Decisão Monocrática nº 50435950620228210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 17-05-2023

Data de Julgamento17 Maio 2023
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50435950620228210010
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003784030
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5043595-06.2022.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR(A): Des. ROBERTO SBRAVATI

APELANTE: VALQUIRIA PIRES FERREIRA (AUTOR)

APELADO: AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. REVISÃO DE CONTRATO.

DA APLICAÇÃO DO CDC E DOS CONTRATOS DE ADESÃO. RELAÇÃO CONSUMERISTA CONFIGURADA. PRESENÇA DE CONSUMIDOR E FORNECEDOR; ARTS. E DA LEI 8009/90. SÚMULA 297, STJ. LEI PROTETIVA APLICÁVEL AO CASO CONCRETO.

TARIFA DE CADASTRO – A TARIFA DE CADASTRO SOMENTE PODERÁ INCIDIR NO INÍCIO DO RELACIONAMENTO ENTRE O CONSUMIDOR E A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, DESDE QUE CONTRATADO EXPRESSAMENTE, RESSALVADO A ANÁLISE DA ABUSIVIDADE NO CASO CONCRETO, SE COMPARADA COM A MÉDIA MENSAL DIVULGADA PELO BACEN. SÚMULA Nº 566 DO STJ. AUSÊNCIA DA ABUSIVIDADE ALEGADA PELO CONSUMIDOR, RAZÃO PELA QUAL DEVE SER MANTIDA A COBRANÇA, CONFORME CONTRATADO.

SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. Aplicação do entendimento exarado nos REsp n. 1.639.259/SP e REsp n. 1.639.320/SP – Tema 972/STJ. “Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada.” Venda casada configurada, afastada sua pactuação.

DA MORA. É A CONSTATAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE NO PERÍODO DA NORMALIDADE QUE TEM O CONDÃO DE AFASTAR A MORA DO DEVEDOR. PRESENTE A ILEGALIDADE CONTRATUAL, A MORA DEVE SER AFASTADA.

DA TUTELA ANTECIPADA. ESTANDO PRESENTES TODOS OS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA, SEU DEFERIMENTO ESTÁ CONDICIONADO À REALIZAÇÃO DOS DEPÓSITOS NOS VALORES RECALCULADOS CONFORME ESTA DECISÃO.

APELO PARCIALMENTE PROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de apelação interposta por VALQUIRIA PIRES FERREIRA contra sentença proferida nos autos da Ação de Revisão de Contrato que, o ora apelante, ajuizou em face do AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.

A sentença recorrida assim decidiu:

Assim, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação revisional ajuizada por VALQUIRIA PIRES FERREIRA contra AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., para:

1) determinar a revisão do(s) contrato(s) objeto(s) dos autos para:

- limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado, para o mês da contratação, permitida a capitalização, na forma da fundamentação.

2) condenar a parte ré a compensar o débito com o crédito da parte autora decorrente desta revisão, corrigindo-se monetariamente as parcelas pagas a maior pelo IGP-M, a contar de cada desembolso, com juros moratórios de 1% ao mês desde a citação e, remanescendo saldo credor em favor da parte autora, os valores deverão ser restituídos, na forma simples, com a mesma forma de atualização monetária e juros determinados na compensação;

3) revogar a antecipação de tutela, em razão do descumprimento dos requisitos impostos na decisão concessiva da liminar, mantendo-se hígida a mora contratual;

4) rejeitar os demais pedidos, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Condeno cada uma das partes ao pagamento de 50% das custas processuais, além de honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa.

Apela a Autora (evento 49). Requer o provimento do recurso para a reforma da sentença a fim de possibilitar a revisão das quantias cobradas em excesso, pleiteando pela declaração da inexistência da mora; pela exclusão da tarifa de cadastro e do seguro, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor; e pelo deferimento da tutela antecipada.

Com as contrarrazões (evento 54), subiram os autos a este Tribunal.

Vieram os autos conclusos e em condições de julgamento.

É o relatório.

Decido.

Na forma do art. 932, V, alíneas ‘a’ e ‘b’, do CPC dou parcial provimento ao recurso, tendo em vista que a decisão profligada encontra-se em dissonância parcial com as Súmulas e o entendimento firmado em recursos repetitivos julgados pelo Superior Tribunal de Justiça quanto ao tema, senão vejamos.

