. Provido no tópico. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 50015250920208210021, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cairo Roberto Rodrigues Madruga, Julgado em: 15-12-2021)(grifei)

Feitas essas considerações, passo ao exame do contrato submetido à apreciação judicial.

Contrato de Empréstimo pessoal nº 802087213, firmado em 07/11/2014, no valor de R$ 34.000,00, com juros remuneratórios de 3,51% ao mês; enquanto a taxa média divulgada pelo Bacen para operações de crédito pessoal consignado para trabalhadores do setor público, à época, era de 1,80% ao mês, que, somada ao percentual de 30%, resulta em 2,34% ao mês.

Desse modo, levando em consideração a tabela do Bacen para as operações da espécie, constata-se que os juros remuneratórios pactuados estão superiores à taxa média de mercado.

No entanto, mantenho a limitação imposta na sentença em 2,07% ao mês, fins de evitar reformatio in pejus.

2. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA.

Adoto atual posicionamento do STJ, que considera que a cobrança do crédito com acréscimos indevidos, como por exemplo, juros remuneratórios excessivos, não tem o condão de constituir o devedor em mora, porque dificultado o pagamento, causando a impontualidade da qual ainda se beneficiaria com a aplicação da cláusula penal (EREsp n. 163.884/RS).

Além do Resp. suprarreferido, cito outro precedente da Superior Instância:

AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL.

CONTRATO BANCÁRIO. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. FALTA DE IMPUGNAÇÃO A FUNDAMENTO DA DECISÃO AGRAVADA. INCIDÊNCIA DO VERBETE 283 DA SÚMULA/STF. NÃO PROVIMENTO.

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