Decisão Monocrática nº 50457129420228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 19-08-2022

Data de Julgamento19 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50457129420228210001
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoTerceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002605300
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5045712-94.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Anulação e Correção de Provas / Questões

RELATOR(A): Des. LEONEL PIRES OHLWEILER

APELANTE: IGOR SANTETTI LAZARI (IMPETRANTE)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (IMPETRADO)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. CONCURSO PÚBLICO. MANDADO DE SEGURANÇA. BRIGADA MILITAR. EDITAL nº 01/2021/2022. Soldado de Nível III. PROVA OBJETIVA. ANULAÇÃO DAS QUESTÕES NºS 18, 20, 22, 23, 25, 40 e 44. ILEGALIDADE NÃO CONFIGURADA. NULIDADE DA SENTENÇA NÃO VERIFICADA.

1. O juízo de origem fundamentou sua decisão, não incidindo em nenhuma das hipóteses do § 1º do artigo 489 do CPC. Afastada a alegação de nulidade da sentença.

2. Inexiste obrigatoriedade de instauração do incidente de uniformização de jurisprudência, uma vez que se trata de faculdade disposta ao julgador em face de eventual divergência entre os entendimentos desta Corte. No caso, o apelante não indicou qualquer divergência de entendimento entre as Câmaras que compõem o 2º Grupo Cível desta Corte, limitando-se a alegar a existência de "decisões interlocutórias divergentes entre si". Rejeitado o pedido de instauração do incidente.

3. O direito líquido e certo é aquele que se mostra inequívoco, sem necessidade de dilação probatória, exigindo-se para sua configuração a comprovação dos pressupostos fáticos adequados à regra jurídica.

4. O ponto central da polêmica em relação aos concursos públicos reside na abrangência do controle jurisdicional sobre as provas do concurso realizado pela Administração Pública, considerando especialmente o artigo 2º da Constituição Federal que estabelece a independência e harmonia entre os poderes.

5. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal adota atualmente o entendimento segundo o qual o controle deve ser exercido com restrição, primando pelo exame de questões relacionadas à legalidade, sendo vedado substituir a banca examinadora para avaliar as respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas, excepcionalmente admitindo-se controlar o juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do concurso com o edital, conforme julgamento do RE 632853/CE, rel. Min. Gilmar Mendes, datado de 23.04.2015, com repercussão geral.

6. Hipótese em que não foi demonstrado que as questões nºs 18, 20, 22, 23, 25, 40 e 44 possuem as ilegalidades apontadas.

APELAÇÃO DESPROVIDA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

IGOR SANTETTI LAZARI impetrou mandado de segurança contra ato do PRESIDENTE DA COMISSÃO DE CONCURSO PÚBLICO DA BRIGADA MILITAR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.

O magistrado de 1º grau denegou a segurança, nos seguintes termos:

Ante o exposto, DENEGO A SEGURANÇA.

Custas pela impetrante. Deixo de condená-la ao pagamento de honorários advocatícios à parte adversa, com base no art. 25, da Lei nº 12.016/2009.

Publique-se. Intime-se. Registre-se.

Em razões de apelação (evento 38), o impetrante reitera a existência de nulidades das questões de nºs 18, 20, 22, 23, 25, 40 e 44, pois apresentam erros grosseiros e duplicidade de respostas. Sustenta, em síntese, que é passível de controle pelo Poder Judiciário a análise de ilegalidades de questões de concurso público, razão pela qual devem ser examinadas as questões apresentadas. Afirma que a sentença recorrida fere os direitos fundamentais de acesso ao Poder Judiciário (inafastabilidade da jurisdição) e a necessidade de fundamentação das decisões judiciais, com descumprimento das normas constitucionais dos artigos 5º, inciso XXXV, e 93, IX, e ao devido processo legal, previsto no artigo 5º, inciso LIV, todos da CF. Pede a instauração de Incidente de Assunção de Competência e Uniformização de Jurisprudência, tendo em vista "decisões interlocutórias divergentes entre si". Postula o provimento da apelação.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 44), pugnando pela manutenção da sentença.