DA APLICAÇÃO DO CDC

Enfrenta-se a questão da aplicabilidade do CDC ao caso em tela.

É consabido que se tem matéria sumulada – verbete 297, do colendo STJ.

Contudo, oportuno referir que, mesmo antes da edição de dita Súmula, já se admitia a incidência da lei consumerista para casos como o que se está a examinar.

O conceito de fornecedor e consumidor está plenamente caracterizado e o tema encontra-se pacificado nos Tribunais, razão pela qual a aplicabilidade do CDC, no caso concreto, é irrefragável.

TARIFA DE CADASTRO

Consoante sedimentado no Resp paradigmático nº 1.251.331-RS, da relatoria da Eminente Min. Maria Isabel Gallotti, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, a tarifa de cadastro possui como fato gerador a remuneração do serviço de “pesquisa em serviços de proteção ao crédito, base de dados e informações cadastrais, e tratamento de dados e informações necessários ao início de relacionamento decorrente da abertura de conta de depósito à vista ou de poupança ou contratação de operação de crédito ou de arrendamento mercantil, não podendo ser cobrada cumulativamente”.

Nesta esteira, segundo a conclusão daquele Sodalício, a Tarifa de Cadastro “somente pode incidir no início do relacionamento entre o cliente e instituição financeira, e se justifica pela necessidade de ressarcir custos com realização de pesquisas em cadastros, bancos de dados e sistemas”.

Ainda, a Súmula nº 566 do STJ assim orienta:

“Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira."

Portanto, tem-se que a cobrança de referida tarifa mostra-se passível de contratação, desde que a instituição financeira limite a sua incidência somente na primeira relação contratual com o consumidor, ou seja, no início do relacionamento entre consumidor – fornecedor, não sendo permitida sua cobrança a cada novo contrato firmado entre as partes.

Ainda, convém salientar que embora permitida a sua cobrança, desde que pactuada de forma clara e objetiva, o fato é que se mostra cabível a análise, caso a caso, de eventual excessiva onerosidade em sua contratação, mediante comparativo a ser feito pela média mensal divulgada pelo BACEN.

Nesse sentido, transcrevo o trecho do voto da Eminente Min. Maria Isabel Gallotti, no Resp paradigmático nº 1.251.331 – RS:

“Reafirmo o entendimento acima exposto, no sentido da legalidade das tarifas bancárias, desde pactuadas de forma clara no contrato e atendida a regulamentação expedida pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central, ressalvado abuso devidamente comprovado, caso a caso, em comparação com os preços cobrados no mercado.

Esse abuso há de ser objetivamente demonstrado, por meio da invocação de parâmetros objetivos de mercado e circunstâncias do caso concreto, não bastando a mera remissão a conceitos jurídicos abstratos ou à convicção subjetiva do magistrado.

Anoto que o Banco Central do Brasil divulga os valores mínimo, máximo, a periodicidade de cobrança, e a média das diversas tarifas cobradas pelos bancos, o que permite, a exemplo do que já ocorre com os juros remuneratórios, e em conjunto com as demais circunstâncias de cada caso concreto, notadamente o tipo de operação e o canal de contratação, aferir a eventual abusividade, em relação às práticas de mercado, das tarifas cobradas.”

Desta forma, a cobrança da Tarifa de Cadastro não está limitada pelos lindes legais, mas tampouco está de todo liberada, devendo estar em harmonia com a média do mercado divulgada pelo BACEN, e sem resultar em vantagem exagerada por parte da instituição financeira.

No caso em exame, o pacto prevê Tarifa de Cadastro em R$850,00, ou seja, em valor superior à média do mercado apurada para o período em que se deu a celebração, que era de R$599,61. No entanto, na esteira de recentes decisões desta Colenda Corte, não percebo abusividade nesta variação, eis que entre a média e o valor efetivamente praticado, há proximidade compatível com a razoabilidade. Destarte, sua cobrança deve ser mantida tal qual avençado.

SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA

Conforme restou definido no julgamento dos Recursos...

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