Subiram os autos, e, neste grau, o Ministério Público, em parecer da Procuradora de Justiça Cristiane Todeschini, manifestou-se pelo desprovimento da apelação (evento 7).

É o relatório.

Decido.

I - CABIMENTO DA DECISÃO MONOCRÁTICA.

O artigo 932, incs. IV e V, do Código de Processo Civil, assim dispõe:

Art. 932. Incumbe ao relator:

IV - negar provimento a recurso que for contrário a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

E o Colendo Órgão Especial deste Tribunal aprovou o Novo Regimento Interno, dispondo:

Art. 206. Compete ao Relator:

XXXVI - negar ou dar provimento ao recurso quando houver jurisprudência dominante acerca do tema no Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça com relação, respectivamente, às matérias constitucional e infraconstitucional e deste Tribunal;

II – PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE.

O apelo é tempestivo e está isento de preparo em virtude da concessão do benefício da gratuidade judiciária. Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

III - MÉRITO.

Cabimento do Mandado de Segurança

Conforme determina o artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal:

“conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”.

A Lei nº 12.016/09, no seu artigo 1º, caput, igualmente prevê:

Art. 1º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.

O direito líquido e certo é aquele que se mostra inequívoco, sem necessidade de dilação probatória, urgindo, para sua configuração, a comprovação dos pressupostos fáticos adequados à regra jurídica. A propósito do tema, alude Hely Lopes Meirelles1:

“... o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais.”

Sobre o ponto, importa referir o entendimento do Ministro Luiz Fux:

“O direito líquido e certo no Mandado de Segurança diz respeito à desnecessidade de dilação probatória dos fatos em que se fundamenta o pedido. Trata-se de pressuposto processual objetivo (adequação do procedimento), que não subtrai do autor o direito à jurisdição sobre o litígio, mas apenas invalida a sua tutela através da via do Mandado de Segurança.

(...)

“O direito líquido e certo é, pois, requisito lindeiro ao âmbito probatório, posto referir-se à comprovação dos fatos e não ao direito objetivo em si, emigrando para o campo eminentemente processual. É, então, titular do direito líquido e certo aquele que demonstrar, desde o ajuizamento da ação, a incontestabilidade do seu direito, mediante prova pré-constituída, em regra, consubstanciada em prova documental ou prova documentada, como v.g., uma justificação ou uma produção antecipada.

(...)

“A liquidez e a certeza, consoante a concepção ora lavrada, não erigem óbice à investigação jurídica da questio iuris envolta no mandamus, exigindo-se tão-somente que os fatos sejam comprovados de plano. Isso quer dizer que a complexidade da interpretação das normas atinentes ao direito invocado não apresenta óbice ao cabimento da ação, tratando-se inclusive de entendimento sumulado –Súmula n. 625 – pelo Supremo Tribunal Federal.”2

A partir da regulação constitucional e da própria Lei nº 12.016/09, também se exige a presença de ilegalidade ou abuso de poder. Ao examinar tais expressões, M. Seabra Fagundes, em obra clássica sobre o tema do controle dos atos administrativos, destacou a abrangência do conteúdo “ilegalidade” tanto em relação à ilegalidade infraconstitucional, como a oriunda de violações de dispositivos constitucionais3, sendo até desnecessária a referência ao abuso de poder. De qualquer modo, conforme Marçal Justen Filho:

“O mandado de segurança destina-se a atacar a ação ou a omissão que configurem ilegalidade ou abuso de poder. A fórmula constitucional é tradicional e revela, em última análise, a tutela, não apenas aos casos de vício no exercício de competência vinculada, mas também no caso de defeito no desempenho de competência discricionária. Há casos em que a lei condiciona a existência ou a fruição de um direito subjetivo a pressupostos determinados, caracterizando-se uma disciplina vinculada. Se, numa hipótese dessas, houver indevida denegação do direito subjetivo assegurado a alguém, o interessado poderá valer-se do mandado de segurança para atacar essa ilegalidade. Alude-se à ilegalidade para indicar que a decisão atacada infringe a disciplina legal, uma vez que recusa ao interessado um direito cujos...

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